Entre Eles: I - O começo

Por volta das sete da manhã, a cantina da universidade costumava estar quase vazia. Normalmente só era possível encontrar os funcionários que nela trabalhavam e um ou dois alunos tomando uma xícara do delicioso café com leite que ela servia.

Naquela manhã, o extenso balcão de mármore, que dividia a cozinha universitária das mesas de refeições, era ocupado por dois professores. Um deles – alto, cabelos ruivos e olhos azuis piscina tão frios quanto uma noite no Polo Norte – era um dos professores mais odiados e temidos do campus. Falando assim, até parece que por onde ele passa deixa um ar de tensão quase palpável, o que é de tudo verdade, mas como a maioria dos assuntos que circulam sua vida por obrigação, ele pouco se importava. Tomava tranquilamente uma xícara de café puro acompanhado de uma pequena porção de biscoitos servidos em um pires de porcelana, posicionado ao lado do crachá jogado de qualquer forma no balcão em que dizia que seu dono tinha como identificação Doutor Ronald Weasley, Professor e Coordenador do centro de História da Universidade de Londres.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

O outro – um pouco mais baixo que o amigo, de cabelos negros que cresciam para todos os lados e olhos verdes vibrantes que se escondiam atrás de um óculos de armação fina e redonda – era o professor de literatura clássica. Costumava ser sempre simpático com seus alunos, apesar de problemas que vinha tendo de uns tempos para cá estarem o deixando um tanto estressado. Seu pedido na cantina era sempre o mesmo, um copo de leite acompanhando de meio pão com manteiga. Para aqueles funcionários, ele gostava de ser chamado pelo primeiro nome, apenas Harry, como um amigo acima de tudo. Porém, era preciso manter um nível inquebrável de respeito na sala de aula e nos corredores, sendo apenas solicitado de Professor ou Senhor Potter para os seus alunos.

Os dois conversavam sobre um assunto não muito agradável, mas que Harry tinha a necessidade de compartilhar e só poderia fazer isso com o melhor amigo desde os tempos do colegial, Ron para os íntimos.

– Ela assinou o divórcio?! – o ruivo perguntou fingindo estar surpreso, descansando a xícara de café na superfície de mármore.

– Um alivio que já não era sem tempo – o moreno suspirou batendo na camisa social para tirar algumas migalhas de pão. – Mas você já deve imaginar o escândalo que houve no fórum.

Ronald se viu fazendo parte da cena, estava tão concentrado que nem percebeu quando uma garota de pele morena sentou-se um pouco próxima dos dois. Harry também não viu, sua mente viajava pelo estresse da audiência no dia anterior.

– Conhecendo-a como conheço, parece até que eu estava lá – o ruivo riu sem vontade, jogando uma nota de dez no balcão enquanto pegava seu crachá, se levantando em seguida – Quanto ela pediu?

– Uma mesada bem gorda, com a intenção de me prejudicar, é claro – o outro respondeu seguindo o amigo até o prédio de ensino. – Sem sucesso, já que o que ela me tira todo mês é o mesmo valor que cai na minha conta quase toda semana.

– No que anda investindo agora?

– Em uma marca de jeans nova no mercado. Hum... Só não me recordo do nome, mas isso pouco me importa, contanto que esteja rendendo. E prefiro dar tudo que tenho a Cho, do que voltar a viver uma vida ao lado dela.

– Engraçado será quando ela voltar das férias... Os dias nessa universidade prometem ser um inferno para você – Ronald comentou.

– Nem me fale – Harry bufou pondo as mãos nos bolsos. Os dois professores agora andavam abrindo caminho por entre os alunos nos corredores brancos do prédio de ensino, com muita facilidade, é claro. Já que qualquer alma que tivesse amor pela vida sairia do caminho deles, ou melhor, do professor de História, sem nem precisar fazer contato visual – Mas somos de núcleos totalmente diferentes, vai ser fácil evitá-la... Há aí o primeiro erro entre eu e ela.

– Que erro?

– Letras e números... Equações sempre são problemas.

– Tenho que concordar.

.:x:.

– Divorciado? – Parvati questionou boquiaberta para as outras garotas sentadas a mesa.

– Os dois estavam conversando no balcão da cantina, foi o que eu consegui ouvir. Mas sim, a professora Chang parece ter finalmente assinado o divorcio – Angelina confirmou.

– Vocês duas deviam ter vergonha disso – Luna as repreendeu baixando a revista que lia.

– Falar da vida dos professores é o nosso único passatempo aqui dentro, Luna. Não encha o saco, por favor. – Parvati ralhou.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

– Concordo com a Luna, deve esta sendo uma barra para o professor Potter – Hermione se manifestou. – Vocês deveriam estar preocupadas com os seminários da próxima semana ou até algo um tanto fútil, mas que não envolva a vida íntima dos outros, como o baile do fim do semestre.

