Dia da Mentira

Sage estava eufórica, contando a Katherine suas aventuras em Asgard quando ainda era reconhecida como deusa nórdica da fidelidade, enquanto as duas passeavam pelos corredores de um shopping que estava abarrotado de pessoas atrás de ovos de Páscoa.

— ... Foi quando o Thor nos encontrou, Loki usou sua magia para ficar com a aparência de Sif, assim, não teria problema algum que ele ficasse em meu quarto conversando comigo. Ele enganou Thor para que eu continuasse lhe dando alguns conselhos, principalmente sobre como poderia deixar Odin orgulhoso. Tive que explicar a ele milhares de vezes que ele e Thor são diferentes, então logicamente que o Pai de Todos teria uma relação diferente com ele comparada à relação com o Thor. Mesmo assim, Loki sempre se esforçou para provar o seu valor, e acabou se tornando muito inteligente; claro, ele não deixaria as travessuras de lado, afinal, éramos muito jovens e... – A ruiva logo notou que os olhos da humana passeavam ansiosamente pelas vitrines das lojas - Kate, está me ouvindo?

— Hm? – Katherine virou seu rosto para ela. – Ah, me desculpe, disse alguma coisa?

— Distraída novamente? – A deusa suspirou. A morena estava aérea havia dias, não se concentrava muito nas conversas à sua volta, exceto quando estava treinando com Steve Rogers na SHIELD. Ninguém sabia dizer o motivo exato. Para Lucas, era o nervosismo pela missão em campo que estava por vir; para Sage, eram os sentimentos dentro do coração da garota, que pareciam divergir e ela ainda não sabia identificar; para Loki, era por causa de Pietro; já Pietro, não fazia ideia. Todos concordavam em uma coisa: não era do feitio de Katherine agir daquela maneira.

— Sinto muito. – Apologizou a garota. – É que ando com algumas coisas na cabeça, acabo entrando em um estado de introspecção. – Sigyn franziu o cenho perante tais palavras. Kate havia as pronunciado como um robô, sem demonstração de sentimentos e o tom de voz friamente calculado. Sage segurou o braço de Katherine abruptamente, tão abruptamente que fez a adolescente saltar com o susto.

— Está se sentindo bem? – Perguntou com preocupação a deusa.

— Sim. – Kate piscou, confusa. – Qual é o problema?

— Você parece... Desligada. Como se sua mente estivesse em outro lugar. – Os olhos azuis da ruiva olhavam com intensidade para a jovem, como se quisessem extrair uma resposta sincera dela. – Gosto que seja sensata, Kate, mas assim já é demais. Quando se passa muito tempo pensando nos problemas ou no futuro, acaba se esquecendo do presente. Sei que não é fácil encarar seus sentimentos, mas é preciso fazer isso. Estou aqui, Kate. Se precisar de conselhos, quero que saiba que sou sua amiga e posso te ajudar...

— Wow, wow, calma aí. – A mais nova interrompeu. – “Sentimentos”? Sigyn, o que você acha que está acontecendo comigo?

— Acredito que esteja confusa com relação ao que sente por Pietro. Isso é completamente normal, não precisa ficar desesperada e nem mesmo desistir... – Kate ergueu as mãos e Hollister parou de falar instantaneamente.

— Não estou confusa sobre isso. Estou certa do que sinto, apesar de minhas inseguranças. Não é Pietro que me preocupa...

— Fico feliz e aliviada por isso e...

— ... É o Loki. – Continuou Kate. A deusa ergueu as sobrancelhas, sem conseguir esconder a surpresa. – Não sabia como te dizer isso, estava esperando o momento certo, quando ninguém estivesse por perto... – As bochechas da garota começaram a ruborizar suavemente. Sage dirigiu a ela um sorriso de compreensão em resposta à sua reação.

— Entendo. Imaginei que logo enxergaria as qualidades dele, que vocês se dariam bem. Não esperava que fosse algo tão súbito.

— Na verdade, não há nada entre nós dois. – Kohls parou em frente a uma vitrine com ternos, era uma loja com um estilo requintado, na fachada lia-se “Brooksfield”.

— Então não há nenhuma espécie de relação o fato de estarmos paradas em frente a uma loja com produtos majoritariamente masculinos com a data de hoje? – Sage ergueu uma sobrancelha com um sorrisinho presunçoso em sua face. A recruta da SHIELD estava concentrada em um conjunto de abotoaduras prateadas contido em uma caixa de veludo vinho.

— Você sabe que há uma relação. – A morena nem se deu ao trabalho de olhar para Sigyn, a deusa da fidelidade era famosa por sua sagacidade. Logicamente, ela compreenderia a existência de segundas intenções por parte de Katherine principalmente porque a garota raramente pedia para ir às compras – muito pelo contrário, Kate preferia mil vezes ficar em casa. – Quero que as coisas se acertem entre Loki e eu, não quero que sejamos inimigos. Não vou fingir que entendo que tipo de relação temos, honestamente, nem sei o que somos um para o outro; apenas quero acabar com essa tensão constante e com as desconfianças.

