MELLORY — entre Deuses e Reis

Mar calmo é sinal de tempestade a vista


SERENA E MIGUEL

O comércio de Draken estava mais calmo do que o habitual. O final de domingo deixando a todos um tanto preguiçosos, ainda mais com o frio inusitado que acompanhou as chuvas frontais de primavera. Essa estação costumava ser bem quente naquela região. Cafeterias e bibliotecas estavam lotadas, ao contrário dos demais estabelecimentos. Um fato sobre drakinianos é que mesmo sendo militares, adoravam desfrutar seus finais de semana com livros e bebidas quentes. Um reino muito culto, perdendo somente para Golty.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

Ao entrarem em uma confeitaria, Serena e Miguel escutaram o tilintar de um sininho preso a porta. Sorriram com o som caloroso. O Alfa estava com o braço por cima do ombro de sua mulher e observava atento ela escolher dois cupcakes para eles. O senhor roliço que tomava conta do balcão, provavelmente o padeiro, olhava-os com certa curiosidade e estranhamento. Afinal, nunca antes vira uma preminiana de tão perto, ainda mais acompanhando um dos heróis nacionais. O caçula da família real. Contudo, naquele instante, a seus olhos a morena parecia ser uma jovem inofensiva que apenas estava entretida na árdua tarefa de escolher o sabor certo para seu doce.

— O que acha desse? – Serena chamou a atenção de seu marido, apontando para um dos bolinhos, aparentemente de chocolate e morango. Vestia um moletom confortável e seus cabelos estavam presos em um rabo de cavalo soltinho. Visualmente, muito confortável. Admirá-la soltou um sorriso afetuoso dos lábios de Miguel.

— Parece delicioso. – Admitiu o rapaz. – Vamos querer dois, por favor. – Pediu ao vendedor. O padeiro entregou-lhes os cupcakes e eles sentaram-se em uma mesinha de vidro no fundo. Serena beliscou seu bolo e acabou por sujar seu nariz com glacê, o militar que a acompanhava riu. Ela estava muito fofa com aquela expressão rubra de vergonha. Ele passou o dedo pela ponta de seu nariz e logo depois, provou do gosto daquela cobertura de chantilly. A mulher apertou os lábios, sem jeito. Havia achado o gesto de Miguel um tanto sexy. Sorriu travessa.

— Posso saber o que se passa nessa cabecinha? – Ele divertiu-se com a reação da Alfa.

— Só alguns pensamentos inapropriados. – Ela tratou de voltar a comer seu cupcake, não dando chance para que Miguel prosseguisse com seu questionário de mão única. O homem insistia em permanecer com o capuz na cabeça. – Eu gostei... – Serena começou a dizer flertando. – Digo, de seu novo corte de cabelo.

O Alfa a olhou intrigado. Ergueu-se um pouco de sua cadeira e roubou um beijo doce e açucarado de sua morena. – Sabe, estou tentando parecer sério. – Serena gargalhou e ele voltou a se sentar.

— O que foi? Sou um general, ok? – Ele dramatizou.

— Está bem. Está bem. – A Alfa levantou as mãos rendendo-se. – Então irei cortar minhas madeixas também. – Provocou, sabendo quanto seu marido era enciumado com os fios dela.

— Nem pensar. – Discordou ele. – Seus cabelos permanecem como estão. Longos. Macios.... – Pensou um pouco e sussurrou no ouvido dela. – Cheirosos. – Sua voz soou rouca e encantadora.

— O que te levar a pensar que irei te obedecer? – Ela sussurrou como resposta para ele. Sentiu os pelos de sua nuca arrepiarem.

— Te levo para viajar. – Prometeu ele. – Acho que está mais do que na hora das Tribos de Asgar me conhecerem. Sinceramente, devem pensar que sou um marido desnaturado. E também não posso deixar minha musa andando por aí desacompanhada. É linda demais para isso. – Completou contemplando a bela visão a sua frente.

Serena inclinou-se sobre a mesa, apoiou o cotovelo na superfície e recostou a cabeça a seu braço com uma expressão amável. – Faria isso mesmo? – Seu timbre soou como o de uma adolescente apaixonada pela primeira vez.

