Marcada

Meu Mar de Olhos


Acordei sentindo pequenos arrepios na pele e com a sensação de estar sendo observada. Abro meus olhos lentamente, ainda com a visão um pouco embaçada, vejo uma silhueta sentada ao meu lado na cama. Ele me observa, pisco mais algumas vezes e foco naquele oceano de olhos me encarando. Olho a minha lateral direita e vejo uma cortina fina balançando com o vento que invadia o quarto, a luz emitida dali me avisava que já estava de manhã. Olho pra ele novamente e me deparo com todos aqueles dentes brancos e perfeitos se exibindo pra mim. Não sei se fora coisa da minha cabeça, mas... ele parecia incrivelmente mais bonito hoje. A luz que transpassava entre as frestas da janela, iluminavam ainda mais aquele cabelo loiro, eu já falei que tinha sorte de estar tendo a mais perfeita visão ali?!

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

— Hora de acordar, gatinha – disse, exibindo uma enorme bandeja à minha frente. Gente, eu estava num comercial de TV americana e nem sabia disso.

Esfreguei um pouco os olhos e recuei até a cabeceira da cama, já me sentando. Fiz um coque improvisado tentando ajeitar um pouco aquela juba vermelha, mero disfarce pra poder observá-lo sem dar muito na vista. Ele estava um perfeito galã de filme. Usava uma camisa de algodão branca com duas listrinhas azuis na gola. A manga ia até a metade dos braços, colando neles só pra enaltecer aqueles bíceps tão bem definidos. A bermuda jeans e os tênis davam a perceber que ele estava prestes a ir praticar algum esporte, como Tênis ou algo do tipo. Comecei a ter fantasias imaginando-o segurando uma raquete num movimento sexy, e sorrindo pra mim, como eu queria ser aquela bola. Vamos Jessie, volte à realidade.

— Isso é pra mim? – disfarcei, apontando pra enorme bandeja.

— É sim! Consegui convencer o Sam a te deixar acordada um pouquinho. Ele queria te manter nutrida por remédios, mas acho que você precisa mastigar um pouquinho. Então fiz esse café da manhã pra você. Que modéstia parte, está uma delicia!

E parecia mesmo. Havia de tudo um pouco. Tinha panquecas meladas com caramelo, um prato cheio de frutas cítricas, uma tortinha de sabor não identificado, café, uma xícara de chá, que a julgar pelo cheiro, devia ser de hortelã, algumas torradas e geléia de amendoim, essa última me fez sorrir com as lembranças.

— O que foi? Tem algo errado?

— Não, ta tudo perfeito, de verdade. Será que nos casamos e eu ainda não sei? – ri da minha própria piada, até perceber que ele não estava fazendo o mesmo – Desculpe,eu só estava brincando

— Não, tudo bem, gatinha. É que nunca entendi direito esse lance de casamento. Fiquei me perguntando como seria

— Bom, não tem um segredo pra isso. São só duas pessoas que se gostam e resolvem selar um compromisso diante da sociedade. É como... – tentei buscar as palavras certas ao mesmo tempo que encarava minhas próprias mãos – uma demonstração de amor, sabe? De que quer dividir sua vida com a pessoa

— Mas vocês morrem cedo. Selar algo que dura tão pouco, ou menos ainda quando se separam, me parece meio estranho

— E é! Mas, pra gente significa muito. E vocês, não tem casamentos da onde vieram? – perguntei buscando seus olhos, mas estavam tão vagos quanto sua mente. Me permiti observá-lo um pouco mais. Era a primeira vez que conversávamos assim, tão francamente.

— Bom, é difícil explicar. Meu povo quase foi extinto há uns séculos atrás. Mas antes disso, eles eram bem felizes, tinham famílias e viviam bem juntos. Mas não tinham nada que precisasse pra oficializar aquilo, o amor que sentiam um pelo outro era suficiente – seu olhar finalmente encontrou o meu. Seu tom de voz era tão terno e carente, sentia vontade de abraçá-lo por algum motivo, mas tudo que fiz foi desviar o olhar para as guloseimas a minha frente. – Mas é melhor você comer, café quando esfria perde o sabor, isso eu aprendi aqui. – Assenti com a cabeça, dando uma mordida na torrada.