— Como eu disse, sempre soube que você era uma pessoa sensata. Fico feliz que esteja dando uma chance ao Loki, não sabe o quanto ele precisa disso. Durante a vida inteira, eu fui a única amiga dele, ele ficará infinitamente feliz de conseguir outra, apesar dele provavelmente não demonstrar isso. – Seu sorriso era radiante, os olhos brilhavam vívidos enquanto pensava nas possibilidades promissoras para a vida de seu melhor amigo. Katherine compreendia o porquê de Loki ter Sigyn por perto, e por considerá-la uma verdadeira amiga. Era como ela se sentia em relação a Lucas, ter alguém para quem mostrar seu eu verdadeiro, a face por trás das inúmeras máscaras que era obrigado a usar de acordo com o ambiente, alguém para quem pudesse mostrar seus sentimentos, contar seus segredos e te ajudar a juntar seus cacos, não se importando com o quão quebrado você esteja.

— Amigos? – As senhoritas adentraram a loja, procurando o item ideal. - Sage, acho que ele não me vê dessa forma. – A garota observou o item à sua frente e sorriu satisfeita, certa de que era o que procurava. – É este aqui. – Disse ao vendedor. O homem foi eficiente, logo as garotas estavam com o presente muito bem embrulhado em uma caixa bonita e uma sacola com o nome da loja em mãos.

— Não acha que ele a considere uma amiga? – Disse Sigyn, em seguida indicou a sacola nas mãos de Katherine. – Bom, essa é a sua chance de mudar isso.

{...}

As palmas de suas mãos estavam suando devido ao nervosismo que sentia quando a garota bateu levemente na porta do quarto de hóspedes – o quarto no qual o deus se encontrava. Alguns segundos depois, a porta se abriu revelando a figura de um Loki com seus cabelos negros rebeldes como sempre, uma camisa de botões verde-escura dobrada até os cotovelos, os botões da frente estavam abertos revelando seu tronco esguio, seu abdômen definido com algumas cicatrizes em sua pele (resultantes de batalhas passadas), calça preta, botas de montaria também pretas e uma corrente dourada em seu pescoço que contrastava com o tom de sua pele pálida.

— Katherine? – A voz do deus preencheu o breve silêncio que se instaurara entre os dois. – O que deseja?

— E-Eu... – A garota ficou envergonhada ao ver o deus daquela maneira, não estava habituada àquilo, porém, claro, fora ela quem o interrompera de seus afazeres, perturbando sua privacidade. Ao observar as bochechas da midgardiana corarem, Loki ergueu uma sobrancelha e logo um sorriso preguiçoso surgiu em seus lábios deliciosamente finos.

— Você...? – O moreno apoiou o braço no batente da porta, o que fez com que um pouco mais da pele de seu abdômen aparecesse; então se deliciou com as reações da garota, que parecia extremamente desconfortável. Era interessante observar o quanto ele era capaz de afetá-la, sua inocência era algo que o fascinava completamente. Os olhos de Katherine percorreram por um instante os músculos expostos do deus, em seguida ela desviou o olhar abruptamente para seus pés com as bochechas em chamas. Respirou profundamente, controlando-se e tentando se recuperar de seu constrangimento ao mesmo tempo, depois ergueu a sacola de supetão, praticamente jogando-a nas mãos de Loki:

— FELIZ ANIVERSÁRIO! – Gritou, sem a menor intenção de fazê-lo. O moreno segurou a sacola e franziu o cenho encarando a humana à sua frente.

— Perdoe-me? – Ele piscou, sem entender.

— Feliz aniversário. – Repetiu Kate, um pouco menos eufórica, porém, mais ansiosa. – Desculpe. Hoje é primeiro de abril, conhecido como dia da mentira aqui em Midgard. – Explicou. – Como não sei o dia do seu aniversário, resolvi presenteá-lo hoje. – Um sorriso tímido surgiu em seus lábios delicados. – Passei alguns dias pensando no presente, não sabia o que te dar. Mas então hoje... Hoje encontrei algo que me lembrou você. Espero que goste.

Loki abriu lentamente as caixas, revelando, assim, um conjunto de abotoaduras e gravata verde.

— A cor combina com os seus olhos. – Comentou a garota. Loki a observou por um momento. Katherine parecia indubitavelmente feliz por presenteá-lo, e aquilo o pegou desprevenido. Mas não demorou muito para que o deus da mentira se recompusesse.

— Obrigado, Katherine. – Agradeceu cordialmente. A humana abriu um enorme sorriso luminoso.

— De nada. Espero que tenha gostado. – Ele assentiu. – Muito bem, então. Agora devo ir até Sigyn, ela deve estar precisando da minha ajuda. Com licença. – Kate se retirou, indo em direção à sala.

O deus da mentira fechou a porta do quarto em seguida, apoiou as costas nela e apertou a caixa do presente contra seu peito. Aquilo havia significado muito para ele, mais do que Katherine poderia imaginar.

— Eu adorei. – Murmurou.