Identidade Homicida

Madeixas, pernas, dedos


[Lysandre]

Levei as mãos à fechadura do armário, admirando com êxtase seu interior ao abri-lo.

— Mas não faz mal, querida Clara. Todos nós merecemos uma segunda chance.

Delicadamente inseri o braço dentro do armazém, onde toquei uma de suas mãos. Trouxe seu corpo leve para fora, acolhendo-o rente ao meu.

Sua silhueta plastinada pairava sobre meus braços, gélida e inexpressiva. Ainda nu como viera ao universo, todavia nas proporções de uma jovem adulta, admirava-a. Todos aqueles fragmentos de matéria, cada um retirado de uma rapariga qualquer, desde a vendedora de geleias às estudantes da instituição - todos pertenciam somente ao novo recipiente da alma de Clara. Um trabalho de dois anos e meio.

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Gentilmente anexei uma palma à sua cintura, ajeitando seus dedos sobre meu ombro. Sustentei seu tronco há alguns milímetros do chão, o que permitiu-me manejá-la com facilidade. E guiei-a para que dançássemos, rodopiássemos em sincronia dentre a moldura da janela, sobrepondo a luz da noite.

— Meu irmão lhe fará um belo vestido quando estiver pronta… - finalmente sorri.

Meus dedos pressionaram suas maçãs pálidas com singeleza - ergui sua face diante a minha, fitando as órbitas negras e vazias, ainda ausentes de um par de olhos, e em seguida, derramando meus lábios em sua testa.

Dizem-nos que os olhos são a janela d’alma, e por este motivo, que precisava obtê-los o mais rápido possível.

[-x-]

Iniciado o festival sob o sereno da noite, barracas e pessoas tumultuavam as áreas ao redor do interior do colégio.

Em meio ao complexo amontoado e vai e vem de pessoas, camuflou-se Jade, quem tinha Peggy em sua companhia. A dupla caminhava lado a lado.

— O que veio fazer aqui? - a rapariga sussurrava-lhe num tom de repreensão. - Sabe o problema que vai dar se alguém te reconhecer?

— Você se preocupa demais. - sorriu enquanto remexia levemente a cabeça. - Me sinto praticamente irreconhecível.

De fato, os longos fios verdes e a japona marrom trazia-lhe um aspecto... Exótico.

— Quando se trata de Shermansky, todo cuidado é pouco. A velha tem mantido sua identidade sob todo um sigilo; com certeza perderia a cabeça caso descobrisse que saiu do esconderijo.

— É sua tia. O que faria? Te deixaria de castigo? - gracejou.

— É melhor não testar a paciência dela.

— Relaxe… - revirou os olhos. - Depois de tantos meses dentro da clínica, acho que mereço um momento de lazer, não?

O rapaz soltou uma piscadela para Peggy, que de súbito corou.

— “Lazer”... - murmurou ela, debochadamente.

***

Três balas de chumbo afundaram seguidamente sobre o centro da mira. O senhor que coordenava a barraquinha de tiro ao alvo surpreendeu-se, fitando boquiaberto Kentin - quem segurava a pistola de brinquedo com grande rigor.

— Q-que prêmio deseja? - balbuciou o homem.

Kentin rodou os olhos pela prateleira de brindes em busca de algo que o agradasse. Logo sorriu, a apontar:

— Aquele ursinho.

Quando entregue em suas mãos a pelúcia bege, o rapaz fitou-lhe com carinho. Tinha uma textura macia e agradável, e uma capa e máscara carmesim - artefatos que provocavam nostalgia.

O rapaz espalhou-se pela movimentação do evento; a mão direita anexada ao braço felpudo do brinquedo. A noite fria e a ausência de seus companheiros fê-lo refletir por alguns instantes.

“Aquele pirralho do leito sete, sabe? O menino respondão e rabugento…” , Kentin relembrou, com um riso, da vez em que escutara uma das enfermeiras a cochichar palavras semelhantes sobre si. Na época o rapazinho fechou a cara, fez greve de fome por três dias e desmaiou no banheiro do hospital. Hoje, ele só poderia concordar com tudo aquilo. Era uma peste.

Elsie e Agatha Cotton foram as únicas esperanças para um fedelho como ele.

