Estações

Eu Não Posso Perder Você


“Você foi embora e meu coração foi com você, eu falo seu nome em cada oração que faço, se existisse outro jeito, de provar que eu te amo, eu juro que não sei como. Você nunca saberá, se eu não te contar agora...” You’ll never know – Michael Bublé

Inácio não sabia dizer se foi o tom de Elizabeth que o levou a recuar ou o impacto daquelas palavras. “Estou morrendo!”. Um silêncio mortal se alastrou entre os dois. Ela por não saber o que fazer e ele para digerir o que ouviu. Soriano amava aquela mulher tanto que doía e odiava ser tão fraco, odiava não conseguir esquecê-la em todos esses anos e agora ouvir que estava morrendo... Ia ser real, ele ia perdê-la para sempre.

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O velho, porém charmoso homem de 62 anos caiu sentado no banco de metal branco próximo a ele, chorou com as mãos na frente do rosto, cotovelos apoiados nos joelhos e o corpo prostrado. Como se não bastasse Helena no centro cirúrgico, numa linha tênue entre a vida e a morte, agora ele iria perder Elizabeth também. Se existia algo que temia era a morte, o grande e poderoso Inácio Soriano tinha medo de apenas uma coisa. A morte. Esse cruel fantasma já levara sua Isabel, ameaçava arrancar-lhe sua amada Helena e como se não bastasse, levaria Elizabeth junto.

Isso o tornava impotente, era o que mais afligia Inácio, pois contra isso, ele não tinha força alguma, defesa nenhuma, dinheiro nenhum poderia detê-la.

— Inácio – Elizabeth caminhou em sua direção, esperando que ele a olhasse – tudo o que eu mais queria era poder ajudar Helena – ela suspirou, uma lágrima descendo por sua face – daria minha vida se necessário, mas não tenho como doar meu sangue, está contaminado.

— Eu entendo, me desculpe – ele dizia com a voz embargada pelas lágrimas, ainda com as mãos cobrindo o rosto – é só que... Eu não sei o que fazer! – confessou – não sei agir quando não tenho o controle da situação, me sinto acuado e impotente, por isso estou tenso e irritado... – ele a encarou, olhando dentro dos olhos dela, fazia tanto tempo e ela ainda continuava deslumbrante. Inácio sempre teve certeza que Helena envelheceria tão bem quanto a mãe, seus olhos de jabuticaba estavam cheios de desespero, ainda sim continuavam lindos e vívidos, seu coração perdeu uma batida, faziam muitos anos que não parava para admirá-la. A intensidade do momento levou Elizabeth a desviar o olhar.

— Inácio – ela tomou a mão dele na sua – Você é um homem forte, muito poderoso de fato, porém, nem todas as coisas e situações estão ao seu alcance, pois você não é Deus – ele ainda encarava o chão, Elizabeth tomou seu queixo com a mão livre – Eu estou com tanto medo quanto você, perder Helena é perder a única pessoa que mesmo me odiando – abriu um riso fraco – sei que me ama, a última ligação com a vida que tínhamos. Eu morreria dessa vez, tenho plena certeza.

O italiano não conseguia desviar o olhar... “Quando foi que seu coração começou a bater tão rápido?” Mesmo sem querer, eles tinham se colocado numa proximidade quase embaraçosa, mas nenhum deles queria se afastar, o toque despertando sensações há muito esquecidas.

— Você tem razão Elizabeth – o polegar deslizou suavemente pela mão dela – Não suportaria perder Helena, quase pelos mesmos motivos que os seus. Eu a amo demais, ela é minha única filha, a única lembrança da nossa vida quando tudo era tão simples e... porque ela me lembra você – os olhos de Elizabeth arregalaram-se – Você estava enganada sobre Helena ser a única pessoa a te amar, eu... – “ele não ia dizer aquilo? Ia?”– eu sempre amei você – engolindo o nó de emoção que se formou em sua garganta, seus olhos encheram-se de lágrimas.

Teria ela ouvido direito? Inácio tinha acabado de dizer que não suportaria perdê-la. Parecia ter perdido a fala, o impacto foi imenso. Como deveria reagir a isso?!

— Achei que você me odiasse Inácio – ele se levantou.

— Eu também! Acreditei nisso cada segundo da minha vida desde que você partiu até o dia em que você apareceu no casamento de Helena, meu coração nunca mais havia batido daquela forma, então eu percebi que a linha entre o amor e o ódio é muito fina – segurando o rosto dela entre as mãos, afastou as lágrimas que desciam com os polegares – Eu te amei mesmo enquanto te odiava. Todos os dias, até hoje, eu apenas sou, ou era, orgulhoso demais para admitir. Você poderia me perdoar?

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Elizabeth sentiu as pernas vacilarem, segurou docemente nos punhos dele, aquilo só podia ser um sonho...

— Inácio, porque está me pedindo perdão quando sou eu quem te deve isso?!

Inácio estava com os olhos avermelhados por causa do choro, as bochechas marcadas pelo rastro das lágrimas, segurou o olhar dela, sentiu-se ainda mais envolvida. Os olhos dele tinham um tom de verde que Elizabeth adorava...

— Porque eu também errei contigo, errei demais – ele fechou os olhos, ergueu a cabeça e suspirou, sem desfazer o contato – Agora eu percebo o quanto nos prejudiquei...

— Eu errei muito mais – ela colocou a mão sobre a bochecha e acariciou, ele suspirou, fechando os olhos. O toque era tão macio quanto se lembrava – Você tem o coração muito benevolente, como o da nossa filha.

— E o orgulho imenso também! – ela sorriu – Elizabeth, eu sei que terminamos com tanto ressentimento entre nós, eu fui tão estúpido, não permiti que você voltasse porque meu ego estava ferido... Ouvir você dizer que está morrendo, me fez perceber que eu não posso perder mais pessoas, que meu orgulho apenas me impediu de ser plenamente feliz... Se eu tivesse feito diferente – suspirou mais uma vez se amaldiçoando pelas escolhas erradas do passado – poderíamos estar em outro lugar hoje...

— Eu gostaria que você me perdoasse – o perfume dela ainda era o mesmo. Intoxicado, ele acenou com a cabeça – eu lhe prejudiquei muito e a nossa filha também...

— Eu perdôo – Elizabeth suspirou, também tinha feito tantas escolhas erradas, perdido tanto, tudo poderia realmente ter sido diferente se... “Porque fugi?!”. Inácio ainda continuava tão charmoso, vulnerável de uma forma que apenas ela e Helena já tinham visto. Aqueles olhos claros sempre foram péssimos em lhe esconder algo, podia lê-los tão facilmente, ele tinha se aberto e confessado algo que desejou ouvir durante todos os últimos anos. Era sua hora.

