Moran

A adaga na escuridão


–Sebastian, você esteve fora por bastante tempo. Talvez tempo demais - o Professor Moriarty cumprimentou o visitante com um sorriso jovial que transformava suas feições austeras em uma expressão afável, daquelas capaz de inspirar confiança imediata. Mantinha os braços abertos enquanto caminhava até a entrada de seu gabinete para, finalmente, abraçar Sebastian Moran como a um filho que retorna ao lar.

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–Professor - falou em voz saudosa enquanto abaixava levemente a cabeça em uma espécie de reverência. - Sinto muito por Jim e quero que o senhor saiba que eu não deixarei que a morte dele passe desapercebida.

Moriarty ainda mantinha as mãos apoiadas no ombro de Sebastian e permaneceu daquela forma enquanto, com o semblante impassível, sondava o homem a sua frente.

–Tanto tempo já se passou... Por que agora? - perguntou cautelosamente, sem concordar ou discordar com a proposta de Moran.

–Eu tive alguns problemas - respondeu com relutância evidente.

–Problemas? Jogos, talvez? Irritou alguém que não deveria? - o Professor deu de ombros enquanto caminhava de volta a sua mesa, sentando-se com a postura de alguém que conduz uma entrevista de emprego. O tom paternal servia somente para mascarar a reprovação. - Mas, de todas as formas, você já está aqui há mais de um ano. Portanto, repito a pergunta: Por que agora? Entediou-se com a rotina londrina?

–Todas as minhas dívidas pendentes foram resolvidas. Esperei até agora para não lidar com Sherlock Holmes enquanto sou flanqueado pelos falsos amigos.

–"Flanqueado". Um termo de batalhas. Sente falta da sujeira da guerra? - os olhos vítreos não deixavam que um movimento facial de Sebastian passasse em branco; percebiam e analisavam tudo.

–Estou agindo agora - ignorou a pergunta anterior - porque não tive sinal nenhum de que o senhor estava fazendo algo. - Essa objeção era a mais próxima de uma reprimenda que Sebastian atrevia-se a dizer.

–Eu acho, Sebastian, que você é um homem sem nada a perder - Moriarty também ignorou a crítica - E homens como você são perigosos, perdem a perspectiva - disse a última palavra lentamente, como se saboreasse cada sílaba. - Começam a agir por impulso, se acham invencíveis... Jim sempre foi inconsequente e teatral. Brilhante, sem dúvida nenhuma, mas somente um garoto. Ficou público demais e eu não pude interferir. Você entende, claro, que meu trabalho consiste na transparência.

–Está dizendo que não vai me ajudar a trazer vingança ao seu irmão?

–Não, Sebastian. Estou dizendo somente que tenho outras formas de agir e gosto de não ter detetives particulares entediados nos meus calcanhares. Jim queria desafios, testar a inteligência, encontrar um inimigo à altura... Eu não preciso da glória. Parece-me muito mais genial quando seu inimigo nem ao menos sabe que você existe, não? - e sorriu mais uma vez daquela maneira que tornava fácil de gostar do régio professor.

–Sherlock Holmes também não me conhece. Ainda.

Moriarty soltou um suspiro que poderia ter soado como uma risada. Com sua calma descomunal tentou restaurar a razão de Moran.

–Há anos, um taxista com uma sentença de morte fez com que meu nome chegasse aos ouvidos de Sherlock Holmes pela primeira vez. Então, Jim começou a brincar o seu grande jogo e o detetive assumiu que tudo se tratava dele. Portanto, permaneci no anonimato e tornei minhas ações cada vez mais sutis. Seu espírito jovem talvez possa ver isso como covardia. Não temo o Sr. Holmes, lhe garanto, mas uma adaga na escuridão é bem mais perigosa que uma arma engatilhada. Entretanto suponho que depois disso - indicou a televisão desligada, fazendo uma menção ao vídeo de Jim que fora reproduzido em toda Londres - você não tenha mais outra opção. Todo o dinheiro que precisar, encontrará aqui, porém lembre-se de uma coisa: meu nome, minha existência e tudo que eu represento nunca deverá chegar aos ouvidos de Sherlock Holmes.

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Sebastian Moran concedeu-lhe um sorriso de canto e Moriarty já quase podia entrever seus planos futuros, mas não se engava. Estava olhando para um homem morto, contudo, como todos os condenados, Moran ainda podia afundar muitos juntamente a si.

Nada importava, contanto que ele permanecesse sendo a adaga na escuridão.