Lembrava-se, lucidamente, da primeira vez em que a mulher-fada e a pequena heroína cruzaram o aro da porta de seu leito. Achou tudo uma bobagem; coisa de criancinha. Mas também, recordava-se, contraditoriamente com grande pesar, sobre quando recebera alta do hospital. A garoa noturna presente pelos arredores do colégio fazia-o vivenciar aquela noite mais uma vez - o momento que pisara os pés para fora da clínica, por um momento, desejando adoecer mais um pouco.

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Arrastado para a escola militar, resgatou força de suas lembranças; imaginando que poderia um dia reencontrar a dupla Cotton e retribuir parte de seu débito. No entanto amadurecido, distraiu-se de seus pensamentos utópicos.

Kentin reconhecia quão intensos eram seus sentimentos a respeito das poucas pessoas na qual se afeiçoava; mesmo que não manifestasse muita coisa. E admitia, também, o erro que cometera ao precipitar-se com decisões ligadas a tais companhias. Quem diria que um plano aparentemente infalível seria capaz de arruinar todas suas expectativas.

Kentin caminhava com a face voltada para o chão; até que pôde ouvir a voz de Elsie, longinquamente. Levantou o semblante para vê-la próxima à porta dupla do ginásio junto de Armin:

— Eeei!

O rapaz deu um sorriso singelo, caminhou até a dupla, cumprimentando-a.

O trio formado adentrou em conjunto e acomodou o peso sobre as cadeiras de plástico; mais espectadores assomavam-se ao ginásio, que diminuiu dentro de poucos minutos.

Os amigos segredaram entre si sobre a ventura que tiveram ao obterem um ponto aproximado do palco, tendo o diálogo interrompido pelo ruído de interferência do microfone apalpado. Migraram a atenção para o palanque; onde Shermansky, aclarada pelo único foco de luz presente no interior do repartimento vasto, mostrava-se numa de suas raras aparições físicas.

Peggy anexara seus braços ao redor de Jade, aconchegando a cabeça em seu ombro - o rapaz não sofreu estímulos, mantendo os olhos pálidos erguidos. Jay mirava o espetáculo com tédio; eventualmente oscilando sua perspectiva para Nathaniel. Burniel Tissou, de pé, apoiado sobre um dos canteiros, atolava os dentes em sua barra retangular de chocolate, de forma a amenizar sua ansiedade rotineira. E a tríade de companheiros, conjuntamente perturbada com a imagem pacífica de Shermansky e suas cortesias fictícias.

— Boa noite! - sorriu a matriarca, em otimismo. - Inicialmente, agradeço à presença de todos nesta fatídica noite. Afinal, este instituto completa hoje seus trinta anos. Não passava de um mero terreno para a pré-escola na qual eu e meu marido criamos. Eliot estaria muito satisfeito com todo o caminho que trilhamos, caso estive aqui...

Encerrada sua introdução dramática, Shermansky recebera uma penca de palmas de seus ouvintes - incluindo todos os killers presentes naquele cômodo, que assistiam o cinismo ardente de Shermansky sem grande assombro.

— E agora, como parte da comemoração, peço para que apreciem um pouco da música de nossos célebres estudantes! - anunciou erguendo uma das mãos para o alto. As raparigas da plateia rumaram à loucura; grande parte dos visitantes aguardou somente para aquilo que viria.

Ao retirar-se do palco, as luzes foram completamente apagadas. Ouviu-se três vezes o som das baquetas impactando entre si, iniciando o solo da guitarra para que as cortinas fossem erguidas junto a euforia das colegiais. Mais alguns segundos no instrumental, canhões de luzes foram projetados no baterista; e em Castiel, o guitarrista.

Para finalizar o trio, a voz melódica de Lysandre introduziu-se à cena:

Hoje, mais uma vez, uma bela mulher veio me visitar

“Você tem um belo sorriso, será minha nova esposa”

Um contrato proibido, o diabo deu-me este poder.

Os trajes peculiares e visualmente antigos cobriam o corpo do rapaz, que balançava junto ao timbre de sua cantoria.

Com o poder de atrair todas as mulheres.

O homem que morava sozinho em sua mansão,

trazia todas as mulheres que o agradavam.

Nathaniel observava pensativamente o poeta, e, inconscientemente, franzira uma das sobrancelhas em desconforto. Aquelas letras recheadas de perversão enojava-o.

Logo na terceira fileira de espectadores, Elsie contemplava a harmonia dos instrumentos de perto. O palco escuro e sem cenários contrastava com a beleza pálida de Lysandre; que sob um manto de iluminação provinda de um dos holofotes, assemelhava-se à uma espécie de entidade divina.