— Queria que você soubesse que – ele segurou seu olhar novamente, levando-a a vacilar tamanha a ânsia por ouvir, o que sabia que sairia dos seus lábios – também nunca deixei de amá-lo Inácio, nem um único dia. Estava muito atormentada quando sai de casa, perder Isabel me devastou e não conseguia compreender que só encontraria alento para minha dor junto da minha família – Elizabeth descansou a testa na dele, suas mãos deslizavam timidamente pelos antebraços de Inácio, enquanto as dele desceram do rosto e pousaram na cintura dela – Eu estava tão devastada que culpei Helena, culpei você, culpei a mim, culpei todos – ela fungou em meio as lágrimas que desciam silenciosas pelo seu rosto – Eu simplesmente fui pelo caminho mais fácil e fugi. Eu sinto tanto, tanto. Gostaria de ter tomado o percurso mais difícil.

— Nós dois desistimos um do outro, presos em medos e preconceitos, orgulho e rancor, mas eu abro mão de tudo isso hoje, para recomeçarmos, você também?

— Sim – ela sorriu em meio as lágrimas – Deus! Sim! É tudo o que eu mais quero – sorrindo juntos, finalmente se beijaram, um sôfrego e cálido beijo, cheio de saudades e tantas coisas não ditas, lágrimas descendo pelos olhos de ambos, Inácio sentindo o desespero de mais uma iminente perda. “Não! Não! Não! Eu acabei de conseguir uma segunda chance, por favor, não a leve novamente!” orou.

— Não quero perder mais ninguém Lizzie – Inácio a puxou para mais perto, abraçando-a com força, chorando contra a curva do pescoço dela.

- Eu não posso prometer que isso não vai acontecer, mas... quando acontecer, será diferente do que da última vez, sem culpa ou ressentimento. Quanto a nossa filha, ela é uma Soriano, forte e teimosa, tenho certeza que ela vai acordar logo e brigar com todos nós pelo drama. – sentiu os lábios dele se curvarem em um riso, depois beijarem de leve seu pescoço – Precisamos ter esperança e fortalecer Heitor, o rapaz está consumido pela culpa Inácio, eu vi em seus olhos.

— Eu também vi – ele se afastou o suficiente para olhá-la nos olhos – Você tem razão – fungou puxando a respiração, endireitando os ombros – Nossa filha vai sair daquela sala viva. Nossos netos também. E seja lá o que você tenha, vamos descobrir uma solução – ele beijou a testa dela, o rosto de Elizabeth se iluminou, o toque redescoberto era bom demais.

— Sim, eles vão! Quanto a mim, tenho leucemia, faço tratamentos, conseguimos controlar no começo, porém há anos eu não venho reagindo bem as medicações e procedimentos, é imprevisível, porque estou viva há 11 anos quando minha médica me deu apenas quatro...

Inácio tremeu, sentindo uma sensação ruim crescer no seu estômago, faria de tudo, procuraria todos os meios, mas Elizabeth viveria.

— Quando você soube disso? Como descobriu? – ela o fez sentar no banco de metal outra vez e pôs-se sobre o colo dele de leve, seu apoio maior era o chão, as duas pernas viradas para direita, enquanto ele descansava uma mão no final de sua coluna.

— Deixe-me te contar minha história... Quando eu parti, fiquei com minha tia Constanza em Veneza, ela me aconselhou muito ao longo do primeiro ano, mas eu não ouvia ninguém, emagreci muito, não queria comer, entrei em uma depressão profunda – Inácio subia e descia a mão por suas costas, querendo aliviá-la de fardos passados – Ela me levou há alguns psicólogos, nunca confiei em nenhum. Dra. Michelle, depois de 2 anos, conseguiu achar a porta da caverna escura onde me escondia, aos poucos ela foi me tirando de lá. Foi quem me fez perceber do que eu tinha aberto mão e insistiu para que eu voltasse. Estava tão assustada Inácio, tinha certeza que você não me aceitaria, eu não tinha notícia nenhum de vocês dois, mas eu queria tanto voltar, queria tanto recomeçar, sentia falta da minha filha e do meu marido, milhares de pensamentos rondaram minha mente...

— E você fez o que?

— Eu decidi voltar – suas sobrancelhas se ergueram, surpreso ele a deixou continuar sem interrompê-la – Arrumei minhas coisas, agradeci minha tia pela ajuda e fui uma última consulta com Dra. Michelle, ela pediu que eu procurasse um clínico geral e fizesse exames, só para garantir como estava minha saúde física, uma vez que a mental eu tinha restabelecido. Deixei para procurar por um hospital em Soriano, estava ansiosa para vê-los. Chegando a casa da fazenda soube que vocês agora moravam no México, eu me decepcionei, claro! Mas eu não desistiria, consegui seu telefone novo e voltei para a cidade, disquei inúmeras vezes, mas não tinha coragem de completar a chamada, eu sempre desligava. Resolvi ir ao hospital, não estava me sentindo muito bem. Voltei no dia seguinte para buscar o resultado. Era a data do aniversário de Helena e eu tinha resolvido ligar a qualquer custo, não aceitaria deixar minha filha pensando, pelo terceiro ano consecutivo, que não lembrava de seu aniversário. Estava na sala de espera, aguardando ser chamada, disquei o número e o meu nome foi anunciado. Cancelei a chamada e entrei no consultório para receber a pior notícia da minha vida... Como eu podia voltar para vocês estando doente? Eu não lhes daria esse fardo Inácio, não mesmo. Minha alma recém curada, logo adoentou-se outra vez.

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— Eu sinto muito Elizabeth, se você tivesse voltado, nós poderíamos ter procurado ajuda juntos.

— Será que você realmente me aceitaria? – ela questionou – Aquela noite em que fui embora, você estava tão ferido, falamos coisas horríveis um para o outro. Você ia pensar que eu tinha voltado só porque estava doente e precisava de ajuda.

— Eu era tão apaixonado por ti, tal qual agora, teria aberto mão de quem sou por você – Inácio beijou a bochecha dela – meu coração estava muito menos ferido e mais aberto a recomeços, Helena era só uma menina, teria sido muito mais fácil...

—É verdade, mas eu fui uma covarde e paguei o preço disso.

— Chega dessa conversa, nós estamos recomeçando hoje, o passado deve ficar lá, não tornaremos a ele. Vamos nos preocupar com o futuro que devemos construir, tudo bem?!

— Sim, concordo. Vamos voltar e conversar com nosso genro, ele precisa de nós.

— Eu ainda estou chateado com Heitor Elizabeth, não vou mentir, Helena sofreu bastante a falta dele, mas prometi deixar os ressentimentos para trás.

— Ele ainda precisa aprender Inácio, esses dois são muito novos, espero que isso abra os olhos dele. Heitor é um homem maravilhoso, eu vejo o quanto ele ama Helena...

— Isso é verdade – ele sorriu - Vamos? – estendendo a mão ela aceitou, sorrindo ambos deixaram a sala, prontos para recomeçar.