— Ah, trouxe umas coisinhas pra você, gatinha. – O vi levantar e apanhar algumas coisas numa gaveta atrás de si. Era uma caixa de tamanho médio. – Espero que não se importe por eu ter mexido nas suas coisas, mas achei que você ia gostar de ter consigo enquanto estivesse aqui.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

Ele estendeu a caixa pra mim. Afastei a bandeja um pouco pro lado e tomei nas mãos o objeto. Era uma caixa de madeira, com relevo acentuado e tinha uma fitinha marrom cuidadosamente enlaçada. Desfiz o laço num leve puxão, e o encarei novamente, ele me observava com aquele irresistível sorriso no rosto e expectativa no olhar. Me voltei para a caixa novamente, levantei sua tampa devagar. E no mesmo instante um sorriso gigantesco tomou conta dos meus lábios. Todos os meus objetos de estimação estavam ali. Retirei um por um, ao mesmo tempo em que era tomada por uma incrível nostalgia. Tinha meu ursinho Puff que havia ganhado da minha mãe quando pequena, um DVD do Green Day que ganhei da July no meu aniversário de quinze anos, uma presilha de cabelo em formato de um lacinho rosa que Kat tinha me dado de presente quando éramos crianças, tinha também meus dois livros da saga “Crônicas Saxônicas”: O Último Reino e O Cavaleiro da Morte. Abaixo deles haviam mais cinco livros, esses estavam ainda plastificados como se tivessem sido recém comprados.

— E esses aqui? – apontei

— Ah, bom... Eu tava dando uma olhada e percebi que você não tinha a saga completa, aí fui numa livraria e comprei os que estavam faltando

— Você o quê?! – falei em êxtase, abrindo o embrulho de cada um deles. Estavam lá: “Os Senhores do Norte, A Canção da Espada, Terra em Chamas, Morte dos Reis, e por fim, O Guerreiro Pagão”. Não sabia descrever a alegria que estava sentindo. Analisei cada detalhe de cada um deles, a capa, contra-capa, o relevo, as páginas, cheguei a cheirar todos. Kaeth só ria observando a cena. Voltei a observá-lo, mal podia acreditar que estava sendo presenteada pelo meu “sequestrador”, e estava feliz com isso.

— Gostou?

— Se eu gostei? Há tempos estava querendo comprar o restante da saga. Você não tem ideia de como estou me sentindo! Obrigada, e obrigada! – disse quase cantarolando, e me joguei em seus braços num apertado e íntimo abraço. Demorei alguns segundos pra notar o que tinha acabado de fazer. Eu vestia uma camisola de seda branca um pouco mais fina do que deveria,e estava de joelhos na cama, abraçada a ele. A proximidade absurda me permitiu sentir seu cheiro pela primeira vez. Meu nariz estava próximo à sua nuca, ele tinha cheiro de jasmim com hortelã. Uma mão estava tocando seu ombro, e a outra... bem, podia sentir seus fios dourados e macios entre meus dedos, estava segurando seu cabelo. Nossa senhora das desesperadas, como eu havia ido parar naquele estado. Fiquei paralisada, nenhum movimento brusco, era como se estivesse em cima de um campo minado, qualquer movimento brusco poderia ser fatal. Esperei uma reação, e a tive. Suas mãos encaixaram perfeitamente na minha cintura e me afastaram levemente, agora estávamos nos encarando. Aqueles olhos azuis maravilhosos me observavam intensamente, sua mão ergueu a altura do meu rosto, e pôs uma mecha ruiva do meu cabelo atrás da minha orelha. Respirar estava difícil, tentei dizer alguma coisa ou recuar, mas não consegui. Só conseguia ficar olhando aquele Deus grego, e ficamos assim, em silêncio nos encarando por longos segundos, até um pigarreio intenso de uma terceira pessoa nos interromper. Saltei para trás, e ele recuou um pouco sem jeito.

