Entre Otakus

Hermione


Os minutos voaram dentro do táxi. Falaram sobre o último lançamento *yaoi que Rony acidentalmente leu antes de perceber do que se tratava, sobre o programa que Hermione carregara em seu laptop que catalogava seus mangás e o patético número que ela descobriu ter de apenas cento e oitenta volumes, enquanto ele, orgulhoso, lhe disse possuir prateleiras gigantescas em seu quarto, albergando mais de mil cento e trinta exemplares.

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De repente o caminho até o evento havia se encurtado magicamente e o carro já estava ao meio fio da rua, em frente a um grande complexo metálico.

— Chegamos? — ela questionou boquiaberta.

Centenas de jovens espalhavam-se pelas calçadas ou se aglomeravam numa fila desalinhada para uma provável portaria perdida de vista. Reparou em suas roupas singulares e já pôde identificar alguns em cosplays chamativos. Intimamente, ela percebeu que estava um pouco receosa pela aventura de entrar naquele mundo.

— É isso aí. — respondeu o rapaz sacando uma carteira surrada do jeans.

— Vamos dividir a corrida. — ela prontificou-se, voltando a atenção para dentro do carro.

— Que nada. — Rony deu de ombros, já separando as notas.

— Foi meio longe, sim. Deixa eu ajudar...

— Na volta, pode ser? Agora relaxa porque eu vendi o rim do meu avô semana passada. Tô com grana de sobra aqui.

Hermione sorriu rendendo-se a condição e saiu do carro devagar. Logo ele veio juntar-se a ela na calçada e o táxi partiu. Ficaram emparelhados fitando a multidão, os ombros próximos, exceto por ele ser uns vinte centímetros além dela.

— Vamos encarar? — o ruivo quebrou o silêncio.

Ela o observou de soslaio e notou como, de perfil, o nariz dele era bem formado. Um pensamento aleatório, do qual sequer entendeu bem porque lhe ocorreu.

— Como assim “vamos encarar”? Eu achei que estava vindo com um do bando.

— Calma lá, ok! Eu te disse que esses lugares são um pouco extravagantes, e eu não sou um cara extravagante.

— Isso é você quem está dizendo. — ela deu de ombros.

— Você consegue me imaginar de Kirito do Sword Art Online, como aquele cara ali?

Hermione observou um carinha passando com um sobretudo cintilante negro, e uma espada gigante na bainha sobre a cintura.

— Não dá pra te imaginar de muita coisa com esse seu guarda-roupa permanente de jeans e moletom...

— Esse é meu estilo. Acho que você não me verá de modo muito diferente disto.

— Nada contra seu estilo. — ela anunciou.

— Que bom. Senão detonaria o seu!

— Como é meu estilo?

Ele de repente ficou sem jeito, Hermione não deixou passar, mas sustentou o olhar porque tinha uma curiosidade aguçando-a por dentro.

— Te digo depois. — Rony contornou.

— Me enrolando...

— Digo mesmo. — pôs-se a caminhar para multidão com as mãos enterradas nos bolsos — Ainda hoje.

— Vou cobrar. — ela seguiu-o.

***

Pegaram fila na bilheteria, fila na entrada porque haviam algumas editoras distribuindo folders, e fila nos corredores entre os estandes. E Hermione não percebeu seu desgaste físico em nenhum momento.

Riu foi muito, porque ambos haviam feito uma brincadeira de cutucarem o capuz do outro sempre que vissem alguma fantasia bizarra, e elas eram muitas. Rir pelas costas dos outros em franca zombetearia era algo essencialmente infantil, do qual ela precisava há tempos.

O peso das responsabilidades adultas de sua vida real soterrou esse lado descontraído, natural da garota. Sem perceber, ao lado dele, provou do elixir de seu próprio caráter novamente.

A um determinado ponto, finalmente suas pernas estavam doloridas pela caminhada, o pavilhão era gigantesco, então resolveram parar na praça de alimentação montada na ala sul.

Ela acomodou suas compras em cima da mesa e orgulhosamente retirou os títulos das sacolas para apreciá-los rapidamente. Muitas de suas escolhas foram indicadas por Rony (quase todas), outras se tratavam de títulos atrasados, dos quais não achava em lugar algum. E também havia encontrado Love Hina.

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— As garotas não costumam gostar muito de Love Hina. — Rony argumentou enquanto a observava.

— Por quê? Pelo fanservice?

— É.

— Eu gosto pela comédia e relevo fanservice. Não sou bitolada no feminismo, nem me incomodam certas insinuações.

— Percebi. Você é meio moleca.

— Você não para de me ofender não?

— Não é ofensa. — ele disse com sinceridade. Ela ficou desconcertada. Agora Rony não estava brincando. — Você me parece espontânea e bem resolvida.

Não! Não sou bem resolvida! E na maioria das vezes nem espontânea também. Contra-argumentou por dentro. Por fora, ficou lisonjeada com a observação inquirida.

— Engraçado, porque me passa a mesma impressão. — devolveu com franqueza. — Às vezes ficamos rodeados de muitas pessoas cheias de compromissos, “saudáveis responsabilidades”. Viver simplesmente tem se tornado um tanto difícil.

Preferiu não ser tão aberta. Percebeu que sua voz estava ficando melancólica.

— Tem a ver com aquela sua sogra, né? — ele fitou-a. Os cotovelos apoiados na mesa, mãos enterradas no rosto. Além do gorro escondendo seus cabelos fantásticos, ainda colocara o capuz do blusão.

— Ela me irrita demais, sim. — Hermione confessou. — Todo tempo me medindo, avaliando meu grau de competência para seu filho. Um olhar diferente, mas constantemente reprovador sempre que me vê.

— Faz tempo que aguenta isso?

— Alguns anos já. Agora que estamos definitivamente certos no altar, tem sido mais implacável e eu tenho de aturar. Por ele, por nós.

— Minha mãe conhece umas mandingas malucas da América do Sul. Jogar sal por cima do ombro, colocar a vassoura de ponta cabeça atrás da porta... Parece que tudo isso funciona contra bruxaria.

Ela riu mais descontraída.

— Nem devia estar te aborrecendo com isto.

— Você fica em dívida comigo.

— Mais? O táxi, me acompanhar até aqui, reservar meus mangás... Mais dívidas?

— Pois é.

Embora tivesse se sentindo tola no início, Hermione percebeu que falar mal de sua sogra para alguém a deixava um tanto leve. Uma espécie de vingança. Fez uma anotação mental de fazer isso mais vezes.

Logo eles levantaram-se de novo e continuaram a explorar a feira. As sacolas recheadas de itens foi ficando mais pesada, então ele prontificou-se a carregar a maioria das coisas dela.

Se divertiram muito mais pelo resto do dia. Esse tal Ronald Weasley mostrou ser um cara pra lá de engraçado.