Moon Lovers: The Second Chance

Um Wang de Orgulho Ferido


Por mais que lesse os importantes documentos, Gun não conseguia se concentrar. Sua segunda semana como CEO avançava na empresa e ele, frustrado por não conseguir se dedicar ao cargo cem por cento, mantinha a mente enevoada, os pensamentos o distraindo com problemas que nem deveriam existir. O semblante dissimulado de Shin não saía de sua cabeça. Maldito intruso. O desfecho daquele jantar acontecera na noite passada, mas se o rapaz fechasse os olhos, era como se irmão estivesse na sua frente, zombando novamente.

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Depois do anúncio do pai, depois de Shin, sentia que o controle de muitos aspectos da sua vida deixavam seu domínio, se diluindo a favor do triunfo dos seus inimigos, as pessoas com quem tinha de dividir o mesmo teto. Isso porque, ultimamente, nem o pai ele conseguia enxergar como alguém que queria vê-lo bem. Não, aquele homem o renegou seus direitos por conquista.

A secretária entrou na sala de reunião - onde ele, sozinho, se preparava para a primeira reunião do dia, antes da chegada dos demais - e, cautelosamente, numa habilidade sorrateira de se fazer invisível, algo que Gun apreciava muito, deixou mais papéis referentes ao assunto que seria discutido em breve. Ele pegou as folhas e percorreu-as lentamente, focando nos parágrafos e tentando assimilar o conteúdo deles para além dos seus demônios pessoais.

O projeto que permearia toda a disputa do cargo entre os Wang, o protótipo do novo carro, atualmente chamado por P02, vinha em um relatório de mais de oitocentas páginas, discriminando todos os seus componentes físicos, desde a mecânica ao design. O herdeiro, porém, poderia soletrar a maior parte daquelas páginas, afinal se debruçara sobre aquela ideia, ajudara a montar sua fôrma, seu conteúdo, em conjunto com Taeyang, havia muitos meses. Eles continuavam frustrados com a qualidade do motor, mas agora os outros chegariam nos detalhes finais, principalmente Shin, o mais odioso, apenas para colocar a cereja em cima do bolo. Era injusto de tantos modos que ele não conseguia acreditar que era real.

Na sua formatura, dois anos antes, Gun havia se comprometido com o pai que o brindaria com um projeto incrível, do qual ele se orgulharia e Hansol, em resposta, dissera estar ansioso para o ver este dia, o seu triunfo.

Meu filho, meus parabéns — Hansol aproximou-se dele, um jovem recém-diplomado idealizando sua carreira promissora, a beca impecável depois de acabar de proferir seu discurso de formando — Você me orgulhou tanto essa noite — o olhar do velho Wang marejando.

Gun se assustou duplamente. O carinho paterno, repentino, e a expressão emocionada do pai eram coisas que ele não via a toda hora. E lágrimas... nunca lembrou de presenciar alguma saindo daqueles olhos.

Eu vou te surpreender, papai — Gun, que perdeu as palavras por alguns instantes, recobrou-as veementemente.

Eu sei, eu sei... — Hansol deu uma palmadinha carinhosa no ombro do filho.

Não, o senhor não entende — o herdeiro prosseguiu numa voz apaixonada — Vou ser o melhor engenheiro da empresa e criarei um automóvel incrível. Algo que o senhor se orgulhará muito!

O pai lhe sorriu amoroso e, subitamente, trouxe o garoto para um abraço repentino. Ele se deixou embalar, perplexo no início, mas então começou a corresponder ao afeto, apertando o corpo do velho contra o seu. Quando se soltaram, o Sr. Wang disse:

Estou mais do que ansioso. Tenho certeza que me orgulharei de você, Gun. Meu menino… — o pai, mirando-o, estudou-o demoradamente, o olhar perdido em pensamentos que o Wang mais novo desejava alcançar com fervor — … Tudo dará certo.

“Tudo dará certo…”

O herdeiro daria um braço para saber o que passava na cabeça do pai quando lhe disse aquilo. O homem que desejou tudo de melhor para ele na formatura, que se emocionara por sua conquista, era, agora, um completo desaparecido. Um homem que o subjugava e o equiparava àqueles que nunca se deram ao trabalho de compreender a importância daquela empresa.

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— Qual o motivo de toda essa concentração? — Na Na surgiu bem atrás dele, quase encostando o rosto ao seu, falando baixinho, mas sendo intrusa o suficiente para assustá-lo. Gun, que nem a tinha escutado abrir a porta, teve de se controlar para não ser rude em demasia. Além dos problemas com toda a sua família, ser interrompido em um momento de reflexão o deixava possesso.

