POV Lia

Eram 9am quando meu telefone tocou. Quando vi quem era tive um mau pressentimento; um péssimo pressentimento pra falar a verdade. Krig era o nosso melhor contado como fornecedor, mas também era um velho amigo meu e fazia alguns trabalhos como hacker pra mim. Ele vivia isolado porque não gostava muito de pessoa; em resumo não era do tipo que ligava pra alguém. Por isso mesmo ele estar me ligando não era a melhor das notícias.

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–-Por favor; diga que me ligou só porque se sentiu sozinho e quis falar com alguém – eu peço atendendo a chamada.

–-Desculpe; Lia, mas esse não é o caso – fala a voz do outro lado da linha.

–-O que aconteceu? Melhor; o que descobriu nas coisas que deixei com você? – perguntei desanimada já sabendo que coisa boa não era.

–-Há tempos eu não via tanta informação junta, Lia. A Amélia realmente pesquisou muito. Era tanta coisa que não consegui achar uma ligação e um padrão entre todas as informações então resolvi jogar num programa e trabalhar a aleatoriedade. Não esperava encontrar tanta correlação. Esses Cloud’s estão envolvidos em coisa grande Lia; grande demais até pra mim. Usei as pesquisas da Am e dei uma busca no meu banco de dados e as coisas não são nada legais; já te mandei esses arquivos pra você dar uma olhada por falar nisso.

–-Ainda não entendi o porquê de você me ligar por causa disso; Krig – falei já que realmente aquilo tudo, por pior que fosse, não era motivo pra uma ligação dele.

–-O programa de analises aleatórias tava ligado na rede. Não era minha busca inicial, mas ele cruzou alguns dados aparentemente sem conexão e encontrou uma coisa.

–-Não gostei desse seu tom de voz, Krig.

–-Não era pra gostar mesmo – ele retrucou meio irritado – Achei a Amélia, Lia. Ou pelo menos a ultima pista que ela deixou.

Meus olhos se arregalaram. Pra ele dizer isso com esse humor não quer dizer que era algo bom. Mas eu não entendia como achar a Amélia; algo que estamos tentando há meses; pode não ser algo bom.

–-Lia?? – ele me chamou; acho que fiquei quieta tempo demais.

–-Ainda to aqui. O que achou exatamente?

–-To te mandando isso agora. É melhor você olhar o mais rápido possível. Se já tiver encontrado a Juli é melhor ir com calma pra contar pra ela.

Agradeci por aqueles dois ainda não terem voltado; assim eu poderia checar isso sem ela por perto.

–-Vou ver isso gora; Krig. Mais alguma coisa?

–-Sim – ele falou preocupado – Seja rápida.

Depois disso ele desligou sem se despedir. Não que isso não fosse normal e já esperado, mas ele podia pelo menos explicar o que quis dizer com aquilo.

POV Julia

–-É tudo muito complicado, Ford – falei pra ele depois que me perguntou sobre meu mundo.

Estávamos voltando devagar, sem pressa. Cada um montado no cavalo em que veio, mas andando bem próximos um do outro.

–-Não tem que me dizer detalhes. Só simplifique o que for mais fácil de contar e explicar – ele insistiu – Quero saber o que puder sobre você Julia.

O sorriso calmo dele me fez sorrir também.

–-Certo; vou tentar, mas não prometo muita coisa – respondi rindo e o sorriso dele aumentou – Tá, me deixe pensar por onde começo.

Pensei um pouco. Não era um assunto fácil de falar e explicar. Por fim decidi começar por algo prático.

–-Primeiro: existem dois tipos de caçadores de recompensas. A maioria são criminosos. Aceitam qualquer serviço que pague bem; não se importam com o que vão ter que fazer e nem respeitam lei nenhuma. Alguns poucos são como eu, lia e minha mãe. Nós somos o que o governo chama de caçadores confiáveis – rolei os olhos – Apesar de não confiarem nada em nós. E, bem – dei de ombros – Nós ainda infringimos leis, quebramos regras e usamos de meios não legais para conseguir o que queremos. Por isso, se nos encontrarem e puderem, vão nos prender com certeza. Mas mesmo assim todos eles fazem vista grossa para nós, só não podemos deixar que eles nos peguem. Acho que essa é a parte mais simples de entender.

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–-Sim – ele falou sorrindo como se tivesse achado engraçado meu jeito de contar tudo aquilo – Acho que entendi bem essa divisão entre os caçadores.

–-Isso – falei animada – Divisão é a definição perfeita. Existe mesmo uma clara divisão, tanto entre os próprios caçadores quanto aos trabalhos que fazem e onde os encontram. Veja, para quem sabe o que e como procurar é possível acessar, pela rede, o que eles chamam de “Lista”. Que é o lugar onde estão os trabalhos que precisam de voluntários. Um caçador qualquer pode acessar essa lista e escolher um serviço. Só que existe também uma outra lista que só alguns tem acesso: a “Lista do Governo” – faço aspas com os dedos dizendo isso – Só caçadores selecionados e reconhecido pelas autoridades mundiais tem acesso a essa lista porque ela aparece em endereços eletrônicos que damos a eles sempre que ocorre uma mudança. Esse numero de caçadores é muito restrito por que poucos são bons o bastante para que eles decidam aceitá-los.

