Estamos prontos para levantar acampamento e Katniss pede para eu ajudar Beetee a se levantar e caminhar. Ironia isso, pois eu mal estou me aguentando. Finnick dá um passo a frente, mas eu lhe lanço um olhar que faz ele recuar. Se é pra Katniss acreditar que estou bem, tenho que fazer mais coisas além de dormir. Trêmulo, eu agarro os braços de Beetee, mas ele se recusa a sair do lugar. Que droga.

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– Wire – ele chama com o olhar perdido.

— Ela está aqui — digo, e tento mais uma vez levanta-lo. Sem sucesso. — Wiress está bem. Ela está vindo, também.

Ele não se mexe. Em condições normais eu levantaria ele facilmente, mas no estado em que estou, me vejo escorando em seu corpo para não vacilar, e consequentemente cair.

— Wire — ele insiste.

— Ah, eu sei o que ele quer — Johanna diz impaciente.

Ela anda alguns metros e pega uma espécie cilindro, que está coberto de sangue seco. Este objeto estava com Beetee quando despimos ele. Me pergunto o que pode ser.

— Essa coisa inútil. É algum tipo de arame ou algo assim. Foi como ele se cortou. Correu para a Cornucópia para pegar isso. Não sei que tipo de arma isso deve ser. Acho que você pode retirar um pedaço e usá-lo para estrangular ou algo assim – diz Johanna.

— Ele ganhou os Jogos dele com arame. Construindo uma armadilha elétrica — relembro. — É a melhor arma que ele poderia ter.

Katniss estreita os olhos.

— Parece que você já tinha chegado a essa conclusão — ela diz encarando Johanna. — Já que você o apelidou de Parafuso e tudo.

Uma cor avermelhada vai subindo pelo rosto de Johanna, enquanto ela mantem os olhos fixos em Katniss.

— Sim, isso foi realmente algo estúpido da minha parte, não foi? — ela diz, alterada. — Acho que estive distraída mantendo seus amiguinhos vivos. Enquanto você estava... o quê, mesmo? Deixando Mags ser morta?

Katniss respira ofegante, seus dedos encontram a faca em seu cinto. Não vou deixar isso acontecer.

— Vá em frente. Tente. Não me importo se está no comando, vou rasgar sua garganta— diz Johanna.

São coisas como essas que me deixam confuso sobre o fato de eu gostar de Johanna. Como eu posso gostar de alguém que fala sem pudores que vai rasgar a garganta da garota que eu amo?

— Talvez seja melhor nós termos cuidado onde pisamos — Finnick diz num tom sombrio, e lança um olhar para Katniss. Ele pega o rolo das mãos de Johanna e joga para Beetee. Acho que tudo está mais calmo, por enquanto.

— Aí o seu arame, Parafuso. Preste atenção onde você o coloca – ele avisa, seriamente.

Beetee parece ter saído do seu transe quando seu objeto o acerta em cheio no peito. Ele então se levanta, e eu não preciso fazer força alguma para ajudá-lo.

— Para onde? – pergunto sentindo uma ansiedade estranha correr pelo meu corpo.

— Gostaria de ir para a Cornucópia e observar. Só para ter certeza de que estamos certos sobre o relógio — diz Finnick.

Não tendo nenhuma objeção, seguimos para a grande coisa de metal dourada, na esperança de entender melhor a arena, e assim, ficar longe de seus horrores.