— Você não estava na fábrica hoje? — perguntou franzindo o cenho para seus documentos e fazendo questão de parecer muito introspectivo naquele momento.

— Sim... Mas precisei voltar aqui para procurar um documento nos arquivos — ela lhe respondeu, o costumeiro tom de voz delicado e pausado — E também trouxe um café para você — se sentou na poltrona ao lado, entregando o copo.

Gun, contrariado com aquela intromissão, pegou o café e experimentou um pequeno gole. Na Na bebericava o seu, fitando-o serenamente.

— Não está bom — ele concluiu após uma única prova e colocou a bebida, praticamente intacta, longe dele.

— Eu... eu comprei no mesmo lugar de sempre... E do jeito que você normalmente gos…

— Estou muito ocupado, Na Na! Será que não percebe? — Gun interrompeu-a impaciente, virando as folhas do documento sobre o protótipo com tamanho descuido que uma das páginas rasgou — Eu quero sossego.

— Mas eu vim apenas trazer um combustível a mais para você aguentar seu dia... Já estava de partida…

— Parece que você faz isso de propósito.

— Isso o quê? — a moça o questionou, o rosto transformado numa máscara de confusão.

— Isso. Me interromper quando sabe que preciso ficar sozinho — rebateu, apertando as mãos contra o rosto e se esforçando para não gritar com ela. Seu íntimo urgia pela vontade de escorraçá-la dali, mas sua mente pedia para ter calma. Calma, essa palavra que vinha se apagando do seu dicionário pessoal dia após dia.

Na Na ergueu-se abruptamente da poltrona e agarrou o copo que havia trazido para ele. Com meia dúzia de passos duros, encaminhou-se para o lixo mais próximo, dentro da sala, e jogou o objeto violentamente no recipiente. O barulho de algo líquido se espalhando contra o sólido avisou para Gun de que o copo de plástico não resistira à violência sofrida e estourara com a força do arremesso dela. Ela retornou para a mesa, os saltos agulhando o chão, e agarrou a bolsa sobre a madeira envernizada.

— Vou te dar quanto tempo precisar longe de mim e da minha intromissão, não se preocupe — informou-o numa voz endurecida, fria, totalmente anômala a ela, e abandonou o recinto encerrando o herdeiro num vazio incômodo.

***

Ha Jin acreditava que o melhor momento do dia naquela mansão era após o almoço. Geralmente, naquele horário, só havia as três mulheres dos Wang na casa - Ah Ra, Sun Hee e Ha Na, o que era, felizmente, sinônimo de menos trabalho e um pouco mais de descanso.

Agora, durante aquele frio entardecer, a jovem governanta pensava nas várias coisas que aconteceram em sua vida desde que acordara daquele coma sentada em uma das cadeiras da cozinha devorando grandes pedaços de melancia. Era quase inacreditável pensar que os Wang que conhecera em Goryeo estavam ali, reunidos no mesmo lugar e ao seu redor, com suas personalidades praticamente intocadas.

Era bem verdade que nem todos a cercavam. Não encontrou a amiga Chae-ryung, embora tenha conhecido uma Ryung tão boa quanto ela, assim como não avistara o nono príncipe. Imaginou se em outra vida, a antiga amiga tivera a sorte de viver seu grande amor.

E eu…? será que algum dia vou conseguir viver o meu amor? Embora já tenha tido a minha oportunidade... Eu a aproveitei ao máximo que pude e por aquele tempo, fui feliz. Os poucos anos que pude viver com So foram os melhores que eu poderia querer... Mas hoje, ele sequer lembra de mim. Preciso dar um jeito de fazer com que ele se lembre de mim. Por que ele não lembra de mim?

— Onde está a Governanta Nyeo? — fora acordada de forma abrupta dos seus devaneios pelo Wang que estava no pódio de seus pensamentos, quase engasgando com o pedaço de melancia que abocanhara.

— Boa tarde, senhor Shin — respondeu engolindo a fruta com desespero, fazendo um movimento de saudação rápido com cabeça, levantando-se — Ela se encontra na lavanderia. Precisa de algo? — perguntou sem lhe fitar os olhos.

— Talvez... O que está fazendo agora? — ele perguntou avaliando a cena.

