Os dias que se seguiram tiveram uma rotina semelhante. Compras para o apartamento; a reforma para que tudo ficasse do agrado de Regina; e as noites de longas conversas entre as duas mulheres, claro, após um tempo para brincadeiras com as crianças. Henry sentia-se eufórico por compartilhar da presença das duas mães em harmonia, em um tempo em que elas não disputavam por qualquer motivo ou tentavam se matar, embora, agora ele percebesse, elas nunca, realmente, tiveram essa intenção.

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Regina também sentia-se cada vez mais confortável com essa nova rotina, especialmente por ver o bem que tudo aquilo fazia para Júlia, que chorava cada vez menos por saudades da mãe falecida, além de diminuir a frequência com que falava dela com tristeza, apenas citando-a com naturalidade em algumas situações. Regina não tinha a intenção de permitir que a filha se esquecesse da própria mãe, mas, no momento, uma distração para a menina era bem vinda. Os sorrisos fáceis que escapuliam da pequena e de si própria na companhia dos outros dois traziam cor para os dias nublados de Boston.

Emma, por sua vez, sentia-se como se finalmente tivesse encontrado a razão de tudo. Enquanto em Storybrooke seus dias eram maçantes e sem vida, onde ela não conseguia ver qual a finalidade das coisas, ali era como se tudo fosse mais interessante, mais atraente e com um ritmo próprio. A dinâmica que os quatro criaram era harmônica e divertida, não havia uma vírgula sobre a qual a salvadora pudesse reclamar.

Como uma nuvem escura em dia ensolarado, o telefonema de David os levou de volta para a realidade quando Swan se viu obrigada a voltar. “O dever me chama”, ela disse quando a sobrancelha de Regina se ergueu para seu olhar desapontado ao desligar a chamada. E, assim, a loira partiu na companhia de Henry, deixando com Regina e Júlia as boas lembranças de dias e noites barulhentas e divertidas.

Henry, como ficou estabelecido com Regina em uma conversa tranquila, viajava para Boston na sexta a tarde, quando Emma o deixava em um posto não muito longe de Storybrooke, onde ele apanhava um táxi, enviado por Regina, até o apartamento. Ele voltava no domingo à noite com muitas novidades sobre a grande cidade e como se divertiu com a mãe morena e a irmãzinha, a quem adquiriu imenso apresso.

Durante os próximos dois meses, Emma e Regina mantiveram conversas por telefone e via internet. A loira mantinha a rainha atualizada sobre a pequena cidade mágica, além de suas aventuras na cozinha, uma vez que a sheriff deixou-se convencer de que era hora de aprender a cozinhar um pouco. Quanto à Regina, falava sobre os acontecimentos engraçados do trabalho, o desenvolvimento de Júlia e sua mais nova atração pelo “por quê?”, agora que passou a frequentar a creche para que Regina pudesse trabalhar, além das novidades do cinema. Com o tempo, suas conversas tornaram-se ainda mais frequentes, quase diárias, e os assuntos entraram em campos mais pessoais, o que apenas contribuía com a paixão de Emma pela morena. E a rainha, não ousava negar, sentia-se cada vez mais encantada pela nova amiga.

Durante esse tempo, Regina trabalhou duro para reajustar sua vida. Júlia consumia praticamente todo o seu tempo. A adaptação na creche não foi fácil, ao contrário do que Regina imaginava, uma vez que a filha sempre foi sociável. Em uma conversa informal com a psicopedagoga, Regina ouviu que a pequena podia estar temendo ser deixada de lado agora que uma de suas mães havia “partido”, como costumava explicar para todos que conhecia. Era um fato compreensível, considerando que, com a morte de Luna, Regina, necessariamente, a matriculou na creche e isso pode ser interpretado como um afastamento proposital em seu cérebro de dois anos, mas isso não fez com que Regina deixasse de se sentir uma mãe horrível, mesmo que fosse, simplesmente, uma ideia absurda.

