Quando me recuperei do choque, sorri para Alice. Sorri o mais docemente e hipocritamente possível. Não estava nada à vontade com o O’Brien na mesma sala que eu, na minha casa.

Quem eu estava a tentar enganar? Eu estava completamente desconfortável de estar no mesmo espaço que ele.

Dean adiantou-se para me abraçar e me beijar a bochecha. Ele pareceu totalmente diferente do suposto irmão, não de aparência, porque o Sr. Sanchez tinha cabelos loiros igualmente e o mesmo rosto severo e marcado. No entanto, Dean era mais amistoso e alegre. Menos sério.

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—Tu és tão linda quanto o paspalho do teu pai!- ele examinou-me com um sorriso bonito a espreitar na face.

Corei, contudo tive de brincar com a situação.

—Papázinho, estás a ver que não estás velho… Se és tão lindo quanto eu, nunca vais envelhecer, ó velhote!

O meu pai riu e o meu avó sorriu também quando aproveitou para comentar:

—Claro, tem os meus genes! E tu, mesmo que não os tenhas, és a minha anã e a de mais ninguém!

Senti o carinho por aquele senhor percorrer-me as veias. Senti a tristeza também. Senti a tristeza de nunca conhecer os meus pais biológicos e de não ter o mesmo AND que a minha família. Senti a tristeza, que por mais que tivesse o apelido e os bens que lhes pertenciam, sempre seria a ponta solta na família. A que nunca foi desejada e a que foi adotada por pena. Baixei os olhos e ouvi um gemido de dor no silêncio que se tinha instalado na sala.

A minha avó tinha acotovelado o meu avô nas costas, como para dar-lhe uma reprimenda. Foi naquele momento que senti algo a cutucar-me as minhas pernas. Era Maya, aquele anjo. Disfarçando, olhei-a e agachei-me na sua altura.

—Eu sou a Maya. Tenho estes todos-mostrou-me a sua mão com quatro dedos levantados- e adoro algodão doce. Adoro o teu cabelo- ela pegou um cacho meu e rodou-o entre os dedinhos gordos e fofinhos, sorri verdadeiramente. Ela era tão fofa!

—Olá Maya. Eu sou a Kaiko e adoro o teu cabelinho também. É muito lindo!

—Bem, presumo que deva pedir a Bonnie e Beverly que sirvam o jantar. Kaiko, meu amor, podes ir buscar um vinho para acompanhar o empadão de rim? Escolhe um vinho tinto. Ah! E traz também um refrigerante ou um sumo da geladeira para ti, para o James e para a Maya.-a minha mãe obviamente percebeu o meu desconforto. Ah, como eu a amava.-James querido, porque não vais com a minha filha?- ok mãe, comecei a odiar-te a partir deste momento.

James olhou para mim e eu encarei-o de volta, sem vergonha. Eu não me ia rebaixar por um estúpido a que se juntava a palavra idiota, que tinha um ego enorme e era um babaca sem filtros.

Ele pareceu sem graça por apenas um segundo, como se o meu enfrentamento o incomodasse.

—Mãe, acho que não é necessário o James ir. Eu sou bem capaz de fazer as coisas por mim própria.

—Eu sei, linda, mas assim podiam conhecer-se melhor.-pelo amor de Deus, tu não compreendes, minha mãe, que eu não quero estar no mesmo ambiente que ele!! Que raiva, mulher!

—Eu vou ajudá-la, senhora Roberts.- o insecto disse para a minha mãe com um sorriso irresistível.

—Querido, chama-me só de Malia. Senhora Roberts lembra-me a minha sogra ali sentada.- apontou a minha avó, que abriu um sorriso irónico para ela.

—Senhora Roberts e com respeito, porque eu aprecio…- a voz da minha avó elevou-se com sarcasm. No entanto, o sarcasmo não era mordaz. Era uma espécie de provocação e brincadeira que elas faziam entre si.

Revirei os olhos, depois diziam que eu era infantil. Levantei-me e saí pela porta, em direção à enorme adega na frente da piscina. Estava escuro lá fora. A piscina era Iluminada pela luz da lua, que estava cheia, e produzia um efeito meio fantástico, assustador. Estaquei os meus passos, de repente, apenas ficando observer a água que brilhava e ondulava levemente.

Senti uma pequena brisa trepassar-me com um arrepio estranho e depois continuei em frente. Quando estava pronta para abrir a porta da adega, o arrepio subiu-me pela espinha novamente. Uma respiração era sentida no meu pescoço.

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Ok, manter a calma. Eu estava a ser assaltada, porque a minha família estava lá dentro na mesa de jantar. Tinha de ser outra pessoa que estava por detrás de mim neste momento. Tinha de ser outra pessoa.

Virei-me de imediato, pronta a defender-me com tudo o que tinha. Pronta a gritar e espernear e bater. Abri a boca para o fazer. Uma mão grande e repleta de calos tapou-a e eu fui obrigada a encarar uns olhos lindos e brilhantes. Fui obrigada a encarar um rosto conhecido e por mim não agradado.

Porque é que ele estava tão próximo em mim? Quem lhe deu esse direito, outra vez?!

Ele estava tão próximo do meu corpo que conseguia sentir os seus músculos, a sua pele protegida pela camisa. Conseguia cheirar o seu perfume e ver as suas sardas no nariz reto dele. O meu corpo não reagia à minha mente.

Tudo bem… Ele era bonito, porém é tudo. Ah! Ele é um deus mesmo à minha frente. A encurralar-me… Como naquelas fantasias…

Foca-te Keahi! Pelo amor de Nossa Senhora, age! Tu não gostas dele! TU NÃO GOSTAS DELE!

