Observaram o cenário por algumas horas.

Era uma noite nublada. As estrelas estavam tapadas por uma espessa camada de nuvem que recobria o céu. A lua oscilava em suas aparições quando brechas entre as tapagens davam oportunidade de se mostrar. A única iluminação era proveniente das tochas que alguns guerreiros e caçadores carregavam consigo. Com certeza não era o melhor cenário para um combate, mas, devido às circunstâncias, eram o que tinham para se adaptar.

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As sentinelas que vigiavam a entrada da construção trocavam seus turnos a cada uma hora. Não parecia ter mais nenhum tipo de segurança externa para atrapalhar os planos. Era simplesmente uma questão de passar por eles e esperar uma reação quando já estivessem dentro da prisão. Um plano simples.

— Parece que está tudo de acordo com o que tínhamos falado. - constatou Auster.

— Um pouco fácil demais. - completou Sylvie. - Porém, vamos adiante com o que tínhamos planejado. Não tem como eles imaginarem que estamos aqui.

— Sim! Estamos seguindo nossa estratégia enquanto eles terão que lidar com imprevistos. - respondeu o irmão. - Preparem-se!

Um grupo de lanceiros tomou a dianteira seguido por alguns guerreiros montados a cavalos. Um pequeno grupo de caçadores formava-se logo atrás. Esses seriam os responsáveis pelo primeiro ataque, liderados por Carsen. Logo atrás viria o restante, divididos de acordo com as estratégias de Auster e Gustav. Alguns moradores de Yor'Em aceitaram ajudar, contanto que não se envolvessem em combates físicos e, assim, decidiram ficar responsáveis por cuidar dos feridos em batalha.

O primeiro grupo começou a marchar em direção a prisão. Carsen caminhava na frente atento a qualquer atividade suspeita e inesperada que pudesse acontecer. Seus passos ditavam o ritmo que deveria ser seguido. O ritmo que, de repente, cessou ao som de uma explosão que tomou conta daquele cenário.

Um a um, guerreiros começaram a tombar imóveis no chão. Cavalos cambaleavam até finalmente tropeçarem em suas pernas e também atingirem o solo arenoso. O grupo que havia ficado para trás assistia aquela situação sem entender o que, de fato, acontecia. Auster não conseguia pronunciar nada, apenas demonstrava espanto e incredulidade na sua face ao ver seu plano dando errado em questão de segundos.

— Prendam a respiração! Protejam-se! - gritou Carsen o mais alto que conseguiu quando constatou o que estava acontecendo. Os caçadores colocaram seus protetores faciais e alguns guerreiros conseguirem tapar o nariz com o braço. Infelizmente para outros, já era muito tarde. Um quarto do primeiro grupo encontrava-se estendido sem se mexer.

— Ainda estão respirando! - disse um dos caçadores próximo a Carsen quando verificou o pulso de um dos guerreiros caídos. Sua voz estava abafada pelo protetor.

Ao escutar a informação, Carsen prontamente abaixou e pegou um dos guerreiros abatidos e começou a carregá-lo em direção ao primeiro grupo. Outros caçadores seguiram o exemplo do líder. Os guerreiros pensaram em fazer o mesmo, porém não tinham como fazer sem desproteger sua respiração. Os cavalos, porém, ainda continuavam derrubados.

— Deve ser o mesmo pó que usaram na gente na floresta! - gritou Clair quando finalmente entendeu a situação.

— Fizeram o mesmo comigo quando estava aprisionada. - contou Amber.

— O que vocês estão querendo dizer, crianças? - questionou Gustav ao escutar a conversa.

— O homem que raptou Amber nos colocou pra dormir de algum jeito. - explicou Tyler.

— De algum jeito não, com um tipo de pó. - corrigiu Clair.

— No meu caso, na prisão, ele me paralisou. Estava ciente do que acontecia mas não conseguia me mexer.

— E só agora vocês se importaram de passar essa informação? - repreendeu Gustav fazendo com que eles adquirissem uma expressão de decepção.

Algumas pessoas do primeiro grupo foram de encontro aos caçadores que estavam carregando os guerreiros para auxiliá-los. Auster ainda não acreditava naquilo tudo e não estava preparado para lidar com aquele imprevisto. Estava contando com toda ajuda possível e mal o combate tinha começado, já tinha perdido uma parcela de sua equipe.

