Dianella foi cuspida para fora do arco das dimensões.

E ela não estava sozinha.

— Dianella.

Estremeceu ao ouvir aquela voz. Nunca esteve tão apavorada em toda a sua vida.

Ela não sabia o que fazer. Precisava de Jilian, Jilian precisava estar lá com ela...

Pôde ver Rookwood se retirar da sala sem que o seu lorde precisasse pedir. Isso não significava que já tinham dado cabo da fuga em massa de Azkaban, já que o auror nunca foi preso por trair o Departamento de Mistérios. Tinha sido ele quem levou o arco dos universos para o seu senhor, ele que o contou tudo o que os inomináveis tinham descoberto sobre aquilo.

Por culpa dele a sua vida estava um completo caos agora.

Voldemort percebeu a sua hesitação.

— Dianella — voltou a dizer o seu nome, mais firme dessa vez.

Ela forçou-se a se levantar do chão, os braços quase não podendo sustentar o seu corpo. O seu coração batia tão forte que ela pensava que ele pararia voluntariamente em algum momento.

— Milorde — disse com a voz rouca — O que aconteceu?

— Você foi engolida pelo arco e levada a outra dimensão — Voldemort respondeu — O que você viu lá?

— Eu... Eu não... Não me lembro.

Pôde ver a sua túnica movendo-se em sua direção e então sentiu a sua mão rodear seu pescoço, fazendo-a olhar direto em seu rosto.

— Você é uma péssima mentirosa — ele sibilou.

Não seria capaz de atacá-la, seria?

Não era possível que tudo o que tivessem dito a ela sobre ele fosse verdade.

Não...

— Você viu Harry Potter? — Tom perguntou.

— Não.

Sentiu a falta de ar conforme a sua mão apertava o seu pescoço.

— Milorde... — ela tentou falar.

Levou as suas mãos para o pescoço, tentando afastar a sua mão.

Viu a raiva cintilar em seus olhos vermelhos.

— Dianella, não me provoque. Você não entende o quão importante é que me conte o que você viu? Você não entende que isso me ajudará a destruir Harry Potter? — a sua voz foi aumentando o tom conforme falava antes que estivesse gritando.

E então ele a empurrou, a mão ainda em seu pescoço. As suas costas bateram duras contra o chão de pedras, fazendo com que perdesse o ar. Virou-se para o lado, engasgando e tentando recuperar o fôlego.

Antes que pudesse dizer algo, escutou o bruxo das trevas pronunciar:

— Crucio.

Não sabia como era a sensação de mil facas sendo enfiadas em sua pele, mas imaginava que seria algo como aquilo. Cada poro de seu corpo parecia gritar de agonia. Não conseguiu segurar o próprio grito nem por um segundo.

Ele levantou o feitiço por tempo suficiente apenas para que ela recuperasse o ar antes que trouxesse de volta a dor.

— Por favor! — ela gritou.

Era como se a dor das outras pessoas o deixasse feliz.

Ele parou o feitiço, praticamente agachando-se ao seu lado para ver o seu rosto mais de perto.

— O que você viu?

Não parecia nem um pouco arrependido ou afetado por tê-la machucado da mesma forma que os trouxas de seu orfanato fizeram por todos aqueles anos.

Nada se meteria em seu caminho, em seu objetivo de matar Harry Potter.

Harry.

O seu irmão.

— Eu não... Eu não sei o que você quer saber! — Dianella exclamou.

— Ficou assustada ao ver o que ocorrerá no futuro?

Ele realmente acreditava que tinha sido o único universo em que tinha perdido para um bebê de um ano de idade?

— Acha mesmo que o tolo Harry Potter é capaz de me derrotar? Sabe o que me impediu naquela noite? O amor de Lily Potter. Um feitiço poderosíssimo e ancestral — disse Voldemort — Acha que não falando o protegerá?

— Você vai matá-lo de qualquer forma.

Ele levantou-se e ela fechou os olhos.

— Crucio!

A próxima hora foi nebulosa.

Aos poucos, ela sentia como a sua sanidade escorria para longe de suas mãos.

Nunca sentiu tanta vontade de morrer como naquele momento, mas ele nunca permitiria que isso acontecesse. Ele não a deixaria ir sem a sua informação. Se ele não tivesse a informação...

Dianella ofegou.

Ele atravessaria o arco.

Como ela conseguiu algo que falharam por tanto tempo?

— Eu lhe dei todas as oportunidades, Dianella, e você me decepcionou — Voldemort silvou — Legilimens!

Mesmo que soubesse oclumência, não tinha forças para lutar contra aquela invasão.