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— Eu confio em ti Alexandre, faça o que for necessário, entretanto, antes de você levá-la para o centro cirúrgico eu posso vê-la?

— Não, mas você tem sorte de ser amigo do chefe – ele sorriu e Heitor agradeceu com um sorriso também – Venha comigo.

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O corredor branco parecia sem fim e frio, sentindo como se estivesse no corredor da morte, um peso imenso sobre caiu seus ombros. Era sua culpa! Se ele estivesse em casa, se tivesse voltado mais cedo, se não houvesse passado a gravidez inteira longe... “Shit!”. Entrando na sala onde Helena estava, Heitor não olhou logo para cama, envergonhado. Alexandre pegou no seu ombro, apertando-o, como se lesse sua mente, lhe disse:

— Sei que estás se sentindo culpado, não faça isso! Foi um acidente.

Heitor fechou os olhos e uma lágrima escapou, engolindo o nó em sua garganta respondeu:

— Mas se eu... – Alexandre o cortou.

— O que teria mudado se você estivesse aqui? Poderia ter acontecido também, ou não, nunca saberemos. Dê força a sua esposa, ela vai precisar. Deixe-a saber que você está aqui. Como neurologista posso afirmar que mesmo inconsciente, a mente humana trabalha de forma fantástica, não perca seu tempo com remorsos, vá dizer a ela que você estará esperando-a acordar.

— Obrigado.

— Não demore, temos que iniciar a cirurgia o quanto antes – o doutor se retirou da sala.

Se aproximando do leito hospitalar, ele a viu ligada a aparelhos que mediam seus batidos e outras coisas que não sabia decifrar. Outra máquina menor marcava os batimentos de dois pequenos corações, seus filhos. Estendendo a mão tocou a barriga redonda, a maior de todas as gravidezes, os bipes subiram algumas batidas. Helena sabia que ele estava lá, reconheceu seu toque.

Emocionado ele colocou a outra mão sobre o rosto dela.

— Hey bonitona, estou aqui. Eu disse que chegaria a tempo do parto, mesmo que você tenha se antecipado – ele beijou sua testa e sussurrou – Por favor Helena, eu sei que você está com raiva de mim, mas não me puna assim, não sei viver sem você. Volte para mim meu amor, volte para mim – descendo os lábios, pressionou-os contra a boca pálida dela – Estaremos te esperando. Eu, Henrique, Gabriela esperaremos você e os bebês. Te amo.

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5 anos atrás, Universidade de Columbia, 2 dias antes da formatura de Victor...

— Laura, você está bem? – Alice perguntou da porta do banheiro – Já tem uns dias em que acordo contigo com a cara no vaso.

Apertando o botão da descarga, Laura levantou e caminhou até a pia lavando o rosto e a boca, encarou o espelho. Sua imagem estava horrível, vivia enjoada e suspeitava o porque, sua amiga se colocou do lado dela e tocou seu ombro.

— Acho melhor irmos a enfermaria e conversar com o médico de plantão – Laura lançou-lhe um sorriso aguado e suspirou tomando coragem.

— Eu acho que sei porque estou assim Ally... – a garota morena a olhou confusa – Eu acho que estou grávida...

— OH MY GOD LAURA!!! Você esta brincando comigo não é? GRÁVIDA? O que você e aquele imbecil do Victor tem na cabeça? Vocês não usavam camisinha?

— Sim, usávamos, mas as vezes confesso que acabávamos esquecendo...

— Merda, merda, merda... Mil vezes merda! Como vocês vão criar uma criança? Você está no meio da faculdade e seus pais? Se fossem os meus iam me matar! Pelo menos você não foi estúpida o bastante para engravidar de um qualquer, seu filho terá a sorte de ter um pai rico. Isso se ele não for deserdado, porque do jeito que aquela cadela da mãe dele te odeia, agora que terão um bebê...

— Pare de falar Ally! – elevou a voz para conseguir calar a amiga – Eu sei que vacilamos, mas agora preciso ter absoluta certeza, vou comprar uns testes de farmácia e depois fazer um hemograma.

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1 hora depois...

— Então?

— Positivo, todos os 4.

— Ferrados! Vocês estão ferrados!

— Obrigada pelo lembrete – revirando os olhos, Laura suspirou, andou pelo quarto até sua cama e se jogou.

— Desculpas ok?! Eu só estou preocupada contigo... – Ally sentou-se ao lado dela e mexeu nas mechas ruivas – Você é minha melhor amiga e isso é uma grande responsabilidade. Vai ligar para o Victor?

— Vou, mas não agora, primeiro vou fazer um hemograma, esperar passar esse processo da colação de grau, festa e meus exames finais.

— Se eu fosse você contava logo, o quanto antes. Esperar nunca é bom... E parabéns! De verdade, afinal, eu vou ganhar um sobrinho ruivo para mimar.

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Um mês depois...

Victor e Laura não tinham conseguido se ver direito desde a formatura, ele envolvido com estudos para o exame da Ordem e ela com inúmeros trabalhos e provas. Laura quase contou depois de receber o hemograma há 1 semana, mas acabou sendo interrompida por um telefonema da mãe convocando-o para o bendito jantar com a família de Amelie. Sentiu que havia algo escondido entre eles, sabia que não era só ela que tinha um segredo. Os olhos azuis denunciavam culpa e ela temia descobrir de que.

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— Pietro eu preciso contar para Laura, esconder isso está acabando comigo. Ela vai me odiar, mas eu não posso mais guardar, sinto como se estivesse enganando-a, não posso mais nem olhá-la nos olhos direito.

— Ih eu não sei não, mulher odeia ser traída, por isso eu não me comprometo sério, não conseguiria ser monogâmico...

— Eu não sei como isso foi acontecer, eu não me lembro de nada, apenas de Laura tendo que ir embora da festa para estudar e minha mãe insistindo para que eu me aproximasse de Amelie. Depois da discussão com ela eu acabei bebendo demais e acordei com Amelie do meu lado na cama. Não preciso dizer que minha mãe quase soltou fogos, em plena manhã de domingo, quando viu a menina saindo do meu quarto, enquanto eu me consumia de culpa.

— Cara, você tem certeza que vocês foram para a cama? Pelo jeito que estavas bêbado, pode ser que tenham só chegado até seu quarto e nada tenha acontecido...

— Mesmo que ambos estivéssemos nus pela manhã? Amelie diz que aconteceu... Não acho que ela mentiria, será?

— Não sei companheiro, não sei...

— Eu vou falar com Laura hoje.

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— Oi Vic, entre – ela se inclinou e beijou-o.

— Já faz uns dias que não te vejo, odeio isso – ele a abraçou apertado e ela correspondeu na mesmo medida – senti saudades suas!

