Capítulo 11

Volto a me concentrar no lugar onde estou. Todos os rostos encarando a mim e a Katniss. Imagens de pessoas morrendo de fome no distrito 12 surgem em minha mente. Sei que o que eu pensava até agora, chega a ser fútil, mesmo que me faça sofrer. O que é querer o amor de alguém, comparado a querer um pouco de comida?

— Você segue em frente, pensando que pode lidar com isso, pensando que talvez não sejam tão ruins, e então... – não sou capaz de terminar a frase.

Katniss pondera o que acabo de dizer, mas sei que ela acha o mesmo. Deve ser ainda mais revoltante para ela, que já se encontrou nessa situação, de quase morrer de fome.

— Peeta, eles nos trouxeram aqui para lutar até a morte para seu entretenimento —ela sussurra. — Sério, isso não é nada em comparação.

Percebo que não há ninguém perto o suficiente para escutar nossa conversa. E a equipe de filmagem está se dando um tempo de folga na mesa dos mariscos. Decido tocar no assunto.

— Eu sei. Eu sei disso. É só que às vezes eu não consigo suportar. Até que... eu não sei o que farei. — Suspiro. — talvez estejamos enganados, Katniss.

— Sobre o quê? — ela pergunta.

— Sobre tentar acalmar as coisas nos distritos.

Katniss olha para todos os lados, assustada com a hipótese de alguém nos escutar. Já verifiquei isso, mas ela está certa. Pode ter sempre alguém a nos vigiar.

— Desculpe — falo.

— Guarde isso para quando estivermos em casa — ela responde entre dentes.

Neste exato momento, Portia nos surpreende com a sua presença, acompanhada de um homem corpulento. Nunca o vi antes, mas Katniss o olha como se fosse familiar. Minha estilista o apresenta como Plutarh Heavensbee, o novo idealizador chefe dos jogos. Um arrepio percorre meu corpo quando ele pede para dançar com Katniss. Vejo que as câmeras voltaram a nos filmar, e com o sorriso mais falso que consigo obter assinto.

– Mas é claro! Só não fique muito agarrado com a minha bela noiva – brinco.

Katniss me olha de soslaio como se dissesse – eu não quero dançar com este homem – mas é tarde demais, e ela já está rodopiando com ele no salão.

Mal pisco e muitas pessoas vem em minha direção, me parabenizando pelo noivado, por minhas telas, e tudo o que consigo me lembrar é do líquido que faz as pessoas vomitarem para comer mais. Vou agradecendo, e me afastando cada vez mais daquelas pessoas, que agora não me causam compaixão, e curiosidade, me causam repulsa. De repente, me deparo com uma mesa cheia de bolos. Um mais belo que o outro. Consigo experimentar um pequeno pedaço de um bolo com recheio de frutas vermelhas com chocolate, e glacê. Estou terminando de engolir, quando avisto padeiros se acotovelando pelo salão e sei que eles estão vindo em minha direção. Eles são mestres da decoração e sabor, mas me vejo falando sobre meus simples truques de padeiro. Me sinto engrandecido quando vejo que todos olham vidrados para mim, enquanto falo sobre como fazer uma boa massa. Na verdade eu poderia começar a falar de qualquer outra coisa, até sobre porcos no chiqueiro, que eu acho que eles continuariam me olhando como se eu fosse um Deus. Katniss aparece, e me sinto aliviado por estar tudo bem com ela, e por poder finalmente acabar com minha palestra boba. Digo para um dos padeiros providenciar um bocado de doces para que eu leve ao distrito 12 e examine com mais calma. Mas na verdade, esses doces servirão para colocar um sorriso no rosto daquelas crianças que passam fome. Que mal faz tirar de quem esbanja, para dar a quem não tem?

— Effie disse que temos que estar no trem à uma. Eu me pergunto que horas são — digo para Katniss, pegando sua mão.

— Quase meia-noite — ela responde num tom sombrio, e arranca uma flor de chocolate de um dos bolos, roendo-a sem um pingo de boas maneiras. Eu sorrio. Effie que adoraria ver isso.

— É hora de dizer obrigado e adeus! — Effie grita, no exato instante em que Katniss está se lambuzando com a flor.

Encontramos Cinna e Portia, e começamos a nossa despedida, mas só para as pessoas mais importantes. Que eu nem sei quem são.

— Não deveríamos agradecer ao Presidente Snow? — pergunto, numa tentativa de descobrir se ele está contente com o que Katniss e eu fizemos. — É a casa dele.

— Oh, ele não gosta muito de festas. Muito ocupado — Effie conta. — Eu já organizei para que as anotações e presentes necessários sejam entregues a ele amanhã. Aí está você!

Effie acena para dois atendentes da capital que carregam Haymitch nos braços. Não vi ele a noite toda. Devia estar muito ocupado bebendo tudo o que visse pela frente. Espero que ele não tenha bebido o liquido daquelas malditas tacinhas por engano. O percurso até a estação é lento, mas conseguimos chegar – graças a Effie e sua pontualidade exagerada – pontualmente a uma da manhã no trem. Haymitch é depositado em seu quarto e o restante de nós bebe um pouco de chá na sala. O trem ganha velocidade e Effie nos relembra de que a turnê ainda não acabou, ainda teremos nossa última parada em nosso lar, o distrito 12 para o encerramento. Katniss é a primeira a se retirar. Eu fico na sala até todos irem dormir. Fico repensando os acontecimentos desta noite. Cansado demais, vou até meu quarto, e tomo um longo banho, mas parece que é tão errado eu me deitar sem Katniss ao meu lado. Já me acostumei com isso. Imagino como será quando voltarmos para casa, e eu ter de conviver com o fato de ter que me separar dela de novo. Como uma sombra na escuridão, visto um agasalho e saio do meu quarto. Sem fazer o menor barulho ando com uma direção certa. Chego em frente a porta e penso em bater. Desisto e simplesmente giro a maçaneta. Encontro Katniss dormindo em sua cama. Ela treme um pouco. Não está frio para tanto. Me deito ao seu lado e envolvo seu corpo. O tremor subitamente para. Dou um beijo em sua testa.

– Boa noite, meu amor – sussurro.

Para minha surpresa, um leve sorriso se forma em seus lábios.

– Peeta – ela sussurra, e se aninha ainda mais ao meu corpo.

Meu coração acelera tanto, que eu tenho medo de acordá-la. Mas eu permaneço ali, afagando seus cabelos. Posso estar criando falsas esperanças, mas ela disse meu nome. Enquanto dormia. Isso não é um sinal de que ela pensa em mim? Uma faísca se acende em mim. E eu decido que vou lutar pelo amor dessa garota. Até o fim. Até não me restarem mais forças. O sono me vence e dessa vez eu nem tento resistir. Talvez Katniss me acorde com algum pesadelo, pois eles nunca param de vez. Mas tudo que eu quero nesse momento é dormir com a respiração suave da garota que eu amo em meu pescoço. Eu não tenho como saber quando será a última vez. Nem o que o amanhã reserva. Tudo o que sei, é que neste momento eu me sinto a pessoa mais sortuda do mundo, pela perfeição deste momento.