Harry Potter e o Orbe dos Universos

O sonho, A Toca e Colin Creevey


Aquele era um corredor comprido. Tão comprido que nem mesmo se ele se esforçasse conseguiria ver seu fim. As paredes eram cobertas por um veludo carmim desbotado, e haviam vários quadros nas paredes, todos contendo o nome de quem habitava dentro das molduras em uma placa dourada engastada em baixo do mesmo. Mas não importava o quanto ele gritasse ou tentasse chamar atenção dos homens e mulheres pintados, nenhum lhe dirigia o olhar, como se ele não estivesse ali. Portanto, fez o que lhe parecia mais sensato: continuou andando o que parecia uma eternidade. Parecia que horas se passaram junto com o eco de seus passos no carpete comido por traças, mas ele não poderia ter certeza, pois não tinha como medir o tempo naquele lugar. Mas finalmente chegou. Só não sabia dizer onde exatamente ele tinha chegado.

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No fim do corredor havia uma sala circular. Talvez chamar aquilo de sala seja demais, era pequeno demais para ser considerado um ambiente; parecia apenas que o corredor se alargou poucos metros para cada lado e se fechou abruptamente do outro lado. Havia janelas do teto ao chão, de cerca de três metros de altura cada uma, circundadas por cortinas cor de sangue desbotadas e cheias de poeira, que impediam que o sol da manhã entrasse propriamente no lugar. E no centro, uma mesa, também circular mantinha seguro um orbe negro repousado em uma almofada velha.

Ele não sabia bem o porquê, mas alguma coisa em seu íntimo o fez chegar mais perto da bola negra que pulsava, como se estivesse viva. E a cada passo que ele dava, era como se uma voz em sua mente o chamasse: Harry... Harry... Harry...

— Harry!

Tendo a certeza de que essa voz não era a mesma que o chamava no sonho, Harry Potter abriu os olhos. Com a vista embaçada pela falta dos óculos, olhou miopemente para os dois vultos que se encontravam na sua frente, um mais alto e com a parte superior muito vermelha e o outro mais baixo, castanho e volumoso.

— Viu só, eu disse que ele estava acordado. – Ron ria olhando para o amigo, o rosto abatido e com enormes olheiras, mas limpo e arrumado, assim como a garota ao seu lado.

— Ele não estava acordado, você o acordou. Francamente, Ronald, não tinha necessidade para isso! – O vulto mais baixo ralhou enquanto entrava em foco aos olhos de Harry. Mione também estava abatida. Talvez mais magra do que deveria, mas sem dúvida limpa e com os volumosos cabelos arrumados, ou pelo menos o mais arrumado que conseguiam ficar,

— Eu estou bem, já estava na hora de acordar mesmo.... Eu acho. – Sentando nas almofadas, descansado como não se sentia há meses, Harry olhou para os amigos. Nesse tempo que passaram escondidos, estressados e em perigo eles haviam mudado bastante.

Ronald Weasley sempre foi um garoto alto, e agora homem estava mais ainda. Os cabelos ruivos, antes curtos agora estavam compridos devido a falta de corte, caindo pelos olhos e bochechas sardentas. Ele havia feito a barba, então o maxilar estava limpo, embora a mancha persistente que ele tinha no longo nariz estivesse ali. Já Hermione Granger havia mudado muito desde a última vez que Harry tinha realmente reparado nela. Os cabelos estavam bem mais compridos do que se lembrava, mas ainda estavam armados e cacheados como sempre. O rosto também estava mais magro, mas Harry não sabia bem se isso era devido ao amadurecimento da amiga ou aos meses de refeições malfeitas que os três sofreram.

— É que ficamos preocupados – Hermione se sentou no pé da cama, depositando no colo de Harry uma enorme quantidade de comida em uma bandeja de madeira – Já passam das três da tarde...

— E além disso, minha mãe já apareceu na lareira umas quatro vezes desde que voltou para A Toca – Ron continuou capturando um bolinho de café e o levando a boca – Ela diz que é para irmos para lá assim que você acordasse... E bem, ela estava perdendo a paciência. Está muito sensível com... com o Fred... E...

— E ela quer todos perto. – Mione completou, já que Ron parecia muito interessado em olhar para seu bolinho com os olhos marejados. – Então viemos ver se você já tinha acordado.

— Porque não voltaram antes? – Harry teve que engolir um grande gole de suco para que a quantidade de ovos que pôs na boca pudesse descer facilmente, tamanha fome que se encontrava – Para a Toca, eu digo... Podiam deixar um recado num pergaminho, ou pedir para alguém me avisar.