— Eu também, odeio a distância que se formou entre nós essas semanas... – ela fez um biquinho doce de indignação, os lábios torceram de leve e ele se derreteu. Mas tinha ido ali por um motivo, precisava tirar o peso de seus ombros, encarando-a, ele foi direto.

— Laura, tenho algo para te contar.

— Que bom, eu também tenho.

— Você primeiro – Victor disse.

— Não Vic, você. Afinal, foi quem pediu primeiro – assim ela acumulava mais coragem. Ela o guiou até sua cama e eles sentaram-se, o hemograma estava no criado mudo, bem próximo dela. O pegou enquanto ele se acomodava, escondendo embaixo do travesseiro para que não visse, até o momento em que ela revelaria sobre o bebê.

— Laura no dia da formatura, depois que minha mãe lhe importunou e você passou mal, eu deveria ter ido contigo, a festa havia acabado para mim ali. Mas você insistiu pra que eu ficasse e evitasse mais problemas com minha família – ela concordou com a cabeça, acariciando seus braços o incentivando a continuar – Eu bebi, permaneci contra minha vontade, tinha planejado algo especial para nós dois e tudo foi por água abaixo... Estava frustrado e enchi mesmo a cara, depois disso eu só me lembro de acordar em casa na manhã seguinte.

— Desculpe Vic, mas eu não entendi o que você está querendo me dizer.

A garganta dele secou devido o desespero, um nó se formando tamanha a angústia que ele teve dificuldade de engoli-lo. “Deus, como ele contaria aquilo para ela?!”.

— Quando eu acordei naquela manhã, eu não estava sozinho. Amelie estava ao meu lado – ele fechou os olhos e suspirou frustrado, sentido-a se enrijecer e afastar-se dele como se tivesse levado um choque.

Laura parecia ter recebido um soco no estômago, o ar lhe faltou e o coração agora pesava toneladas.

— Você transou com ela? – indagou ferida e com a cabeça baixa.

— Eu não lembro Laura, eu juro que não tenho uma memória se quer, mas acordamos nus e Amelie confirmou que aconteceu. Eu sinto tanto, por favor, me perdoe.

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— Você dormiu com a garota que deveria ser sua noiva, você tem noção do que isso significa para mim Victor? Ou para sua família? Que a essa altura com certeza está planejando os detalhes do casamento de vocês...

— Eu sinto muito, não quero desviar minha culpa por causa da bebida, porém eu realmente vacilei, nunca mais tinha bebido a ponto de não ficar consciente dos meus atos... Não era meu objetivo te machucar amor, eu venho me sentindo um lixo esses dias... Laura eu te amo e ter que admitir isso para ti está me ferindo também...

- Eu não sei o que dizer Victor – ela o encarou, a dor era visível nos olhos de ambos – Você dormiu com outra e isso colocou uma barreira entre nós.

— Laura, será que você pode achar um caminho para me perdoar? Eu não posso te perder...

— Não – assustado, Victor a olhou, o coração perdeu uma batida de tanto medo – Pelo menos não agora, você poderia ir embora e me deixar sozinha? Preciso de um tempo para pensar...

— Claro – levantando-se derrotado, ele caminhou em direção a porta, mas parou no meio do caminho, colocando as mãos nos bolsos frontais da calça – O que você queria me dizer?

Dando um riso triste e balançando a cabeça, falou:

— Esquece...

Abrindo a porta, olhou mais uma vez para a cama, ela brincava com o anel que ele havia lhe dado, seu olhar preso no giro da jóia de prata.

— Laura – ela o fitou – Nunca se esqueça que eu a amo e que você é a mulher da minha vida – ao bater porta, num movimento sincronizado, uma lágrima solitária escorreu pelo rosto dos dois.

—_____________________________________

- Laura, por favor, saia dessa depressão horrível, você vive nessa cama, quando não está no sanitário vomitando. Quantas aulas já perdeu? Eu sei que o que Victor fez te machucou, mas perdoe o pobre homem, ele estava bêbado, foi impensado, ele não foi canalha, não fez por querer e ele te ama. Veja todas essas flores – Alice apontou para o quarto repleto de buquês e vasos de flores que foram entregues todos os dias nas últimas duas semanas – responda ao menos um telefonema ou mensagem dele. E claro, lembre-se que você precisa contar a ele sobre o bebê. Mesmo que não o queira mais, vocês compartilham um filho e ele deve ajudá-la.

— Alice, se Serena já acha que quero o filho como uma forma de ascender de vida, quando descobrir sobre o bebê terá certeza. Não sei qual a cisma dela comigo, meus pais não tem a conta bancária deles, é claro, mas vivemos bem, sempre estudei em boas escolas, cursos auxiliares de linguagens e arte, viajei para onde quis e tive tudo. Não tenho porque dar o “golpe do baú” em Victor. Talvez isso seja um sinal para que eu me afaste dele de vez...

— Não seja ridícula Laura! O único sinal latente é que você precisa contar sobre o bebê. Serena é uma mulher egocêntrica e mesquinha que acha que o mundo gira em torno dela. Victor te ama, mesmo que tenha sido estúpido o suficiente para te engravidar agora, mas contra isso nada podemos fazer. Ligue para ele, marquem um encontro e resolvam isso por favor.

— Você tem razão, preciso dizer para ele. Até porque daqui uns dias começará a ficar evidente e eu preciso contar aos meus pais também, oh God!

— Vai dar tudo certo

— Obrigada Ally por estar ao meu lado – elas se abraçaram e Laura levantou da cama, lavou o rosto e ligou para o número de Victor.

—____________________________________

- Victor dear... Você está aqui? – Serena entrou no quarto do filho e o procurou. Ao notar o chuveiro ligado, percebeu que ele estava no banho. Quando ia fechar a porta o telefone começou a tocar, uma foto da garota ruiva que tinha atrapalhado seus planos apareceu na tela. Cogitou desligar, mas esperou a chamada terminar com o aparelho em mãos.

O sinal da caixa postal apitou e ela ouviu o recado:

“- Victor, bom dia. Eu sei que não tenho respondido você ultimamente, mas eu precisava de um tempo depois da história com Amelie... Será que nós podemos conversar pessoalmente? Vou mandar uma mensagem com o endereço do Café, me liga quando ouvir o recado.”

O telefone vibrou, uma notificação de mensagem apareceu e o horário para o encontro. Serena sorriu, o filho era igual ao pai, não se preocupava em colocar senha nos eletrônicos. Destravou a tecla de segurança automática e apagou as mensagens, tanto de texto como de voz. Ela mesma iria ao encontro de Laura e resolveria essa situação, aproveitaria que o coração de Victor já estava sofrendo pela separação momentânea da namoradinha e faria aquilo se tornar permanente, ele sofreria de uma vez só. Quem sabe depois disso seu juízo não voltasse e seguisse os planos que foram estabelecidos para ele.