— Ah... — a governanta pareceu constrangida em ter de dizer “nada” ou “comendo” — Estou aguardando a governanta Nyeo voltar e me indicar o que fazer.

— Ou seja... está fazendo nada. Muito bom, isso — ele não demonstrava qualquer sentimento ao falar. Ela não o encarava — O ócio pode ser benéfico em determinados momentos da vida. Nunca pensou em fazer uma faculdade ou ter um trabalho melhor?

— Qual o motivo da pergunta? — os olhos se encontraram finalmente; as sobrancelhas da mulher erguidas em estranhamento.

— Aparentemente esse cargo não te inspira muito... Você não parece ter sido feita para ele. É intrometida demais para receber ordens submissamente. Além do mais, quando gostamos do nosso trabalho, procuramos o que fazer… não ficamos perdendo tempo sonhando com coisas impossíveis enquanto comemos metade de uma melancia sozinhos.

— Hum... A governanta Nyeo gosta do meu trabalho, senhor… — observou, a voz sutilmente contrariada pelas acusações injustas de procrastinação, o rapaz indo em direção às melancias no balcão, muito perto dela.

Será possível que ele tenha o poder de saber dos meus pensamentos? Será que minha viagem a Goryeo nos deu esse tipo de habilidade? Aissh…Deixe de pensar idiotices, Ha Jin. E por que diabos ele está usando meu talher?

— … mas já pensei sim, em fazer faculdade. Me formei em estética na escola profissionalizante, mas a faculdade… — deu de ombros, afastando para longe seus devaneios sem sentido.

— E o que queria fazer? — ele perguntou com aparente interesse.

— Química — falou com simplicidade.

— Química? — admirou-se.

— Sim. Queria me especializar na criação de cosméticos…

— Cosméticos? — ele a mirou densamente — Uma ideia peculiar… Completamente condizente a você — ela o olhou, aparentemente magoada e Shin, incapaz de esconder certa inquietação por aquele olhar, a motivou a continuar enquanto focava nas melancias — Por que cosméticos?

— Ah… é uma bobagem… — sentiu-se acanhada em seguida.

— Pode falar… — incentivou enfiando um pedaço exagerado de melancia na boca e mastigando.

— Bem… Antes era um sonho infantil… Hoje tenho o sentimento de que poderia ser especial para alguém dessa forma, de que poderia fazer alguém feliz…

— Criando cosméticos? — ele também achou peculiar a justificativa — Como poderia ser especial assim?

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— Acho que… — ela estava absorta em seus pensamentos ao falar, viajando mil anos atrás enquanto sonorizava sua resposta — Gostaria de criar perfumes e cosméticos com características especiais para que pessoas especiais pudessem usá-las e se sentirem mais belas, mais vivas e alegres... Mesmo que estivessem à beira da morte ou com alguma cicatriz que lhes impedisse de viver normalmente... que esses produtos poderiam trazer um pouco de bem-estar…

— É uma justificativa nobre, mesmo que estranha.

— Sim… — continuou com nervosismo, as mãos se movendo mais do que necessário — Acredito que em uma vida passada eu deva ter sido uma espécie de alquimista que misturava flores, óleos, essências e ervas entre si e conseguia trazer um pouco de beleza e confiança para quem usasse…

— Houve um rei na dinastia Goryeo que possuía uma cicatriz no rosto… — ele levou o talher que ela usava anteriormente, e que agora tinha a posse, até a face, apontando no exato local onde So era marcado, porém do lado direito.

— Eu sei… Gwanjong... Mas era no lado esquerdo do rosto — ela corrigiu, afoita, o interrompendo. Não acreditava que ele estava falando justamente de seu passado.

— Sim… Esse mesmo — Shin pontuou, levando outro pedaço da fruta à boca parecendo pensativo. Depois de engolir, prosseguiu — Parece que havia uma criada no palácio que deu um jeito na cicatriz dele. Ela dominava os cosméticos, algo assim…

Com a pulsação latejando no pescoço, a jovem governanta perguntou-lhe numa voz falha:

— Estudou muito sobre a dinastia Goryeo? Digo, alguma vez viu a gravura desse rei?

— Humm — o rapaz ponderou um pouco enquanto mastigava novamente para então dizer — Acho que não… Na verdade, o pouco que sei sobre isso veio do meu avô. Ele dizia que somos descendentes diretos dessa linhagem… Mas não sei, realmente… De qualquer forma, não seria possível ver a cicatriz — parou um instante focando a mulher — Interessante... Talvez você seja uma descendente daquela mulher…

— O que? — espantou-se, os olhos arregalados. Gaguejou — Não! Digo… Não sei… Pode ser… Quem sabe?