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— O ar está contaminado! - contou Gustav. - Não dá para passar desse jeito. É muito arriscado.

— O que vamos fazer então? Abortar a missão? - Auster respondeu bruscamente numa mistura de tensão e raiva.

— Calma, Auster! - gritou Sylvie enquanto sacudia o irmão. - Não é hora de surtar. Vamos ter que pensar numa coisa rápido. Você é o líder dos caçadores e eles estão contando com você. Não pode deixar que uma situação assim te tire o foco.

— Acho que consigo dar um jeito nisso. Ou pelo menos posso tentar! - sugeriu Gustav.

Gustav assumiu a dianteira do grupo e concentrou-se. Começou a fazer um conjunto de gestos circulares com seus braços, despertando a curiosidade de quem o observava. O cenário atrás do primeiro grupo começava a ser engolido por uma nuvem de areia. O vento soprava forte na direção oposta à deles, tentando diminuir a concentração de resíduos que pudessem conter ali.

— Não é que você realmente se parece com ele? - disse Dahlia para Tyler. - Só precisa de um pouco mais de experiência.

— E você precisa aprender a guardar esses comentários para você! - rebateu Tyler, ainda que soubesse que faltava bastante para fazer algo semelhante.

O guerreiro voltou a sua posição próxima a Auster. Os guerreiros abatidos começavam a ser atendidos pelo povo de Yor'Em na esperança de que encontrassem um jeito de retomarem seus sentidos mais rapidamente.

— Uma solução temporária. - admitiu o guerreiro. - Não impede que eles lancem novamente. Precisamos pensar rápido numa solução.

— Não acho que será necessário. Eles não arriscariam... - respondeu Auster de forma vaga.

— Como assim? Como você tem tanta certeza? - questionou a irmã.

— Vejam! - e apontou na direção da nuvem de areia que se assentava.

Bem ao longe formavam-se silhuetas de pessoas. Aos poucos distinguiam-se armas e até mesmo quantidade. O contra-ataque estava sendo feito e de uma forma mais antecipada e direta do que eles esperavam.

— E agora qual é o plano que iremos seguir? - perguntou Sylvie esperando uma resposta do irmão.

— Só tem uma coisa que podemos fazer. - Auster ficou sério e determinado. - Dividir e conquistar!

Era hora da luta começar.

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Auster e Carsen ficaram num grupo junto com Cassius. Os gêmeos pretendiam não deixar que o druida sofresse outra lesão em combate. Tinham assegurado para Dahlia que entregariam o pai dela ileso dessa vez. Era uma promessa que não podiam dar muita certeza de cumprir, porém fariam o máximo para que fosse verdade.

O tilintar de metal chocando com metal já tomava conta do ambiente. O grupo adversário era formado por diversas pessoas de etnias diferentes. Não tinha como prever aquele cenário.

Um homem de roupas rasgadas carregando um grande machado vinha em cima de um cavalo em grande velocidade pronto para atacar. Carsen pegou sua boleadeira e, depois de rápidos giros, a lançou prendendo as patas dianteiras do animal, que lançou o homem a distância, não demorando muito para ter uma espada atravessada em seu peito em seguida.

— Eles estão em maior número! - constatou Auster. - Estamos em desvantagem.

— Vou tentar diminuir essa diferença. - respondeu Cassius.

O druida sussurrou algumas palavras brevemente e seguiu com um assobio bem agudo. Como em resposta ao som, em vários lugares do campo de batalha, o chão começou a ceder criando alguns buracos de onde grandes garras de pelagem marrom-avermelhada apareceram fincando no solo. Grandes rugidos eram escutados. Um exército de leontropos havia emergido para ajudá-los.

— Isso já ajuda um pouco, certo? - perguntou o druida ao ver os gêmeos incrédulos.

— Se você tiver mais truques que possam nos ajudar a vencer isso logo, sugiro que não espere até o último momento para mostrá-lo. - disse Carsen surpreso em tom de brincadeira.