Saiu do quarto ao escutar o chuveiro sendo desligado e pegou seu celular, discando o número de Amelie.

— Olá querida, cancele todos os seus compromissos dessa tarde, você irá comigo a um lugar as 16h.

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Sentada numa mesa próximo a grande janela de vidro, Laura apreciava a vista do jardim aconchegante do lugar, alguns beija-flores enfeitavam o ambiente, seduzidos pelas flores radiantes da primavera. Serena e Amelie andaram até a mesa e sentaram-se, a ruiva estava tão distraída com os pássaros que só notou quando as cadeiras de vime foram arrastadas.

Encarando as duas mulheres vestidas elegantemente, com duas bolsas Chanel da nova coleção penduradas nos ombros, ela tentou empurrar a apreensão que se formava em seu estômago. “Onde Victor estava e o que elas faziam ali?”.

Por longos minutos elas se olharam, até que Laura se pronunciou:

— Boa tarde. O que vocês duas desejam?

— Viemos conversar contigo querida – Laura sentiu a ironia expressa em cada silaba da última palavra.

— Desculpe, não quero ser grosseira, mas eu não tenho nada para conversar com a senhora, nem com esta senhorita.

— A questão é que eu tenho algo para falar e você vai me ouvir.

Laura se levantou, pegando sua bolsa na única cadeira que ficou fazia na mesa de 4 lugares, depois que suas companhias sentaram-se. Serena a puxou pelo pulso, fazendo-a sentar-se outra vez, sua bolsa caiu no chão com o movimento brusco, recolhendo-a, depositou-a onde estava anteriormente.

- Diga logo o que a senhora quer, por favor, e me deixe ir embora, não vim aqui para encontrar vocês.

— Você veio para encontrar meu filho, então é meu assunto. Quero que o deixe em paz, trouxe Amelie para que a conhecesse pessoalmente. Victor vai se casar com essa moça, isso está acordado desde quando eles eram apenas crianças e você está atrapalhando o relacionamento deles.

— Veja bem Sra. Campbell, Victor e Amelie não tem relacionamento nenhum, além desse criado pelas mentes de vocês, não estou atrapalhando nada, Vic é livre para decidir o que bem quiser da vida dele. Eu o amo e não vou desistir dele. Me admira você, uma moça tão elegante participar de algo tão obsoleto quanto este acordo ridículo.

— Eu sei bem o que você ama no meu filho.

— A senhora está muito enganada. Não preciso do dinheiro de Victor, meus pais não são milionários, mas temos dinheiro, o bastante para viver bem e com conforto pelo resto de nossos dias. Também posso usar Chanel se eu quiser, aliás, eu até tenho umas. Então tire essa ideia da sua cabeça, como já disse, eu amo Victor, não seu dinheiro. Agora por favor, me deixe ir embora – ela deu um impulso para se levantar, quando finalmente Amelie abriu a boca.

— Então você já perdoou Vic por ter dormido comigo? – loira disse e Laura sentiu uma onda horrível de náuseas.

— Isso é algo que nós estamos conversando. E não devo satisfações a você sobre minha decisão...

— Nem se eu lhe dissesse que aquela noite deixou consequências maiores do que a separação de vocês?!

Franzindo o cenho, Laura a encarou estudando-a. Demorou dois segundos, até ela perceber o que Amelie queria dizer. “Não! Não...”

— Você está grávida?! – perguntou aturdida.

— Sim, descobri não tem mais que uma semana. Só contei ao Victor, nem Serena sabia – a ruiva a olhou e ela realmente estava tão surpresa quanto ela, só que de uma forma agradável. Laura sentia o estômago revirando “bebê, essa não é uma boa hora”, o coração se contorcendo, batendo rápido, liberando pancadas e mais pancadas de dor – Eu espero que você permita que o meu filho tenha um pai – mentalmente indagava: “e o meu?”— e que nós possamos criá-lo como uma família.

— Isso não sou eu quem vai decidir, sim Victor. Mas não se preocupe, “não ficarei mais no caminho de vocês” – zombou revirando os olhos – Acredito que tudo tenha ficado resolvido entre nós 3, portanto estou indo embora. Passar bem.

— Adeus querida! – Serena falou.

Laura saiu tão apressada rumo ao banheiro, na ânsia de vomitar, que não viu seus pés arrastarem o envelope do hospital que havia caído de sua bolsa, deixando-o no campo de visão de Serena. Pegando o papel ela se surpreendeu ao notar o exame de sangue marcando BHCG positivo. Victor tinha sido estúpido para engravidar a fedelha.

— Amelie, como você me escondeu que estava esperando meu neto? – perguntou extasiada.

— O que é isso que você tem nas mãos?

— Nada demais... Agora nós precisamos contar ao Victor, tenho certeza que ele vai adorar.

— Não Serena, não faça isso. Disse aquilo sobre a gravidez apenas para fazer com que Laura desistisse de vim atrás de Vic, não estou esperando bebê nenhum.

— Mas mantenha a história, vamos usá-la como um impulso para Victor se casar contigo.

—_____________________________________

Algumas semanas depois...

— Laura porque você está arrumando suas coisas? Vai viajar?

— Não, eu conversei com meus pais, depois que vi o anúncio oficial do noivado de Victor estampado em todas as colunas sociais, percebi que ele decidiu brincar de casinha com Amelie, então eu não preciso ficar aqui e assistir.

— Mas você o ignorou completamente...

— Continuando Ally – Laura lançou um olhar ferido para a amiga – Meus pais só concordaram em me ajudar se eu cortasse ligações com Victor e fosse recomeçar em outro lugar. Não quero que ele me veja grávida e tente reatar só pelo bebê, se escolheu o conforto que a família lhe oferece em meu lugar, nada posso fazer.

— Venha cá – ela abriu os braços e Laura a abraçou apertado – Quero que você chore, que grite, que libere todas as emoções que tem guardado ultimamente, ouvi dizer que não faz para os bebês, comigo você não precisa se fingir de durona.

A ruiva obedeceu o comando da amiga e chorou, chorou as lágrimas guardadas durante toda essa confusão. Chorou pela traição e por ter sido trocada, chorou pela covardia de Victor, por sua falta de convicção, por tê-la enganado, porque agora seu bebê não teria pai... Todos os seus medos sendo colocados para fora, Alice sentiu o coração da amiga se quebrando em pedaços, compaixão inundando o dela própria, ela afagou as costas e cabelos de Laura até que ela se acalmasse e depois beijou sua bochecha, sentando-as na cama.

— Você não vai dizer que eu estraguei tudo? Que ferrei minha vida e tomei um chute na bunda?!