– Sentida pelo Potter, Granger? – Angelina questionou com veneno – Quem diria, não é mesmo?

– O que quer dizer com isso, Angelina?

– Nada, querida... Mas lembrem-se de que a regra é clara: nada de relacionamentos de alunos e professores.

– Enlouqueceu?

– Claro que não, querida. Mas ninguém em sã consciência sente pena de professores ridículos ou se queimam tanto assim por comentários sem importância como os nossos. É só uma brincadeira, florzinha.

– Vamos embora, Hermione. Hoje elas estão com tudo – chamou Luna se aborrecendo e levantando-se da mesa, pondo um fim na discussão – A gente se fala depois, meninas.

Hermione pegou suas coisas e com um último olhar de desaprovação deixou a mesa no meio do pátio. Ela e Luna caminharam até o prédio de ensino em silêncio, seguindo para o segundo andar, onde teriam duas aulas de História Global.

Era uma terça-feira ensolarada e fresca, com brisas a se deliciar por todos os lados. O dia parecia perfeito e até poderia ser para as duas amigas, se ambas não tivessem de enfrentar duas horas de aula. O cansaço antecipado não era por causa da matéria, mas sim pelo professor que a aplicava.

– Pronta para mais uma aula do Weasley, O Terrível? – Luna fez graça sentando-se em uma carteira ao fundo.

– Admiraria você se eu dissesse que não? – Hermione quis saber sentando-se ao lado da amiga – Estou tão cansada, passei o fim de semana preparando o seminário dele e tenho quase certeza que apesar de todo meu esforço, ele achará uns quinhentos erros.

– Mas essa apresentação não é só pra próxima semana?

– É, mas não quero deixar tudo pra última hora. E todo o tempo que eu tiver para me dedicar a esse trabalho é precioso. Você sabe...

– Ele pega mais pesado com você do que com o resto da turma, - Luna franziu a testa – Mas não se pode desanimar de qualquer forma, só temos mais um semestre aqui e adeus Ronald Weasley!

– Não sei se terei tanta sorte, prevejo minha reprovação na matéria dele se minhas notas não melhorarem... – Hermione suspirou cansada.

– Não perca as esperanças tão cedo, Mione... Ele ainda pode levar uma topada e bater fortemente com a cabeça.

– Que horror, Luna! Nunca se deseja a morte de ninguém!

– Morte? Quem aqui está desejando morte de alguém? Só quero que ele se fira gravemente, nada mais.

Hermione focava a amiga descrente pronta para argumentar novamente, quando ele passou pela porta. Sua cara constantemente zangada estava pior do que qualquer dia anterior, caso fosse possível. Suas roupas, milimetricamente engomadas, passavam ainda mais o perfil de carrasco que ele adquiriu durante os anos. O blazer preto por cima de uma camisa social cinza era um belo contraste para sua pele pálida e valorizava muito seus olhos azuis e seus cabelos ruivos...

– Você deixaria de brigar com os seus sentimentos se ele fosse tão lindo de espírito quanto ele é fisicamente, não deixaria? – Luna perguntou em um sussurro surpreendendo a morena do seu lado.

– O quê?! – Hermione, para sua desgraça, deixou escapar o espanto completamente audível para a sala toda. Suas preces para que o Prof. Weasley não se importasse foram, obviamente, em vão.

– Eu acho que fui bem claro no meu primeiro dia de aula, que, após meus pés atravessarem a linha daquela porta, a sala tinha que estar em silêncio, absoluto... Lembra-se Srta. Granger? – ele ralhou largando sua pasta em cima do birô.

A sala, já lotada, se virou inteira para encarar a morena encolhida no fundo. Hermione sentiu seu rosto esquentar com toda aquela atenção indesejada e, como sempre, não fazia ideia do que fazer.

– Estou esperando sua resposta, Srta. Granger – a voz do ruivo ecoou dominante no ambiente mais uma vez, fazendo a aluna em questão tremer.

– Desculpe-me, professor. Isso não vai mais acontecer – ela respondeu rezando para que ele se contentar com isso e começasse logo a dar sua aula.

– Não acha que suas roupas estão um pouco inadequadas para minha aula? – Ronald continuou. Uma pequena elevação no canto dos seus lábios demonstrava uma diversão diabólica com toda aquela situação.

Pelo amor de Deus, porque diabos uma regata e uma calça jeans podem fazer de tanto mal?, ela se questionou mentalmente.