Viu como surgiu no Departamento de Mistérios junto com outras quatro garotas.

Viu como transformou-se naquela massa escura que quebrou a parede.

Viu quando encontrou-se com Nagini.

Quando foi interrogada por Voldemort, que invadiu a sua mente, mas não com tanta brutalidade.

Quando invadiram Azkaban para soltar os prisioneiros.

Quando conheceu Jilian e as outras irmãs.

Ele não pôde ver o endereço de Grimmauld Place, por mais que tentasse por causa do Feitiço Fidelius. Nem mesmo a legilimência poderia quebrar aquele contrato mágico poderosíssimo, apenas traição. Como a que Pettigrew cometeu.

Não sabia muitas coisas do tempo em que passou na Mansão Black, apenas que Ginny Weasley foi possuída por Voldemort em seu primeiro ano, e as vezes em que Harry foi quase morto pelo bruxo.

E mesmo o que o Voldemort de outro universo tinha lhe dito... Não via como podia ser útil para o seu plano.

Assim que terminou de revisar as suas memórias, o bruxo ficou em silêncio.

— Então eles estão vigiando o Departamento de Mistérios, hum? — ele comentou com ela, como se estivessem discutindo estratégias e não como se ele tivesse acabado de quebrar a sua confiança e a torturado por horas — Acham mesmo que podem me impedir de ter conhecimento da profecia? Tolos.

Viu-o aproximar-se do arco e pôr a mão no meio, mas já tinha tentado aquilo diversas vezes. Ele a princípio não se arriscaria podendo falhar, e de qualquer forma o arco não funcionava como eles queriam. Não sabiam o jeito certo de fazê-lo funcionar, apenas os inomináveis do outro universo sabiam como.

Talvez o próximo passo fosse sequestrar ou enfeitiçar outros inomináveis.

Eles descobriram como fazer porque o arco abriu do lado deles. Ou talvez já soubessem algo que eles não sabiam...

— Mas eu tenho uma carta na manga — disse Voldemort — Será o fim de Harry Potter e a Ordem da Fênix.

Ele não explicou o seu plano, apenas foi embora da sala sem dignar-se a dirigir-lhe outro olhar.

— Rookwood! — escutou-o gritar de algum lugar da mansão.

Ela arrastou-se pelo chão, tendo a certeza de que não demoraria muito para que os seus dedos, joelhos e cotovelos começassem a sangrar pelos arranhões causados pelo chão de pedra.

Qual era a cisma dos bruxos com pedra?

Assim que chegou próxima do arco, fechou os olhos e concentrou-se em tudo o que estava acontecendo.

Como o universo podia simplesmente mandá-la para um lugar seguro e depois mandá-la de volta ao inferno?

O que esperavam? Que ela morresse? Ninguém se preocupou com isso?

Como Voldemort podia ter tentado matá-la?

Sentiu o seu cabelo mexer-se sozinho, como se uma janela tivesse sido aberta e um vento tempestuoso entrasse. Cerrou as suas mãos em punhos, sentindo a raiva dominá-la. Lembrou-se de cada humilhação que passou, de cada tortura. Soltou um grito que não era relacionado a dor e então focou a sua mente em apenas uma coisa antes de tomar a sua forma obscurus.

— Não!

O arco rachou-se quando atravessou-o, formando uma parábola.

Assim que o mármore caiu ao chão com um estampido, ela também caiu contra o piso de pedra do castelo.

Rookwood tremia na porta do cômodo.

— O que você fez? — ele perguntou pálido e então gritou — O que você fez?

"Só mais um pouco, Dianella".

Reuniu forças novamente para atravessar o vidro da janela da sala.

— Avada...

Escutou o Comensal da Morte exclamar e depois sentiu o seu corpo cair novamente do lado de fora, escorregando e rolando pela colina da floresta. Agora seus machucados também estavam cobertos de terra e folhas de árvores.

Cambaleou pelo caminho, procurando afastar-se ao máximo das proteções oferecidas pela Mansão.

Não achava que seria capaz de aparatar como Scarlet, já que nem sabia como fazê-lo. Também não sabia se poderia viajar como obscurus, principalmente por não ter certeza se poderia se controlar.

E se acabasse matando alguém?

Gostaria de ter forças para matar a Voldemort, mas para isso as horcruxes precisariam ser eliminadas.

Nunca se preocupou em saber onde o castelo era localizado, e de qualquer forma nunca saiu de lá desde que foi resgatada do orfanato. Então apenas tropeçou pela encosta, tentando aumentar a distância entre ela e a Mansão. Pensou ter escutado passos algumas vezes e escondeu-se atrás de uma árvore.