— Você sim parece ter estudado bastante sobre o passado do país… Devia procurar sobre sua linhagem e sobre essa mulher. Talvez explique melhor seu gosto por cosméticos e todas essas coisas…

— Ah, sim… Eu estudei um pouquinho na escola, mas não tanto para isso — disfarçou sentindo que falara demais, o coração pulsando descompassado, tentando controlar a respiração acelerada.

— Para onde foi aceita?

— Aceita? — perguntou, perdida naquela conversa.

— Faculdade…

— Ah… Isso faz muito tempo, senhor… — continuava gesticulando mais que o necessário, claramente nervosa.

— Gostaria de saber… — um estranho interesse.

— Ah… Sim. Universidade Sogang — ele a olhou com leve espanto enquanto ela falava com um sorriso forçado, constrangida — Escola de Ciências Naturais… Departamento de Química.

— É uma das melhores universidades do país — falou com leve admiração.

— E das mais caras também… — pontuou, sem graça.

— É uma pena que não tenha conseguido continuar…

— Sim… — concordou lembrando que, além do pouco dinheiro, abandonou tudo para correr atrás daquele maldito namorado. O patrão não precisava saber sobre esse detalhe.

— Por que não tenta a faculdade agora que recebe um bom salário?

— Senhor… — Ha Jin respondeu com demasiado cuidado — Com todo o respeito, mas… que pergunta estúpida…

— Mas que garota insolente! — ralhou com ela, os olhos ameaçadores, se aproximando — Por que é uma pergunta estúpida?

— Como poderia ir para a universidade usando o salário que recebo aqui? Trabalho das oito da manhã às oito da noite… Para ir à universidade, teria de sair do emprego. Seria impossível manter os dois — observou que Shin, há poucos passos dela, estava levemente desconcertado.

— E por que não seguiu o ramo, já que se interessa tanto? — se afastou; fora atingido — Mesmo sem ir para a universidade, poderia ter tentado de outra forma.

— Na verdade, eu tentei. Como falei, sou licenciada em estética pela Escola Profissional e… — o sorriso largo e sem graça, cheio de dentes aparentes, estampou novamente o rosto da governanta — Bem… Trabalhei em uma empresa de cosméticos e fui demitida depois de um tempo... Mas estou bem aqui. Obrigada.

Shin voltou a encará-la, agora um olhar de julgamento em seus olhos. A governanta estava completamente sem graça. Se sentia uma tola por ter contado seus sonhos frustrados para ele, o rosto estava quente e a incomodava por saber que estava vermelha. Queria poder voltar no tempo, alguns poucos minutos, e refazer aquela conversa, mas não era possível.

— O que gostaria de pedir para a governanta Nyeo, afinal? Posso ajudar?

— Você tem uma mania irritante de tentar ajudar as pessoas… — ele pontuou ignorando a pergunta feita, e ela o olhou com constrangimento, os olhos arregalados. Sabia que falava sobre a noite anterior.

— Senhor, desculpe pelas palavras que falei ontem à noite — foi objetiva, sem rodeios, os olhos evitando o contato com o olhar do patrão — mas eu não pude suportar vê-lo ser humilhado daquela forma e sair de cabeça baixa. Sei que fui intrometida e poderia ser demitida por isso, ainda posso, na verdade, se quiser, mas não consegui me calar e fico muito feliz por ter dito tudo aquilo. O senhor voltou para a mesa e as coisas deram certo, afinal.

— Por que se importa comigo e com o que fazem contra mim? — ele perguntou se aproximando mais, se aproximando muito mais.

— Eu... — ela o olhou espantada em resposta à pergunta e se perdeu um pouco dos sentidos com a aproximação repentina, se sentindo encurralada — Eu não gosto que as pessoas sejam maltratadas.

— Você é estranha, governanta... Você é...

— Boa tarde, senhor Shin, já está em casa?

Nyeo Hin Hee acabara de entrar na cozinha e, estranhando aquela cena e proximidade, inspecionou o rosto dos dois com cuidado. Shin se afastara da mais nova assim que ouvira sua voz, Ha Jin parecia perdida em um mundo impenetrável. Ficou curiosa sobre o que estaria acontecendo, mas preferiu ignorar aquela cena momentaneamente.

— Estava procurando por você — ele continuou como se nada realmente acontecesse antes.