– Posso quase ler seus pensamentos, Srta. Granger – ele continuou deixando-a mais vermelha e encolhida. – E juro que tento entender que o dia está com um clima agradável e que usar uma camiseta um pouco mais fechada seja um tanto difícil, mas na minha aula eu gostaria de ver esse esforço.

Foi ai que a morena se deu conta do que realmente está acontecendo e a raiva lhe subiu pela cabeça. Luna percebeu, mas já era tarde demais para impedir que Hermione levanta-se com a face fervendo.

– Acho que o senhor não tem nada a ver com o que eu visto ou deixo de vestir e enquanto eu não estiver mostrando o que importa por ai, qualquer roupa mais prática serve – as palavras saíram como balas de metralhadora de sua boca – E se me der licença, sua aula já estava insuportável mesmo antes do senhor aparecer.

Ao fechar a boca, Hermione atravessou a sala como um furacão, sumindo ao passar pela porta. Deixando mais de trinta alunos boquiabertos e um professor furioso.

.:x:.

– Sr. Potter, seria bom que o senhor passasse a entregar seus planos de aula pontualmente – Gina Weasley parecia muito irritada sentada atrás de sua mesa. – E não é a primeira vez que faço essa reclamação.

– Vou tentar ser mais pontual na próxima – ele a garantiu descansando um envelope amarelado em cima da mesa – Mas não posso prometer.

– Não compreendo o porquê – a ruiva ironizou.

– E nem poderia, a senhorita não está se divorciando – o moreno devolveu com um meio sorriso, mas seu tom voz era seco.

Aquele maldito meio sorriso, que combinava perfeitamente com aquelas duas esmeraldas que ele tinha como olhos, fazia o coração da professora e coordenadora de línguas vacilar perigosamente. Mas ela preferia morrer a admitir isso, para qualquer um que fosse.

– Saia da minha sala, Potter – foi gélida.

– Eu sei que você me adora, Gina. Por que negar o prazer da minha companhia? – ele brincou.

– Você é uma pessoa insuportável, sabia?

– Mas você adora quando eu vou visitar sua família e preparo aquela macarronada...

– Sabe muito bem que só tem o seu espaço naquela família por causa de Ronald, mas por mim, eu mandaria você ir à merda.

– Uma escritora renomada não deveria falar nesse nível – ele disse se divertindo a cada vez mais que o rosto da ruiva ficava vermelho.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

– Suma da minha sala, Potter. Não tem nada mais para ver aqui! – ela bateu o punho no birô. Ficando ainda mais irritada pelo fato de estar tão irritada com aquele ser na sua frente.

– Tenha um ótimo dia também, Srta. Weasley. – Harry se retirou dando altas gargalhadas.

.:x:.

– Vamos lá, Malfoy! – um dos amigos exclamou – É uma aposta muito simples.

– É cara! – o outro concordou eufórico – Você só precisa seduzi-la, fazê-la se sentir especial e larga-la. Fim.

– Que crueldade! – o loiro debochou – A mente de vocês está ficando pior do que a minha. É um belo plano, mas para uma vingança. O que eu ia ganhar fazendo isso com a Lovegood?

– Dinheiro!

– Isso eu já tenho até demais, seus idiotas.

– Então faça pela diversão, Draco!

– Essa diversão não me parece valer a pena, Rafael. É muita perda de tempo. Me deem um motivo mais plausível.

– As falsificações vão ser suspendidas – Tom ameaçou.

– Você não seria capaz de fazer isso, Tommy! Eu lhe pago muito bem! – Draco se aborreceu lembrando ao amigo.

– Dinheiro é outra coisa que nós três aqui temos de sobra. Ou você faz o que estamos lhe pedindo, ou o seu pai vai ficar sabendo de um monte de coisas.

Malfoy se viu encurralado pelos olhares firmes dos “amigos”. Não poderia colocar tudo em risco negando o que eles estavam lhe pedindo, mas mesmo que aceita-se, precisava saber o real motivo de tudo aquilo.

– Por que ela? – perguntou.

– Isso não é da sua conta – Rafael respondeu ríspido.

– É claro que é! Se vou aceitar essa merda toda, preciso saber o porquê!

– Talvez quando tudo isso acabar você saiba – Tom disse – Mas por enquanto, você só precisa fazer o combinado e seu pai estará orgulhoso de você no fim do semestre.

Draco bufou se levantando com tudo da mesa. Estava frustrado com toda aquela situação e ainda mais irritado por não estar no controle. Deu uma última olhada para os dois colegas ainda sentados com expressões divertidas nos olhos e lhes disse:

– Eu vou fazer isso. Mas se houver um simples errinho nas impressões do seu trabalho, Tom. Eu vou ferrar com as suas vidas e vocês sabem muito bem que eu posso.