Cinzas do Crepúsculo

Um monstro chamado Harry


CAPÍTULO 54

A MONSTER CALLED HARRY

Harry se mostrou na sala de aula de McGonagall exatamente às oito horas da próxima terça feira, carregando quatro livros empoeirados nos braços. Viu que a professora estava como gata na mesa, olhando o relógio. Ao vê-lo, McGonagall se transformou de volta.

“Harry, qual foi a primeira coisa que mudou em mim?”

A pergunta o pegou de surpresa, porém sua mente estava pronta. Ele havia visto aquela transformação tantas vezes nos últimos cinco anos que já sabia de cor o que mudava primeiro. “Sua coluna. Ela se eleva.”

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“Muito bem” aprovou Minerva. “Planeje mal sua coluna e você ficará para sempre em uma Cadeira Flutuante. Não quer isso, quer? Ninguém quer ficar em uma Cadeira Flutuante. Quanto mais você mudar, mais difícil será a sua transformação, por isso alguns iniciantes desejam se tornar macacos. Não é nem de perto tão interessante, mas pelo menos eles se mantêm em duas pernas.” Ela se transformou novamente e voltou à forma original. “E a próxima?”

Harry reviveu as cenas que viu em sua mente. “A cabeça, então os membros.”

A animaga fez que sim com a cabeça. “Ótimo. E você disse que medita. Já sabe alguma coisa sobre sua forma? Como se movimenta, qual a sua pelagem, sua velocidade?”

Dessa vez, o menino precisou pensar por mais tempo. Não tinha muita certeza quando respondeu: “Acho que sou rápido” ele se sentiu corar, e murmurou um xingamento ao se lembrar de que ainda não tinha controle sobre seu novo corpo. “Sinto muito, eu queria me lembrar de mais, só que é tudo um borrão.”

Minerva sorriu com delicadeza, não surpresa com o resultado. “É assim que acontece. Quero que você treine a pronúncia do feitiço, por enquanto, e leia esses dois livros aqui para semana que vem. Não perguntarei nada diretamente, mas espero que saiba ao que me refiro na próxima aula. Entendido?”

“Sim, professora.” Ele pausou, e pensou na coisa mais embaraçosa que conseguiu para voltar a corar. “Você acha que eu vou conseguir? Quero deixar meu pai orgulhoso.”

Múltiplas facetas cruzaram a face de McGonagall. Suspeita, dúvida, consideração, ponderação, e finalmente, um assentir rápido. O menino esperou por mais, porém minutos se passaram e o silêncio reinou. A animaga examinou o menino, sua face gentil demais para seus quinze anos, sua voz a de uma criança que pedia permissão, seus olhos de cachorro perdido... Suspirou.

“Animagia não é um assunto fácil, Harry” falou ela, bem mais suavemente do que antes e definitivamente mais suave do que durante as aulas de Transfiguração. “Porém você é um excelente aluno, e ainda tem três anos de Hogwarts pela frente. Só Merlin sabe o que vai acontecer em três anos.”

Um sorriso rompeu em sua face, e ele se sentiu como se ainda estivesse no orfanato, agradecendo as senhoritas: “Obrigado, professora! Quinta feira?”

A professora parecia quase desapontada. Como aluna, ela e Dumbledore haviam desenvolvido uma excelente amizade; ela desejava que o mesmo pudesse se aplicar a um de seus alunos – discussões sobre Transfiguração nos finais de semana, brincadeiras e um pouquinho, só um pouquinho, de trabalho extra, afinal, Minerva era uma professora e deveria manter-se como tal.

“Sim” concordou, passando dois livros pesados para Harry. “São esses aqui. Se não entender algum termo, pode me perguntar no fim das aulas normais. Estão um pouco rabiscados, mas acho que vai conseguir ler tudo. As anotações são todas minhas, e funcionaram. Só não use as riscadas.”

Harry assentiu.

“Boa noite” finalizou, pegando os livros da mão da professora e se dirigindo para a porta. “A propósito, sua dissertação sobre as propriedades de Transfiguração está pronta.”

“Ótimo” a animaga sorriu. “Traga-o amanhã. E Harry?” o menino se virou para ela. “Boa noite.”