Num gesto súbito, o excêntrico par de olhos heterocromáticos penetrou às íris de Elsie, fazendo-a constranger-se por alguns segundos. Então, o albino erguera gentilmente uma das mãos sobre a plateia, em direção à rapariga, no intuito de pescá-la. Elsie não compreendera o ato a princípio, e desviou o olhar até que notasse a curvatura nos lábios do poeta, acolhendo-lhe. Ela estendeu o braço para apanhá-lo; quer que fosse o propósito. Cavalheiresco, Lysandre auxiliou-a a migrar para o palco, permanecendo de mãos dadas com a garota - para desprezo de suas adoradoras.

Armin, muito intrigado, analisou cada gesto suspeito vindo de Lysandre, atento às feições inocentes de Elsie.

— Tá com ciúmes, é? - brincou Kentin, ao deparar-se com o cenho sólido do colega.

— Tem alguma coisa errada. - Armin, todavia, não parecia disposto para piadas.

Lysandre permanecia a cantar; desta vez com sua convidada de honra.

Hoje, mais uma vez, uma bela mulher veio me visitar

Venha, dance comigo, seja mais uma do meu harém.

De repente, no exato momento em que fora pronunciada a última palavra, a música e luz cessaram. Os ouvintes na plateia passaram a murmurar entre si, pouco assustados, criando ruídos contínuos que tornavam Armin ainda mais apreensivo:

— Elsie não sabia que isso aconteceria, com certeza. - comentou sem demover a atenção do breu a sua frente.

Kentin fitou-lhe pensativo.

Passou-se um tempo considerável. A dupla de colegas tornava-se acercada pela angústia e o público tomado por uma curiosidade saudável.

Uma iluminação dourada passou a emergir gradativamente, banhando o palco e ofuscando os olhos mais vulneráveis à luz. A visão que os aguardava era uma Elsie enrolada a uma espécie de tecido de tela brilhante - semelhante à seda - , adormecida, suspensa por alguma corda fixa às coxias do teto. Os músicos dissolveram-se, restando apenas seus instrumentos.

Imaginando tratar-se como parte da apresentação, a plateia tratou com naturalidade - iniciaram-se os sussurros; exceto de Armin, que transpirava mal estar.

— O que vamos fazer?... - Kentin interrogou o colega, bufando, como se já previsse a dificuldade que enfrentariam; uma prova de que entendera o entortar de nariz de Armin desde a entrada do espetáculo.

— Você quer dizer: “O que eu vou fazer”, não?

Assim que a silhueta esguia de Lysandre finalmente deu as caras sobre o palanque, Armin não pensou duas vezes em pôr-se abruptamente a empurrar a multidão assentada à sua frente, ignorando reclamações e o sermão sufocado de Kentin:

— Volta aqui, seu idiota!

Armin rapidamente escalou o palanque. Fitou Elsie velada, amordaçada ao centro do palco; rangiu os dentes.

Quando prestes a ir em sua direção, o vulto esbelto ligeiramente bloqueou sua passagem, de braços curiosamente postos para trás. Armin encarou-o mortalmente, e antes que pudesse atacá-lo, uma melodia eufórica tomara conta do ginásio. Lysandre devolveu o olhar com cinismo, iniciando:

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— Duvido que passará! Tua amada ao relento, adormecida, jamais há de mover as pálpebras por ti! - disse alto, para que o acústico propagasse pela plateia. - Mas sejamos justos, cavalheiro. - detrás das costas retirara duas espadas de esgrima, estendendo uma das armas para Armin, num sorriso desafiador. - Se ainda queres tê-la para si, prove que há honra para tal!

— Sai da frente. - murmurou o outro.

— Tem certeza que pretende se arriscar dessa forma por este futuro cadáver?

— O que você fez com ela?!

— Hm… Um “não-killer” não levaria isso tão a sério. Creio que minhas fontes não estavam enganadas sobre você. - sussurrara, preocupando-se para que sua comprovação não invadisse os ouvidos dos espectadores.

— Fala!

— Sinto dizer, Romeu, sua Julieta já ingeriu o licor da morte! - outra vez ascendera seu tinir. - Está completamente enfeitiçada!

Armin petrificou-se com tais analogias, suando frio. Elsie fora envenenada?

— No entanto nem tudo está perdido! Exatamente quinze minutos é o máximo de tempo que tem para encostar a ponta desta esgrima em qualquer pedaço do meu fraque. Vença o combate e terá o antídoto em suas mãos!