Ele balançou a cabeça pra cima e pra baixo como se dissesse que estava entendendo.

–-Algo mais? – ele pergunta pra confirmar e eu perco minha animação.

–-Bem... – “vamos lá Julia”, eu penso, “tenho que contar isso pra ele uma hora ou outra” – Sim... O motivo pelo qual eu me afasto das pessoas – falo suspirando – Bem, não tem relação só com meu passado e minha vingança.

–-Como assim Julia?? – ele pergunta me encarando confuso; pude ver que nos olhos dele tinha um pouco de medo pelo que eu poderia falar, mas notei que não era do que eu falaria, mas medo pelo que poderia estar acontecendo comigo.

–-Todos os caçadores são caçados também, Ford – falei como se fosse algo óbvio – Independente de que tipo de caçador você seja, sempre que completa um serviço você prejudica alguém. Nem todos ficam quietos depois disso. Dependendo de quem você prejudicar ele e seus aliados vem atrás de do caçador. Isso faz com que cada um de nós tenha uma recompensa por sua cabeça.

–-Ainda não entendi como isso se relaciona com o fato de você se afastar das pessoas – ele retrucou sério percebendo que eu estava enrolando.

–-Minha mãe é uma caçadora do governo, isso significa que ela entrega criminosos. Se eles descobrissem que ela tem uma família viriam atrás de todas essas pessoas para atingi-la.

–-É por isso que você não se envolve?? Por medo de envolver outros nesses riscos que vocês duas correm? Medo de seus inimigos atacarem aqueles que são próximos a vocês??

–-Também... – certo; seria complicado explicar isso pra ele, mas melhor tentar agora do que nunca – Não quero que descubram quem eu sou.... Ford, você viu a cara da tia Jes quando olhou pra mim. Por um instante ela teve certeza de que era minha mãe. Você pode imaginar como outras pessoas não acabariam nos confundindo e ligando os fatos de que somos da mesma família?

–-É – ele admitiu – Não posso.

–-Quando comecei a treinar com a Lia nós planejamos uma forma de nunca me reconhecerem. Hoje, depois de mais de dois anos nisso, não há uma única pessoa sequer no mundo dos caçadores que conheça o meu rosto. Eu sou o fantasma que caça em nome do governo. Um fantasma sem rosto, sem nome e sem corpo. Eu apareci no mundo dos caçadores de recompensa como uma sombra e ninguém consegue me rastrear – Ford fez uma cara confusa e devo admitir que se eu não me entendesse o pouco que entendo também estaria assim – Minha mãe não chama muita atenção porque sempre faz trabalhos pequenos; bons, mas pequenos. Eu não. Quando comecei estava decidida a superar a Lia. E, bem, todos medem o quão bom é um caçador pelo preço que estão dispostos a pagar pela cabeça dele. Lia tem o maior preço até hoje – falo suspirando – Eu sou o segundo caçador mais procurado.

Olho pra Ford e a expressão dele é indecifrável. Posso ver que ele esta tentando absorver essa quantidade toda de informação e não esta se saindo muito bem em correlacionar tudo. Encaro o campo a nossa frente e recomeço a falar:

–-Eu não existo Ford – falo olhando pro céu antes de continuar – Pra segurança da minha mãe e minha eu não posso existir. Por que se descobrirem quem eu sou vão atrás dela. Mas não é só isso. Me acostumei a ser uma sombra, eu apareço e desapareço como um piscar de luzes. Eu não posso ter nada me ligando ao mundo real. Eu... um fantasma não tem amigos ou família.

–-Não precisa ser assim – ele fala e posso sentir o peso do olhar dele sobre mim, mas não me atrevo a encará-lo – Eu não vou desistir de você por causa de possibilidades. Céus!! Eu não desistiria de você nem por fatos concretos.

O encaro não acreditando. A maioria das pessoas deveria entender a magnitude do que eu falei. Caralho!! Acabo de falar pro cara que se ele ficar comigo corre o risco de ter centenas de caçadores inescrupulosos e sedentos de sangue atrás dele também e o cara me responde que não se importa??? Isso não é normal. Mas parte de mim esta aliviada por ser assim. E é essa parte que faz um sorriso aparecer no meu rosto. Não falamos mais nada no resto do caminho. Já havíamos falado demais então apenas nos deixamos levar pelos cavalos admirando ora a paisagem ora um ao outro.

Se eu pudesse imaginar o que me esperava garanto que teria cavalgado muito mais rápido, mas o que aconteceu já é passado e não podemos mudar o que passou. Resta apenas decidir o que faremos com o que vier pela frente.