— Atrapalho o casal? – vejo Derick encostado com as costas viradas para a parede. Será que ele estava ali há muito tempo? De repente começo a me sentir culpada, mas pelo quê? Não havia nada de errado, não havia feito nada e não lhe devia explicações.

— Kaeth só estava... estava... – tentei disfarçar buscando as palavras nos objetos acima da cama, mas estava nervosa demais para dizer algo coerente

— Eu sei o que Kaeth estava fazendo. O que ele faz sempre, só que com mulheres diferentes. Só vim avisar que o Sam nos quer lá em baixo, mas acho que cheguei na hora errada, não Kaeth?

— Não, maninho. Se tivesse chegado um pouquinho mais tarde iria ter a oportunidade me ver pondo o preservativo, né gatinha? – disse naturalmente ainda sem encarar Derick. Meus olhos quase saltaram das órbitas ao ouvir aquilo. E não foram só os meus. Podia sentir o clima tenso no ambiente. Derick não estava mais encostado na parede, sua postura estava rígida, e eu estava começando a ficar vermelha como tomate menstruado. – Brincadeira! A gatinha não é dessas – disse por fim, me dando uma piscadela e se levantando. O vejo pôr a mão no ombro do irmão e sussurrar alguma coisa, se a intenção era acalmar os ânimos, não tinha surtido muito efeito, ele continuava rijo feito uma estátua.

Depois que Kaeth saiu, ainda ficamos mais alguns instantes num silêncio que me incomodava cada vez mais. Comecei a organizar os presentes, e depois voltei a comer, e ele persistia em me observar. Me analisava como se estivesse tentando decifrar algum código importante. Interrompi a xícara de café no meio do caminho e passei a retribuir seu ato.

— Algum problema? – perguntei um pouco mais irônica do que pretendia

— Tirando o fato de ter uma adolescente humana e mimada comendo da minha comida e sendo comida pelo meu irmão? Nenhum! – deu de ombros. Aquilo foi a gota d’água. Coloquei a xícara de volta na bandeja e a afastei de mim. Estreitei o olhar e afiei a língua antes de disparar

— Escuta aqui, eu não tenho nada com o seu irmão, ok? Ele só foi gentil comigo, e está tentando me ajudar enquanto fico presa aqui!

— Ah claro, imagino o tipo de ajuda que ele está te oferecendo. Todos os dias mulheres vêm aqui em busca dessa ajuda

— Não me interessa a vida pessoal dele. Assim como não te interessa a minha também. E você quer saber? Eu preciso tomar um banho, é melhor você sair! – levantei da cama, o enxotando

— O quê? Você sabe com quem---

— Sei sim, o cara que vai me fazer sofrer se eu não obedecer. E que se transforma em lobo, e pode me matar, e bláblá. Agora tenho que tomar banho, tchauzinho! – concluí fechando a porta na sua cara, sua última expressão foi de surpresa e confusão. Típico de quem nunca foi desafiado por uma mulher antes. Eu sei, você deve estar me achando uma louca por ter desafiado desse jeito o cara que quase me matou duas vezes! E sim, no fundo estava morrendo de medo de ele voltar e fatiar minha garganta em mil pedacinhos. Engoli a seco imaginando aquelas presas rasgando a minha pele. Esperei mais um pouco, mas ele não havia voltado. Dei um intenso suspiro, peguei uma toalha que parecia recém lavada no guarda-roupa, e me joguei naquela banheira.

— Derick? – surgia Kaeth no corredor, observando o irmão que estava “petrificado” frente a porta do quarto de Jessie. – Você ta bem, cara?

— Hum? Não, quer dizer... to. Eu acho

— Algum problema com a ruivinha? – Derick o observa, hesita por um momento em falar. Era possível avistar os pontos de interrogação e exclamação circundando o corredor – Tá... Bom, eu fui lá em baixo e não vi ninguém

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

— Ah, esqueci de avisar. Eles estão no escritório

— Eles? Quem mais ta aqui?