— Claro que sim. – Miguel ficou sem jeito com a proximidade. Escondeu seu rosto com as mãos para que ela não percebesse o quanto ele estava vermelho. Sua face de líder durão desmantelando-se.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

— Fico feliz, então. E com meu cabelo então. – Deitou em cima da mesa e fechou os olhos. – Sinto saudades de Mellory.

— Eu sei, meu amor. – O Alfa beijou a lateral de seu rosto e começou a comer seu próprio aperitivo. Sua esposa tinha acertado em cheio seu gosto. Intenso como aquele doce. – Tive uma ideia. – Algo ascendeu em seus pensamentos.

— Hum... – Ela murmurou preguiçosa, mantendo as pálpebras ainda fechadas e esperando que Miguel continuasse.

— Vamos voar! – Exclamou animado. Serena abriu os olhos e revelou duas esferas confusas com a fala do rapaz.

— Querido, sinto dizer-lhe, mas não somos pássaros. – Lembrou, tentando desiludi-lo. O Alfa riu.

— Suponho que nunca tenha passeado em um balão de hélio... – Começou levantando uma sede por aventura no interior da mulher. Ela voltou a postura normal em seu assento.

— Não está me dizendo que vamos... – Miguel a interrompeu, pondo um dedo em seus lábios, impedindo protestos.

— Um amigo meu mexe com uma central de turismo daqui do reino e como os ventos estão favoráveis nessa época do ano, acho que será divertido. – Completou vivaz o homem.

— Você não consegue parar de me surpreender, não é mesmo? – Serena cedeu alegre. Seu marido era um sujeito bem divertido.

— Não mesmo. Seu sorriso enche meu coração. – Ele pôs a mão dela sobre seu próprio peito e deixou que ela percebe o ritmo frenético que ressoava dentro de seu corpo. – Agora, vamos ou não poderemos embarcar! – Apressou ele, levantando-se e praticamente, puxando Serena para fora da confeitaria após pagar a conta.

*

— Prazer, meu nome é Serena. – A Alfa estendeu a mão para o colega de Miguel, Ezequiel estava escrito em seu crachá. Estavam em um terreno repleto de margaridas, as flores favoritas da mulher e todas elas exalavam um perfume peculiar.

— O prazer é todo meu por conhecer tão bela mulher! – Ele cumprimentou animado, arrancando uma expressão enciumada do Alfa. Era um cara de bom porte, mas com beleza um tanto comum. Cabelos pretos e bem cortados, unindo-se a olhos do mesmo tom. Parecia um moleque aos olhos de Serena, no máximo no auge da puberdade. Sorriu com a fala calorosa do rapaz e eles apertaram as mãos. – É uma honra conhecer a pessoa que roubou o coração de meu amigo aqui. – Deu uma cotovelada de leve em Miguel, o que o envergonhou um pouco. Esse coçou a cabeça buscando disfarçar o momento.

— Fico feliz. – A morena concluiu sorrindo e apertando um pouco seu rabo de cavalo. Os fios castanhos- mel chegando até um pouco antes da cintura. – Então, vamos subir ou não?

— Certamente! – Miguel a apressou mais uma vez, conduzindo ela para dentro do enorme balão colorido de cores quentes. O interior parecia de uma cesta de piquenique. Pequenino e minucioso comparado ao resto da engenhoca. Ezequiel fez alguns ajustes antes de cortar as cordas. O veículo começou a erguer voo e Serena apoiou-se no ombro de seu marido, tremendo um pouco.

— Vejamos o que temos aqui! A melhor militar de todos os tempos com medo de altura... – Caçoou o Alfa sorrindo. Gostava de quando ela ficava com medo, pois podia apará-la com um abraço bem apertado.

— É só que sempre fui de batalhas terrestres. – Tentou justificar-se ela, tornando o olhar para baixo. A distância do chão fazendo-a nausear. Miguel consentiu não pretendendo contrariá-la.

