Paz

Em um mundo chamado Terra, eu via duas crianças correrem por um vasto campo florido. Elas se divertiam, sorrindo uma para a outra sem parar.

Por mais que eu estivesse ali com elas, era como se um vidro inquebrável nos separasse, nenhum ser humano me via, eu era como um ser inexistente. Quem me dera se eu conseguisse estar presente, feliz da vida junto com elas. Eu poderia conseguir isso por algum tempo, se quisesse. Mas aceitava que só o faria quando fosse necessário.

Meu campo de visão mudou, eu estava do lado de fora de uma escola. Um montinho de alunos formava um círculo em volta de algo. Abri caminho entre eles e vi um rapaz batendo em outro.

Bullying. Ninguém ajudava a vítima, que apanhava sem tentar revidar. Era engraçado, eu já tinha visto alguns adultos, e entre eles, até mesmo um professor, que viam a cena sem tentar pará-la.

Caminhei até o garoto agressivo e toquei sua testa. O tempo parou e somente ele pôde me ver.

Paralisado, ele via a mim, um ser sem gênero, com vestes longas e soltas. Meus cabelos atingiam o chão, provavelmente algo assustador para quem nunca vira nada parecido.

Ele tentou falar, mas perdeu a fala.

– Você pode parar, rapaz... A escolha é sua. – e então eu toquei novamente sua testa e ele não me viu mais. O tempo continuou e o rapaz estava trêmulo, suado. No chão, perto dele, o menino que apanhava não sentia mais dor, pois eu segurava sua mão. Ele não conseguia me ver, mas sentia minha presença, apesar de não saber o que eu era.

Eu também não sabia o que eu era.

Soltei sua mão e me coloquei junto com o grupo que ainda estava ao redor dos dois.

Mexi minha mão em um gesto circular, que fez com que o pessoal simplesmente saísse dali por vontade “própria”.

Vi o agressor colocar as duas mãos na cabeça e se perguntar o que havia feito.

Eu sorri.

Ele pedia desculpas sem parar para o outro, que ainda se encontrava no chão.

Abri ainda mais o sorriso.

Eles podem ter virado amigos depois disso, eu não sei. O bullying pode ter continuado depois, eu não sei. Porém, eu os perdoaria mais uma vez e os ajudaria novamente se precisassem.

Meu campo de visão mudara novamente.

Eu voltara para o campo florido, onde as crianças não mais permaneciam.

Sinto o vento balançar meus cabelos e caio no chão, dormindo, sentindo a brisa invadir meu corpo e a paz plantada no meu coração.

E mais uma vez, sorrio.