A rainha esforçou-se para seguir em frente, embora, apenas a ideia de seguir com a sua vida, tenha doído. Não havia como fazê-la achar justo que sua vida deveria continuar, que o mundo ainda girava, quando alguém tão importante já não existia mais. Apesar disso, ela sabia que era preciso, sabia que os ponteiros de Boston não poderiam ser congelados como os de Storybrooke. Aos poucos sentiu que seu terreno interior estava se recuperando de um longo período de seca e que as flores poderiam apontar quando menos esperasse. As lágrimas já não eram mais o dilúvio que levava embora toda a semente que tentava plantar, agora elas já eram capazes de regar. O equilíbrio entre o luto e a vida haviam, finalmente, chegado para ela.

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Na última sexta-feira desse período, Regina abriu a porta do apartamento, com Júlia agarrada em uma de suas pernas, e chamou por Henry quando ele não veio correndo até ela como sempre fazia. As luzes estavam todas apagadas e o silêncio prevalecia. Como uma mãe preocupada, que nunca escondeu ser, Regina fechou a porta atrás de si, pegou Júlia no colo e caminhou lentamente analisando cada canto dos cômodos por onde passava. Quando passou pela porta que a levaria para a cozinha, a luz se acendeu de repente e a morena teve a visão de Emma e Henry atrás da bancada onde um bolo, coberto por cascas de chocolates e cerejas, descansava.

— Surpresa!!!

Os dois gritaram arrancando um sorriso largo de Regina, que diminuía o tamanho dos seus olhos. A morena desceu Júlia do colo e abriu os braços para receber o filho. Após um aperto de mãos desajeitado em Emma, a rainha analisou o bolo e tirou uma fatia de chocolate, partindo-a ao meio e dando uma metade para Júlia enquanto saboreava a outra.

— Não quero decepcionar ninguém, mas não acho que seja meu aniversário.

— Não precisa ser o seu aniversário para que receba surpresas. – Henry enlaçou a cintura da mãe e descansou a cabeça em seu ombro. – A senhora gostou?

— Eu amei, querido. Muito obrigada. – Regina afastou-se apenas o suficiente para que pudesse beijar a bochecha do garoto. – Obrigada a você também, Swan.

Emma sorriu tímida em resposta para os lábios esticados de Regina e só então teve consciência de como sentiu falta da mulher.

— Tivemos uma pequena discussão sobre o sabor, mas espero que você goste. – Swan pegou a faca que estava colocada ao lado do bolo e o partiu. – Henry, você pode pegar os pratos, por favor?! – Ao ato do garoto, Emma colocou o grande primeiro pedaço sobre a louça branca do prato e entregou para Regina. – Nós nos certificamos de comprar pronto.

— Eu aprecio a informação. – Regina sorriu para as lembranças dos relatórios que Emma fizera questão de compartilhar sobre suas habilidades na cozinha desde que passou a se dedicar um pouco mais. – Não tenho certeza se você já consegue fazer algo parecido.

O bolo não durou muito e logo Henry e Emma já estavam debruçados sobre a bandeja, lambendo o que sobrara. Quando Júlia coçou os olhos, Regina a levou para um banho antes de colocá-la na baixa cama infantil. A morena deitou-se ao lado da filha com vários de seus livrinhos em mãos para que a menina pudesse escolher um. Quando a pequena finalmente escolheu, Regina ajustou a cabeça da filha em seu colo e iniciou a leitura.

— Era uma vez um jovem príncipe que vivia em seu lindo castelo. Apesar de toda riqueza que possuía, ele era egoísta e não tinha amigos. Em uma noite chuvosa ele recebeu a visita de uma velinha...

Regina se divertia até mais do que Júlia quando lia as versões dos contos de fadas desse mundo. Rumple não era jovem e nem tinha um lindo castelo, ao contrário, era sombrio, mal localizado e só era limpo devido à Belle. E a velinha que o visitou era, na verdade, a própria escuridão. Mas o pior de todo aquele conto, é que ele oferecia um final feliz para a Fera, algo que não aconteceu. A maldição de Rumple nunca foi quebrada. Apesar das diferenças, havia apenas um conto que Regina se recusava a ler e que, inclusive, queimou o livro. “A Branca de Neve e os sete anões” era proibido dentro das paredes de uma residência Mills.