Quando atingiram uma distância confortável e Serena já se acostumara com a ideia de estar a muitos pés da superfície, os dois admiraram a vista. Draken erguendo-se por detrás de imponentes muralhas, Mellory surgindo ao fundo como um enigma e um afluente do Rio Lótus passando por perto. A preminiana apontou animada para a direção de seu reino e lembrou de todos os momentos bons que passara lá. Infelizmente, ao recordar as lembranças com seu pai, entristeceu um pouco. Mas, seu marido tratou de animá-la, mostrando-lhe que uma borboleta curiosa havia pousado em seu nariz. Era um belo inseto, com asas avermelhadas.

— Quero mudar o brasão de nossa família. – O Alfa comentou em alto, como uma ideia vaga ainda. – Penso que meu irmão deve carregar o símbolo oficial, mas que eu e você poderíamos unir os nossos. Afinal, cogito a hipótese de começarmos do zero seu reino.

— Quer dizer que pensa em viver em Premin por um tempo? – Ela indagou entusiasmada. – Suponho que tenha seus afazeres como Alfa menor...

— Bem, estou falando do futuro, porém, minha senhora, acho que sua terra natal precisa mais de você no momento do que Draken de mim no momento. Somos um reino saudável e próspero, mas Premin já sofreu demais nas mãos de tiranos. – Explicou-se.

— Seria interessante se entrelaçássemos o signo do dragão negro junto com o do leão guerreiro em nosso brasão. – Possibilitou Serena apoiando –se numa das paredes do balão.

— Ficará esplendoroso. – Ele olhou-a com uma preocupação surgindo em sua face. – Só não faça nenhuma loucura sem me avisar, ok?

— Tipo?

— Mudar-se sem avisar. – Miguel segurou o rosto dela com as duas mãos. Beijou delicadamente seus lábios e sorriu junto a sua boca. – Quero uma vida com você, Serena.

— Eu também. Irei repetir mais uma vez. Você é meu lar, senhor militar. O lugar do qual não planejo deixar. – Serena roçou seus lábios nos dele mais uma vez e logo, as carícias foram aumentando. Miguel as interrompeu.

— Calma.... Se não você vai me fazer ter pensamentos fantasiosos... – Sussurrou próximo a seu ouvido, provocando-a. A mulher protestou um pouco, mas contentou-se com as mãos fortes que a envolviam pela cintura. O balão começava a rebaixar-se e lentamente, eles retornaram para terra firme. Miguel ergueu o corpo de Serena com facilidade, ajudando-a descer. As estrelas já brilhando altas no céu azulado.

— Quanto foi, Ezequiel? – Miguel perguntou acertando as contas.

— Para o casal mais inesperado do ano, irei fazer uma cortesia. – O guia respondeu bem-humorado. Beijou as costas da mão de Serena e despediu-se, tornando a trabalhar.

— Se você insiste... – O Alfa guardou a carteira com um murmúrio vendo o garoto afastar-se. Caminhou ao lado de Serena no caminho para casa, conversando sobre banalidades, até que a morena adentrou em um assunto mais sério. Já estavam entrando no bosque de coníferas que circundavam o chalé, quando ela começou a falar:

— Penso que deveríamos apadrinhar Steve e Logan. – Parou de andar e fitou Miguel, esperando a reação de seu marido. – São bons meninos, mas estão muito sozinhos. Não seríamos seus pais, até porque o mais velho tem quase nossa idade, mas eles poderiam ir morar conosco. Eu treinaria o caçula com maior empenho e pessoalidade e poderíamos mandar Steve para a Academia de Belas Artes Drakiniana. Sabe, o garoto é um talento. Desenha e esculpi qualquer coisa com minúcia sem igual.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

O Alfa cogitou a ideia por um momento. – Não me parece ruim. Entrarei com uma petição para o conselho tutelar da cidade. Acho que no próximo solstício, a papelada já estará pronta para que eles venham morar conosco. – Serena abriu um sorriso de orelha a orelha.

— Eu te amo, te amo, te amo. – Repetiu depositando vários beijos no rosto do homem, que deu um passo para trás desequilibrando-se.

