Cheguei a casa e meu pai já havia chegado, minha mãe estava na cozinha e ele sentado no sofá. Os dois estavam em silêncio. Isso não era estranho, mas eu não me sentia bem, meu coração estava apertado. Aquilo sim era estranho.

–Oi, pai.

Ele não me respondeu, talvez não notasse a minha presença. Resolvi ignorar. Subi as escadas e fui para o meu quarto, acho que com barulho meu pai percebeu que eu estava em casa.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

Fui tomar banho e, ao sair do banheiro, me deparei com gritos vindos da sala.

Você acha que eu aguentarei isso todo dia!? – Era a voz da minha mãe.

–Eu não estou pedindo nada! Só quero que fale direito comigo, tá bom?

–Você está sempre certo, eu não posso abrir a boca para reclamar de nada, né?

–Você tem tudo! Não entendo por que reclama.

–Com certeza lá na rua as meninas que ficam te esperando não reclamam, por isso você acha que eu não devo reclamar também. Pensa que eu não sei!

–Que meninas?! Você está louca?!

–Que meninas? QUE MENINAS? Eu que te pergunto! Quando eu pergunto onde você estava, nunca me responde.

–Você está mudando de assunto, isso sim. E, que saber? Eu não sou obrigado a ouvir isso!

–Então sai de casa! Elas estarão te esperando mesmo! É melhor do que ficar aqui, já que você acha que só sei reclamar! – A voz da minha mãe parecia de choro.

–Olha o que você está dizendo! Já percebeu o escândalo que está fazendo?

Engoli a seco, faz tempo que não ouvia as brigas dos meus pais. Pensei em descer e intervir. Mas senti medo, sei lá. Meu pai não seria louco de... Bem, eu sei que não. Se eu fosse até lá, poderia agravar mais a briga deles.

Respirei fundo e pensei em mil coisas ao mesmo tempo. Caminhei involuntariamente até minha cômoda e peguei um caderno, depois saí do meu quarto, desci as escadas e fui para a sala.

–Tá vendo, até seu filho não aguenta isso. – Disse meu pai, ao perceber minha presença.

–Seu filho também, tá? E, se ele não aguenta, a culpa é sua. Eu estava em paz aqui em casa.

–Então eu que causo isso tudo, né?

–Eu não disse isso! – Minha mãe estava quase chorando, passei direto entre os dois.

–Ronan, a sua mãe está dizendo que eu fico comprando as coisas para agradar as pessoas de fora do que aqui dentro de casa.

–Mas não é verdade, filho? Ele só quer comprar coisa cara, mas o essencial mesmo não compra.

–Ronan! – Meu pai me chamou, esperando a minha resposta. Talvez para decidir quem estivesse certo e quem estivesse errado.

Parei na porta, levei minha mão até a maçaneta, mas não abri.

–Eu nasci do amor dos dois, não da briga. Então não me coloquem no meio disso tudo, porque eu não suporto quando as coisas chegam nesse ponto! – Gritei para que eles entendessem nitidamente o que eu estava sentindo.

Saí e bati a porta. O silêncio pairou na sala. Elesis chegava de moto com o Lass, estava tão abalado com o que estava acontecendo, que nem liguei muito. Sentei-me da calçada.

Abaixei meu rosto e uni meu joelho na altura do meu peito, envolvendo meus braços nele. Estava frio, fiquei com raiva por isso, poderia estar fazendo calor, pelo menos para aquecer e confortar a minha dor e o frio que eu sentia em meus profundos sentimentos.

O caderno que eu havia pegado estava na calçada gélida por causa do tempo, olhei de canto para ele, tinha um lápis dentro do arame. O retirei dali e abri o caderno.

Eu havia começado esse carta... Na verdade nem sei mais o que isso é. Mas agora, nesse exato momento que escrevo, queria ter você ao meu lado, como em nossa infância, que você me ajudava a superar a dor de perder uma bola de gude num jogo a vera. Eu sei que isso é bem idiota, mas... Elesis... Você me faz muita falta.”.

Dei um ponto final no que escrevia e fechei o caderno com força. O que eu estava fazendo mesmo? Tudo estava voltando a ficar confuso... Que merda... Quando eu penso que minha vida voltaria a ficar normal, na medida do possível, tudo muda da água para o vinho!

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

Voltei a me encolher na calçada, envolvendo-me com meus braços para suprir o frio que eu sentia. Meus pais haviam voltado a discutir, mas não dava para ouvir claramente o que eles diziam, também não fiz questão de descobrir. Fechei os olhos com força, não queria saber de mais nada!

–Não fica assim. – Ouvi um sussurro em meu ouvido.

Era ela. Elesis. Eu não estava sonhando. Era ela. Sua voz invadindo a minha mente e me fazendo sorrir em meio a uma escuridão de tristeza que me encontrava.

Senti o calor de seu corpo, ou seja, ela estava ao meu lado. Não tive coragem de olha-la.

–Por que está aqui? – Perguntei, ainda de cabeça baixa e o tom da minha voz também saiu baixo.

–Não sei... – Mas Elesis me ouviu...

Virei meu rosto e passei as costas da minha mão em meus olhos, eles estavam úmidos.

–Então... – Elesis continuou – Faz um mês que não nos falamos depois que eu vim na sua casa, né?

Apenas assenti positivamente, não queria falar muita coisa, estava impossibilitado de tocar naquele assunto, pois só de lembrar, meu coração apertava angustiosamente. Era tão estranho sentir algo conotativo...