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— Não tem mais ninguém aqui, Harry – A voz de Ron saiu meio abafada pelo segundo bolinho de café que ele atacava – Todos foram para as suas casas, ou procurar as pessoas que sumiram ou se esconderam... Só temos nós aqui no castelo. Até mesmo os elfos foram comemorar pelo mundo, depois que fizeram seu café não sobrou nenhum na cozinha.

Ainda mastigando, Harry parou para digerir as informações que os dois iam lhe contando. Os que estavam feridos, os que morreram, os que sobreviveram, que foram capturados, os que fugiram... Era tanta coisa que mesmo que tivessem duas semanas somente para analisar essas informações não seria o suficiente.

— (...) Draco escapou de Azkaban, pelo que soube... Mas acho o pai dele vai ter uma temporada lá pela frente. – Alguns julgamentos já estavam acontecendo, e o Profeta Diário estava cobrindo todos eles, entregando remessas do jornal até mesmo naquele dia logo após a batalha.

— Os Malfoy já foram julgados? – Harry perguntou limpando o prato do resto do que tinha do seu café – Isso não parece certo, imaginei que fossem ser julgados mais tarde... Se é que seriam julgados.

— Não, isso foi o Shacklebolt quem nos contou, antes de ir embora. – Mione estava de pé, segurando uma muda de roupas limpas dobradas nas mãos – Ele passou aqui para falar com você, mas assim que dissemos que você estava dormindo ele disse que poderia esperar, mas que gostaria de ter um encontro com você o mais rápido possível.

Harry aceitou as roupas da mão da amiga, levantando-se para ir tomar um banho e tirar da pele toda sujeira e sangue estava nele.

— Parece que vocês estão acordados faz bastante tempo...

— Oh! Nós... não dormimos. – Mione ficou extremamente vermelha e Ron parecia altamente interessado na superfície de seu terceiro (ou seria quarto?) bolinho de café. – Nós dois ficamos conversando, colocando algumas coisas no lugar. Mas vá logo! A senhora Weasley deve vir te buscar pessoalmente aqui se demorarmos mais um pouco.

Com uma sombra de um sorriso divertido no rosto, Harry finalmente entrou no banheiro do quarto que passou tantos anos como estudante e, pela última vez, tomou uma ducha quente entre aquelas paredes. Não fez a barba, pois parece que a matriarca dos Weasley apareceu mais uma vez na lareira ameaçando que se os três não aparecessem n’A Toca em cinco minutos contados, ela iria pessoalmente buscá-los.

***

Depois de devidamente alimentado, limpo e vestido, Harry acompanhou os dois amigos (ele não pode deixar de reparar que estavam de mãos dadas) até a lareira. A viagem até A Toca não foi diferente das outras viagens com pó de flu, portanto, terminou com um Harry cheio de fuligem caindo de joelhos na sala de estar dos Weasley.

— Ah, meninos, graças às barbas de Merlim vocês chegaram! – O senhor Weasley apareceu do outro lado da sala correndo para ver quem eram os recém-chegados – Molly já estava ficando desesperada... Ela está bem sensível depois que... Bem. Fred. Todos estamos.

— Arthur? Quem chego... Ah, Harry, querido! – Molly Weasley era uma mãe. Não havia melhor palavra para descrevê-la. Amorosa, cuidadosa, e extremamente protetora de suas crias, fossem elas de sangue ou não. – Eu já estava ficando preocupada. Rony me dizia que você estava dormindo, mas ainda assim... Ah, meu Harry, temos tanto o que agradecer, todos nós...

— Não, senhora Weasley, não tem nada o qu...

— Deixe de bobagem, Harry. Simplesmente aceite os agradecimentos. – A senhora Weasley falava despreocupadamente tirando um resto de pó de flu que havia ficado nos ombros do garoto. – Salvou a todos nós... Sei que até meu Fred... Bem, só temos que te agradecer, querido. Estávamos esperando você para almoçar, fiz suas comidas favoritas, e as de Ron também, as de Mione, dos meus ge-êmeos...

Harry nunca soube bem como agir nessas situações. Sendo órfão de pai e mãe, o único amor maternal que ele chegou a conhecer foi com essa mulher nos poucos meses que ele passou n’A Toca durante as férias escolares. Se já estava desconfortável com os agradecimentos, quando as lágrimas da Senhora Weasley vieram, ele se viu em pânico. Sem saber o que falar, simplesmente abraçou a chorosa mulher, que retribuiu com toda força que tinha em seus braços roliços. A impressão que dava era que ela já havia perdido um filho para sempre, portanto não perderia mais ninguém da sua vista, garantindo que todos estejam sempre bem.

