Efeito Borboleta

Sob Perigo.


Katniss estaciona o carro em frente à escola e as gotículas d’água escorrem pelo para-brisa. O tempo havia mudado em um piscar de olhos, o céu limpo e ensolarado havia se tornado nublado e chuvoso. O caminho havia sido silencioso, mas um silêncio bastante agradável, enquanto estávamos cada um preso em seus próprios pensamentos. Minha dor de cabeça felizmente havia passado, mas não podia negar, estava com medo. Ficar voltando no tempo estava afetando drasticamente meu cérebro, e eu precisava descobrir algo sobre aquilo, principalmente a origem daqueles “poderes”, como Katniss gostava de chamar.

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— Muito bem Srta. Everdeen. Bem a tempo da minha aula de fotografia. — quebro o silencio, forçando minha voz a sair formal, o que acaba arrancando uma gargalhada de Katniss.

— Sempre que precisar Sr. Mellark. ­— sorri, mas então seu sorriso se desmancha e ela fica séria, enquanto retira o cinto para poder ficar de frente para mim — Escute só, eu estive pensando e cheguei à conclusão de que o seu poder de voltar no tempo tem que estar ligado à neve de ontem... Isso poderia explicar sua visão do tornado.

— Explicar o quê? — elevo as sobrancelhas — Que a neve é igual a um enorme furacão que acabará com Arcadia Bay? — faço uma careta — Você está louca.

— É sério que você está dizendo isso? — ela revira os olhos — Acorda, Peeta. Você salvou minha vida duas vezes. Isso quer dizer que você alterou o curso do meu destino, do seu e o de outras pessoas. — ela cruza os braços — Você conhece a teoria do caos?

— Espera... O que você sabe sobre a teoria do caos, senhorita “odeio matemática”? — pergunto debochado.

— Isso foi a cinco anos, idiota. — ela me dá um tapa no braço — Algumas pessoas mudam, ok? E eu estou falando sério. A sua situação é a tempestade perfeita para a física quântica.

— Mas por que eu? — franzo o cenho confuso — Sou só um cara nerd em uma cidade pequena.

— Um exemplo perfeito de “ímã de coisas estranhas”. Você não aprendeu nada nas aulas de física? Temos um tornado, o poder de voltar no tempo e a droga da neve... Olá, Armagedom! — ela balança as mãos no ar como se fosse obvio.

Paro alguns segundos para refletir sobre suas palavras, e então minha memória trata de me levar para a pesquisa que havia feito ontem à noite em meu quarto. Eu lembro-me bem de ter lido algo sobre como pequenas alterações, mesmo que insignificantes, poderiam gerar graves consequências. Se isso fosse mesmo verdade, então eu poderia ter ferrado com a linha do tempo.

Deus! O que eu faço?

— É... Talvez você esteja certa. — minha voz sai baixa e um pouco perdita. Fecho meus olhos por alguns instantes, tentando organizar meus pensamentos que naquele exato momento estavam uma completa bagunça.

— Como essa semana consegue ser tão merda e ao mesmo tempo uma das melhores da minha vida? — sou trazido de volta à realidade com as palavras de Katniss.

— Porque estamos de volta à ação. — respondo, recebendo um belo sorriso da morena. Ergo minha mão e então fazemos um toque high-five — Certo, agora chega de papo e vamos entrar. Não quero chegar atrasado à aula.

— Ok, Mr. Nerd. — ela ergue as mãos em sinal de rendição e saímos da caminhonete — E lá vou eu para mais um momento de tortura. — resmunga fazendo drama. Não consigo conter o riso enquanto saio arrastando-a pela mão em direção à entrada da escola.

Paramos em frente aos armários rindo da quase queda que levamos no campus devido ao chão molhado por conta da chuva. Algumas gotículas d’água escorriam pela pele um pouco bronzeada de Katniss, e logo tratei de enxugá-las. Ela sorriu para mim, um dos sorrisos que mais amo, o que faz aparecer às pequenas covinhas em suas bochechas, e então passou os braços pelo meu pescoço, abraçando-me fortemente. Enlacei sua cintura trazendo-a para mais perto de mim, o cheiro de morangos que emanava de seus cabelos rapidamente entrou em contato com minhas narinas, deixando-me extasiado.

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— Foi muito bom ter passado esse tempo com você. — sussurra ao pé do meu ouvido, causando-me uma onda de arrepios. Sorrio.