— Não, você já sabe disso – ela sorriu – Agora vou dizer algo que você ainda não sabe. Primeiro, você está sendo muito mais corajosa do que eu teria sido no seu lugar, talvez eu tivesse optado pela escolha errada e mais fácil, teria feito um aborto. Segundo, eu vou sentir muito sua falta, muito mesmo. Terceiro, eu amo o seu bebê tanto quanto eu amo você. Mesmo que ele venha ter os genes do imbecil do Victor – Laura abriu a boca – E não me venha defendê-lo.

— Eu não ia, não teria argumentos. Pensei em ir para o Canadá, mas meus pais conhecem alguns professores numa universidade na Cidade do México, eles gostaram das minhas notas e me aceitaram. Só vou parar de estudar quando o bebê estiver perto de nascer. Assim que eu estiver fixa, te mando o meu endereço. Vou sentir sua falta também Ally. Obrigada mais uma vez. Love u... Só me prometa uma coisa...

— Diga.

— Não conte ao Victor sobre o bebê em hipótese alguma, essa criança vai ser apenas minha.

— Como você desejar.

—___________________________________

— Mamãe, por que você anunciou um noivado que não existe? – Victor jogou a revista estampando uma manchete com fotos dele e Amelie – Eu não vou me casar com ela, já disse!

— Querido e quanto ao seu filho?

— Eu vou dar todo meu amor e apoio a ele, vou assumi-lo e dar-lhe meu sobrenome, me tornarei totalmente responsável por essa criança, mas não tenho que fazer o mesmo por Amelie. Estou cansado de repetir que não a amo. Deve ser por isso que Laura está me evitando de todas as formas possíveis... Céus! Imagina quando descobrir sobre o bebê... Eu sou um idiota!

Serena manteve-se calma ao ouvir o nome da garota, sentiu seu estômago se encher de antecipação, lembrando que seu neto, na verdade, crescia nela e não em Amelie como falsamente tinham contando.

— Laura deve ter percebido que nunca o amou e por isso se afastou, entendeu que o melhor para você é Amelie.

Ele suspirou irritado, bateu as duas mãos sobre a mesa de mogno do escritório da mãe, assustando-a.

— O melhor para mim é a mulher que eu amo! – vociferou – Eu já coagi demais com esse teatrinho de vocês, não me admira que Laura me odeie, mas vou lutar por ela. Se quiser me deserdar, pode fazê-lo. Não vou abrir mão dela, nem por um milhão de Amelies ou por todo o dinheiro e conforto que existirem. Espero que tenha ficado claro – ele se retirou da sala sem olhar para trás, deixando a poderosa advogada de divórcios sem palavras ou argumentos.

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— Laura abra essa porta, por favor! Você vai falar comigo hoje, por bem ou por mal – ele dizia ofegante. Tinha saído do escritório, entrado no carro e corrido até o dormitório dela.

— Laura não está aqui – disse Alice com uma cara de poucos amigos, ao abrir a porta o suficiente para que apenas sua cabeça tivesse passagem.

— Eu não acredito. Laura – chamou outra vez – precisamos conversar! Eu nunca pedi Amelie em casamento, aquilo é coisa da minha mãe...

— Eu já disse que ela não está aqui, que saco!

— Eu só acredito vendo – ele empurrou com o máximo de delicadeza possível Alice até que conseguiu entrar no quarto, quando viu o espaço que pertencia a ela vazio, ele temeu – Onde estão as coisas dela Alice?

— Laura não mora, nem estuda mais aqui, ela foi embora.

— O que? Para onde? Quando? – seu coração cheio de adrenalina da corrida de poucos minutos atrás, começou a ficar ainda mais agitado, misturando-se ao desespero crescente em cada molécula sua.

— Já faz uns dias e não adianta me perguntar, pois mesmo que eu soubesse onde ela está não lhe diria. Você é um canalha imbecil, um covarde! Eu deveria socar sua cara por ter usado Laura como fez! Minha amiga sempre foi tão alegre e por pouco você não a destruiu, se não fosse pelo... – ela mordeu a língua. “Controle-se Alice!”

— Se não fosse pelo que?

— Se não fosse o fato de você ser um moleque medroso, que põe o rabo entre as pernas cada vez que seus pais lhe dão uma ordem, tudo poderia ter sido diferente. Você acha que Laura não me contou sobre a gravidez da Amelie? Onde você estava com a cabeça?

— Ela já soube?! Merda! Não acredito, era para eu ter contado.

— Claro que soube! – Alice revirou os olhos – Guarde melhor a prova da sua masculinidade dentro das calças, vire um homem Victor, aprenda a ser independente e depois procure Laura, ou melhor, deixe-a em paz, com certeza está bem melhor sem você! Agora saia do meu quarto – ela andou até a porta e a segurou aberta, o dedo estirado inflexível indicando a saída.

—______________________________________

- Oi, bom dia – Victor disse quando um homem alto atendeu a porta da casa dos Aldrin – Eu gostaria de falar com Laura. Ela está? Sou...

— Deixe-me adivinhar? – O homem, que ele julgou ser o pai dela, Conrad Aldrin, era ruivo e se colocasse um kilt ninguém diria que não era um escocês nato, estava com um semblante irritado – Victor Campbell. Você deve ser o rapaz que partiu o coração da minha filha.

— Mr. Aldrin, eu gostaria de conversar com Laura justamente para explicar o que aconteceu, foi tudo um mal entendido. Nunca foi minha intenção magoá-la.

— Olha aqui meu rapaz – Conrad saiu e bateu a porta atrás de si, parando em frente a Victor, olhando profundamente em seus olhos – eu não sei que tipo de educação seus pais lhe deram, mas os meus, me ensinaram que quando uma garota não quer vê-lo ou conversar contigo, você deve deixá-la em paz.

— Por favor, só me diga onde ela está ou o número do telefone, Laura precisa saber o que realmente aconteceu.

— A única coisa que minha filha precisa é ficar longe de você! Agora, se viestes aqui na esperança de que eu lhe desse qualquer informação sobre ela, perdeu seu tempo. Não direi por que respeito a vontade de Laura.

— Quem dera todos os pais pensassem como o senhor, minha vida teria sido mais simples... Obrigada e desculpe qualquer má impressão. Diga a Laura que eu meu coração sempre será dela como sei que o dela é meu – virou-se e caminhou até seu carro.

—____________________________________________

4 meses depois... Cidade do México

— Meu amor, acalme-se e deixe a mamãe estudar – Laura massageou a barriga de 7 meses, enquanto lia um livro para o último exame do semestre – você esteve inquieta o dia inteiro, o que está acontecendo ai dentro?

Ela sorriu e foi tomar um chá de camomila para ver se sua filha conseguia relaxar e a deixava estudar. Estava sonolenta e começando a entender o quão ruim poderia ser o último trimestre de uma gravidez. Alguém bateu na porta do apartamento.

— Ally! – puxando a amiga para dentro, a abraçou – Estou tão feliz em tê-la aqui – seu sorriso não negava.