— No que posso ajudá-lo? — Nyeo perguntou prestativa.

— Vim avisar que, a partir de hoje, comerei com os demais à mesa. Não precisa mais me levar nada no quarto... A não ser aqueles seus lanches maravilhosos fora de hora — Ha Jin avaliou, curiosa, que ele parecesse tão agradável na companhia da mais velha, “Afinal, ela praticamente o criou. Nada mais natural.

— Fico muito feliz com essa decisão, senhor Shin — a governanta principal sorriu satisfeita — Providenciarei para que não lhe falte seu lugar à mesa.

— Obrigado. Até mais tarde.

***

A jovem governanta, de pé, no mesmo local que estivera na noite anterior, observava os primeiros familiares Wang dispostos ao redor da mesa de jantar e já conseguia sentir a tensão que emanava deles. Gun, afundado em seus pensamentos, estava concentrado em olhar o corredor dos quartos sem quase piscar. Yun Mi, ao lado da mãe, observava a expressão do irmão mais velho e, em silêncio, parecia idealizar algo, pois seu rosto apresentava aquela conhecida expressão maligna tão bem conhecida pela governanta.

Já sentados, também estavam Jung e Sun. Os dois, um de frente para o outro, olhavam, assim como o senhor Hansol, à cabeceira da mesa, para o prato extra colocado ao fim da grandiosa mesa. O homem mais velho, embora notasse o desagrado estampado no rosto de Gun, tinha a feição satisfeita; um discreto sorriso amenizando o cansaço do dia e, com as mãos dadas, apoiadas sobre o tampo lustroso da madeira, esperava o início do jantar.

O próximo a sentar-se fôra Taeyang. Como sempre, o jovem rapaz tinha um semblante contrariado. Entre Jung e Yun Mi, fitou com rancor o irmão mais velho, sentado à direita do pai, e focou o prato à sua frente em seguida. Suas reflexões estavam divagando entre a empresa, aquela disputa e Na Na. Precisava, e o mais rápido possível, deixar claro para a garota que ela seria infeliz ao lado de irmão e, como se esse ouvisse seus pensamentos, Gun o focou brevemente, os olhos de ambos se encontrando e digladiando por poucos instantes. Gun desviou primeiro ao perceber uma nova movimentação vinda do corredor, dessa vez era Eujin.

O recém-chegado sentou ao lado direito de Sun, que havia deixado o assento ao lado de Gun vago, e percebeu um prato extra ao seu lado direito. Se sentiu feliz. Sabia que Shin decidira tomar um pouco do que era seu por direito agora. Não imaginava o quê, ou quem, o fizera decidir, mas era completamente grato por aquela mudança. E o dono daquele lugar era o único que ainda estava ausente. Ha Jin também percebia essa demora e temeu que ele desistisse.

— Como estão as coisas na empresa, meu filho? — Hansol começou chamando à atenção de todos para si.

— Estão bem, papai. Tudo segue como sempre — Gun respondeu sem muita empolgação.

— Como está se sentindo à frente do conglomerado?

— Nada disso é novidade para mim, e o senhor bem sabe. Estou continuando a fazer tudo o que já fazia antes na empresa e na fábrica. Não há alteração alguma no meu trabalho.

— Fico feliz que seja assim…

— O senhor sabe que não há outra pessoa mais capacitada para estar à frente da Wang S.A. Trabalho lá há mais tempo que qualquer um dos meus irmãos. Mesmo meus anos de estágio escolar foram lá. Não sei porque ainda insiste em manter essa disputa sem sentido se…

— Já disse para não falar sobre o controle da empresa com tanta propriedade, Gun — Taeyang interrompera a fala do irmão chamando a atenção dos demais. O rosto ruborizado — Todos nós temos condições de estarmos na direção da empresa da nossa família.

— Fale por você... — Sun murmurou quase inaudível enquanto Tayeang continuava.

— Não se sinta o melhor por ter começado na empresa antes de nós. Tenho certeza que tem um motivo lógico para papai ter tomado essa decisão e, você, tão apaixonado pelos negócios, deveria aceitar essa condição de uma vez por todas. Você não é melhor em tudo o que faz, entenda de uma vez.

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— Tenho a leve sensação que está tentando dizer algo a mais com suas palavras, irmão — Gun alfinetou, tamborilando os dedos na mesa e sorrindo dissimuladamente para o irritado interlocutor.

— Entenda como quiser... Não vou perder meu tempo com você.