Ela deveria ter pegado uma varinha.

Havia um vilarejo perto dali, mas não era nada como Londres. Era menos... urbano. A floresta que escondia o castelo abandonado ficava a um lado, enquanto que todo o resto era uma planície cheia de plantações.

Mesmo assim tudo parecia ser abandonado. Talvez os Comensais da Morte tivessem algo a ver com isso.

Caminhou pela rua de terra, evitando olhar ao redor. Uma estalagem tinha uma placa de madeira pendendo escrita "Pendle Hill".

De dentro do hotel, ela paralisou ao ver um homem de péssima aparência arrastando um corpo morto e cheio de mordidas, sangrando. Estava silencioso demais, como se todos os moradores estivessem mortos.

O homem olhou em sua direção.

Lobisomem.

— Olhe só o que temos aqui — ele escancarou os seus dentes pontiagudos.

Dianella não sabia muito sobre as coisas do mundo bruxo, mas imaginava que lobisomens só se transformassem em luas cheias. Então por que aquele homem parecia ser lobisomem em tempo integral?

— Abaixe-se!

Não sabia se a ordem tinha sido para ela, mas jogou-se ao chão e sentiu um raio de luz vermelha passar voando por cima de si e atingir em cheio o homem, que foi lançado para longe e desmaiou.

— Senhor, tem uma garota aqui — escutou o bruxo de pele escura e uniforme de auror gritar.

Lembrava-se do uniforme por causa do Ministério da Magia.

Ela correu em direção a taberna, pensando que precisava se esconder, que se fosse pega pelo Ministério...

Não estava saindo nada como o plano que montou com Jilian.

— Ei, espere! — gritou uma mulher.

Foi interceptada não muito longe, já que estava cansada e dolorida. Estava pronta para fugir como obscurial outra vez quando reconheceu a mulher à sua frente.

Ela tinha cabelos coloridos, a viu na sede da Ordem da Fênix durante o pouco tempo em que esteve lá.

— Eu preciso ver Dumbledore — ela disse — Não pode deixar que o Ministério... Por favor.

Esperava que a bruxa entendesse.

Que a ajudasse.

— Tonks? — escutaram o mesmo bruxo gritar.

— Podem ir, eu já os alcanço — ela respondeu no mesmo tom.

Viu-a mexer nos bolsos de sua capa, segurando a varinha em sua outra mão e então tirou um relógio de bolso.

— Ponha a sua mão aqui — Tonks a instruiu — É uma chave de portal. Vai nos levar a Londres.

Dianella olhou por cima do ombro da auror, mas não havia sinal de seus colegas de trabalho, e atrás dela a floresta parecia cada vez mais fantasmagórica.

Que lugar horrível para se viver.

Assim que pôs a sua mão na superfície de ouro, sentiu a paisagem rodar. Por que todos os meios de transporte bruxos eram uma péssima experiência? Segurou com força, com medo de que fosse cair pelo caminho, mas a magia a mantinha atraída àquele objeto.

Ela caiu em um baque contra o chão de pedra.

Outro chão de pedra.

Tonks a ajudou a levantar-se, ao mesmo tempo em que a mantinha na mira de sua varinha. Não era estúpida, apesar do que outros poderiam pensar.

— Não saia daqui — a fez sentar-se em uma das cadeiras de um pub que estava relativamente movimentado, apesar da decoração não ser convidativa — Vou pedir para que Dumbledore venha.

Odiava confiar em outras pessoas. Elas sempre mentiam ou traíam.

A auror saiu pela porta dos fundos do pub, que dava para uma parede de tijolos e latas de lixo. Viu-a conjurar uma forma prateada e conversar com ela. Estava esperando uma chamada por flú, e não aquilo. Ela retornou quando a forma desapareceu e Dianella virou-se para fingir que não tinha visto.

— O que estava fazendo em Lancashire? — Tonks perguntou a ela assim que sentou-se à sua frente, pondo os cotovelos em cima da mesa.

— Eu fui levada — respondeu em um murmúrio — O que aconteceu lá?

— Greyback — foi só o que disse.

Ela batia os dedos contra a mesa, parecendo nervosa pela situação.

Então nenhuma das duas estava muito a fim de dar explicações uma para a outra.

Sentiu a presença de Dumbledore antes mesmo que o bruxo se aproximasse da mesa em que estavam.

— Boa tarde — ele disse com tranquilidade, assim que tomou assento.

Foi difícil não pensar na raiva que sentia daquele bruxo.