Auster não estava certo de como aquelas criaturas iriam apresentar algum tipo de vantagem num ambiente daqueles mas acreditava que Cassius tinha algum objetivo em fazer aquilo. Carregou sua balestra e lançou a flecha, atingindo o braço de um homem que tentava se aproximar. Infelizmente o tempo de recarga daquela arma era maior do que ele necessitava naquela batalha, sendo atingindo na perna, de raspão, enquanto realizava o processo de recarregamento.

— Não se preocupem comigo! – gritou o caçador ferido enquanto limpava o sangue que escorria na perna.

— Você não vai conseguir andar direito assim! – disse o irmão preocupado desviando de uma saraivada de flechas que vinha em sua direção.

— Me dê cobertura! – pediu Cassius.

— O que você vai fazer agora? Tem alguma criatura que você vai chamar para curar minha perna? – Auster lutava contra a dor.

— Eu disse que ia tentar ajudar o máximo que podia. Apenas confie em mim!

Carsen ficava analisando a situação. Observava quando algo vinha em sua direção e tentava desviar ou alertar Cassius. Não precisava de dois feridos naquela situação. Viu quando o druida se aproximou do cavalo que recém havia tido suas pernas presas pela boleadeira e agonizava no chão tentando se libertar.

— Você é louco? Vai acabar se machucando! O que você pensa que está fazendo? – questionou Carsen.

— Ele não vai conseguir se locomover sozinho! Talvez se tiver montado num cavalo pode servir melhor nessa luta! – respondeu.

— Esse cavalo não é nosso. Jamais vai obedecer nossas ordens.

— É isso que eu pretendo consertar. Apenas aguente mais alguns instantes!

Cassius chegou perto do animal enquanto relinchava e se debatia em vão. Tentava posicionar sua mão sobre a cabeça do cavalo, que balançava em protesto a situação, sem ser golpeado por ela. Por fim, conseguiu.

O equino relaxou. Não mais parecia temer ou se preocupar com o que estava acontecendo. Seguiu Cassius com os olhos quando ele aproximou de suas patas dianteiras e desenrolou a boleadeira. E, apoiando-se nas patas, antes presas, rapidamente levantou e seguiu na direção de Auster.

— Você poderia parar de guardar esses truques para última hora? – resmungou Auster. – Mas, obrigado! Agora se importam em me ajuda a subir?

A perna ardia com o corte e sangue quente ainda escorria pelo ferimento. O cavalo abaixou para facilitar a montaria e Carsen ajudou o irmão a se acomodar na sela. Auster sabia que não teria como manusear sua balestra naquela posição. Não era a arma ideal antes e, agora, menos ainda. Não iria cometer o mesmo erro duas vezes.

— Peguem aquela lança para mim! – ordenou Auster.

Um guerreiro que estava próximo pegou a arma e entregou ao líder dos caçadores, que a analisava com bastante cuidado e observava seu sangue na lâmina pontiaguda.

— Você acha que consegue fazer isso novamente? – disse olhando para Cassius.

— O que? Encantar mais cavalos? Só entrando em contato com eles. – explicou.

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— Então prepare-se! Se eles gostam de raptar os outros, nós também iremos pegar o que é deles! – falou com um brilho de determinação em seus olhos. – É hora do contra-ataque!

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Dahlia mirava seu bumerangue nos inimigos, conseguindo atingir mais de um em uma só lançada enquanto Sylvie tentava acompanhar o mesmo ritmo, mesmo que tivessem se passado anos desde a última vez que tinha estado numa situação daquelas. Ambas tentava atacar ao mesmo tempo que protegiam Leena, a mais nova daquele grupo.

Apesar da falta de treino, Sylvie ainda mostrava habilidades no manuseio de sua kurisagama. Girava a extremidade da corrente em que se encontrava um peso metálico, ora atingindo os inimigos diretamente, e ora conseguindo imobilizá-los facilitando um ataque com a foice da outra extremidade. Ainda assim, não estava o obtendo o resultado que esperava e precisava se manter firme ali, pois era a mais forte e, talvez, mais experiente.

— Eles estão vindo de todos os lados! – gritou Dahlia desembainhando sua faca de caça enquanto aguardava o retorno do seu bumerangue.

— Estão em maior número do que esperávamos. – completou Sylvie ao ver mais alguns homens vindo em sua direção.