Antes mesmo da história terminar, Regina sentiu o corpo de Júlia ficar mais pesado e pode ouvir sua respiração regular. Com cuidado, esquivou-se e depositou um beijo na testa da filha antes de cobri-la adequadamente e deixar o quarto. Quando chegou na sala, o sofá-cama, que seria, novamente, a cama de Emma, já estava pronto e Henry estava sentado em cima dele com alguns pacotes de salgadinhos no colo. Regina estava pronta para recriminá-lo quando o garoto a olhou e sorriu carinhoso, batendo no estofado ao seu lado convidando-a para se sentar. Emma surgiu por trás da porta da geladeira com um sorriso semelhante e, quando a fechou, Regina identificou uma quantidade exagerada de refrigerante nos copos.

— Noite de filmes! – A loira anunciou caminhando até Regina e lhe entregando um dos copos. – Nós estamos escolhendo um de terror, já que é seu gênero favorito.

O final de semana passou para os quatro como se as horas corresse mais veloz do que em quaisquer outros dias das últimas semanas. Antes que pudessem fazer tudo que Henry programou, a tarde de domingo já chegava ao fim dando início a uma noite, impressionantemente, quente. Após um dia de diversão às margens da lagoa de Boston Common Park, Júlia não conseguira manter os olhos abertos por mais do que alguns minutos quando chegaram em casa. Enquanto Henry tomava banho e organizava suas malas para voltar à Storybrooke, Regina serviu-se de uma taça de vinho e estendeu outra para Swan.

— Eu pretendo dirigir daqui a pouco com o seu filho no banco do carona, você se lembra disso, certo? – Emma sorriu para o rolar de olhos da morena e tomou a taça em mãos, elevando-a para um brinde. – À vida.

— Às amizades improváveis. – Regina bateu a sua taça contra a de Swan. Ambas recordaram-se de uma das primeiras noites de Regina em Storybrooke, depois dos cinco anos afastada, quando Emma lhe levou sidra e elas brindaram àquelas mesmas palavras.

Regina ofereceu um breve sorriso antes de sentar-se no sofá sobre as próprias pernas cruzadas. Impressionava-as como aquela estranha relação de amizade instaurou-se e se desenvolveu naqueles meses e como, a cada dia, ficava mais forte. Emma já não conseguia passar mais que algumas horas sem falar com Regina ou sobre ela, e a morena percebeu que há muito ela recorria à salvadora quando precisava de alguém para desabafar ou até mesmo jogar conversa fora. Elas não estavam mais na vida da outra devido ao Henry ou a qualquer relação que a estranha árvore genealógica da Floresta Encantada pudesse sugerir, elas estavam presentes uma para a outra por vontade própria.

— Você não quer se sentar, Swan?

— Por que continua me chamando assim? – Emma sentou-se ao lado de Regina imitando sua posição.

— Eu fui bem educada. – Regina provou o vinho e suspirou para o sabor adocicado. – Nunca entendi por que isso te incomoda tanto.

— Só acho que passamos dessa fase de formalidade...

— Você achava isso quando eu tentava te matar. – Regina a cortou com uma risada escapulindo por sua garganta.

— Bom... – Emma tomou um gole de sua bebida e relaxou o corpo no encosto do sofá. – Não tenho argumentos contra isso.

— Prefere que eu incluía o “senhorita” na frente como costumava fazer?

— Não. Não. – Swan bateu uma de suas mãos contra o joelho de Regina. – É uma maneira de me manter distante?

— Você é mais esperta do que eu pensava que um descendente Charming seria.

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A sugestão de Emma fez com Regina ainda fosse capaz de ouvir a voz de Cora recriminando-a pela amizade com os plebeus, quando ainda não era mais do que uma criança.

— Quando você permite que um deles te chamem pelo nome, você está dando-lhe permissão para acessar a sua vida, a sua intimidade, a sua pessoa. Mantenha os pronomes de tratamento e eles estabelecerão a distância necessária entre você e aqueles que não têm importância.

Naquela época Regina julgou ser apenas o ódio gratuito da mãe por qualquer um que não tivesse sangue real e não pudesse levá-la ao trono, mas quando era ela própria que ostentava a coroa de rainha e viu todos virando-se contra, finalmente entendeu do que Cora falava. Quando se permite que alguém chegue perto o bastante, essa pessoa tem potencial de machucá-lo mais do que qualquer inimigo. O pronome de tratamento havia sido abandonado, mas, muito claramente, esse era o máximo que Regina estava disposta a chegar naquele momento.

— Talvez algum dia o nome “Emma” deixe de queimar sua língua.