— Eu não vim por você, vim pela minha sobrinha – acariciou a barriga de Laura e a olhou de cima a baixo – A propósito, você está linda grávida.

— Obrigada...

— Como estão as coisas por aqui?

— Fora o fato de que minha filha não me deixa dormir está tudo bem – ela sorriu e encaminhou-as para o sofá – E por lá? Como vão as coisas?

— Você não vai acreditar... Mr. Collins finalmente casou! – Alice riu e Laura formou um O com a boca.

— Não acredito! Quem aceitou tal calvário?

— Miss. Charlotte, professora de Literatura.

— Pobre mulher – soltou uma gargalhada.

— De fato! Vou ficar o fim de semana, então se não tiver uma cama extra vou dormir na sua.

— Tenho um quarto de visitas – a ruiva revirou os olhos – acho que você não vai querer dormir comigo, principalmente quando o bebê começar a chutar, coincidentemente ela adora fazer isso quando me deito.

— Azar seu!

Sorrindo, ela se aproximou e pegou a mão de Alice colocando sobre a barriga, onde sua filha dava pontapés fortes.

— Acho que ela gosta de você, converse com ela.

— O que eu devo falar? – ela perguntou aflita. Laura sorriu.

— O que quiser...

— É... Oi pequena – ela se inclinou, ficando com a boca bem perto da barriga de Laura – Você ainda vai demorar muito? Se eu fosse você ficava ai dentro para sempre, aqui fora tem muitas coisas ruins...

— Não diga esse tipo de coisa para minha filha Ally! Vai assustá-la.

— Deixe-me continuar... Aqui fora tem muitas coisas ruins, mas também muita coisa legal. Como sua tia postiça, é minha obrigação protegê-la de tudo, então, quando você estiver preparada, pode vim. Vou tomar conta de ti e da sua mãe.

Elas conversaram por horas. Contra todas as restrições médicas, Ally obrigou Laura a comer do brigadeiro que tinha feito e elas colocaram um filme na TV ao qual nem prestaram atenção.

— Vamos lá Laura, faça a pergunta que você realmente quer fazer... Sei que estás esperando por ela desde a hora em que eu entrei aqui.

— Sou tão transparente assim?

— Às vezes...

— Você o tem visto? Ele realmente casou?

— Não o vi e também não sei dizer se ele casou. Uma recomendação: esqueça o cara e viva sua vida!

— Ele foi atrás de mim alguma vez? – Alice percebeu os fios de expectativa em sua voz

— Para que você quer saber disso agora?

— Porque eu preciso saber se ele sofreu pelo menos um terço do que eu sofri! Caramba Ally... É difícil esquecê-lo... – ela suspirou – todos os dias eu olho para o meu corpo mudando, porque carrego um pedaço dele, um pedaço que eu amo mais do que qualquer outra coisa na vida, e assim vai ser pelo resto dos meus dias...

— Ok, ok... Ele foi, alguns dias depois que você se mudou. Mas eu o expulsei, xinguei, falei umas verdades e ameacei socar a cara dele. Essa foi a única vez que ele apareceu por lá – Laura abaixou a cabeça e começou a rodar o anel que ganhara de Victor em seu dedo até o retirar – Está tudo bem?

— Sim – ela deu um sorriso aguado, lendo a frase na inscrita na jóia: “my heart is yours like yours is mine” – Vamos mudar de assunto.

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Cidade do México, dias atuais...

As portas de vidros do primeiro andar do hospital se abriram automaticamente, Sonia passou por elas apressada, após uma rápida conversa com a recepcionista ela tomou o rumo para a ala onde Helena estaria sendo operada.

O elevador estava vazio naquele começo de madrugada, ela aproveitou para verificar se a leve saliência da barriga de 18 semanas estava aparecendo. Optou por uma bata folgada e com bastante movimento, que disfarçasse ao máximo, mas logo começou a se questionar se estava fazendo certo em esconder o bebê de Alexandre. Perdida em pensamentos a porta do elevador se abriu, começando a caminhar pelo corredor que terminava na sala de espera, logo ela avistou Heitor inquieto, as mãos cruzadas e o queixo apoiado nelas, os cotovelos sobre o joelho, o pé direito batendo a sola do sapato no chão num tempo quase que incontável, ela podia dizer que seu amigo estava a beira de um colapso.

Logo mais, no sofá a frente, estavam Elizabeth e Inácio, sentados próximos, Sonia não deixou de notar que as mãos deles estavam entrelaçadas e a senhora cochilava com a cabeça deitada no ombro do homem, ela estaria vendo coisas?!

— Heitor – chamou e ele se levantou abraçando-a, ela logo se desvencilhou, com medo dele sentir sua barriga – alguma notícia de Helena?

— Sonia! Que bom que você está aqui – ele sorriu e ela virou-se na direção de Inácio sorrindo, o senhor lhe devolveu o gesto – Ainda não, já estamos há 1 hora e meia esperando e nada.

Sonia abriu a boca para falar quando foi interrompida pela voz de seu marido, que vinha caminhando lentamente na direção deles, distraído, acalento os dois pequenos pacotes envolvidos em mantas nos seus braços.

A modelo percebeu os olhos de Heitor se encherem de lágrimas, sem palavras ele se adiantou na direção deles, Inácio já acordava Elizabeth, apressando-a tamanha ânsia em conhecer seus novos nipotes.

Alexandre sentiu Heitor parado a sua frente, as bochechas marcadas pelas lágrimas, ele sorriu e passou as crianças para seu colo.

— E Helena? – ele perguntou após beijar a cabecinha dos seus filhos, cobertas por gorrinhos.

— A cirurgia ainda não terminou, estamos reparando a ruptura do útero, trouxe seus filhos para você conhecê-los, contra todas as regras, pois os bebês deveriam ir para a incubadora por algumas horas, só como garantia.

Heitor parecia nem ouviu o que Alexandre falava, totalmente envolvido pelos pequenos sons e movimentos que os bebês faziam. Ele conferiu, 4 mãozinhas e 4 pezinhos, que juntos somavam 20 dedinhos minúsculos, eles eram perfeitos. Um menino com ralos fios dourados e uma menininha carequinha. Os dois estavam calmos, encarando-o com olhos acinzentados que ele tinha certeza que terminariam azuis como os seus. Bem, não tinha sido dessa vez que ele ganharia uma mini cópia de sua mulher, talvez os cabelos da filha acabariam pretos?! Afinal ela ainda era careca... Sorrindo, ele distribuiu mais beijos pelo rostinho dos bebês, ninando-os suavemente.

Inácio e Elizabeth olharam para os netos enternecidos, perdidos naquele momento família íntimo, eles até tinham esquecido o medo que os assolava. Alexandre perdeu a atenção da cena doce, ao notar que havia mais uma pessoa naquela sala. Olhando para trás ele a viu.

Sonia.

