Estava mais frio da segunda vez que aparecemos por lá; ironicamente, meus pais gostaram tanto da hospedagem que ficamos no mesmo lugar.

Nada tinha mudado, exceto eu. Com o primeiro ano do Ensino Médio, eu comecei a ter noção de que certas coisas — lê-se: minha obsessão por garotos da revista Capricho, que eu ainda tinha mas me recusava a admitir — eram bobas demais para levar em conta, e que eu deveria focar nos meus estudos.

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Mas é claro que eu não me lembrei de nenhuma fórmula de física quando o Garoto das Toalhas ganhou um nome:

— Danilo! — gritou a mulher da recepção para o garoto-não-tão-baixinho-quanto-da-última-vez-que-eu-o-tinha-visto sentado no mesmo banquinho atrás do balcão. O rosto dele, porém, era o mesmo; infantil, com aquela penugem no queixo que garotos na puberdade insistem em chamar de barba. Como o grito não pareceu funcionar, ela foi até ele e puxou de uma vez os fones brancos de suas orelhas.

— Oi! — respondeu ele, parecendo assustado. Não tinha ignorado a mãe (como descobri mais tarde, todas as pessoas que trabalhavam lá eram de uma só família), só não tinha ouvido.

— Vá arrumar o quarto deles — prosseguiu a mulher. — O último — completou, lançando um sorriso pra minha mãe. Sim, eles também tinham pedido exatamente o mesmo quarto.

Enquanto minha metade sedentária se afogou em gritos de agonia, a metade bailarina recém-surgida (amém, projeto de integração de dança nas escolas) comemorou o fato de ter ao menos um exercício para as pernas durante as semanas sem aula. Mesmo sendo meio tarde para começar a fazer balé, como eu nunca pretendi seguir a carreira de dançarina, não tinha problema algum.

O ex-Garoto-das-Toalhas levantou e se posicionou na nossa frente.

— Só vai demorar um minuto — disse. Por um instante, seu olhar travou no meu, mas passou rápido; no seguinte, ele já estava subindo a escada de dois em dois degraus.

Mal tive tempo de sentar num dos sofás da recepção e começar a folhear uma revista antes de ele voltar. Estava comemorando internamente por finalmente poder desfazer as malas e tirar a roupa da viagem — talvez usar uma das calças bonitas de frio que tinha comprado — quando meu pai me chamou.

— Lis, tem uma cafeteria descendo a rua. Passamos por ela vindo pra cá, lembra?

Fiz que sim com a cabeça.

— Café ou chocolate quente? — Sorri. Eu poderia ter reclamado, afirmado que qualquer um dos meus irmãos poderia ir, que era injusto que eu fosse a escolhida e blá blá blá, mas não o fiz.

— Café. — Ele sorriu de volta e eu soube que tinha dito a coisa certa. Peguei o dinheiro e estava prestes a sair quando a mulher da recepção gritou o nome do filho outra vez.

— Danilo!

Ele não ouviu, como esperado, já que estava de volta a seu cantinho da música. Dessa vez, a mãe não arrancou os fones, apenas deu-lhe um tapa na nuca.

— Sim? — Ele tirou os fones e lançou um olhar inocente para a mãe como se nada tivesse acontecido. Fui obrigada a disfarçar o riso e fingir que não estava observando os dois.

— Não deixe a menina ir sozinha. Vá, vá! — comandou ela, naquele sotaque sulista que eu não consegui reconhecer. Meu pai inclinou a cabeça para ela em agradecimento ao mesmo tempo que Danilo se aproximava de mim.

Da mesma forma que engoli a onda de drama que ia despejar sobre meu pai, engoli o orgulho e aceitei que ele viesse comigo. Qual era o problema, afinal?

Assim que passei pela porta, uma rajada de vento frio bateu no meu rosto e agradeci mentalmente por estar preparada para o frio dessa vez.

— Seu cabelo ficou mais curto — comentou o garoto. Percebi pela forma que ele pronunciou o "r" que tinha o mesmo sotaque da mãe.

— E você cresceu — devolvi, enquanto descíamos a rua que não parecia tão grande quanto da última vez. — Mas não muito.

Ele deu de ombros.

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— Meninas crescem mais rápido.

— Touché.

— Bom, como você já descobriu, eu sou o Danilo — apresentou-se ele. — Dani, Danizinho e Daniel não são formas aceitas de pronúncia.

— Tá, então eu vou te chamar de Lilo. — Ri e desacelerei o passo. Não queria, afinal, que chegássemos tão rápido assim.

— Ok, então me diz seu nome pra eu não ter que te chamar de Stitch. — Ele pronunciou o "tch" devagar, como "shh", como se fosse difícil. Por mais que eu soubesse que não era legal rir da fala das pessoas, não pude evitar.

— Lis. — Acenei com a cabeça.

— Só Lis?

— Melissa — corrigi. — Mas essa não é uma forma aceita de pronúncia.

Eu não sabia ao certo o porquê de estar sorrindo, apenas estava. Quando chegamos à tal cafeteria, fiquei surpresa com o preço absurdo das coisas ali; em compensação, havia uma variedade de chocolates que eu nunca encontraria na minha cidade natal, e claro que fiquei babando em cima deles como a criança esfomeada que era.

— Você quer algum? — perguntou ele, naquele tom de zombaria que as pessoas usam quando querem sair por cima.

Bom, talvez eu esteja sendo parcial aqui e ele só tenha feito uma pergunta qualquer, mas foi desse jeito que eu ouvi.

— Não, claro que não — respondi, olhando pra minha nota de dez reais e pro maior e mais gostoso café que eles poderiam servir. Como o dinheiro não daria nem pra isso, escolhi o médio mesmo.

Ele rolou os olhos e agarrou um punhado de chocolates, pagando logo em seguida sem que eu pudesse dizer nada. Então, quando peguei o café e o segui pra fora, ele abriu o saquinho e começou a comer o conteúdo na minha frente.

Pela terceira vez no dia, engoli a indignação e passei por ele rapidamente.

— Eu tô brincando, calma! — Ele começou a rir. — Não aguento nem ver chocolate. Acho que em algum ponto você se enjoa de tudo. É pra você — terminou, estendendo o tesouro para mim e tomando o copo de café nas mãos para que eu pudesse comer com mais facilidade.

— Obrigada — agradeci, me sentindo um pouco estranha. Não tinha entendido a motivação por trás daquilo, mas um saquinho de chocolate sempre seria um saquinho de chocolate.

Ele deu de ombros em resposta.

— Disponha. — Quem é que fala "disponha"? — Eu disse, você tava babando em cima dos chocolates. Eu sei como as meninas ficam quando têm vontade de alguma coisa, e não quero que a pousada seja destruída pela fúria feminina.

Me preparei para dar um soco em seu braço, meio de brincadeira, meio sério, mas assim que fechei o punho ele apontou pro café em sua mão. Maldito!

— Vou te perdoar dessa vez — comentei, tentando falar bonito como ele, mas falhando miseravelmente porque minha boca estava cheia de chocolates.

— É brincadeira!

Ele começou a rir; uma risada contagiante, tanto que, sem que eu percebesse, logo estava rindo junto.

Diferente das outras férias, tivemos mais oportunidades de conversar dessa vez, mas nunca sozinhos. De qualquer forma, aquela risada reverbera na minha mente até hoje; consigo ouvi-la como se estivesse ao meu lado.

Infelizmente, não está. Esse é o motivo número 2.