— Sábia decisão, Taeyang — Shin, que acaba de chegar à sala de jantar, concordou com o irmão enquanto ia sentar-se ao lado de Eujin — Você chega a ser irritante com essa sua mania de querer ser o melhor, Gun. Precisa entender que, além da mamãe, nada mais gira ao seu redor.

— Com se atreve a voltar aqui? Como se atreve a sentar nessa mesa conosco? — Gun iniciou sua cota de ofensas, o rosto irado — Quando vai entender, de uma vez por todas, que esse lugar não é seu? Volte para o lugar de onde nunca deveria ter saído. Você não é bem-vindo aqui.

— Shin é muito bem-vindo onde ele quiser — Eujin começou, mas o irmão mais velho o tocou no seu braço como na noite anterior, chamando sua atenção. No olhar, o pedido mudo para que ele não falasse nada.

— Muito me espanta que a pessoa que mais almeja o cargo máximo da empresa tenha esse tipo de pensamento mesquinho e segregador — Shin iniciou com tranquilidade — Como planeja controlar uma empresa do porte da nossa sendo a imagem perfeita do individualismo e do egoísmo?

— Não fale idiotices, seu tapado — Gun continuou. A cólera estampada se apoderando de suas feições.

— E você deveria ter um pouco mais de respeito com seu irmão mais velho — Shin rebateu. A expressão tranquila.

— Você não é meu irmão... Você é um agregado que não percebe que o seu lugar é longe dessa casa e dessa família. Você não entende que não faz parte de nada aqui, que nada aqui pertence a você?

Ha Jin observava tudo com demasiada ansiedade aliada a uma vontade imensa de acertar o vaso que estava ao seu lado na cabeça do futuro noivo de sua prima. Não conseguia entender o motivo do senhor Hansol continuar calado diante do embate travado pelos dois filhos mais velhos. Acreditava que o homem seria o único capaz de fazê-los parar, mas Hansol parecia flutuar em uma órbita distante daquela. Os demais, focados na nova discussão da noite.

— Você chega a cansar com essa sua conversa. Sempre choramingando... Não se cansa de todo esse teatro? Todos aqui te conhecemos bem para saber que suas palavras são recheadas de segundas e terceiras intenções.

— E você continua sendo um metido tentando tomar posse de coisas que não lhe dizem respeito. Esse lugar não é seu.

— Quantas vezes repetirá isso? — Shin revirou os olhos, focando o irmão com intensidade — Esse lugar é tão meu quanto seu. Alguns diriam que é até mais meu, afinal sou o primeiro depois de Sook. Agora, pare com essa sua demonstração de afeto tão aberta; eu não vou a lugar nenhum. Estou muito bem onde estou e vou me esforçar a continuar.

— Se você não vai, então eu vou.

— Você não vai para lugar nenhum, rapazinho — Hansol rugiu em meio ao infrutífero bate-boca assustando todos os filhos. Sua voz imponente e definitiva fez Gun, prestes a deixar sua cadeira, sentar-se pesadamente outra vez — Uma família come junto. Era assim na época do meu pai e é assim na minha casa. Fique onde está.

— Perdi a fome — o herdeiro, revoltado, mas mais ainda envergonhado por ter sido disciplinado no testemunho dos irmãos, da madrasta e dos funcionários da mansão, murmurou.

— Então vai aguardar nós terminamos e, somente após, deixará a mesa, como manda a boa educação.

— Isso… Isso não tem cabimento… — respondeu transtornado.

— Devo deixá-los cientes também de que Shin deve ser inserido a tudo o que diz respeito à família. Não importa o que escutaram por aí ou o que suas mães comentaram sobre a ausência dele, agora seu lugar é entre nós. Ele é um de nós e como tal será tratado.

Enquanto as palavras do patriarca iam aderindo à mente de cada um dos jovens, Shin sentiu o estômago revolver de confusão devido àquele breve discurso. Ele encarou o homem sem ter certeza se deveria agradecer, aquiescer ou contestar; ver o pai tomando partido dele era antinatural. A chance de se expressar passou, tanto para ele quanto para os outros, Hansol erguendo a mão e sinalizando, avisando que Nyeo e sua equipe poderiam trazer a refeição.

O jantar ocorreu no mais completo silêncio. Jung e Sun rindo discretamente um para o outro vendo Gun ser obrigado a pagar seu argumento anterior, encarando um prato vazio ao redor de tamanha fartura no menu.