–x-

Os Holmes, juntamente com John e Mary Watson, acompanharam Amelia Murray e seu séquito de homens armados engravatados até uma propriedade do governo britânico usada para fins que eles somente poderiam imaginar. Poderia ser tida como uma espécie de pousada devido suas várias portas visíveis, mas não havia ninguém no local e o que aquelas fechaduras ocultavam, eles também só poderiam especular.

Mycroft não permaneceu, outro carro lhe esperava no local e ele não concedeu-lhes nem ao menos um olhar de despedida ou alguma instrução, somente foi embora.

–Sra. Watson, a senhora pode aguardar em um dos quartos... - Amelia Murray começou a falar enquanto fazia menção para que dois de seus homens escoltassem Mary.

–Ei, ei - John Watson protestou - se a senhora acha que eu vou deixar minha esposa grávida...

–Por favor, me poupe do falatório. Não vamos machucá-la. - desconsiderou a opção com um tom despreocupado - E, acima de tudo, não estou lhe dando propriamente uma escolha.

–Está tudo bem, John. Eles não vão me machucar - Mary tentou tranquilizá-lo e seguiu dois dos homens de Amelia até um dos quartos. Eles a deixaram entrar sozinha e permaneceram postados em sua porta. John continuava desconfortável com aquela situação e procurava apoio em Sherlock que, por sua vez, adotava a expressão desprovida de qualquer indicação de que ao menos estava ali, presenciando toda a situação.

O detetive deu alguns passos a frente, ficando somente a um palmo de distância de Amelia Murray. Inclinou-se levemente para igualar suas alturas, posicionando o rosto próximo ao ouvido da agente.

–Você não vai querer machucá-la - afirmou em um murmúrio rouco audível somente para ela.

–Está me ameaçando, Sr. Holmes? - retrucou Amelia, afastando o rosto para trás de modo que pudesse olhar Sherlock de frente.

–Você não vai querer machucá-la - repetiu, sem dar importância ao ato que poderia estar repleto de insensatez - Eu não ligo para quem quer que você seja ou o que quer que você faça. Mas garanto, não vai querer machucá-la.

Dizendo isso, afastou-se e sentou em um dos sofás disponíveis na salão de entrada, seguido por John.

–O que disse a ela? - quis saber.

–Queria saber onde eu me inscrevia para ter minha própria horda de homens mal encarados dispostos a assustar quem estiver na minha frente na fila do banco ou supermercado - respondeu, descartando a pergunta do amigo.

–Sherlock, sei que você se acha engraçado, mas essa não é hora para brincadeiras. E você nem vai a nenhum desses lugares. - retrucou em um sussurro ríspido. Ambos olhavam para Amelia, que dava ordens aos seus homens e, em seguida, virou-se para eles.

–Então? Devemos começar?

–x-

Estavam em Baker Street, mergulhados em um silêncio que chegava a ser palpável. Sherlock estava sentado em sua posição costumeira e o casal Watson esperava que ele dissesse algo.

–O que exatamente ela mandou que ele fizesse? - murmurou Mary para o marido.

–Não investigar nada a não ser que fosse convocado.

–Isso quer dizer que...

–Ele vai investigar tudo, encontrar pistas, obstruir provas da polícia, ser quase preso e fazer de tudo para chegar ao fim dessa história sem a interferência do governo. Provavelmente arriscará a carreira de Lestrade algumas vezes e a minha vida também.

–Então basicamente o de sempre.

–Isso mesmo.

–Vocês sabiam - a voz altiva de Sherlock Holmes interrompeu a conversa do casal - que Moriarty tinha um irmão? Vamos Watson, agora deve ser a hora perfeita. Mary, fique à vontade - sorriu para ela enquanto pegava seu sobretudo.

–Hora perfeita para que exatamente? - questionou John.

–Ele não está em casa esse horário e a empregada deixa o serviço às 4 da tarde.

–Você está sugerindo que...

–John, por favor, cale essa boca e vá logo invadir a casa do pobre professor com Sherlock - Mary objetou, encerrando a discussão.

–Se sua esposa não estivesse grávida, você nem apareceria nos meus planos investigativos, John.

E dirigiram-se para a casa do célebre Professor Moriarty.

–x-

Quase uma hora se passou antes que Amelia Murray finalmente concordasse que eles não tinham nada a ver com a suposta volta de James Moriarty. E, mesmo permitindo que fossem embora, os três sabiam que estariam sob vigilância.

Quando já estava sozinha, longe até mesmo da vista de seus homens, Amelia fez uma ligação.

–Ele não parece saber de nada. Juro que está tão surpreso quanto nós. Não acho que isso seja a volta de Moriarty. Acho que, infelizmente, ele continua morto - fez uma pausa, esperando a resposta do outro lado da linha - Sebas... Oh, sim... Eu entendo... Sim, Professor. Claro.