— Eu senti muita falta desses nossos momentos. — digo no mesmo tom — É muito bom estar aqui com você novamente. — beijo os seus cabelos.

— Eu que o diga. Estou feliz por ter meu melhor amigo de volta, apesar de você ter sido um idiota. — rimos e ela se afasta, o sorrio brincando em seus lábios – Eu tenho que ir agora... Nos vemos mais tarde?

— Com certeza. — me apresso em dizer.

— Então, até daqui a pouco super-herói. — ela beija minha bochecha demoradamente antes de subir para o segundo andar.

Fico ali parado no meio do corredor igual a um bobo, com a mão repousada na bochecha, no mesmo lugar onde ela havia beijado. Um suspiro apaixonado acaba me escapando.

Ela não faz ideia do efeito que tem sobre mim.

Um riso curto escapa de meus lábios enquanto viro-me para seguir caminho em direção a minha sala, porém não consigo dar nem cinco passos quando uma voz grossa e autoritária chama meu nome. Viro-me novamente e dou de cara com Haymitch parado a alguns metros de mim, braços cruzados e postura durona. Respiro fundo antes de me aproximar dele.

— Pois não, Sr. Abernathy.

— Bem... Eu sei que as coisas esquentaram um pouco ontem no quarto da Katniss. — ele descruza os braços e deixa a pose de durão de lado — Aquele maço de cigarros era mesmo seu?

— Ahn... Sim. — coço a nuca um pouco nervoso e ele ri, me fazendo franzir o cenho confuso.

— Eu sei que os cigarros não eram seus, garoto. Clara me contou a verdade e eu... sinto muito. Eu estava errado, mas chateado. Katniss às vezes me tira do sério. — admite em um suspiro.

— Pode até ser, mas você é um veterano de guerra, então ela não é uma ameaça para você.

— Não mesmo. Mas acredite garoto, eu me importo com ela. — ele retira o boné da cabeça e passa a mão pelos cabelos, os ajeitando — Quando eu tinha a idade dela, causava muito mais problemas. Só que ela é melhor do que isso. Todos vocês jovens são, assim como a Madge Undersee.

— Você não parecia pensar isso dela ontem enquanto a enquadrava.

— Mas é claro que eu penso! Ela só... é um problema completamente diferente. — reviro os olhos com suas palavras.

— Ela não fez nada de errado, ok?

— Peeta, a questão não é só a Madge. Minha preocupação é com a segurança de todos os alunos da Blackwell. Incluindo você.

— Mas para isso será preciso mais do que câmeras de vigilância. — cruzo os braços.

— Será preciso mais do que o abaixo-assinado da Srta. Trinket para encontrar garotas desaparecidas. — rebate com um sorriso de deboche.

— Essa não é a sua responsabilidade como chefe de segurança? Proteger os alunos? A não ser que você saiba de algo sobre a Johanna Mason que ninguém mais saiba... — deduzo estreitando os olhos em sua direção. Ele volta a colocar o boné, parecendo desconfortável.

— Olha... eu não quero mais brigar com você. Não quero mais brigar com ninguém, então esse assunto se encerra por aqui... Pode ir, Peeta. — fico o encarando por mais alguns segundos antes de finalmente lhe dar as costas e seguir em direção a minha sala.

No meio do caminho acabo esbarrando com Cashmere, que estava preparando a lista de convidados para a próxima festa do Clube Vortex. Conversei com ela por alguns minutos e consegui com que a mesma colocasse o meu nome e o da Katniss na lista. Aquela seria uma ótima forma de pegar Gale no flagra, e assim juntar provas o suficiente para incriminá-lo.

Quando chego ao corredor que leva até minha sala, avisto Madge conversando com Seneca. Diminuo a velocidade de meus paços para não interrompê-los, mas ainda consigo ouvir o final da conversa.

— Então você não pode me ajudar? — pergunta Madge, parecendo um pouco deprimida.

— Eu estou tentando, mas você tem que entender minha posição...

— Por quê? Você não entende a minha. — ela o interrompe e depois se afasta — Ninguém entende... Ninguém... — ela murmura enquanto passa por mim, chorando. Chamo-a algumas vezes, mas ela simplesmente se vai.

O que será que aconteceu?

Aproximo-me de Seneca, que estava bem distraído enquanto analisava algo em seu celular.

— Bom dia, Sr. Crane. — cumprimento atraindo sua atenção.

— Peeta... Ahn... Oi. Bom dia. — ele sorri, mas vejo em sua postura que ele parece um pouco nervoso — Você parece preocupado. Está tudo bem?