As armas de Sylvie e Dahlia permitiam um ataque a longo alcance, porém não apresentavam grande eficácia quando muitos inimigos estavam em curta distância. Outros guerreiros e caçadores cuidavam para mantê-los distantes, mas nem sempre isso era possível. E, quando alguns conseguiam ultrapassar as linhas de frente, Leena utilizava suas habilidades de energia focalizada para nocauteá-los.

Leena não estava contente com o papel coadjuvante que estava representando naquela batalha. Tinha ciência que aquele cenário talvez não fosse apropriado para uma menina de sua idade, porém não queria sentir que não podia fazer nada. Sentia que já tinha se omitido tempo o suficiente e queria contribuir de algum jeito. Observava aquele número de inimigos ao redor delas aumentando consideravelmente e seu sangue fervia com vontade de acabar com aquilo. Sabia, porém, que sozinha não conseguiria.

— Cuidado! – gritou um guerreiro alertando Leena, que segundo depois se viu empalado por um grande dardo.

Leena ficou em choque e sua roupa tinha adquirido algumas manchas de respingo de tonalidade vermelha. Sua mente não aceitava o fato de estar totalmente vulnerável e dependente naquela luta. Via Dahlia e Sylvie fazendo o que podiam para protegê-la e queria estar lá ajudando. Não queria ter que ver outra vida sendo tirada em sua frente só porque ela poderia parecer frágil demais para estar ali.

"Não, sozinha eu realmente não consigo." Repetiu para si mesma enquanto segurava seu amuleto com as duas mãos lembrando do treinamento que havia feito com Amber. "Mas, talvez com você eu consiga! ".

Sem soltar do amuleto, Leena começou a concentrar toda a sua energia para o interior de suas mãos. Desviava de algumas flechas que vinham em sua direção e confiava, embora não quisesse depender exclusivamente disso, que alguém iria protegê-la caso tentassem fazer algo contra ela. Era uma tentativa desesperada e ela tinha consciência do que estava fazendo. Contudo, precisava tentar.

— O que você está fazendo, garota? – gritou Dahlia enquanto bloqueava um ataque com seu bumerangue, quando viu uma luz intensa vindo da mão de Leena.

— Confio em vocês... – sussurrou Leena abrindo suas mãos em direção ao céu, como se libertasse uma ave que há muito tempo não voasse.

O grande brilho em suas mãos começou a adquirir forma. Aos poucos, um par de asas começou a surgir enquanto patas e um bico se pronunciavam caracterizando aquela silhueta que subia num vôo acelerado e vertical cada vez mais alto, ganhando atenção de algumas pessoas que compunham aquele cenário violento.

Parou. Explodiu.

A ave havia se separado em diversas rajadas de energia que Leena havia transferido que agora caíam e atingiam diversos inimigos pelo campo de batalha.

Leena sabia que não poderia simplesmente lançar sua energia aleatoriamente pois poderia atingir aliados. Confiava, contudo, que ao transferir sua energia ao seu espírito, ele a guiaria para atingir os alvos certos. Era um sacrifício que estava disposta a fazer.

Dahlia, rapidamente, tirou seu bumerangue de modo defensivo e num movimento forte e circular atingiu as pernas do adversário, que urrou de dor com os membros fraturados. Num segundo giro, agora mais alto, a caçadora pretendia atingir quem estivesse mais longe a fim de dar tempo de Sylvie chegar em Leena, cujo corpo cedia lentamente até tocar o chão desacordada.

— Leena! Leena! – Sylvie repetia enquanto sacudia, em vão, o corpo da garota.

Levou sua palma da mão para próximo do nariz de Leena e, num breve momento de alívio, constatou que, apesar de fraca, ainda estava respirando. Não podia deixar nada acontecer com ela. Gustav tinha confiado a segurança de sua filha a ela. Jamais iria se perdoar se algo acontecesse.

— Preciso levar ela para os moradores de Yor'Em! Eles devem conseguir fazer algo para recuperá-la. – anunciou no momento em que um círculo de guerreiros se fechou ao seu redor para protegê-las.

— É muito perigoso sair com ela assim. As duas podem acabar sendo atingidas!

Mais uma saraivada de flechas estava vindo na direção delas. Os guerreiros levantaram seus escudos, evitando que fossem atingidas. Porém, não podiam ficar muito mais tempo naquela situação. Eles precisavam assumir uma posição de ataque.