Eu apoio Beetee sobre meus ombros, mas na verdade eu estou mais me apoiando nele do que o carregando. Percebendo isso ele me lança um olhar interrogador, mas não diz nada. Eu começo a pensar que estamos chegando ao fim disso. Poucas pessoas restam, e a maioria dos vencedores, está comigo e Katniss, são nossos aliados. Eu realmente gostaria que fosse uma regra nesse jogo não fazer aliados. É cruel o que estou pensando, mas eu não me abalaria muito com a morte de porca e parafuso. Afinal, na maior parte do tempo eles parecem alheios a vida real. A capital já fez um estrago irreversível na vida deles. Mas quando penso em Chaff, Finnick e Johanna... Eu nunca seria capaz de machuca-los. Mas será que fariam o mesmo por mim? Será que teriam coragem de matar a mim ou a Katniss? Eu não sei, mas eu realmente espero que não. Quando chegamos a cornucópia, coloco Beete sentado no chão, e inspiro e expiro devagar, na intenção de fazer o ar circular dentro de mim. Beetee chama Wiress e pede para que ela limpe o rolo, ela assente e vai para a beira do mar, extremamente contente com a tarefa que lhe foi designada. Ela começa a cantar uma cantiga infantil enquanto lava o cilindro, e é quase débil o modo como ela canta. Me faz sentir pena. Ela não deveria ser assim antes do jogo que venceu. Devia ser uma pessoa normal, apenas inteligente. Com a cabeça baixa, me afasto incapaz de continuar a ver a desgraça que a capital fez com essas pessoas, e comigo também, penso enquanto manco discretamente com minha perna artificial. Sento em uma sombra, e vejo uma enorme folha de árvore no chão. Nunca tinha visto uma folha deste tamanho. Mas as coisas aqui estão longe de serem normais. Com a ponta da minha faca começo a fazer algo para me distrair. Mas não só pra isso, começo a desenhar algo na folha que pode ser bem útil para nós. Usando o único dom que tenho, reproduzo perfeitamente a cornucópia, e suas supostas doze sessões. É quando eu sinto alguém se aproximando. Me viro, alerta e encontro Katniss me observando.

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Sorrio.

— Olhe como a Cornucópia está posicionada — digo. Ela examina atentamente meu desenho, e assente.

— O final aponta para doze horas — ela diz.

— Certo, então este é o início do nosso relógio — continuo, desenhando os números de um a doze ao redor da “arena-relógio”. — Doze é a zona do relâmpago.

Vou desenhando em cada sessão, a ameaça que ela reproduz. Os macacos, a neblina, o raio.

— E das 10 às 11 é a onda — Katniss acrescenta.

Assinto, e marco mais essa ameaça. Johanna e Finnick se juntam a nós, e eu fico impressionado ao perceber o quanto estão armados. Não sei se tudo isso é mesmo necessário, mas enfim, contanto que essas armas não matem Katniss, por mim está tudo bem. Tenho vontade de rir, ao olhar apenas para minha faca, quando Johanna tem três machados.

– Bem, é muito mais do que nós sabíamos esta manhã, de qualquer forma – digo quando termino. Todos assentem, e eu sinto uma espécie de determinação pairando no ar. A selva não irá nos matar. Conseguimos ao menos isso, fazer esses idealizadores de bobos. Me sinto quase feliz. Mas tudo isso acaba, quando vejo Katniss se virar para trás, colocar uma flecha em seu arco, e atirar. A flecha atinge a cabeça de Gloss, que segura em seu colo a cabeça de Wiress pendendo do pescoço. Horrorizado, recuo, enquanto Johanna lança seu machado no peito de Cashmere, e Finnick com seu tridente, bate numa lança que com toda certeza me acertaria em cheio. Me levanto a tempo de me desviar de uma faca lançada na minha direção por Enobaria. Com toda a adrenalina, começo a correr com os outros atrás desses dois carreiristas. Foram os únicos vencedores que eu não gostei nem por um minuto. São os únicos que tem sede de sangue. Que querem matar, por diversão. E é nesse momento, quando estamos perto de alcança-los, que o chão ao redor da cornucópia dá um solavanco, e começa a girar descontroladamente, arremessando meu corpo para longe. Me seguro em uma rocha, enquanto uma mistura de areia e água torna quase impossível respirar ou enxergar algo. Sinto a gravidade puxando meu corpo para baixo. Sei que se eu não me segurar, posso cair e me afogar. Mas nada disso importa, pois meu único pensamento é acerca de onde Katniss está, e quanto mais eu penso sobre isso, mais minha mão escorrega e mais rapidamente o chão roda, com meu desespero crescendo na mesma proporção.