— Hm... Acho que sim. De qualquer modo, não quero incomoda-lo.

— Só fico incomodado quando você evita enviar as fotos. Mas você já sabe disso. — ele guarda o celular no bolso antes de ajeitar os óculos em seu rosto — Então, o que posso fazer por você, Peeta?

— Bom... — suspiro — É que eu estou muito preocupado com a Madge.

— Já sei até o motivo. Estão dizendo por aí que você e ela tiveram um pequeno confronto com o nosso chefe de segurança ontem.

— Pois é, acontece que eu não consegui me segurar quando o vi berrando na cara da Madge sobre algo... Ela não merece isso.

— É claro que não. E sabemos que o Sr. Abernathy não tem a alma mais gentil. — ele solta uma risada anasalada — Você tem alguma prova de que ele a estava acusando?

— Minha palavra não é o suficiente? — pergunto exasperado — Justo quando decido não tirar uma fotografia. — resmungo.

— Nunca perca um momento. Essa é a regra número um da fotografia. — ele cruza os braços — Mas não se preocupe Peeta, prometo que esse assunto está sendo discutido pelo corpo docente. Agora, suponho que você saiba sobre esse vídeo viral...

— Sei sim, e a Madge está assustada com tudo isso. Ela não consegue fazer o dever de casa enquanto está sendo atormentada diariamente. — minha voz sai triste ao me lembrar do sofrimento estampado em sua face hoje mais cedo.

— Deve ser terrível, mas, eu sinto como se... Não sei... Parece que ela está ocultando a verdade, sabe? Você falou com ela?

— Sim, falei hoje mais cedo e... Bom, ela só precisa de amigos e muito apoio para não... — hesito um pouco antes de pronunciar as próximas palavras — Eu não quero que a Mad se torne a próxima Johanna Mason.

— Johanna Mason? O que ela tem haver com a Madge? — pergunta confuso.

— Com todos os cartazes de pessoa desaparecida por aí, é difícil não pensar nela.

— A Johanna não era nada como a Madge. — sua expressão se torna séria assim como sua postura mais rígida — O diretor Snow disse que você tinha algo que não queria contar a ele. Gostaria de compartilhar? — ele muda completamente de assunto, o que me deixa com uma pulguinha atrás da orelha. Isso é muito estranho.

— Agora não... Contarei assim que descobrir tudo. — enfio as mãos nos bolsos.

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— Gostaria de acreditar nisso, Peeta. — ele descruza os braços — Parece que há drama demais ao seu redor nessa semana. — seus olhos se estreitam em minha direção por trás das lentes dos óculos.

— Sr. Crane, eu só... — sou interrompido pelo toque de seu celular.

— Com licença. — ele retira o telefone do bolso e o atente — Alô? Sim? Ahn... Só um segundo. — ele afasta o aparelho do ouvido e se volta para mim — Eu tenho que atender. Entre na sala, já apareço para dar inicio a aula. — e então se afasta.

Salvo pelo gongo Peeta, ou melhor, pelo toque do celular.

Entro na sala e ela já está repleta de alunos. Alguns conversando, outros somente tirando um cochilo sobre a mesa, e outro tirando fotos, como era o caso de Clove e Enobaria. Quando chego a minha mesa, dou o azar de ter Glimmer e Gale sentados sobre ela enquanto conversam animadamente. Eu mereço!

— Com licença, mas será que vocês poderiam desocupar minha mesa? — indago tentando ao máximo não parecer rude.

— Olha só quem resolveu aparecer. — Gale sorri maldosamente — Estava esperando você deixar de ser medroso e aparecer para que eu terminar de quebrar sua cara! — ele tenta avançar em minha direção, porém Glimmer o impede.

— Chega Gale! Você já tem problemas demais! — ela o segura pelos ombros e tenta acalma-lo.

— Posso sentar na minha mesa agora? — pergunto entediado.

Se Gale estava querendo me deixar com medo, ele havia falhado miseravelmente na tentativa.

— Se cuida, Mellark. Estarei de olho em você! — avisa, lançando-me um olhar raivoso antes de se afastar.

— Você está tão ferrado, Mellark. — Glimmer ri com deboche antes de seguir os passos de Gale.

— Idiotas. — resmungo antes de me sentar.