Sylvie viu o esforço que Leena fez e não queria deixar que aquilo tivesse sido em vão. Observa a facilidade com que Dahlia manejava seu bumerangue com seu espírito guardião. As duas garotas haviam dado o máximo até agora, e ela pretendia levar isso como exemplo.

Posicionou o amuleto que havia ganho de presente do Oráculo num orifício feito perto da foice de sua kurisagama. E, numa prece silenciosa, apenas pedia para que o que estava fazendo desse certo.

A arma começou a adquirir um brilho esverdeado. A corrente vibrava fortemente até começar a fazer movimentos como se tivesse vida própria. A extremidade com a foice ergueu-se ficando na altura dos olhos de Sylvie e, por um momento, a caçadora conseguiu enxergar a cabeça da serpente, com os olhos a encarando. Não tinha certeza do que fazer, e assustou-se quando, repentinamente a extremidade com o peso enroscou em seu braço direito.

Sylvie sentiu uma leve pressão no braço, contudo, não sentia dor. Era como se tivesse ajustado exatamente o suficiente para ficar presa sem incomodar. A caçadora sentia o sangue pulsando em suas veias e, estranhamente, sentia-se como se o material metálico da corrente também emanasse algum tipo de pulsação desejando que ela fizesse algo naquele instante.

Seus pensamentos voltaram para a imagem de Leena com a respiração fraca em seus braços. Tinha dito a Gustav que tomaria conta dela e não pretendia quebrar essa promessa. Precisava criar um caminho naquele campo de batalha para que pudesse levar a garota para o grupo de Yor'Em cuidar dela. Depois voltaria a ajudar na luta.

— Você vai ficar bem? – gritou Sylvie um tanto quanto desesperada com a situação.

— Eu dou meu jeito! – Dahlia fez um movimento para desviar de uma espada que passou perto de seu braço, atingindo rapidamente o atacante com sua faca de caça. – Tira ela aqui!

Com Leena por cima de seu ombro esquerdo, Sylvie levantou, com um pouco de dificuldade, enquanto a corrente fazia movimentos em espiral ao redor delas. Ora ou outra, a extremidade com a foice fazia movimentos próprios rebatendo flechas que vinham em direção delas. Agarrou a arma e girou-a por cima de sua cabeça por alguns segundos, lançando-a para frente logo em seguida. A foice serpenteava por entre os inimigos, desferindo cortes e deixando uma trilha de corpos por onde passava. Alguns tentavam proteger-se com escudos fazendo com que a lâmina ricocheteasse e atingisse quem estivesse ao lado.

Dahlia tentou vigiar Sylvie se afastando por alguns segundos. Não podia perder o foco na luta e seu destino estava no lado oposto ao que a caçadora mais velha estava correndo. Ainda não tinha certeza de como conseguiria passar pela defesa inimiga e nem como entraria naquela prisão. Contudo, infelizmente, só tinha tempo suficiente para pensar no que faria naquele instante para sobreviver e teria que deixar para analisar o que viria depois em uma outra hora.

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— O que é isso? – perguntou Shane assustado quando uma criatura surgiu ao seu lado lançando para longe com seus braços aqueles que ousassem atacá-la.

— É um leontropo. – respondeu Clair. – Eu não sei como vieram parar aqui, mas acredite em mim quando eu digo que é bem melhor tê-los do nosso lado. Você não ia querer correr de um monte deles aqui no meio do nada.

Shane e Clair tinham se separado de Tyler e Amber em algum momento durante a batalha e não sabiam ao certo quando exatamente isso tinha acontecido. Quando perceberam já estavam rodeados por guerreiros inimigos tentando esquivar-se de ataques repentinos.

O xamã utilizava sua lança do jeito que podia, porém, combates físicos não eram seu forte. Em determinados momentos conseguia prender lâminas de espadas e cabos de lanças na parte circular de sua arma e assim, desarmava o adversário por tempo suficiente para fincar sua própria lança. Lamentava não existir iluminação suficiente para utilizar suas verdadeiras habilidades.