— Melhor você mesmo ver. E tenta se controlar, ta?

Na sala de estar o silêncio reinava. A lareira acesa os mantinham aquecidos. As pequenas fagulhas carregadas pelo vento, pousavam na lente cara, forçando Sam a limpar o óculos a cada cinco minutos. Em seu traje formal de sempre, lá estava ele usando a calça social preta que já era padrão, a camisa também social branca de botões argentinos, com sua gola perfeitamente dobrada. Na poltrona ao lado com um copo de uísque na mão estava um novo ser. Ela era alta, e tinha um corpo magro, mas esbelto. Vestia uma calça de couro marrom, com uma bota de salto por cima. A blusa preta de algodão ilustrava uma fina cintura, sem falar dos cabelos castanhos claros, lisos com suas pontas formando perfeitas ondulações. Seu rosto era oval e um pouco fino, e seus olhos negros se moldavam num olhar extremamente sexy. Era de parar o trânsito, e a cidade inteira.

— O que essa vadia ta fazendo aqui? – disparou Kaeth invadindo a sala, irado

— Calma, Kaeth. Eu vou explicar – tentou acalmá-lo, Sam

— Explicar o quê? Por que raios você a trouxe pra cá?

— Ela vai nos ajudar, Kaeth – interveio Derick

— Nos ajudar? Acha mesmo que essa miserável pode ajudar alguém? A única pessoa que ela ajuda, é a si mesma, Sam!

— Acalme-se, está bem? Vamos conversar

— Conversar o caramba! Não tenho nada pra conversar com ela. Aliás, por que ela ta aqui mesmo? Sam, dá pra mandar essa vadia embora?

— Vadias são as piranhas que você leva pra cama – interveio a mulher, já se levantando

— As piranhas que eu levo pra cama são muito melhores do que você. Nem pra limpar o chão que elas pisam, você serve

— Que feio, gatinho. Você não me tratava assim quando estávamos juntos

— Sam, tira ela daqui ou eu não respondo por mim

— Kristen, vá! Depois terminamos essa conversa

— Tudo bem. Vou servir de companhia pra mocinha lá em cima. Soube que estão fazendo ela de refém – ela tenta subir as escadas, mas Kaeth se põe a sua frente segurando seu braço. A força com que estava pressionando era tanta, que o mesmo já estava ficando roxo, o sangue estava impedindo-o de circular

— Se você tocar num fio de cabelo dela, eu acabo com você!

— Sabe que eu adoro quando o Kaeth fofo mostra seu lado sádico pra mim

— Não me provoca, você não sabe do que eu sou capaz – apertava mais ainda seu pulso

— Parem, os dois! Kristen, vá embora

— Tudo bem, tudo bem! Já entendi o recado – se desvencilhava do loiro, apanhando a garrafa de uísque – Cavalheiros, tenham todos uma boa noite! – bate a porta

— Que merda você pensa que ta fazendo, Sam? E você Derick, por que não o impediu? Será que estão todos loucos por aqui?

— Kaeth, se controle! Agora que viramos alvos da facção mais perigosa de anjos, estamos correndo o dobro de perigo. Precisamos de uma bruxa ao nosso lado

— E por que não pedir ajuda de outra? Porra, Sam! Você sabe o quanto a odeio, custava procurar outra. Tem milhares de bruxas por ai

— Aí que você se engana. Quase todas as bruxas estão servindo aos Anakins. E a outra parte vive sob ameaças dele, não seria confiável

— Ah, claro! E você acha que “ela” – gritou – é confiável?! Quem nos garante que ela não vai nos entregar de bandeja pro Morphet assim que lhe convir? Hein?

— Ela também está sendo caçada por ele. Eu vou garantir. Sei que é difícil pra você, mas tente entender. Precisamos dela

— Façam o que vocês quiserem! Mas quando aparecerem uma dúzia de Anakins batendo na nossa porta, não vem dizer que eu não avisei! – se vai

— Derick?

