Coisas do Acaso

cap 16: Nem tudo é o que parece...


– Quanto tempo caipira, você vai demorar em achar uma vaga? - pergunto bufando impaciente e com razão, já fazia exatos dez minutos que Filipe procurava uma vaga e não achava.

– Ei calma,você lembra do convite que te fiz? - pergunta sem desviar o olhar da pista.

– Para falar a verdade não - respondo realmente falando a verdade.

– Bem eu tinha te convidado para ir á uma festa de queima de alho, agora lembra? - questionou desviando rapidamente o olhar da pista, mas logo em seguida voltando a atenção para a mesma.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

–Ahhhh sim - digo me lembrando.

– Aqui também está ocorrendo essa festa, por isso há tantos carros e poucas vagas – explica como se estivesse falando algo para uma criança e talvez nessa situação eu estivesse mesmo parecendo uma.

– Entendi – me limito em dizer.

Depois de mais uns cinco minutos, ele conseguiu achar uma vaga que ficava umas seis quadras do hospital aonde meu pai se encontrava. Meu pai! Como será que ele estava? Será que ele estava bem?

– Vai ficar sentada aí até quando? - o caipira indaga apoiado na porta do passageiro, que se encontrava aberta para que eu saísse.

– Ahh desculpe... - peço ruborizando.

– Tudo bem - diz com um sorriso fofo, que mostrou suas covinhas. – Deve estar sendo uma barra para você o acidente do seu pai né ou talvez... Você só esteja encantada com a minha beleza. – brinca ele. Reviro os olhos.

– Sim, Filipe. Está sendo bem difícil - confesso pela primeira vez, saindo do carro e batendo a porta com força.

– Vamos até uma panificadora para você comer algo. O Simon disse que você ainda não comeu e eu hoje, estou fora da sua lista. – ele fala com ironia me puxando para o outro lado da rua, onde se encontrava a lanchonete.

– Tá bom. – digo de repente quando chegamos na calçada. Olho bem nos olhos do caipira e suspiro alto. – Me escuta bem que eu não estou muito a fim de repetir. Para de me paquerar.

– Só estou tentando descontrair Bia. Só isso. – ele responde com um sorriso.

– Que seja! Mas... Eu já tenho alguém e estou feliz com ele. – pisquei e desviei os olhos dos dele.

– Só queria te fazer esquecer isso tudo. – murmura entrando na lanchonete.

Ao entrar, percebi que era muito diferente dos lugares que estava acostumada a ir lá no Rio. Não era sofisticado e muito menos movimentado, mas até que tinha certo charme. As paredes tinham um incrível tom de vermelho e havia uns objetos indígenas como decoração do local, o que dava um ar de familiaridade ao ambiente. As mesas eram de madeiras entalhadas, muito bonitas.

Sou puxada pelas mãos do Lipe que me levou até uma mesa mais afastada.

– Por que escolheu essa mesa? – deixei escapar antes que conseguisse segurar minha língua.

– Achei que iria querer privacidade – diz evasivo.

– Ah claro - assinto me acomodando confortavelmente na cadeira.

Pego o cardápio e escolho alguns pães de queijo e um suco de maracujá, ao mesmo tempo em que o caipira escolhe um salgado e uma coca cola. Enquanto nossos pedidos não chegavam, comecei a pensar no meu pai. Pensei no tempo que perdi sendo mimada e fútil, no tempo que perdi o culpando de ter me deixando ao invés de tentar entender que ele apenas estava seguindo a vida dele, assim como minha mãe estava seguindo com a dela, no tempo que perdi sem falar com ele. Quanto tempo eu perdi sem ele. Comecei a pensar em como a vida é. Sabe? Foi sábio quem disse que não se pode deixar pra amanhã, o que se pode fazer hoje. Hoje eu sei disso. Sei que você precisa deixar o orgulho de lado antes de acabar perdendo, porque ás vezes, só querer que as coisas se ajeitem não dá certo. Pensando em tudo isso, não consegui segurar as lágrimas que já ameaçavam cair, e que agora rolavam pela minha bochecha.