_

Daphne olhava as pessoas ao redor deles como se fossem ratos de laboratório, sendo examinados para algum tipo de doença ser diagnosticada. Não era nojo, apenas uma curiosidade mórbida. Seu olhar cruzou com um dos novatos Gryffindors; ela fuzilou o menino com os olhos, o olhar que dizia “sou muita poção para o seu caldeirão”, e manteve os olhos fixos até que uma risada foi ouvida ao seu lado.

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“O menino está na primeira semana de aulas” disse Harry, observando o pupilo apressar o passo para se afastar deles. “Tire uma folga do seu cargo de princesa do gelo, Daph.”

“Mas eles continuam a nos encarar” ela reclamou, apontando discretamente para a dúzia que pessoas que, em grupos maiores, realmente encaravam e cochichavam... alto. “Eles não pararam desde que se deram conta que estamos juntos. Desde que você voltou, na verdade.”

E Harry sabia que seu voltar não fora o de Hogwarts.

O menino deu de ombros. Não que ele não estivesse incomodado; ser observado vinte e quatro horas por dia era para poucos, apesar de parecer ser uma coisa de família: Harry só havia se acostumado com o garoto fotógrafo de Gryffindor, os pupilos de Ravenclaw perguntando para ele como foi toda a sua experiência, e a própria família sondando-o por informações.

Sim, ele estava acostumado. Mas também estava puto da vida.

Sibilou as próximas palavras: “Deixe-os em paz, Daph, e talvez, só talvez, eles vão fazer a mesma coisa.”

“Eles estão olhando para você” ela sibilou de volta.

“Fique tranquila” murmurou Harry, deitado e aproveitando o sol fraco da Escócia enquanto podia. “Estão só curiosos” ele se virou, deitado de bruços, encarando Daphne com um olhar brincalhão. “E qualquer coisa, lembre-se que por lei, estamos noivos.”

A loira delicadamente lhe mostrou o dedo do meio.

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Havia um silêncio mortal na mesa dos Slytherins quando Harry se aproximou para tomar o café da manhã continental, contrastando com a usual alegria pelo fato de que finalmente, parecia que seus interesses estavam sendo ouvidos.

“Quem morreu?” brincou o moreno, sem deixar de estar preocupado. Ele beijou Daphne e se sentou ao lado dela, procurando por um jornal ou qualquer fonte do que pudesse ter acontecido. “Sério, gente. Me expliquem o que está acontecendo.”

“A Ordem está tentando remover Umbridge do cargo de Defesa Contra as Artes das Trevas.”

Harry franziu a testa. “Mas isso é ótimo! Nem mesmo uma alma nessa escola gosta da senhora em rosa.” Viu os olhares que recebeu e parou para pensar no que tinha dito, por algo que pudesse explicar a situação. “Ok. Qual o problema?”

“O Ministério entrou com uma ordem judicial juntamente com Hogwarts para remover Umbridge e colocar um professor que ambos julguem adequados para ensinar jovens mentes.”

“Papai entrou no meio da briga” confessou Draco, a leve vermelhidão em sua face se destacando contra a pele extremamente branca e os cabelos claros, dando-lhe a impressão de ter se exercitado por muito tempo. “Ele é um ótimo trabalhador e sabe brincar com galeões para mover o fluxo dos pensamentos. Nossa melhor chance seria vovô, mas duvido que Abraxas Malfoy seja a opção número 1 da luz para advogado.”

Harry deu de ombros. “Seu pai talvez tenha mais chances, sendo amigo do Ministro. Afinal, não pode haver muitos membros da Ordem sobrando. Metade das nossas aulas são ensinadas por eles.”

Pansy o cutucou e perguntou se por acaso o moreno sabia de alguém que poderia servir de substituto caso Umbridge definitivamente fosse ser removida do cargo. Harry franziu a testa, pensando por um instante.

Nenhum nome lhe veio à mente.

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Acabou que ele estava, mais uma vez errado.

Quando alguém caiu do lado de fora da sala de aula, os alunos reviraram os olhos. Quando a mesma pessoa tropeçou no batente da porta, os mais ousados riram, seus risos aumentando de intensidade quando se depararam com a pessoa que lhes ensinaria Defesa Contra as Artes das Trevas.

“Me chamo Tonks” anunciou a metamorfomaga, ajeitando seus curtos cabelos cor de rosa e se posicionando no centro da sala. “É Tonks, não Thonks. Quem me chamar de Thonks vai ter uma surpresa desagradável. Ah, perguntas?”