— E se eu quiser resgatá-la à força? - retrucou sarcástico, apertando o punho, pronto para agarrar o pescoço do oponente.

— Do que adiantaria consegui-la de volta se nem viva a teria? - retornou ao tom de seu adversário.

O moreno, perplexo, alternava a visão entre o semblante de Lysandre e a lâmina falsa em suas mãos. "Maldito", sussurrou, bruscamente sacando o objeto que lhe era oferecido, franzindo o rosto com decisão.

***

Para Kentin o tempo era curto: Assim que Armin tomara sua decisão de invadir o espetáculo, o rapaz, eufórico, estudou todo o ambiente para encontrar um meio de seguí-lo sem se manisfestar com sua igual falta de singeleza.

Relembrou do vestiário; que em eventos como aquele, era conectado com o palco para servir de camarim.

Naquele instante, já no corredor dos lavabos, introduziu-se no troca roupas masculino. A sinfonia abafada de fora estremecia às paredes de leve. Procurava por algo que o desse assistência - um objeto que fosse apenas servir para criar um pequeno rebuliço, uma distração, sem hematomas.

Encontrou uma caixa grande de papelão posta ao lado dos armários de ferro, preenchida de roupas teatrais. Vasculhando às pressas, ao ritmo dos violoncelos, largou tudo pelo chão, encontrando, inesperadamente, um pequeno bloco de notas ao fundo.

— “Plastinação”? - sussurrou o título para si, erguendo o utensílio na altura de seus olhos.

O rapaz folheou o talão, surpreendendo-se com rabiscos e anotações feitos a traço pesado.

“Plastinação é o procedimento técnico da preservação de corpos”. - prosseguiu com uma leitura baixa. - “consiste em extrair os líquidos corporais com métodos que utilizam acetona fria ou morna..”.

Aquilo com certeza não derivava de algum projeto das atividades escolares.

— Cara, o que tá acontecendo?

Kentin ouriçou ao ouvir uma segunda voz adentrando o vestiário, apressando-se em meter as informações no bolso, mergulhar para dentro de um dos compartimentos de banho e encostar a porta.

— Vocês não podem de repente decidirem parar de tocar. - a queixa do indivíduo tornou-se mais nítida ao que aproximava-se donde escondia-se o moreno.

— Nós te avisamos antes de começar.

Kentin arregalou os olhos ao reconhecer o timbre de Castiel, junto ao cheiro insuportável de seu cigarro; julgando que a outra voz pertencia ao baterista do grupo.

— Como assim, velho?! A gente tem que combinar tudo antes, não na hora do show. Isso tá errado!

Os olhos acinzentados reviraram-se como que exaustos do estresse do músico. Castiel tragou o tabaco, respondendo-lhe com uma monotonia que elevaria o estresse de qualquer um:

— Não fale. Seu silêncio é um poema.

— Não me mande calar a boca, seu bosta! Eu vi o que vocês fizeram com aquela garota! E por quê?! Qual a intenção desse teatro que não me emitem nada?!

O coração de Kentin por pouco não estourou no peito após um estrondo forte vindo doutro lado. O som do metal pesado rolou pelo piso, e uma camada consistente de líquido escarlate adentrou a fresta debaixo da porta, fazendo com que o espiador tapasse os lábios para reprimir sua ânsia.

— Detesto gente que fala demais. - Castiel suspirou fundo, lançando a bituca para o chão, amassando-lhe com o calcanhar. E retirou-se do aposento.

Kentin perdurou estático, questionando sobre o que acabara de testemunhar.

Mesmo que uma aura estranha acercasse Lysandre desde o princípio do espetáculo e suas letras soprassem grandes pistas, o rapaz contentou-se em imaginar que tudo fora produto de sua mente conturbada. Contemplar a Cotton estirada ao conjunto de panos, todavia, fê-lo ter certeza de que o músico possuía alguma intenção débil ao trazê-la para consigo. Para concluir seu raciocínio, após o desgoverno do ruivo, Kentin só poderia presumir que os insanos responsáveis de eliminar as três raparigas, eram ninguém menos que Castiel e Lysandre - visto o raciocínio elaborado por Armin, no telhado.

Aguardou um tempo para que sentisse segurança o suficiente e deixasse seu esconderijo. E quando o fez, ainda oscilante, presenciou o baterista estendido, maculado do sangue que saia desde seu crânio - ao lado, a arma letal: um extintor de incêndio.

Sem mais demandas, Kentin sacou o objeto.

