Capítulo 14 - Cotidiano

Noites de sextas-feiras sempre prometiam demais,com sua característica dubiedade,elas podiam muito bem prometer uma suposta ascensão ou sua própria ruína.Ruína não,decadência é melhor.

Sim,decadência.Um riso frouxo escapou de meus lábios fruto de inúmeras garrafas vazias de vinho barato.

Era uma palavra que certamente definia meu estágio melhor.

Noites de sextas-feiras prometiam para mim o meu pior estado.

Estirada em uma poltrona segurando dessa vez uma garrafa de vodka já que todo o vinho já tinha ido embora enquanto a voz barítona de Julian Casablancas ressoa ao som de “Not the same anymore”.Bem apropriado para uma fossa.

Após essa conclusão,uma súbita e sufocante onda de raiva se apoderou sobre mim como uma descarga elétrica.

Em questões de segundos,todas as garrafas,vasos e taças tinham-se despedaçado,inúmeras folhas com esboços ao chão,rasgadas ou não,gritos também participaram desse ritual e as telas pintadas por mim eram devoradas pelo crepitar da chama pertencente à lareira.

Eu gritei e muito.

Até sentir a garganta doer,a voz falhar,as lágrimas descerem e os soluços surgirem.Meu corpo fraco deslizava apoiado na parede até sentir o impacto dos joelhos contra o chão.

Esse era o pequeno caos que construí.Mais tarde poderia usá-lo como metáfora nos textos que escrevia para poder descrever como estava interiormente.

Devastada e me sentia patética por sentir demais.

Cambaleante levantei pois uma faísca do meu orgulho incendiou não permitindo a persistência desse estado deplorável.Estava descalça então lentamente andava prestando atenção para não pisar em algum pedaço de vidro,simultaneamente,observava o pequeno estrago feito no local,as poltronas e as cadeiras da mesa de jantar recaídas no chão.Passei em frente do aparador que era acompanhado por um grande espelho,porém,ignorei meu reflexo para não constatar o desastre ambulante que definitivamente eu era.

Minerva - Julho 2019