Deposito minha mochila sobre a mesa e respiro fundo enquanto admiro os passos através da janela. Eles voavam de um galho para outro enquanto cantavam em perfeita harmonia. Sorrio, sendo contagiado pela felicidade deles. Abaixo os olhos quando vejo uma figura conhecida passar apressadamente pelo campus. Madge. Ela realmente não deve estar nada bem já que não costuma perder nenhuma aula. Minha preocupação em relação a ela só aumenta. Um movimento próximo a alguns arbustos me chama a atenção, e quando direciono meus olhos para o mesmo, vejo Haymitch agachado tirando fotos dela.

Isso é tão errado.

Minha atenção é desviada da janela quando alguém para a minha frente e senta-se em minha mesa. Delly. Os olhos azuis da loira brilham enquanto ela encara-me com um belo sorriso.

— Hey, Peeta. Como vai?

— Bem. E você? — pergunto, lançando-lhe um pequeno sorriso.

— Estou ótima, mas... estou preocupada com a Mad. Eu a vi hoje mais cedo e ela estava com os olhos inchados de tanto chorar. — ela encara as próprias mãos, cabisbaixa.

Não podia dizer que a Madge e a Delly eram melhores amigas, mas as duas eram bem próximas já que o clube de ciências era comandado por elas.

— Eu também a vi. Ela está passando por muitos problemas.

— Pois é... — ela suspira — Quando a encontrei não soube o que dizer, e ela também não me contou nada. Eu queria pod... — sua voz é interrompida pelo sinal.

— Ok. Eu sei que vocês me amam, mas... — começa Seneca ao entrar na sala — Quem não é dessa turma, vaza.

Delly se despede rapidamente e sai, assim como os demais que não pertenciam a aquela aula.

— Temos muitas coisas para falar hoje e pouco tempo, como sempre... Alguém viu a Madge? — pergunta apontando para a cadeira vazia a minha direita.

— Acho que todo mundo já viu a Madge a essa altura. — a voz de Glimmer sai repleta de deboche e alguns alunos riem.

— Ela não estava se sentindo bem, professor. — avisa Annie.

— Obrigada, Annie. — ele sorri para a ruiva — Acho que você está se referindo a um vídeo que se espalhou, certo Glimmer? — a loira assente — Imagino como seria ter imagens falsas suas espalhadas por aí para as pessoas julgarem. Geralmente, essas pessoas julgam para não precisarem olhar para si mesmas. Deveríamos agradecer aos reality shows por isso. — sorri irônico — No fim, só podemos culpar a nós mesmo por participarmos... Falando em participação, tem algumas pessoas aqui que ainda não enviaram uma fotografia para a competição. Como o Peeta, por exemplo, que eu sei que está ansioso para participar, correto? — seus olhos me encaram e eu sorrio forçadamente como resposta — Sei que vocês leram o resumo da aula passada como se fosse um livro do Harry Potter, então todos devem saber que hoje estudaremos “chiaroscuro”, aquela bela palavra sobre o contraste entre a luz e a escuridão, o jogo de sombras que dá à fotografia um... — ele pausa em busca das palavras corretas enquanto senta-se em uma das mesas —... Poder visual. — completa — É basicamente um yin e yang. Imagens em preto e branco são precisamente eficazes devido aos contrastes. Apesar de tecnicamente não “enxergarmos” em monocromia... — suas palavras são interrompidas por Finnick que adentra a sala bastante agitado.

— Hey pessoal! Está acontecendo uma merda muito louca no dormitório feminino! Venham ver! — exclama ao tentar controlar a respiração.

— Finnick, nunca mais interrompa minha aula! — adverte, pondo-se de pé — Escutem, todos permaneçam sentados... — Seneca tenta por a sala em ordem, mas já era tarde demais. Todos os alunos, incluindo a mim, saímos às pressas em direção ao dormitório feminino, mesmo com a forte chuva.

— Você viu aquilo?

— Isso é sério?

— A vadia entrou em pânico!

— Eu não sabia que ela estava tão arrasada...

Essas eram só algumas das palavras que se sobressaiam em meio ao tumulto de alunos que estavam no pátio do dormitório feminino. Eu não estava entendendo nada. Não sabia o que estava acontecendo e nem sobre quem eles estavam falando, mas bastou empurrar algumas pessoas para que eu me desse conta da gravidade da situação. Meus olhos se arregalaram e eu entrei em pânico ao ver Madge prestes a se jogar do terraço onde ficava o dormitório.

Minha nossa! Eu preciso fazer algo para ajudá-la! Agora!

