Os três estavam no topo do mundo. Pelo menos era isso que Cassie sentia. Ela, Bliss e Sebastian estava no terraço da antiga fábrica de móveis, que ficava afastada da cidade e tinha fechado a 10 anos atrás.

Sebastian rodava em círculos de olhos fechado e com os braços aberto segurando uma garrafa de vinho, que tinha sido misturado com vodka e mais outras coisas que Cassie nem fazia ideia. Receita secreta de Sebastian. Era boa, e subia rápido.

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Cassie não pode segurar o pensamento. Sebastian estava lindo. Ali rodando, cantando, com toda a cidade iluminada com cenário de fundo.

– Oh we can be Heroes, just for one day – Sebasitan cantava

Ele parou de rodar e encarou Cassie e Bliss, então abriu um largo sorriso. Ele se virou de costas para as duas, ficando na borda do terraço respirou fundo e gritou para cidade distante:

– EU SOU O REI DO MUNDO! - então se virou par Bliss e Cassie e continuou: - E essas são as minhas rainhas.

Cassie riu. Bliss ficou de cara fechada.

– I, I will be king, and you, you will be queen! – ele continuou cantando.

**

Para Bliss:

Se Sebastian é um rei, ele é Henrique IV, e nós, não somos nada mais do Maria e Ana Bolena.

– Então deixa eu ver se entendi... – disse Thomas girando um cigarro entre os dedos.

Cassie e Thomas estavam sentados na escada da varanda de Thomas, observando a chuva cair e os carros passarem. Thomas acendeu o cigarro e passou para Cassie, depois acendeu um para si mesmo.

Thomas era o primeiro psicólogo de Cassie, mas ela sabia que psicólogos não deviam dar cigarros aos seus pacientes (especialmente os menores de idade), nem serem tão informais quanto ele era. Naquele momento, Thomas estava descalço, usando um shorts e uma camisa, que Cassie suspeitava que era seu pijama. Mas ela não se importava. Aquilo tinha sido uma das condições para que ela começasse o tratamento. Ela não queria ser tratada como uma paciente. E ela não queria ver Thomas como seu médico. E se Thomas tivesse que ser antiprofissional para ajudar Cassie, ele seria.

– Batalha de robôs... É um campeonato oficial e sério com regras e tudo...

– Isso – Cassie acenou segurando o cigarro nos lábios.

– Mas antes desse campeonato começar... cada equipe tem... “testes”

– Mais ou menos isso. Existem as batalhas não oficiais, que acontecem antes do campeonato começar. Para manter o nível do campeonato, cada equipe tem que ganhar 5 batalhas não oficiais para poder entrar no campeonato. A parte divertida é que o local onde as batalhas não oficiais vão acontecer.

– E onde vai ser? – perguntou Thomas soltando fumaça pela boca.

– Não sabemos. Vai um tipo de caça-ao-tesouro.

– E qual vai ser o grande prêmio? Para quem ganhar o campeonato?

– Eu não sei... também não me importo muito. Um grande troféu talvez... Além do sentimento de superioridade e realização pessoal... – disse Cassie olhando para um carro que passava pela rua, por cima das poças de água, espirrando água para todo lado.

– Então você não quer ganhar?

– Não querer e não esperar anda é a única maneira digna de viver. – disse Cassie apagando seu cigarro no cinzeiro ao lado.

– Existem pessoas que discordam da sua opinião.

– Existem. Essas pessoas têm sonhos e desejos que nunca vão se realizar... E elas vão morrer um dia. Infeliz por não realizarem esses sonhos. Você é um deles.

– Talvez eu seja. Os membros do clube de robótica sabem que você pensa assim?

– Nunca falamos sobre isso...

– Você se dá bem com os outros membros do clube?

– Eles são ok... Não sei exatamente se eles gostam mim...

– Por que você acha isso?

– Sei lá... Eu sei que eles não me odeiam nem nada do tipo. Mas não sei se eles “gostam” de mim. Mas tudo bem, porque eu também não sei se “gosto” deles...

– E você fala com outras pessoas além dos garotos do clube?

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– Hum... Tem o Adam... temos algumas aulas juntos...

– Só isso?

– Acho que sim...

– Você não fala com... nenhuma garota? Você não tem nenhuma amiga?

– Na verdade... não.

– Por que não?

– Não sei... sei lá... as garotas da minha escola parecem todas iguais... com os mesmo gostos... Parecem clones. Gostam dos mesmos atores e cantores... Leem livros diferentes com a mesma historia...

– E que historia é essa?

– Sempre sobre a mesma garota quieta e inteligente, que ninguém nunca presta atenção. Até que um dia o garoto mais bonito da escola de repente se aproxima dela e bla bla bla....

– E você não gosta desses livros?

– Não tenho nada contra os livros... Nem contra as pessoas que os leem... Eu só me pergunto se elas não ficam cansadas de reviver a mesma historia diversas vezes...

– Mas na sua escola existem garotas diferentes... não é?

– Algumas garotas se acham diferentes... Só porque elas têm um corte de cabelo mais ousado, ou se vestem diferente das outras... elas se acham diferentes e especiais...

– E não são?

– Ninguém é especial.

– Todo mundo é especial.

– Especial quer dizer que alguma coisa fora do comum, exclusiva. Peculiar. Notável. Se todo mundo é “especial”...logo... ninguém é especial.

– Você sabia que eu fico aguardando ansiosamente as suas consultas.

– A chegada dos irmãos Karnstein é o ponto alto da sua semana? – Cassie perguntou segurando o sorriso.

– Falando do seu irmão... ele disse que você voltou a correr...

– Eu não voltei a correr. Foi uma recaída... Só isso.o

Thomas olhou para Cassie e começou a rir.

– Qual é a graça?

– Cassie, você voltar a correr não é uma recaída. É o oposto disso. É um sinal de recuperação.

– Jonathan te pediu para falar isso?

– Jonathan me pediu para falar muitas coisas, mas isso não. Isso, sou eu Thomas, seu psicólogo, falando.

– O que mais Jonathan pediu para você falar?

– Te incentivar a se abrir mais com ele, a sair mais, a comprar roupas novas, ou tentar se arrumar um pouco mais.... Mas disse para ele que você precisava fazer as coisas no seu tempo.

– Talvez eu precise de muito tempo...

– Tudo bem. Jonathan pode esperar.

Ficaram por 10 minutos em silêncio, apenas olhando para a chuva, que estava ficando mais fraca.

– Cassie... você está fazendo o que eu te pedi?

– Você me pede tantas coisas....

–Você está “sentindo”?

– Eu tenho.... mas acho que meus sentimentos estão em falta...

– Cassie, você sabe que isso é uma parte importante do seu tratamento. Você precisa sentir. Se você está feliz, eu quero que você pule e grite, se você está triste, quero que você chore abraçada ao seu travesseiro, se você está com raiva, eu quero que você berre e quebre alguma coisa. Quando Bliss morreu, você não se deu ao direito de sentir. Você foi cuidar dos sentimentos dos outros. Você cuidar de Sebastian e dos pais da Bliss, como se eles tivessem mais direito de sofrer do que você. Isso foi um erro. Quando seus sentimentos não conseguiram mais ficar contidos, eles explodiram para fora... e você ficou com depressão. Sentir tudo o que você tem direito de sentir, é um modo de evitar uma recaída de verdade.

– Eu tenho “sentido” coisas. Outro dia eu praticamente dei uma surra em uma arvore....