— Cisnes são animais graciosos, simbolizam coragem, nobreza. Eu acho apropriado, embora não seja por isso que me restrinjo ao seu sobrenome.

Emma sorriu para a divagação aleatória da morena e tomou o restante de seu vinho em único gole.

— Não fuja, majestade. – Emma colocou a taça sobre a mesa de centro e virou o tronco na direção de Regina. - O ponto aqui é que você usa a educação da Idade Média para me manter longe. Mas, eu te pergunto, por quê?

— Eu não sei.

— Talvez eu saiba.

Emma retirou a taça de Regina de suas mãos e depositou ao lado da outra, na mesa. Estendeu uma mão a frente do corpo de Regina, apoiando no assento do sofá, e aproximou-se, mantendo Regina presa entre seu corpo, seu braço, o encosto, o braço do sofá. Emma viu quando o corpo de Regina enrijeceu e os olhos castanhos prenderam-se aos seus. “Swan”. A voz da rainha não era mais que um sussurro quando Emma estava a menos de um palmo de distância. Suas respirações já se misturavam, o hálito quente de Regina batendo contra os lábios semiabertos da loira fazia a pele branca se arrepiar. Nenhum pensamento passou por Emma quando, em um impulso de coragem, uniu seus lábios aos de Regina. A textura da boca carnuda enfeitada com batom vermelho era algo além de qualquer sensação que Swan pudesse ter imaginado durante todo o tempo em que alimentou aquele amor. Emma esperou pela reação aversiva de Regina, mas não aconteceu. A morena permanecia imóvel, permitindo que a loira saboreasse mais a sensação de seus lábios. Quando o ar tornou-se escasso nos pulmões da salvadora, ela inspirou tanto quanto podia de uma única vez e levou a língua para fora de sua boca, passando-a pelos lábios vermelhos em um pedido gentil de passagem. Quando lhe foi concedida, Emma explorou a boca de Regina antes de encontrar a língua que tanto ansiou. Elas praticaram uma dança rítmica, se conhecendo, se apreciando, enquanto as mãos de Emma deslizaram para as costas da rainha. Swan sentiu as mãos de Regina descansarem em seus braços, mas sem uso de força para afastá-la, então, apertou mais o abraço e intensificou o beijo pelo próximo minuto. Quando se separaram, as irises castanhas estavam mais escuras do que Emma já havia presenciado e as esmeraldas que enfeitavam o rosto da loira brilhavam como a rainha não sabia que era possível.

Não havia se passado mais do que alguns milésimos de segundo quando Emma sentiu falta dos lábios, agora inchados de Regina, colados aos seus e um sorriso, inevitavelmente, cresceu em seu rosto. Emma notou seu próprio coração bombeado o sangue para cada centímetro do seu corpo mais rápido que se lembrava já ter sentido. No entanto, a expressão de Regina não era nada como a da loira. A morena demonstrava toda a confusão de sentimentos que o ato provocou. Quando Emma percebeu o quanto Regina mostrava-se perturbada, o sorriso morreu aos poucos e o arrependimento passou a tomar lugar de toda a felicidade.

— Regina, eu...

— Não se desculpe. – Regina apertou os braços de Emma que permaneciam envolvendo-a e os afastou. – Você não fez sozinha. Você conhece o ditado “quando um não quer, dois não brigam”? Acho que se aplica a isso também.

— Mas eu comecei...

— E eu continuei. – Regina desceu os olhos para suas mãos unidas no colo enquanto obrigava seu cérebro a trabalhar formando uma explicação que não partisse o coração de Emma. – Lembra o que eu te disse naquela conversa em que analisava a “bela paisagem” do cupcake? – Sinalizou as aspas com os dedos e voltou a uni-los no colo.

— Você disse que não era o momento.

— Ainda não é.

Emma levou, hesitante, uma mão até as de Regina e entrelaçou seus dedos enquanto atraía os olhos escuros para os seus.

— Um dia será?

Regina arrastou-se para mais próximo de Emma e a envolveu em um abraço. A loira descansou sua cabeça nos ombros da morena e cheirou seu perfume encontrando conforto e, até mesmo, um pouco de esperança.

— Será. Adivinha para quem eu vou contar primeiro.

Antes que Emma pudesse responder, Henry chegou à sala obrigando-as a se soltarem.