Clair, no entanto, tentava lembrar de todos os dias que tinha treinado com Tyler e Amber na clareira e fazia o possível para colocar aquilo em prática. Sabia, contudo, que não tinha muita resistência física e nem força para derrubar muitos adversários. Utilizando seu bastão rapidamente, em dois movimentos, conseguia atingir as pernas de dois guerreiros levando-os ao chão. Em ataques aleatórios, acertava e contundia diversos outros membros deixando os atacantes mais devagar.

Ambos agradeciam a presença das criaturas da floresta naquele lugar.

Um súbito clarão começou a subir ao céu. E foi o momento que Shane tanto ansiou. Conforme o brilho tomava conta do céu, o xamã aproveitava para evocar as sombras dos seus adversários para imobilizá-los.

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— Por que não fez isso antes? Seria bem mais fácil! – reclamou Clair.

— Acredite em mim quando eu digo que teria feito se pudesse! – rebateu Shane da mesma forma que tinha sido respondido antes. – Agora aproveite!

A menina não demorou para acatar a ordem e simplesmente saiu desferindo golpes nas juntas e na cabeça de forma a nocautear ou deixá-los impossibilitados de lutar. Outros não tinham tanta sorte sendo destroçados pelas garras dos aliados felinos. E alguns receberam impactos de energia que caíam do céu assemelhando-se a estrelas cadentes, fazendo com que o brilho se esvaísse pouco a pouco.

— Droga! – exclamou Shane em tom decepção sabendo que voltaria a ter que partir para o combate físico.

Enquanto isso, Clair se via numa disputa de força com um lanceiro, cuja sombra tinha acabado de sumir. A garota segurava seu bastão com as duas mãos impedindo que o cabo da lança adversária se movesse em sua direção. Estava aflita pois sabia que não ia conseguir segurar por muito tempo.

— Ei, seria uma boa hora para fazer seu truque novamente! – gritou Clair.

— Eu já não posso! – Shane estava tão frustrado quando ela. – São sombras! Eu preciso de luz!

— O que? Por que não falou isso antes?

Clair tentou reunir o máximo de força que conseguia naquele instante. Enquanto ainda estava evitando ser atingida, reuniu o máximo de energia em suas mãos que começaram a se tornar fontes luminosas. Shane esboçou um leve sorriso prevendo o que poderia acontecer.

— Se eu fosse você fechava os olhos! – aconselhou Clair enquanto cedia um pouco fazendo o adversário acreditar que ela estava perdendo forças e, num giro rápido, saiu da direção da lança.

Devido a força que estava fazendo, o lanceiro foi ao chão em questão de segundos e sua arma escapou de suas mãos. Ele observou a garota que tinha feito isso com ele, mas seus olhos já não eram capazes de enxergar nada, exceto uma enorme luz branca. Momentos depois, sentiu algo o prendendo. Uma rápida dor na nuca foi a última coisa que sentiu antes de desmaiar.

— Você poderia ter dito antes que conseguia fazer isso. – reclamou Shane.

— E você sabe que o mesmo se aplica a você, não é mesmo? – Clair respondeu sem se alongar no assunto. – Agora a gente pode ficar aqui discutindo ou utilizar essa mesma estratégia para chegar ao portão principal.

— Melhor deixar a parte física para quem realmente entende do assunto. – Shane virou para um leontropo - Certo, grandão?

Um forte urro foi o suficiente para o xamã aceitar como resposta e seguir seu caminho. Clair guiava o caminho iluminando o trajeto e projetando sombras que emergiam do solo formando o exército que auxiliaria aqueles dois jovens naquela luta.

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— Leena! – gritou Gustav ao ver o brilho no céu.

Ele identificou a fonte daquela energia assim que ganhou forma. Sabia que, pela quantidade de energia que tinha sido externada, a filha provavelmente não deveria estar muito bem. Ficou preocupado e seu instinto paterno queria simplesmente puxar as rédeas de seu cavalo e fazê-lo mudar de direção para ir atrás dela, mas não podia deixar Elly para trás. Precisava confiar em Sylvie e, por mais que não fosse filha dela, tinha certeza que ela não deixaria nada de ruim acontecer com Leena.

Gustav agarrou as rédeas com mais força e fincou seus pés nas costelas do cavalo que disparou em grande velocidade. Ao invés de ir ver a filha, o guerreiro, com sua espada já desembainhada, mostrava-se hábil atingindo o máximo de inimigos que conseguia.