***

Ao centro da plataforma, a certa distância, os combatentes se entreolhavam, os cotovelos flexionados rente ao corpo e os dedos firmemente entornados à empunhadura. A melodia aumentava sua velocidade.

— Por que estamos fazendo isso? - Armin questionou baixo. - Por que meteu a Cotton nisso?!

— Eu só gostaria que disputássemos de forma justa a busca por nossos bens maiores.

E Lysandre sorrira, dobrando o corpo para frente, indo em encontro de Armin com a ponta da esgrima mirada em seu peito. O moreno engenhosamente esgueirou para o lado, ejetando sua lâmina rumo ao ombro de Lysandre; que, num nanosegundo, agachou-se, girou o tronco, e mirou-lhe o estômago. Armin, todavia, mais uma vez flexionara-se para desviar, estagnando-se afogado em adrenalina e suor há alguns poucos metros do oponente.

— E.. qual é o seu bem maior? - arfou, o de íris azuladas. Para ele, de nada servira a resposta enigmática de seu oponente.

O poeta desenvergou-se e estalou o pescoço. A audiência parecia entreter-se cada vez mais com o show, passando a estalar as palmas ritmicamente junto a melodia em seu ápice - o que acabara por produzir uma espécie de Flamenco rondeado de castanholas.

Armin tomara a iniciativa desta vez: Mesmo com temor, bradou, disparando a encontro do albino com ambas as garras firmadas à espada. Lysandre velozmente largou a pose e apressou-se em bloqueá-lo, golpeando o ar com sua esgrima de modo a enganchá-la com a do outro. Iniciou-se um atrito sobre par de armas; ambas as faces mais próximas do que nunca.

— Clara Harlow. - iniciou Lysandre, em tom baixo. Armin tomou uma atenção especial para a raríssima faceta amarga do albino. - Estuprada e picotada, armazenada no fundo do quintal de sua casa na cidade.

Armin não sabia se prestava alguma atenção.

— Os cabelos esbranquiçados, suas pernas, seus dedos longos. E uma pele perolada que traria inveja a qualquer porcelana cara. - Lysandre sorria ao recordar-se. - Clara fez uma promessa de me visitar na próxima vez que fosse à sua tia no campo. Mas ela não pôde cumprir, obviamente.

Quando todas as informações acessaram o pensamento do moreno, o mesmo petrificou.

Madeixas, pernas, dedos.

Na plateia, os indivíduos julgavam que tudo não passava de uma performance inteligente e inesperada. No entanto era evidente que ambos os atores executavam uma conversa silenciosa.

Armin vertiginosamente recuou para trás, livrou-se da ficção das armas:

— Então foi você quem fez aquilo com Charlotte e Eduarda! - metralhou o albino com o olhar, exibindo os caninos feito um felino raivoso.

Tendo em sua frente um killer em total desarmonia mental a descrever uma perda frustrante cujo biótipo, curiosamente, enquadrava-se nos segmentos coletados das estudantes, Armin não poderia ter outro pensamento a não ser o de que uma anomalia nível Frankenstein era remendado com o corpo das garotas mortas.

Lysandre sorriu confiante com a descoberta do rival. Ele impulsionou o corpo para frente, golpeando o pulso de Armin com a ponta falsa da lâmina, de modo que o fizesse perder a rigidez na mão e deixasse o sabre rolar para o chão.

— TUCHÊ! - finalizou Lysandre, soerguendo o braço que sustentava o punhal. Todos puderam ouvi-lo.

Armin encarava-o alterado, a respiração ofegante. Os aplausos altos sobrepunham a voz do outro combatente:

— Basta retirarem-lhe seu bem mais precioso que sua verdadeira natureza será posta à mostra. E você sabe muito bem sobre o que estou a dizer, não é? - altivou as sobrancelhas. - Mortes desnecessárias nunca me agradaram, de fato. No entanto, senhor Armin, você tem algo que me pertence.



Então que tal um acordo? - disse Castiel.

Lysandre voltou-se para o ruivo, quem prosseguiu:

Após usá-la como distração, do que acha de entregá-la para mim? - mordeu os lábios em malícia. - Odeio admitir isso mas.. é uma garota interessante..

Sem problemas. - riu contente. - Sabe que não vejo interesse no prêmio de Shermansky. Aliás... sendo Armin meu último retalho, creio não fará mal nos divertimos um pouco numa apresentação para nossos visitantes. - sorrira feito uma criança de luz.