Ergo minha mão, no intuito de voltar no tempo e impedir que uma tragédia aconteça. Contudo, no exato instante em que as coisas começam a ficar distorcidas, a forte dor de cabeça me atinge novamente, impedindo-me de voltar no tempo e, consequentemente, fazendo meu nariz sangrar mais uma vez.

De novo não, não agora...

O desespero me abate enquanto meu coração está quase saindo do meu peito. Tenho que tentar algo, mas não poderei ficar voltando de novo e de novo, já está claro que todas essas viagens temporais estão destruindo meu cérebro. Então como eu poderei salvá-la? Como?

Não sei ao certo quantos minutos fico preso em meus pensamentos, tentando encontrar uma forma de salvá-la, mas sou trazido de volta à realidade quando ouço os gritos dos demais alunos. O ar se torna escasso em meus pulmões quando meus olhos captam a imagem de Madge se jogando do terraço. Sinto minha garganta arder devido ao grito que sai de meus lábios. Fecho os olhos com força para não ver seu corpo se chocar contra o chão. Os gritos e lamentos ao meu redor vão se tornando abafados até o silencio abraçar completamente meus ouvidos, enquanto os soluços começam a escapar de minha boca, fazendo minha cabeça latejar, como se fosse explodir a qualquer momento tamanha dor. Um tremor sobre-humano atinge fortemente meu corpo, deixando minhas pernas bambas, e quando abro os olhos, vejo que as coisas estão destorcidas, as luzes estão mais fortes e tudo ao meu redor encontra-se completamente paralisado. As pessoas, os pássaros, as folhas, as gotas de chuva. Tudo. Absolutamente tudo. É como se eu estivesse assistindo a um filme da qual haviam dado pausa.

Meus olhos rapidamente se voltam para o alto, onde avisto Madge. Eu havia conseguido. De alguma forma eu havia conseguido voltar alguns minutos antes de ela se jogar, e agora o tempo encontrava-se paralisado. Mas, como aquilo era possível? Eu não fazia ideia, e naquele momento também não me importava. Eu só tinha que manter o tempo paralisado por mais alguns minutos, o suficiente para chegar até o terraço e conseguir salvá-la. Mas quando tentei dar o primeiro passo, eu simplesmente não consegui, era como se eu houvesse me tornado duas vezes mais pesado. Todo o meu corpo tremia, assim como meu nariz não parava de sangrar devido a insuportável dor de cabeça.

— Vamos Peeta... não pare... você... consegue... fazer isso... — digo a mim mesmo com certa dificuldade, já que o ar estava tento dificuldades de entrar em meus pulmões.

Com muito esforço consigo enxugar minhas lágrimas e dar o primeiro passo, depois o segundo, o terceiro, e assim fui me movimentando lentamente por entre as pessoas, mas precisamente me teleportando por entre elas. Era surreal como as coisas haviam paralisado no ar, principalmente os pássaros e as gotículas d’água. Aquilo era a definição perfeita para o impossível que se torna possível.

Minhas mãos estavam tremulas e cobertas pelo sangue que escorria de meu nariz, meus pulmões ardiam cada vez que o ar entrava em contato com eles. Aquilo estava acabando comigo, eu podia sentir em cada célula do meu corpo. Aquelas eram as consequências de se manipular o tempo, mas a real pergunta era: quais outras consequências ainda iriam surgir?Depois de um esforço quase sobre-humano finalmente consigo chegar ao terraço. Ótimo, agora só tenho que chegar até Madge e puxa-la para trás. Mas a pontada forte em minha cabeça mostra-me que eu já havia chegado ao meu limite, e com isso o tempo volta ao normal. Droga!

— M-Madge. — minha voz sai rouca e um pouco abafada, mas mesmo assim ela consegue ouvir, já que se volta rapidamente para mim. Seus olhos estavam avermelhados por conta do choro.

— O que você está fazendo aqui, Peeta? — pergunta com a voz embargada. Dou um passo em sua direção, mas ela ergue a mão em forma de protesto — Pare! Não chegue perto de mim! — pede, movendo os pés alguns centímetros, ficando ainda mais próxima à beirada do prédio.

Tento usar meus poderes, mas eles não funcionam. Já estou danificado demais. Agora terei que fazer isso por conta própria.

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— Peeta, é sério, não se aproxime. Eu vou pular. — suas lágrimas se misturam com as gotas de chuva.

— Ok, ok. Estou bem aqui. — ergo as mãos em sinal de rendição — Mad, por favor... não pule. — imploro.

