7. Danos

Se crescer fosse algum tipo de competição ou objetivo de vida, com certeza, eu seria a campeã. Com a alimentação adequada era como se tivessem ligado meu desenvolvimento no modo turbo. Agora não deveria faltar muito para eu poder sair de minha bola. Ela por sinal já não era uma bola, já não era um lugarzinho quentinho e aconchegante. Estava mais para uma camisa de força. Tinha horas que eu achava que ia enlouquecer lá dentro.

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O que tornava suportável e por vezes prazeroso estar em um lugar tão apertado, era o fato de estar conectada a minha mãe. Através dela eu podia sentir coisas incríveis e todas as minhas percepções eram ampliadas. Era muito bom. Mas havia uma coisa que não era nada boa, uma coisa que infelizmente eu percebi quase tarde demais.

Eu descobri que estava machucando minha mãe.

Tal compressão foi um golpe muito brusco. Eu me senti péssima um monstro. Eu a amava mais do que tudo. Mas aparentemente ama-la não faria a menor diferença enquanto eu a estivesse ferindo.

Há algum tempo eu percebera que quando realizava qualquer movimento mais brusco, às vezes nem isso, ela se escolia e às vezes tremia. Todavia eu não achava que aquilo a machucasse, talvez incomodasse, ou fosse estranho, mas machuca-la nunca.

Detendo tal percepção comecei a tentar me mover menos. Procurava a posição mais confortável possível e nela ficava pelo máximo de tempo que conseguisse. Tentava me distrair com outras coisas, com a comida que e deixava tão saciada; com o som agradável das vozes de meu pai, de minha mãe e da voz rouca. Este ultimo era responsável por embalar meu sono e garantir um descanso tranquilo.

Porem inevitavelmente, vez ou outra eu tinha de me esticar e me realojar, o que sempre lhe causava desconforto, muitas vezes dor e de vez em quando, fraturas. E essas eram as piores.

Na maioria das vezes ela só se encolhia e afagava minha bola, como se estivesse tentando me acalmar. Mal sabia ela que eu já estava fazendo um esforço além da conta para me manter calma. Só que as vezes, quando eu ficava tempo de mais em uma posição, ou quando tinha um crescimento muito brusco, eu tinha de me esticar em busca de ar e de uma posição mais favorável. E se não medisse com muito cuidado minha força eu não causava apenas um simples desconforto, eu lhe quebrava um osso.

Eu pude ouvir com clareza quando suas constelas fizeram “clac” e o som foi acompanhado do barulho mais horrível que eu já conhecera. O som do grito de dor e agonia de minha mãe. Acho que se eu pudesse eu teria gritado junto com ela. Eu não os podia ouvir sempre, por isso cada vez que conseguia captar suas vozes eu me deleitava com seus sons e os guardava na memoria com carinho, mas o som do grito de agonia de minha mãe e de seus ossos se quebrando era algo que eu gostaria de ser capaz de esquecer.

Infelizmente houve outras quase fraturas, e muitos outros machucados.

Eu queria poder parar de crescer. Queria não ter de machucar minha mãe, mas não importava o que eu fizesse, o quanto eu me restringisse, eu continuava a feri-la. Aquilo estava me matando junto com ela. Eu me recusava a ser a causa de sua dor, mas principalmente, eu me recusava a ser sua morte.