— Tudo pelo seu bem-estar. – Ele disse. – E além do mais, gosto dos dois moleques. Um é forte e corajoso e o outro, talentoso e observador. Seria um gesto nobre abriga-los por nossa parte.

Serena chegou mais perto do corpo de seu marido, colando seus corpos e fazendo um caminho de beijos até chegar a orelha do Alfa, na qual falou baixinho. – Já que você está tão bonzinho, não vejo porque não o agradar esta noite. – Percorreu com a unha os lábios do militar e os beijou intensa.

Miguel a pegou no colo, fazendo ela soltar um gritinho inesperado. – Se toda fez for assim, vamos adotar todas as crianças de Draken! – Ele completou carregando-a até a residência deles

Um sorriso brotou dos lábios da mulher. Ela estava em casa. Miguel era sua casa.

BRUTUS ABRE LUTA CONTRA DRAKEN

Brutus, o Alfa de Premin, estava, em demasia, estressado. Seus prisioneiros mais perigosos e detestáveis agora eram fugitivos, Draken parecia estar expandindo seu domínio para algo fora do normal e ele temia pela volta da bastarda em busca do trono. – Que insolência! – Bateu no rosto do empregado, fazendo-o gemer de dor. – Imprestável! Não sabe que só tomo vinhos vindos de Findoram?! – Gritou irritado, jogando a taça e a garrafa do líquido escuro sobre o carpete branco que recobria todo seu escritório. Um baque estilhaçado audível por toda a sala. Segurou o rapaz a sua frente pelo pescoço com força e repetiu. – Da próxima vez que cometer um erro banal como esse, mandarei decapitá-lo! – Soltou-o, fazendo com que o jovem magricelo se apressasse para sair.

O Alfa ficou sozinho, imerso a um milhão de preocupações. Governar um país sem o auxílio de um deus era muito cansativo e demandava de uma repressão rigorosa. Talvez fosse isso que o equilíbrio quisesse evitar, um autêntico caos. Passou a mão por seus cabelos loiros e teve uma ideia, um tanto precipitada.

— Iremos atacar o reino do dragão imediatamente... E ainda poderei procurar por Mathias, aquele sujeitinho. – Murmurou meio que para si mesmo. – Ralf! – Chamou em voz alta e autoritária seu beta mais confiável. Ele veio quase correndo, abrindo a porta com velocidade. Ao contrário da maioria da população, era um homem forte e bem-treinado.

— Diga, meu senhor, que eu farei. – Ele fez uma reverência profunda a seu governante.

— Organize as tropas! Partiremos para Mellory o quanto antes! – Mandou sério. Estava decidido.

— Mas, meu Alfa, os soldados estão famintos, não terão forças suficiente para enfrentar um contingente como o drakiniano. – Observou o militar preocupado. O Alfa o repreendeu com o olhar.

— Guarde meus melhores homens e os treine para um combate futuro. Um quinto do exército está bom. – Propôs sem brechas para discussões. – O resto utilize como quiser. Meu objetivo não é dominar o reino dos dragões ainda. Desejo enfraquecê-los e depois provocar um ataque mais pontual. Quem sabe, matando os Alfas e a maldita bastarda que ameaça meu trono. – Puxou o beta pelo colarinho de sua farda. Fitando-o. – Quero meu exército em campo dentro de três dias. Quantas vidas serão desperdiçadas não é importante. – Riu maléfico. – Desejo poder pleno. Mais do que os deuses. Mais do que todos. – Completou cego por sua ambição.

— Está bem. Se assim deseja, Vossa Majestade, realizarei com afinco. – O funcionário concordou. Mesmo que por dentro, achasse o plano de seu rei um absurdo. Aquilo era desumano. Até mesmo para um tirano. Partiu veloz para organizar os batalhões.

Kalisse nada disse, a raposa sabia qual seria o resultado dessa brincadeira. Todos sabiam, e ela faria questão de estar presente. Dhiren e Helias, quando foi que ficaram tão fortes?

Os soldados de Premim viajaram para Mellory como previsto, exatos três dias depois da ordem do Alfa. Encontravam-se no meio da mata quando avistaram as tropas drakinianas fortes no horizonte.