— Ah, Peeta, eu sei que você quer me ajudar... Eu amei você ter me defendido do Haymitch, mas não importa agora. Nada importa. — a tanto sofrimento em seus olhos e em suas palavras que me sinto angustiado.

— Você importa. — dou um passo em sua direção, com cuidado — E não só para mim.

— Eu queria poder acreditar nisso.

— Mad, a sua vida ainda é sua. E nós podemos superar isso juntos... Deixe-me ajudar. — peço, tentando conter meu desespero.

— Estou feliz por saber que você se preocupa comigo... Faz com que eu me sinta melhor.

— Mas é claro que eu me preocupo. — dou mais um passo — Você é minha amiga, Mad.

— É. Você me demonstrou isso quando falou comigo hoje mais cedo. — ela abraça o próprio corpo e solta um sorriso triste — Você é um bom ouvinte.

— Sim, e você pode confiar em mim. Por favor, Mad, fica comigo. Eu posso ajudá-la agora... Eu sei disso.

— Eu não sei se consigo Peeta, foram tantas coisas. O vídeo que se espalhou, todos os xingamentos, todas as piadas de mau gosto... — a cada palavra pronunciada mais lágrimas escorria por suas bochechas.

— Eu sei que não é fácil Mad, mas acredite em mim, ok? Estou coletando provas de que o Gale a drogou. E você não é a única vítima. Então você tem que me ajudar a acabar com ele.

— Você tem provas agora? — pergunta esperançosa.

— Não... mas logo terei. E depois, direto para a polícia. Pense como se estivéssemos purificando a Blackwell. — sorrio, tentando fazê-la desistir de tal loucura.

— Você realmente cuida de mim. — ela descruza os braços e suspira — Essa é a primeira vez que sinto esperança em uma semana...

— Ótimo. Todos nós precisamos cuidar uns dos outros. — dou mais alguns passos até estar parado bem a sua frente — Então eu quero que você venha comigo agora. Por favor... você não tem que fazer isso.

— Peeta, estou em um pesadelo e não consigo acordar... a não ser que eu me coloque para dormir.

— Não Mad, não pense assim. Eu preciso de você ao meu lado, essa é a nossa chance de acabar com os valentões. Essa é a única maneira de conseguirmos vencê-los. — argumento, tentando convencê-la.

— Podemos mesmo, Peeta? Não acredito mais em milagres. — ela abaixa os olhos enquanto funga.

— Mas eu acredito, e você é parte do motivo. — pontuo, atraindo seu olhar para mim novamente.

— Não... Ninguém se importa comigo, ninguém... — ela balança a cabeça negativamente.

— E a sua mãe, Mad? Você acabará com ela. Ela não está nem aí para o vídeo. Ela ama você! — profiro, sentindo minha pulsação aumentar devido ao desespero.

— Você não conhece a minha mãe. Nem um pouco. Ela acha que o Satã já reservou uma descida rápida para eu ir para o inferno. — ela fica mais perto da beirada, prestes a cair — Vamos provar isso então...

— Não! Mad, por favor, pare. — imploro completamente desesperado, já sentindo as lágrimas subirem aos meus olhos — Escute... Esse não e o fim. Não é possível que Deus não tenha grandes planos para você aqui!

— Boa tentativa, Peeta. Mas Deus me colocou nesse telhado. — afirma.

Passo as mãos pelos cabelos, completamente perdido e sem saber o que fazer. Eu não posso permitir que essa tragédia aconteça. Não posso!

Vamos, Peeta, pense!

— “Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu os aliviarei”...

— “Mateus 11:28”... Não acredito que você citou uma de minhas passagens favoritas. — seus olhos esverdeados me encaram incrédulos e impressionados.

— Como eu disse, eu me preocupo com você. Sei que essa passagem significa muito para você. — estendo minha mão em sua direção, sentindo a minha musculatura reclamar devido à tensão — Por favor, Mad.

Seus olhos me encaram por alguns segundos, transbordando uma mesclagem complexa de sentimentos, até ela finalmente pegar em minha mão e se jogar em meus braços, finalmente a salvo. Um longo suspiro aliviado escapa pelos meus lábios e eu a aperto mais contra mim.

— Sinto muito... Sinto muito... — murmura com o rosto enfiado em meu peito.

— Do que você está falando? Você acabou de me salvar da aula. — brinco para tentar amenizar o clima tenso, o que funciona já que ela solta uma risadinha abafada em meio às lágrimas.

Ela está bem. Ela está a salvo. É, Peeta, você conseguiu.