– Ei, não chora... - senti as mãos do Lipe em minha bochecha, limpando as lágrimas que caíam sem minha permissão.

– Desculpa por estar chorando e... Desculpa por antes. Eu sei que você só estava tentando descontrair um pouco.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

– Tudo bem linda. Tá tudo bem. Eu sei o que você está sentindo. - diz ele baixando a cabeça e afastando sua mão do meu rosto.

– Como você pode saber? - inquiro incrédula.

– Porque eu já perdi pessoas que amava muito. Sei como dói. A diferença é que seu pai está vivo. Por isso você ainda tem chance de reverter todo o tempo que perdeu sendo infantil. – ele responde mudando o foco para mim. Engoli em seco.

– Acha que sabe muito sobre mim não é? – uma garçonete sorridente parou do nosso lado e nos serviu com o quê havíamos pedido. Agradecemos e ela saiu. – pois adivinhe... Não sabe.

– Sei bastante Beatriz. – o problema é que ele estava certo. Fiquei quieta por uns instantes pensando no que ele havia dito.

– Então... Quem você perdeu? – perguntei incerta.

– Você por acaso sabe que o Joseph não é meu pai? – ele indaga passando as mãos no cabelo e dando um gole na coca.

– Não. - respondo surpresa pela revelação.

– Ele não é, mais é como se fosse já que foi ele quem cuidou de mim e me amou desde sempre. – diz ele com um olhar vago, como se tivesse perdido nos seus próprios pensamentos. –Minha mãe tinha apenas 15 anos quando engravidou de mim, segundo meu pai ela era uma pessoa divertida, que amava falar e se interagir com as pessoas. Era simpática e amável e sempre sonhou em ser professora. Só que o sonho dela foi destruído por aquele canalha que eu deveria chamar de pai. - Conta com uma raiva mal contida na voz.

– Como assim? Quem era ou é seu pai? - interpolo confusa.

– A minha mãe não engravidou de mim porque quis - Ele se mexe na cadeira parecendo desconfortável.

– Hã? - indago sem saber o que falar.

– Eu sou fruto de um estupro Bia. - com certeza minha cara de espanto estava bem clara - Meu pai de sangue namorava minha mãe, só que o relacionamento não estava indo muito bem e por isso ela quis dar um fim ao relacionamento, mas o meu "pai" não aceitou isso. Ele queria que ela fosse só dele. Inteiramente. Então ele a estuprou. – Sentencia Lipe com a voz fraca, cheio de repulsa. O olhar vago agora dava lugar á um olhar repleto de ódio.

– O quê aconteceu depois? – quebrei o silêncio ao ver que ele não falaria mais nada.

– Minha mãe morava aqui em Pontes e Lacerda na época, quando descobriu sobre a gravidez, resolveu ir morar em Conquista d' Oeste com uma tia que ela tinha lá. Foi em Conquista que minha mãe conheceu meu pai Joseph, e também foi lá que ela foi tirada tão abruptamente de mim. - acrescenta com um olhar de cão abandonado que me encheu de tristeza. O pior de uma situação assim, no meu caso, é que eu nunca sei o que dizer. - É melhor nós terminarmos logo de comer. Assim iremos mais rápido para o hospital. - ele diz antes que eu pensasse em algo para o confortar.

– Tudo bem, mas qualquer outra hora você terá que me contar o resto da sua história. - adianto comendo um pão de queijo.

– Ok - Lipe fala sem nenhuma convicção na voz.

Depois de alguns minutos comendo sem trocarmos uma única palavra, acabo de comer e espero o Lipe ir pagar.

–Vamos? – Ele pergunta e percebo que estava viajando em Marte, pra variar (e quando digo viajando em Marte, quero dizer que fiquei boiando como maluca, olhando pro nada).

– Ahh s-sim. - Digo andando ao lado dele rumo ao hospital

FILIPE

Olho de canto para ela e me fascino mais uma vez com sua beleza, e principalmente, com o seu jeito de ser. Mesmo sendo chata às vezes e briguenta, era aquela que me fazia rir por motivos bestas. Porque justo àquela que eu me vi encantado, melhor dizendo apaixonado, tinha que estar apaixonada pelo Simon?

