Janeiro, 2019

Era uma vez Janie e, de repente, no minuto seguinte, era a duvidosa Jane de volta. Eu, na minha infeliz juventude, que conservava em um tipo de estagnação latente, era incapaz de compreender. Em verdade, Jane, você possuía dois corações, mas era incapaz de dividi-los comigo, pois sabia que ambos estariam reservados para todas as possibilidades de partida, ainda que em seu orgulho infantil, renegasse-as! Afinal, dentro de seu orgulho, oculto a ti mesma, Jane, gostaria de se parecer comigo, ser de um só coração, e entregá-lo à alguma estância inalterável; como a mim, ser de um só coração, sujeito às determinações de um tipo de amor que nunca chegará. Foram tantas revoltas, Jane, tantas guerras travadas. É uma pena sua suposta presença não ter passado de um fantasma ao meu lado, uma presença que pesa como um cadáver. E eu ainda insistirei em dizer que seu nome jamais será bonito o suficiente para ser citado verdadeiramente em alguma carta fantasmagórica!

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Foram tantos lados que não quis enxergar em você, Jane. E agora, as raras vezes em que lhe vejo, vejo tantas mágoas. E logo em seguida imagino quantos ressentimentos cabem em mim em relação a você. A frustração final que percebo é que crescemos, e que realmente, nós aprendemos a viver da ausência e desistência de ambos os lados.

Gosta de passar por tantas estações, Jane. Enquanto isso, eu sou incapaz de acompanhá-la em sua jornada por insatisfações. Jane, você não tem qualquer qualidade, não restou nada pelo que valha à pena lutar e ficar. Jane, foi você mesma a primeira a rejeitar suas qualidades e a regurgitá-las. Como eu poderia insistir em amar algo que não depende apenas de mim, e que você não hesitaria em abandonar?

Jane, talvez eu ainda seja muito jovem para conseguir lhe perdoar por ter me afastado de Janie. E sobre a sua partida, Jane, eu apenas gostaria de lhe agradecer, eu nunca conseguiria melhorar sem ela. A imaturidade da juventude me impede de perdoá-la, Jane, e eu, diante desse cenário desesperançoso, não sinto muito. Obrigada por me dizer que eu jamais seria suficiente para você, Jane. O tempo é rápido demais para ficarmos perto daquilo que se tornou insuportável.

Jane, você veio no fim de Dezembro, alguns dias depois do meu aniversário, quando os outros diziam que você tem bebido. Não pude deixar de notar a ausência de felicitações da sua parte, mais uma vez. Nossa conversa a sós mal durou cinco minutos, e não conseguimos falar sobre o mais importante e, acredito eu, nunca conseguiremos, e no fundo, fico aliviada por isso. Alguém dissera para eu anotar seu telefone, mas não o fiz pois ainda insisto em manter algum rancor como cota para me proteger da letalidade da esperança. Da mesma forma que eu esperava escrever uma carta de despedida há três anos. Da mesma forma cujo o cantor que possui as mesmas iniciais que as minhas canta uma canção sobre a traição de um amor irrecuperável. Da mesma forma que ficamos sem nos vermos por quase dois anos. Da mesma forma que tenho gostado de aprender a estar só, embora, Jane, da mesma forma eu considere tudo o que está ao meu redor terrível e amargamente irônico.

Sinceramente, l. C.