— Nem olhe pra mim. Ele ta certo – disse, terminando de pôr uma dose de conhaque

A noite estava fria, o relógio marcava onze horas da noite. Os flocos de neve insistiam em cair vagarosamente. Os pinheiros balançavam com o vento frio que vinha para arrepiar as espinhas. As estrelas faziam seu papel preenchendo os espaços vagos naquele céu escuro. A lua cheia e tímida, se escondia por de trás das nuvens carregadas. Kaeth, com seu casaco de capuz já se preparava pra entrar na sua BMW, quando tem seus passos interrompidos. Ele vira subitamente, e lá estava ela. Meio escondida atrás de alguns raminhos, com uma calça jeans, all-stars, uma regata branca debaixo de um casaco xadrez vermelho com preto. E aqueles longos fios ruivos, que estavam desarrumados num coque improvisado que a tornava ainda mais atraente. A próxima rajada de vento rompeu aquele coque, libertando seu cabelo, que já esvoaçava sob aquela pele branca de poucas sardas. Algo de diferente o atraíra. Kaeth era do tipo que se atraía fácil por uma beleza feminina. Mas não era atração, havia algo a mais, algo que realmente o fazia questionar a própria existência.

— Tentando fugir? – disse a ruiva, mostrando um meio sorriso

— Eu que devia estar perguntando isso. Tentando escapar, gatinha?

— Não, quer dizer... Agora que você falou, eu podia ta fazendo isso mesmo

— O que você ta fazendo aqui? Sabe que se eles te pegarem aqui, você ta ferrada

— É, eu sei. Mas... ouvi gritos, os seus gritos. Achei estranho e fui espiar

— Isso é feio sabia? Espiar conversas alheias

— Eu sei, me desculpa. É só que... tinha que ter certeza que era você. E confesso que custei a acreditar, você falando daquele jeito...

— Ficou assustada?

— Não. Quer dizer, um pouco...

— Entendo. No fim, os mocinhos tem que ser sempre mocinhos, não é? Não devia confiar em todos que são gentis com você, gatinha – disse enfiando as mãos nos bolsos do casaco, e depois encarando-a – vai acabar morrendo cedo desse jeito.

— Eu sei. Mas estava preocupada com você, precisava ver como estava, se precisava de ajuda

— Se arriscou vindo aqui fora, pra saber como estava o cara que ajudou a te sequestrarem, que se transforma em lobo, e que agora sabe que não é tão gentil assim? Sério isso? – o acenar de cabeça de Jess ainda que desconcertado, fez com que Kaeth parecesse ainda mais confuso. Ele encarava o céu, depois seu rosto, e repetia a intercalação algumas vezes. Até num último suspiro, decidir desencostar do carro, e se aproximar.

— Algum problema? – gaguejou a ruiva, evitando encará-lo nos olhos

— Não, nenhum. – erguia seu queixo lentamente a sua altura – quer saber? Espera aqui – dito isso, ele se vai, e pouco tempo depois estava de volta com um casaco de couro em mãos

— O que é isso?

— Um casaco, ué. Aquelas coisas que te mantém aquecido no frio, vocês mesmos que inventaram

— Eu sei, seu bobo! – socava de leve seu ombro – mas pra quê? Não vamos sair

— Ah, vamos sim! – disse, já pondo o casaco em volta dos seus ombros

— Isso é certo? Se seus irmãos descobrirem---

— Relaxa, gatinha! Dos meus irmãos, cuido eu. Agora, vamos dar uma volta. Vou te levar num lugar legal

— Tudo bem

— Ah, não, não! Não nesse carro – segurou sua mão que já se posicionava na porta da BMW

— Mas esse não é o seu carro?

— É sim. Mas não quero te levar nesse

— Por quê? É aqui que você leva suas beldades pra passear? – arriscou a ruiva maliciosamente

— Bom... Sim, digamos que não tenho um histórico muito bom. Não quero te levar aí

— Hum, como eu devo me sentir em relação a isso?