Harry sorriu. “Qual o seu primeiro nome?”

Os cabelos de Dora instantaneamente mudaram do rosa choque para um vermelho intenso. “Meu sobrenome é Tonks, e isso é tudo que precisam saber.”

Draco levantou a mão. “Há algum motivo pelo qual tem “Nympha” no seu nome?”

“Se está tão curioso para ver como sou na cama, senhor Malfoy, talvez possa sonhar com isso na detenção. Isso é, depois de terminar de tirar minhas cutículas. Não te contaram? Minhas detenções são diferenciadas!” ela bateu os cílios, seus olhos cinzentos característicos dos Black brilhando com diversão. “Varinhas para fora, meninos, e nem pense nisso, Malfoy.” Tonks mirou os outros alunos. “Nenhum engraçadinho, eu espero. Tudo bem, varinhas para fora, temos que colocá-las para funcionar! Acham que é só ficar polindo?”

Theo escondeu a face nas mãos.

“Primeira aula, vamos descontrair. Qual o melhor jeito de incapacitar seu oponente, impedindo-o de correr? Dez pontos para quem não utilizar um feitiço conhecido desde o primeiro ano de vocês.”

Blaise levantou o braço direito e sugeriu acertar um feitiço qualquer na coluna do oponente. Daphne indicou que, realizando um corte no músculo da perna, ninguém irá conseguir escapar sem meios mágicos. Tonks já balançava a cabeça, apesar de ter concedido vinte pontos para Slytherin nos poucos minutos pelas estratégias criativas.

“Senhor Malfoy! Por que não vem aqui, para que eu demonstre minha sugestão em você?”

Draco caminhou até Dora e se colocou em posição de defesa. A professora sorriu. “Puta que pariu!”

“Senhoras e senhores” Tonks voltou a sorrir, notando o desconforto de Draco quando andou de volta para o seu lugar. O cabelo da metamorfomaga mudava de cor a cada poucos segundos, sempre vibrantes. “Eu lhes apresento a hemorroida.”

Conforme ela havia dito, o resto da aula foi baseado em modos criativos de incapacitação. A maioria trouxa, mas alguns bruxos, que podiam ser criados com pequenos feitiços que até primeiros anos seriam capazes de usar, se soubessem. O que era o ato de inchar uma parte do corpo quando eles aprendiam a explodir tal corpo?

Quando foram dispensados, com a ordem da bruxa de que não tentassem aquilo nos dormitórios ou em casa, gritos vindos do Hall Principal mobilizaram todos os estudantes a se espremerem contra as paredes, em silêncio, para ver quem conseguia entender a história primeiro. Demorou um tempo, porque ninguém estava acostumado a ouvir nenhuma daquelas vozes em mais do que um tom normal, porém Draco empalideceu quando reconheceu as palavras promover o relacionamento de bruxos e trouxas.

“Merda” ele murmurou, alto para que todos pudessem escutá-lo. “É o meu pai.”

E de fato Lucius Malfoy elevou a voz ainda mais, gritando sobre a neutralidade de Hogwarts e como era proibido de acordo com tal lei que professores fossem contratados sem que houvesse uma razão, essa razão não podendo ser de maneira alguma o fato de que pertenciam à Ordem da Fênix.

Foi a vez de McGonagall se exaltar: “Se você é o tanto que diz ser, então desenrole a manga esquerda e deixe-nos ver se carrega por aí uma mancha na reputação!” ela se virou para as portas, abriu-as e deu de cara com centenas de estudantes. “Mostre para aqueles que olham para você como o exemplo, Malfoy.”

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Subitamente, o loiro se calou. “Muito bem, Dumbledore, McGonagall. Se é assim que querem jogar, não há nada que eu possa fazer. Apenas quero deixar bem claro que, se Hogwarts estiver em perigo, vocês não podem contar com o Ministério.”

Caminhou pelos estudantes apoiado em sua bengala sem nem mesmo olhar o filho. Manteve os olhos altos, até desaparecer atrás de uma colina. Inconscientemente, todos os estudantes soltaram a respiração.

_

O Lorde das Trevas estava bravo.