— Minha irmã... – Elly suspirou tristemente quando entendeu o que tinha acontecido.

— Vai ficar tudo bem. – Amber tentava acalmá-la.

Com o arco que havia sido presenteada pelo pai, Amber mantinha distância suficiente, escondida atrás de umas rochas, para atirar suas flechas flamejantes. Já estava sentindo falta de poder utilizar a arma que havia praticado por bastante tempo, mas era a primeira vez que se via usando uma numa situação tão estressante. Não estava acostumada a isso e acabava interferindo em sua pontaria.

Elly percebia que a aljava da arqueira estava cada vez mais vazia e isso acabaria colocando as duas em risco. Já tinha tentado colocar em prática o que Eugene tinha proposto a ela e sentia que ali seria o momento de finalmente ver se o esforço tinha funcionado. Era algo pequeno, então esperava que não fosse causar tanto dano a si mesma. Fechou os olhos e buscou a imagem de uma grande quantidade de flechas em sua mente. Sentia algo pesando em suas mãos e, gradativamente, ganhar forma.

— Amber, toma!

— Obrigada! – respondeu prontamente. – Mas onde você achou isso?

— Não importa. Espero que ajude. – Elly sentiu um pequeno desconforto e esperava que isso fosse embora.

Amber tentava ser o mais precisa quanto fosse possível. Tinha que tomar cuidado para não acertar nenhum aliado seu, principalmente Tyler. Depois de imaginar o que supostamente podia ter acontecido com Leena, ela não queria ser responsável por Elly ver seu irmão ferido em batalha. Era necessário ser cautelosa com seus movimentos.

Enquanto isso, Tyler unia-se aos guerreiros e caçadores que estavam por perto na tentativa de avançar para o portão principal da prisão. Sentia que o pouco tempo de treinamento que havia feito com seus tios tinha produzido alguns resultados. Seus movimentos estavam mais fluidos e um pouco mais rápidos, apesar de ainda faltar segurança. Seus pensamentos ainda ficavam em seu caminho.

Manejava suas duas espadas sendo capaz de defender com uma e atacar com a outra. Rajadas de vendo eram criadas com rápidos movimentos das lâminas para desarmar adversários ou até mesmo para afastá-los. Não havia vento sibilando em seu ouvido agora lhe dizendo o que fazer, pois já tinha o ensinado. Mas não estava se importando caso quisesse lhe dar uma ajuda ali.

Amber desviou seu olhar quando percebeu que mais um clarão tomava forma próximo dali. Levou sua mão até sua aljava e percebeu que, pela segunda vez, suas flechas estavam acabando. Dessa vez, Elly não havia prestado atenção. Sua visão tinha ficado um pouco turva e sua cabeça pesava. A arqueira percebeu que a menina não estava se sentindo bem, mas sabia que não podia mais fazer nada escondida ali.

— Fique aqui quieta! – pediu Amber. – Vou lá ajudar eles.

— Mas... – Elly tentou discordar, mas percebeu que seria inútil.

— Você não está bem. Presta atenção e qualquer coisa grita!

Elly assentiu e ficou ali observando enquanto Amber saía do esconderijo. Estava alerta e tentava focar sua visão e, caso fosse necessário, correria.

Com as mãos agarradas em seu amuleto, Amber sentiu o pingente aquecer. Tentou concentrar o máximo de calor em suas mãos e esperou até que seu espírito guardião finalmente aparecesse.

O lobo ganhava destaque naquele cenário escuro. Aquela pelagem cobre ganhava brilho próprio e emanava um calor. Seus dentes afiados já denunciavam que ele estava pronto para atacar qualquer um que apresentasse ameaça para sua protegida. Amber aproveitava-se que seu guardião havia se tornado uma fonte de fogo, para controlar o que não conseguia criar.

Num grande salto, o animal pousou com patas nas costas de um dos inimigos. Com o contato, fumaça começou a sair e lobo fincou suas presas no pequeno espaço do pescoço que estava aparente.

Tyler ficou surpreso ao ver o espírito de Amber naquele estado. Como se já não bastasse estar lutando ao lado das feras das quais ele correu a caminho de Valmees, agora ainda tinha um espírito. Muitos aliados inesperados.

— Ei, Amber. Belo parceiro você tem!