— Hum... – ponderava o loiro – Acho que lisonjeada. Vamos, entra – já estacionava seu Porsche prateado

— Wow! Quantos carros vocês tem por aqui?

— Hum, nunca parei pra contar. Agora vamos, entra aí

Jess entra no carro. Mesmo pondo o cinto de segurança, podia avistar Kaeth observando atentamente cada um de seus movimentos. O revestimento dos bancos, a tecnologia do carro, tudo era moderno ali. E Kaeth, parecia se ajustar perfeitamente àquele automóvel. Ele deu partida, e o som ultramoderno ligou automaticamente. Tocava “The Beatles – Let it be”. Longos minutos de silêncio se arrastavam ali, a estrada era escura e não havia nada, nem outros carros, ou caminhões velhos, nada. Kaeth puxava assunto com perguntas curtas sobre Jessie, e as respostas eram mais curtas ainda. Ninguém se encarava, mas os olhares se atraíam vez ou outra. Após uma pausa das perguntas, a música muda para “The Calling – Wherever you Will go”, uma das favoritas de Jessie. Notando a melancolia da música, Kaeth ergue a mão a fim de mudar, mas é interrompido pelo toque da ruiva, que segurava sua mão, impedindo-o.

— Gosto dessa – disse, ambos olharam para aquelas mãos quase entrelaçadas, Jessie a afasta rapidamente. Ele para o carro no acostamento.

Kaeth persiste o olhar, e Jessie para de resistir, e torna a retribuir o gesto. Os olhares se cruzavam, a distância diminuía gradualmente. O frio do ar-condicionado não era suficiente, respirações ofegantes. Um fio ruivo escorrega para frente do rosto de Jessie, ele o retira. Seu rosto é engolido por aquele mar de olhos azuis. Seus ritmos cardíacos aceleram, o ar escapa pela boca entre aberta de Jessie, que já se voltava para a de Kaeth. Os olhares intercalam de lugar: boca, olhos, olhos, boca... A palma da mão do loiro já percorre lentamente a face dela, seus olhos se fecham, distância diminui, corações na garganta... ele para. Ambos se entreolham de novo, Kaeth beija sua testa solenemente,e ainda de olhos fechados, dispara:

— Desculpa, não devia ter te trago pra cá. Melhor a gente voltar

— Eu fiz algo errado?

— Não, gatinha. Eu não vou mentir pra você. Você me atrai, não só porque você é bonita, mas acho que to começando a sentir algo por você

— Eu sei que parece estranho. Mal nos conhecemos, e você é o cara que ajudou a me sequestrar, e tem essa coisa de lobisomem, é tudo tão louco. Mas... eu também estou sentindo algo por você – a confissão de Jessie, o fez soltar a chave do carro cujo estava prestes a dar partida e voltar a encará-la

— Mesmo?

— Sim, de verdade – o sorriso esperançoso do loiro foi rapidamente substituído por um decepcionado olhar triste, onde voltou a dar partida no Porsche

— Não posso, gatinha. Não é justo com ele.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

— Ele? Ele quem? Do que você ta falando?

— É complicado. Você vai entender mais na frente. Quando acontecer, você vai entender!

Ambos se entreolharam uma última vez. Nenhuma palavra foi dita o caminho todo, até o som fora desligado. Tudo corria tranquilamente quando no meio do caminho, algo o fez parar abruptamente. No meio da estrada, uma silhueta, o que mais parecia ser uma jovem mulher. Estava lá, no meio da estrada de pé, virada de costas para o carro. Kaeth buzina algumas vezes, a moça não se move. Ele grita, pede para que saia da frente, nada, continua intacta. Jessie pede para que ele aumente a luz do farol, ele o faz. Ela reconhece o traje da jovem, sabia de quem era aquela blusa de mangas compridas com o símbolo de sua banda preferida, ela havia dado de presente. Jessie sai do carro rapidamente mesmo sob protesto do loiro. A moça continua lá, parada até que ao ouvir a voz de Jessie recua alguns passos lentos. Há uma grande quantidade de sangue jorrando ao seu redor.

— July? É você?!