Mentira. O Lorde das Trevas estava furioso. Lucius sempre fora um de seus comensais mais úteis, sempre com pauzinhos a mexer no Ministério para que tudo ocorresse ao seu favor, tanto na primeira quanto na segunda guerra. Agora havia se rebaixado ao ponto de não conseguir retirar uma professora novata, da Ordem e provavelmente um pouquinho biruta do cargo? Onde estava a cabeça do loiro? Ele havia esquecido a quem devia lealdade eterna?

Ele se movimentou pela escuridão, sentindo a varinha coçar em seus dedos para ser usada. Era como se ele conseguisse ouvir suas súplicas, a varinha queria usar uma maldição, e ele queria ver o flash de luz verde sair dela. Não havia nada mais bonito, em sua opinião, do que ver uma luz surgir apenas para que outra se esvaia dos olhos de alguém.

Tão poético!

Seus seguidores estavam se dispersando, ele sabia. Desde que o lado das trevas se separou entre seguidores do Lorde das Trevas e do Pequeno Lorde, as fileiras deixaram de ser acrescentadas. Sempre que uma tropa era recrutada, boa parte acabava percebendo que não era tão radical assim e ia para o lado cinzento da vida. Quem não queria ser cinza e ter a liberdade de escolher o que quisesse quando bem quisesse?

Ele.

Não deveria haver um lado cinza. Um crepúsculo era o momento de transição. Assim como este é belo, é belo enquanto dura. Um crepúsculo que durasse pela eternidade deixaria de ser belo para se tornar cotidiano, e enquanto o cotidiano pode não se tornar ruim, o cotidiano, como o próprio nome diz, é repetitivo. Uma guerra não é cinza. O tom da guerra sempre oscila entre o preto e o branco, modificando suas nuances a cada segundo.

O Lorde das Trevas podia seguir a escuridão como um devoto fervoroso, mas... Era diferente. Ele sabia melhor. Conseguiria vencer a guerra com o uso da violência e de feitiços proibidos tanto pelo lado Cinza, quanto pelo lado da Luz. As trevas eram, sem mais nem menos, uma vantagem.

Mas para isso precisava terminar seu trabalho. Antes o trabalho, e depois, como costumava ouvir muitos anos atrás, a diversão. Ele bem sabia que não existia diversão em tempos de guerra: A paz era, de certa forma, a diversão depois do trabalho duro das tropas contra os inimigos. A paz seria atingida. Com o terror, que fosse, mas paz é um conceito que muda de pessoa para pessoa.

Para ele, seria daquela maneira.

E o Lorde das Trevas havia acabado de descobrir a arma perfeita.

Ele abriu os portões, desviando-se de todos os ornamentos do jardim frontal e esperando não ativar nenhum alarme. Sempre fora cuidadoso e sabia muito bem como eram as artimanhas dos comensais, mas tempo era tempo e ele tinha que admitir... Estava ficando velho. Logo não conseguiria mais se manter em forma durante as batalhas sem o uso da Pedra Filosofal.

Iria morrer, ou apenas definhar? Sabia que sua alma havia sido partida muito antes da história das horcruxes.

Mudou de ideia, não usaria a varinha! Precisava fazer aquilo como um trouxa, se rebaixar para realizar uma morte de uma pessoa de alto escalão. Retirou a adaga do bolso, preparou a mira. Pensou em acordá-lo, para que vivenciasse o que estava prestes a acontecer.

Não. Ele não teria ideia do que o havia atingido.

Harry sorriu diabolicamente, seus olhos brilhando no escuro do quarto. Verdes, a maldição da morte sendo carregada por meio de um artefato trouxa. Moveu seus braços, testando-os. Precisava garantir uma força mínima para a tarefa.

Sim, aquilo era o suficiente. Sem desfazer o sorriso, Harry desceu o punhal da adaga no peito de Lucius, repetidas vezes. Não contou quantas foram (como poderia?) mas depois do que estimou serem algumas dezenas, seus braços queimavam de cansaço e a exaustão tomava conta do seu corpo.

Os lençóis brancos da cama estavam vermelhos: Seu trabalho estava feito.

Olhos verdes se arregalaram por um único instante. Percebendo o que estava acontecendo, o Lorde das Trevas se retirou. Harry despencou no chão como uma boneca de pano, inconsciente. Só acordaria no dia seguinte, quando estivesse rodeado de aurores e jornalistas, depois de certos pesadelos que iriam atormentá-lo quando abrisse os olhos...