— Pois é! O seu fala, o meu luta. – brincou a arqueira. – Cada um com suas qualidades.

Amber e Tyler estavam lutando lado a lado. Era um revezamento de rajadas de vento com bolas de fogo. Aos poucos, os jovens começavam a ficar confiantes com a situação. A inexperiência mostrou-se no momento que deixaram a confiança subir-lhes a cabeça a ponto de perderem a atenção no restante das coisas que estavam a sua volta.

— Cuidado! – berrou Gustav ao ver dois homens preparando ataques pelas costas dos jovens e partiu em direção a eles.

Quando Tyler e Amber constataram o que estava acontecendo, só deu tempo de observarem dois vultos subindo por cima deles indo para cima dos atacantes. Ficaram surpresos ao notarem dois lobos idênticos mordendo vorazmente os homens que já aparentavam estar sem vida. Ficaram sem entender o que estava acontecendo, especialmente quando, de repente, um dos seres lupinos simplesmente esvaiu-se.

Num ritmo a galope rápido, Gustav passou por entre os dois indo mais a frente onde Elly encontrava-se em pé. Jogou seu corpo um pouco para ao lado sendo capaz de agarrá-la com força e trazê-la para cima do cavalo. Ele tinha visto quando a filha tinha saído do esconderijo e materializado um animal do nada. Ou assim ele acreditava.

— Por que você fez isso, minha filha?

— Eles vieram me ajudar... eu tinha que ajudar eles. – murmurou pouco antes de desmaiar.

— Claro. – disse soltando uma das mãos das rédeas do cavalo e passando por entre os fios de cabelo da menina. Alterou o tom de voz. – Ela salvou vocês dois! Agora não a decepcionem e sigam em frente. Não façam o esforço dela ter sido em vão!

Gustav saiu na mesma velocidade que tinha chegado naquele local. Precisava levar a filha para ser socorrida e esperava ter alguma notícia de Leena. Ao mesmo tempo, esperava que Tyler soubesse se cuidar. O pensamento que poderiam ter perdas não saía de sua cabeça, mas queria terminar a luta do mesmo jeito que havia iniciado: com seus três filhos vivos.

Tyler e Amber se encararam decepcionados com a situação. Porém não havia tempo para gastaram com tal sentimento e tinham que transformar isso em estímulo para seguir em frente e não errar novamente.

— Você consegue lançar esses ventos aí por essas espadas, não é? – questionou a arqueira curiosa.

— Mais ou menos isso, mas digamos que sim. Por quê?

— Me empresta por alguns segundos...

Amber pegou as duas espadas e segurou as partes de lâmina com força até começar a sair fumaça de suas mãos.

— Ei, cuidado com isso... – Tyler foi interrompido por Amber fazendo sinal para ficar quieto.

— Pronto! – disse Amber quando as lâminas estavam em chamas.

— O que você fez? O que eu devo fazer com isso?

— Isso é como iremos seguir adiante. – explicou a arqueira. – Com seu vento você apenas lança os inimigos para longe, agora assim eles sofrem algo extra.

— Mas corre o risco de o fogo apagar com o movimento da espada, não?

— Trabalho de equipe, você cuida da sua parte e eu garanto que nada vai se apagar aqui.

Tyler ainda estava querendo entender onde essa ideia levaria, mas era a melhor opção que tinham. Com cuidado agarrou o cabo da espada que já começava a ficar quente e, num rápido movimento como se tivesse cortando o ar em sua volta, lançou uma forte rajada de fogo e ficou impressionado.

— Você poderia ter pensando nisso mais cedo! – comentou Tyler.

— Eu acho que penso melhor quando estou de cabeça quente. – Amber deu de ombros e soltou uma risada. – Agora vamos logo com isso que Clair deve estar nos esperando.

— Como você sabe disso?

— Olhe lá! – apontou para uma luz que se aproximava do portão principal.

Dessa vez com as duas espadas, uma em cada mão, Tyler repetiu o movimento de corte criando rajadas paralelas, assemelhando-se a um grande corredor com paredes de fogo. O lobo de Amber adiantou-se e seguiu na frente enquanto os dois corriam logo atrás. Sabiam que teriam que repetir isso mais vezes até chegar o objetivo, mas ficariam atentos a tudo antes que a confiança atrapalhasse novamente.