— Hm... Senhorra Weasley? As coisas lá forra já estan prontas.

— Claro, querida, já estou indo. – Com um último abraço nos três garotos, a senhora foi para o lado de fora da casa, ajudar com seja lá o que fosse.

— Arry? Você finalmente chegou, estávamos prreucupades. – Fleur continuava linda, como sempre, por mais que estivesse com alguns hematomas pela pele branca e o cabelo platinado parecesse menos cuidado que o normal – Emborra Gui dissesse que non havia com o que nos prreocupar. – Ela se aproximou rapidamente e lhe depositou um beijo em cada uma de suas bochechas, deixando essa área levemente mais quente – Eu gostarria de agrradecer, Arry, por tudo. Você é um garroto muy corrajoso, e non tem nada que possamos fazerr que seja suficiente parra agrradecer. Tem nossa eterna gratidon. Agorra, vamos! O almoço já deve estarr pronte!

— Ela tem razão. – O senhor Weasley quebrou o silêncio. – Devemos tudo a você Harry. E não tente dizer que não. – Ele cortou vendo que o menino ia retrucar – Todos temos uma dívida impagável com você. Nem consigo imaginar o terror que seria nosso mundo se você não houvesse sobrevivido ontem, na floresta. Ou quando era um menino. Você é um grande bruxo, e nos liderou de volta à paz. É claro que as perdas existem, e que esse vazio nunca será preenchido. Mas por favor, não diga que você não fez nada, porque você fez tudo. Nos devolveu a esperança de que o mundo é um bom lugar pra se viver. Por isso te agradecemos. – O senhor Weasley mantinha uma mão no ombro de Harry, enquanto falava olhando nos olhos do garoto – Mas Fleur tem razão. O almoço já está lá fora. Eu vou ver se dessa vez George sai do quarto, ou pelo menos come alguma coisa.

— Eu prefiro nem pensar nisso. –Mione suspirou observando o senhor Weasley subindo as escadas. – Em um mundo onde Harry não tivesse sobrevivido, quero dizer. – Ela explicou sob o olhar interrogativo dos amigos. – Imagino que sempre fosse ter uma resistência contra Voldemort, mas... Você quem nos levava em frente, e você quem pôs um fim nisso tudo, Harry. Um mundo em que você não tivesse sobrevivido... Seria um mundo completamente sem esperança.

***

Os dias seguintes foram, talvez, os mais agitados da vida de Harry. Naquela primeira semana, corujas e mais corujas chegavam à Toca carregando pilhas de cartas de agradecimentos, doces de todos os tipos, e algumas raras vezes presentes extravagantes. Ele se recusou a dar uma entrevista formal ao Profeta, proferindo apenas uma nota onde agradecia todo o apoio, mas que não merecia todo o crédito, que todos os bruxos e bruxas que lutaram na guerra sim, quem deviam ser homenageados. Isso não só aumentou todo o alvoroço em volta do rapaz, como a atenção feminina cresceu exponencialmente, deixando a mais nova dos Weasley visivelmente chateada. Ela e Harry ainda não tiveram tempo de sentar e conversar, e em meio a funerais, festas em homenagem aos mortos da batalha e inúmeras reuniões com chefes de Estado; não havia clima para isso. Tinham tempo para isso depois, e os dois tinham uma espécie de acordo silencioso de esperar a poeira baixar para decidirem o que fazer da vida.

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Mas foi o último dia daquela semana de maio que marcou profundamente a memória de Harry. Em uma cidadezinha no sul da Inglaterra, às 9h da manhã aconteceria o enterro de Colin Creevey. Ele foi sozinho, Ron decidiu ficar com a família em seu próprio luto pelo irmão mais velho, enquanto Mione começou uma pesquisa para descobrir onde os pais poderiam estar. Quando Harry chegou no cemitério, o Creevey mais novo logo o reconheceu. A mãe deles não cabia em agradecimentos à Harry, sabia da adoração do filho pelo mais velho e ver que ele veio prestar uma última homenagem ao seu menino foi muito mais do que ela poderia pedir. Foi uma cerimônia simples e rápida, e o caixão estava aberto, o rosto pequeno do menino estava calmo, como se estivesse dormindo. Quando foi sua vez de se aproximar, Harry colocou cuidadosamente uma foto sua entre suas mãozinhas fechadas, a única foto que ele viria a autografar na vida.