–Você já sabia que isso iria acontecer... – Mencionou ela e eu queria muito lembrar da vez que aconteceu algo parecido e Elesis havia ficado sem falar comigo, por ter desabafado, mas eu não conseguia formular a cena, nem o que de fato aconteceu... Eu estava perdendo as minhas lembranças infantis... Eu... O que estava acontecendo comigo?!

Uma dor de cabeça tomou conta de mim. Elesis percebeu que eu não estava bem. Ela, então, se levantou e parou a minha frente.

–Vai ficar me ignorando, é isso? Ronan! O que se passa na sua mente quando estamos juntos? Você me diz tanta coisa, hoje mesmo, na escola, ouvi uma história linda e... Agora, assim como em outros encontros, você não diz absolutamente nada!

Eu fechei os olhos lentamente, respirei fundo para controlar as minhas emoções e tomei coragem para encara-la.

–Seus olhos... – Observou a ruiva – Estão vermelhos...

Permaneci em silêncio. Eu não estava mais suportando aquilo. Estava sobrecarregado. Meus pais brigando, minha cabeça explodindo, eu perdido em minhas próprias mágoas, Elesis bem na minha frente... A vida estava sendo cruel comigo.

Elesis olhou, de relance, para o caderno que estava ao meu lado. Ela parecia não ter visto quando se sentou na calçada. Temi que a ruiva o pegasse, mas ela nada fez. Eu deveria falar alguma coisa. Estava de noite e Elesis poderia ir embora a qualquer momento.

–Eu... – Dei início a minha fala, mas não sabia como prosseguir.

Elesis me olhou com mais atenção.

–Eu estou confuso. – Concluí.

–Eu também estou confusa.

–Estamos confusos. Isso é ruim.

Elesis deixou escapar um breve riso e eu acabei rindo também.

–Quer me contar alguma coisa, Ronan? – Questionou a ruiva, me surpreendendo.

Eu queria contar tudo de uma vez. Mas algo me impedia.

Ronan OFF

Elesis ON

Eu olhava para Ronan e não parecia ser ele ali, bem na minha frente. Algo o perturbava e eu não sabia distinguir o que era. Eu também queria contar algo para ele, talvez dizer logo que estou com uma angústia enorme em meu coração e que, depois do que ouvi hoje, não tinha o porquê de ainda continuarmos nessa separação que nos machuca tanto.

A culpa é minha, porque não aceitei logo os fatos quando desabafei. Mas eu não poderia falar aquilo tudo e depois o abraçar, não era simples. Não seria eu ali. Eu precisava saber se o Ronan estava realmente disposto a recomeçar do zero, sem permitir que as lembranças de três anos atrás atrapalhassem nossa amizade.

O silêncio que Ronan fazia estava me dando nos nervos. Talvez eu devesse contar algo a ele, para encoraja-lo. Sei lá.

–Eu tenho algo a dizer. – Por fim, disse num impulso.

–Diga. – Sua voz saiu trêmula, não havia entendido o motivo. Ronan sofria por alguma coisa... Seu sofrimento se refletia em seus olhos úmidos e vermelhos, como se houvesse chorado ou estivesse perto disso e relutando para não deixar a lágrima invadir sua face.

–Quando nos falamos na hora da entrada, em que... Bem... Recordamo-nos do colar que eu sempre usei e você também usa. – Disse, segurando o meu pingente – Logo depois o Lass apareceu. Nós conversamos e...

Senti que Ronan fez menção de se levantar, mas continuou sentado, olhando para mim como se eu fosse a única imagem existente naquele espaço. Estava ficando enrubescida, com certeza.

–O Lass queria saber mais sobre o que eu sentia em relação a você. Ele é sempre frio em relação a sentimentos, então não deixei que a emoção aflorasse dentro de mim, como aconteceu quando conversamos.

–E... E o que você disse? – Ronan me perguntou e eu pude sentir que sua voz havia voltado ao normal.

–Que você é o meu melhor amigo e, por isso, estávamos conversando. Mas que eu daria um tempo, depois de uma conversa que teria com você, para recolocar meus pensamentos em ordem.

Elesis OFF

Ronan ON

“Você é o meu melhor amigo”, Elesis disse isso no presente, ou seja... Não acredito! Eu esperei tanto ouvir isso novamente e ela me diz bem quando mais preciso. Ela me considera seu amigo de novo, ou melhor, seu melhor amigo. Eu quebrei a barreira!

Levantei-me num impulso de felicidade e Elesis deu um passo para trás. Meu coração estava disparado.

–O Lass... O que ele achou disso? – Perguntei, curioso.

–Ér... – Elesis estava ficando corada, acho que me aproximei de mais. Ao perceber isso, afastei-me um pouco dela, então Elesis continuou – Ele não disse mais nada. Apenas ficou me olhando e eu deduzi que Lass havia entendido a minha situação.

Um sorriso brotou em meus lábios. A vida estava sendo mais carinhosa comigo. Mas não foi por muito tempo.

Sai daqui! Eu já disse que não quero mais você perto de mim!

Minha perna bambeou para trás, senti uma leve tontura e tentei me apoiar em algo, mas não tinha nada. Elesis percebeu que eu estava prestes a cair e me segurou firme, seus olhos esbugalharam assustados.

–Mãe... – Sussurrei.

A ruiva me ajudou a me recompor e depois encarou a porta a minha frente, acho que deu para ela perceber o que estava acontecendo.

–Seus pais estão brigando? Eu ouvi a voz da tia bem alterada... – Disse ela, olhando para mim e segurando em minha mão.

–Estou com medo. – Foram as únicas palavras que eu consegui responder naquele momento.