Ele tirou a mão da minha face, devagar e quase a medo. Logo que tive a oportunidade, tentei fugir. É óbvio que não deu. Por isso, comecei a barafustar:

—Por acaso tu és algum tipo de perseguidor ou assim? Não te dei a permissão para me seguires e muito menos para me tocar!- mesmo no escuro, pude vê-lo revirar os seus olhos, que se encontravam negros e não na cor habitual.

—Sempre a responder! Tu não sabes fechar essa boca bonitinha por um segundo?

—Na realidade, até sei. Tens a noção de que sou um ser humano civilizado, certo? Ah, espera. Tu não sabes o que é isso, visto que não és um. Apenas não me apetece fechar a minha “boca bonitinha”, porque parece irritar-te. E eu acabei de decidir que isso me agrada.

O seu resmungo de desgosto foi como música para os meus ouvidos. Deu-me uma satisfação nunca imaginada. Roberts 1 x 0 O’Brien.

Aproveitei o facto de ele agir como um garoto mimado e empurrei-o for a do meu caminho. Abri a porta e entrei na Adega. Andei por entre todas aquelas fileiras repletas de inúmeras garrafas recentes e antigas, de diferentes tipos e cores. Focalizei a última fileira. Aquela garrafa de Almaviva de 1996, proveniente do Chile, parecia a chamar por mim.

Tentei pegá-la mas estava muito alta. Ótimo dia para a baixinha aqui! Todo mundo deve estar a querer levar uma sova de mim. Não me importaria nada, se fosse para descontar toda a minha raiva.

—Porque não pedes ajuda? Seria mais fácil, não?- e James estava de volta. Ele era tipo pastilha elástica? Daquelas que nunca descola? Ah, que porcaria. Seria errado dizer que ele me irritava mais do que qualquer outra pessoa?

Virei-me para ele. James já tinha um garrafa na mão e…Olha que surpresa! Um sorriso malicioso no rosto.

—E tu és capaz de ser menos idiota?- peguei a garrafa da mão dele com força e virei-lhe costas, dirigindo-me à porta, novamente sem olhar para trás.

^~^~

Suspiro. Bocejo. Outro suspiro.

O jantar estava incrivelmente animado. Nunca pensei que me podia diverter tanto. Maya já dormia no sofa e nós todos estávamos na sala de jantar a beber café e a comer bolo de chocolate da Beverly. Que maravilhoso esse bolo! É como o paraíso a misturar-se com o paraíso de um universe paralelo! Ok, estou a exagerar.

Dean era um cavalheiro, Alice era um doce e James… Nem vale a pena falar desse traste.

Está a deixar-me cada vez mais confusa. Num momento é totalmente arrogante e egoísta; no outro momento perpendicular é gentil, engraçado e querido. O quanto me custa a admitir isso. O quanto me custa a admitir que ele até é bom. Que não é o vilão.

Ou talvez seja só o vilão incompreendido.

Suspiro.

~^~^

A luz iluminou o meu quarto. Por Dumbledore, não me apetecia nada abrir os meus olhos. Estava enrolada nos cobertores e estava tão quentinho…

E lá estava. O maldito despertador. Cacete! Posso amaldiçoar o relógio para queimar no inferno?

Abri os olhos, tendo uma tontura repentina. Era o que dava passar a noite às claras, sem ter um pingo de sono.

Vamos admitir. Eu estou nervosa. Estou muito nervosa. Hoje seria o primeiro dia de escola.

Hoje é o meu primeiro dia de escola em anos. Não sei como me sentir. Feliz não é decerto. Triste? Também não. Desespero? Não é para tanto. Pânico? Mais perto. Medo?

Mil vezes sim.

Porcaria. Sinto o estômago revolto e a garganta apertada. As minhas mãos estão suadas mesmo antes de sair de casa. Harry vai me dar carona com a Liv.

~^~^

Enquanto estava no carro, Liv e Harry tentaram-me descontrair. Soltar toda a tensão que eu estava acumulando nos últimos dias.

Eu juro que aqueles dois eram bonitos juntos. Completavam as frases um do outro. Abraçavam-se muito timidamente e, segundo o que Harry contava para a fofoqueira aqui, passavam horas conversando.

Isto tudo graças a quem? Ah, pois, a mim. Não me vou vangloriar ou parecido, mas sim, eu tinha convencido Liv de que ele não queria brincar com ela.

Porém, ainda sentia que aqueles cabelos ruivos me eram familiares. Sentia conexão com aquele rapaz. Não era conexão amorosa ou assim. É complicado de explicar. Era quase como uma conexão familiar ou de… irmandade. Irmandade. Acho que é o mais certo.

Não voltei a ver James nos últimos dias. O que era bastante bom para o meu pobre coração confuso. Porque é que eu me sentia assim? Na realidade, nunca me tinha sentido assim.

Ao olhar a frente da escola que frequentaria no próximo ano, senti-me com medo novamente, como se fosse uma garota indefesa. Uma princesinha.

Nada contra princesas, claro.

Ok, nada de medo Keahi Roberts. Tu és do mar. E o mar não tem medo. O mar não mete medo. O mar impõe respeito.

Quando ouvi o toque de entrada, entrei para enfrentar tudo aquilo que era novo para mim.

Tudo aquilo que se havia tornado o meu mais novo pesadelo.

E sim, estou sendo completamente dramática. Mas não me importo.

Já tiveram noção que toda a reviravolta que a minha vida deu começou em Miami?

Eu só posso estar amaldiçoada.