Eu me pergunto o que ele tem de tão demais que faz com que todas se apaixonam por ele? Por que só fui ver que estava apaixonado por ela agora? Por que existem tanto porquês e tantas poucas respostas?

– Filipe? – saio do meu transe e viro na direção que me chamaram e me deparo com a Meg e a Bia me chamando.

– Sim? - falo tentando tirar aqueles pensamentos da minha cabeça.

– Você está bem? - pergunta a chatinha (essa é a forma que eu a chamo na minha mente).

– Sim, claro. E aí? O Simon já voltou? - questiono preocupado com o fato de que desde que eu e a Bia chegamos ao hospital, não encontramos o Simon em lugar algum e a Meg estava com uma cara estranha.

– Ainda não, mais logo ele chega - Meg assegura inquieta. Me passou a impressão de estar escondendo algo.

– Não apareceu nenhum médico por aqui que te falasse sobre o quadro do meu pai? Nenhuma enfermeira? Nada? Sobre sua mãe e tal... – Bia interroga um tanto nervosa.

– Minha mãe e irmã estão bem. Nada muito sério. – Meg se limita a dizer.

– Que bom. E o meu pai? Não disseram nada? – Meg me lança um olhar como que implorando para que eu fizesse algo, só que eu também queria saber sobre o Lúcio. Ele era importante para mim. – Hein? – Bia insiste.

– Ele está em coma desde que chegou ao hospital. – Bia arregala os olhos e se apoia em mim. Logo começa a soluçar e me abraça apertado.

– Calma, calma! Tudo vai ficar bem. Logo ele acorda. Tá tudo bem. – Passei carinhosamente a mão nos cabelos dela e nos sentamos numas cadeiras próximas a nós. Esperando por Simon.

Cinco minutos, dez minutos, quinze minutos, vinte minutos. Esse foi o tempo que tivemos que esperar até Simon aparecer junto com um médico.

– E aí Simon? - Meg pergunta parecendo aflita.

– O resultado estava certo – Ele diz sem olhar para nós.

BIA

Olho do Simon para a Meg sem entender nada do que eles falavam. Parecia estar rolando algum código maluco entre eles.

– Que resultado? – indago mais boiando que o caipira.

– O resultado do DNA. - responde por fim o médico, quando viu que ninguém iria responder.

– Para quê teste de DNA? – pergunto sem compreender.

– Para sabermos se o primeiro teste estava realmente certo. – Simon esclarece ainda sem me olhar nos olhos, o que já estava me deixando nervosa.

– Teste de quem? E para quê? – Filipe pergunta fazendo as perguntas que estava querendo saber.

– Esse mocinho aqui – o médico começo dando tapinhas no ombro de Simon – Pretendia doar sangue para o paciente Lúcio Andrade, mas tivemos um problema. O sangue não era compatível. - explica calmamente o doutor me deixando em choque.

– Como assim não compatível? – contesto tentando não ficar histérica.

– É o que queríamos saber. Pois isso significava que o Simon não era filho do paciente. Então fizemos o teste de DNA para termos mesmo certeza. - logo que ele diz sinto falta de ar. – E tivemos. Parece que esse garotão aqui, não é filho do paciente Lúcio. - o médico termina dando uma parada e olhando para o Simon como se pedisse permissão para falar. Daí conclui que tinha mais alguma coisa.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

– Tem mais? – ele assentiu com a cabeça.

– Ligamos para a mãe, senhora Walkíria, perguntando o tipo de sangue dela e por incrível que pareça eles têm o mesmo tipo de sangue. – admite o médico.

– Isso significa o quê? - retruco me sentindo tonta.

– Não sabemos Bia. – Simon intervém me olhando pela primeira vez desde que chegou - Mas eu vou descobrir. Me recuso a pensar que nossa mãe o traiu. – ele afirma se referindo ao meu pai.

– Eu vou descobrir custe o que custar. - Declara com uma promessa na voz e uma determinação indescritível no olhar.