Não pensar que ele foi o principal culpado de tudo o que tinha acontecido com ela desde a morte de seus pais.

Só havia três pessoas mais culpadas, e uma delas a tirou do orfanato que ele a pôs.

— É um prazer finalmente conhecê-lo, senhor — ela tentou manter-se calma — Eu sempre me perguntei quem era o senhor que fazia doações todos os meses ao orfanato Wool.

Observou-o ficar sério à menção do orfanato.

— Quem é a senhorita? — ele perguntou.

Quantas bruxas ele andou deixando naquele lugar?

— Dianella — ela respondeu.

Conteve-se a tempo de não completar "Riddle".

— Ela estava em Pendle Hill, Albus — comentou Tonks — Do outro lado do país.

Fechou os olhos e respirou fundo, tentando deixar a raiva de fora. Estava tão cansada de sentir raiva o tempo todo. Queria não precisar lidar com aquilo, apenas fugir dali e sobreviver pelas ruas. Porém sabia que não podia. O obscurus era incontrolável e ela precisava contar a eles sobre Tom... Apesar da vontade de afastar-se de toda aquela confusão ser imensa.

— O que estava fazendo lá, Dianella? — Dumbledore perguntou como se ela fosse uma aluna de 11 anos pega transgredindo as normas da escola.

— Tom me tirou de lá — ela respondeu — Ele... me prometeu coisas. Me contou coisas também.

— Por que Voldemort faria isso? — Tonks questionou.

O diretor de Hogwarts estava silêncio, parecendo tentar encaixar as peças com dificuldade.

— Porque eu não recebi a minha carta de Hogwarts. Porque eu sempre soube o que era magia. Porque me odiavam e me castigavam por coisas que eu não tinha culpa... — sentiu a sua voz embargar e engoliu em seco — Porque ele poderia me usar. Porque eu sou uma obscurial.

— Não.

Choque.

Culpa.

Tristeza.

Dumbledore parecia muito mais velho.

— Eu não penso que aqui é o melhor lugar para conversarmos sobre isso — disse Tonks diante do rumo da conversa.

A única coisa que fizeram foi subir as escadas para uma das salas privadas do Caldeirão Furado para poderem conversar sem serem escutados.

— Tonks, por favor, nos deixe a sós um minuto — o diretor pediu.

A metamorfomaga concordou, ficando do lado de fora.

— Eu cometi muitos erros dos quais não me orgulho, Dianella — Dumbledore murmurou.

Não pensou que o deixaria tão afetado.

Apesar de pensar que ficaria satisfeita por isso, que a sua raiva seria alimentada enquanto o fizesse sentir culpa por tudo o que tinha causado, não foi o que aconteceu. Sentiu vontade de chorar, e ser consolada, de ter um adulto para dizer que tudo ficaria bem, que dariam um jeito naquela situação.

— Eu tive uma irmã. Ariana foi atacada por trouxas que viram do que ela era capaz de fazer. Depois disso, ela se retraiu, forçou-se a parar de fazer magia — ele contou com o olhar distante.

As meninas tinham dito que talvez a irmã dele fosse uma obscurial.

Era evidente que havia mais naquela história, mas ele não contou a ela. Talvez ela tivesse morrido consumida pelo obscurus, era o que acontecia com obscuriais.

— Lidei com outro obscurial depois, mas nunca pensei que por minha causa pudesse... Eu não imaginei que... — o mais velho atrapalhou-se nas palavras.

— Horcruxes.

Estava cansada daquela conversa.

Não sabia o que sentir e odiava sentir-se dessa forma.

— O que disse? — Dumbledore ficou perdido na mudança de assunto.

— Voldemort criou horcruxes para que não morresse.

E então contou tudo o que sabia sobre esse assunto, o que não era muito.

— Eu já desconfiava há algum tempo, mas a sua confirmação me ajudou muito. Obrigado — ele disse.

— Professor, o que vai acontecer comigo? — fez a tão temida pergunta — Eu não posso ir a Hogwarts, e se o Ministério...

Ele ergueu a palma da mão para que ela se calasse, e por um segundo ela pensou que seria agredida. Costume.

— Mandarei uma coruja a um velho amigo. Tenho certeza de que ele poderá ajudá-la a controlar, ou quem sabe tirar o obscurus de você.

Dumbledore levantou-se da cadeira em que estava sentado.

Antes que pudesse sair da sala, Dianella perguntou:

— Perdão, senhor, mas que amigo?

— Oh, não creio que o conheça — ele respondeu com leveza — Um magizoologista chamado Newt Scamander.