Seu coração começou a bater mais rápido, 4 malditos meses sem vê-la. Doía, doía demais e o tempo separados só a deixou ainda mais bela aos seus olhos.

Sonia não podia negar a excitação crescendo em seu estômago ao vê-lo, ele parecia mais “largado”, a barba que dificilmente permanecia sem aparar, estava por fazer e ela achou que combinou muito com ele. Sorrindo deu um passo e Alexandre jurou que tudo ao seu redor tinha parado, esse sorriso, mesmo que não fosse o mais radiante deles, fazia coisas indizíveis para seu coração. Parando ao lado dele, ela fitou o rostinho dos bebês, tão puros e frágeis, dessa vez, o sorriso foi largo e repleto de felicidade.

— Eles são tão lindinhos, estão bem? – ela sussurrou, sem olhá-lo nos olhos.

— Sim, muito bem, nasceram grandes e bem formados, só quero fortalecer o sistema respiratório deles um pouco mais.

— E Helena?

— A gravidade do procedimento que fizemos não diminuiu quando os bebês nasceram, entretanto, tudo está indo dentro do planejado. Nós vamos precisar de sangue ainda e ao sair da sala de operação, um residente me avisou que conseguimos um doador – o médico disse num tom mais alto e as outras quatro pessoas suspiraram aliviadas.

— Heitor, eu gostaria de saber o nome dos meus netos – Elizabeth solicitou.

— Bom, eu e Helena decidimos que a nossa menininha aqui se chamará Catarina e nosso rapazinho Otávio.

— Lindos nomes companheiro – Alexandre disse, tocando no seu ombro – porém, infelizmente precisamos levá-los.

Duas enfermeiras se puseram do lado do seu patrão, esperando Heitor lhes entregar os bebês. Resignado em separar-se dos filhos, ele pediu:

— Será que posso acompanhá-las Alexandre?

— Sim. Claro. Eu mesmo iria, mas preciso retornar a sala de cirurgia com a bolsa de sangue, só esperarei o doador chegar.

— Vá filho – Inácio disse – Cuide dos seus bebês, ou quando sua mulher acordar vai tratar de castigá-lo pessoalmente.

—______________________________________

Os pais da amazona sentaram-se outra vez, felizes por Heitor ter conseguido uma distração de toda tensão e culpa que os sogros sabiam que ele carregava. As mãos se entrelaçaram outra vez, o toque trazendo o conforto que precisavam. Eles não estavam mais sozinhos com sua dor, podiam compartilhá-la e encontrar refrigério no amor recém confessado.

Sonia permaneceu na sala, eles tinham visto a tensão existente entre a moça e o marido que havia saído há longos minutos para auxiliar o rapaz que doaria o sangue, retornando ao espaço, ele parou diante dela, temeroso em puxar assunto.

—______________________________________

Após a saída de Alexandre, Sonia começou a refletir sobre o segredo que guardava, estaria sendo injusta com ele? Mesmo com a traição?! Ele merecia saber sobre o bebê? Ela podia privar sua criança de desfrutar da ternura de momentos especiais como os da cena que presenciara minutos atrás?! Perdida em pensamentos, ela não o viu se aproximar.

— Oi

— Oi – Sonia disse colocando uma mecha atrás da orelha, enquanto encarava o chão.

— Como estão as crianças? Estou com saudades...

— Tenho certeza que eles também sentem sua falta.

—Eu não me referi apenas a eles... – ela o encarou, sem palavras, mas logo desviou o olhar.

— Eles estão ótimos – voltou ao assunto dos filhos, era muito mais seguro do que o rumo da conversa que Alexandre queria iniciar – César está perdendo o medo de altura – sorriu com a lembrança do quão orgulhosa ficou do filho, ao vê-lo superando um obstáculo – Conseguiu descer o escorrega de um parquinho com a ajuda de Victor – Sonia contava tão alegremente a conquista do menino, que não percebia o incomodo que o doutor sentiu ao ouvir o nome de seu amigo.

Alexandre enrijeceu, o sorriso morrendo, a manchete da revista voltando a sua mente, então além de roubar sua mulher, o tal Victor também passava tardes levando seus filhos a parquinhos?! Isso não estava certo, ele iria a New York ter uma conversa séria com o homem. O silêncio dele foi o suficiente para Sonia entender que ele provavelmente já lera algo sobre as fofocas que circulavam a mídia.

— Estou feliz por César – ele forçou um sorriso. Era péssimo em disfarçar, disso ela tinha certeza – Então... você e esse Victor estão saindo...? – ela quis sorrir tamanho o desdenho com que o nome de seu amigo foi falado.

— Victor é um amigo de longa data... Se estamos ou não saindo, não lhe diz respeito.

“É claro que me diz respeito, você é minha mulher caramba!”

— Me desculpe, eu só me preocupo com quem está na companhia das crianças.

— Eu jamais deixaria alguém que não conheço se aproximar dos nossos filhos, você me ofende em pensar algo assim. Além do mais, você conhece Victor.

— Sim eu conheço “e infelizmente você também”, como disse antes, perdão – ele suspirou – preciso voltar para a sala de cirurgia, assim que possível venho atualizá-los sobre Helena.

— Tudo bem – ele virou-se e começou a se afastar – Alexandre – Sonia chamou, virando-se a olhou. Caminhando alguns passos se pôs diante dele, uniu suas mãos macias de médico, como se fosse fazê-lo orar e apertou gentilmente as suas por cima das do marido – Boa sorte!

Alexandre derreteu ao sentir o toque suave e quente das mãos dela, a raiva se esvaindo como o vapor, seu semblante mudou na hora. Será que ela não percebia que ele a amava tanto, que o menor dos toques o fazia se sentir nas nuvens?! Não conseguia ver que ele não queria outra mulher se não ela?! “Merda Sonia, essa distância está me machucando tanto”.

Obrigado – Alexandre percebia um misto de emoções nos olhos de sua mulher, conseguia ver o medo, a apreensão, mas nem no seu mais remoto pensamento, imaginava que o motivo de tudo isso não era apenas Helena, e sim a dúvida que a consumia em revelar ou não sobre o filho deles que ela carregava – Vai ficar tudo bem Sonia – ele se inclinou e beijou as mãos dela ainda unidas as suas – Vai ficar tudo bem – sussurrou sobre os nós dos dedos – “como eu queria acreditar nisso” Sonia pensou enquanto ele fitou-a, Alexandre sorriu e ela devolveu o gesto. Por que seu coração a traía assim? Esse olhar sempre conseguia confortá-la no seu íntimo. “Nunca foi verdadeiro Sonia, volte a si!”.

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— Agora vá – ela se afastou antes que cedesse aos anseios do seu fraco coração – e quando voltar me traga boas notícias.

Sorrindo, ele acenou com a cabeça, se virou e voltou a sala de operação.