Caçada

A Jaula do Tigre


Meu cérebro trabalhava à mil, enquanto eu tentava captar as palavras do senhor Benzini.“Você está encarregada a partir de agora, de cuidar da nossa nova atração!” Comecei a pensar em todas as maneiras que eu poderia ser devorada por um tigre, e nenhuma delas me animou.

Claro que na cabeça do velho Benzini, se você consegue tratar de cães, você pode cuidar de um tigre de quase 300 quilos, do tamanho de uma moto, que olha para você pronto para te devorar.

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Por acaso ele deu uma olhada naqueles dentes enormes e totalmente letais?

Mas uma parte de mim se agitava com a perspectiva de poder ficar mais perto daquele belo animal, tocar seu pelo macio e poder encarar aqueles olhos amarelos mais de perto.

Aqueles pensamentos insanos começaram a me assustar, afinal, era para eu estar tremendo de medo e não pulando de alegria por ganhar um novo bichinho de estimação.

Fui tirada daquele meu conflito interno, quando um rugido alto invade meus ouvidos. Pisco algumas vezes, e olho para a direção do som, onde era possível ver o tigre encarando Matt com uma cara nada amigável.

– Cuidado com essa jaula, senhor Donovan! Se alguma coisa acontecer com nossa estrela, você ficará sem salário por longos meses!

Senhor Benzini, começou a andar em direção ao seu trailer, balbuciando coisas como:“Vamos ganhar muito dinheiro!”, “Esse será o melhor espetáculo de todos!” e “Esse tigre é minha mina de ouro!”

Matt recomeçou a sua tarefa de levar o tigre direto para um tenda pequena que ficava perto do picadeiro. O tigre resmungou mais algumas vezes, quando Matt batia com a jaula em algumas pedras.

Tentando me localizar no meio de toda aquela loucura, corri para alcançar o senhor Benzini que agora cantava uma música alegre em italiano.

– Por favor senhor Benzini, deixe o Jordan cuidar do tigre, ele sempre disse que era domador de um no circo em que trabalhava! – Digo ofegante devido a pequena corrida.

O velho careca volta seus pequenos olhinhos castanhos em minha direção e abriu um sorriso, enquanto eu rezava para que ele repensasse na ideia de adicionar um novo cargo para mim.

– Jordan vai estar muito ocupado treinando o novo número com o tigre. – Ele diz apontando seu longo dedo para meu rosto. – Você irá cuidar desse animal, senhorita Campbell, pois caso tenha se esquecido, eu aceitei você quando podia muito bem ter lhe deixado em um orfanato qualquer.

Encolhi meus ombros, quando as palavras duras de Benzini atingiram a cicatriz em meu coração. A frustação de estar presa naquele circo fez meus olhos começarem a marejar.

Impedi que as lágrimas caíassem e levantei minha cabeça, encarando os olhos severos do homem em minha frente. Reuni o restante de forças que me restaram e sussurrei.

– Tudo bem, senhor Benzini, eu cuidarei do animal.

A expressão antes nervosa do homem, se transformou em um sorriso satisfeito, enquanto ele dava palmadinhas no meu ombro. Minha vontade naquele momento era jogar o velho gordo na jaula para que o tigre devorasse ele.

– Muito bem, Mia, que bom que você sabe onde é o seu lugar. Agora, se me der licença, vou falar com Jordan sobre nosso novo número...

E com isso, o senhor Benzini virou as costas e continuou a andar, murmurando para si as vantagens de ter adquirido o novo animal.

Eu estava pronta para voltar ao canil e terminar de cuidar dos cachorros, quando uma pergunta surgiu em minha mente.

– Qual é o nome do tigre? - Gritei, fazendo o velho Benzini olhar para mim novamente.

– O antigo dono dele disse que era Kis... Como era mesmo? Parecia indiano... Kisha...Kishan! – Ele diz, batendo os dedos no queixo. – Isso! O tigre se chama Kishan!

Aquilo fez com que algo dentro de mim se agitasse mais ainda e eu tive a estranha sensação de conhecer aquele nome.

– Pare de ser idiota, Mia! Você nunca esteve na índia, por que você conheceria esse nome?- Me repreendo baixinho.

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– O que disse, Mia? - Benzini me olha desconfiado e eu trato de balançar minha cabeça.

– Nada! E-eu... Tenho que alimentar o Thor antes do show começar! – Digo e começo a me afastar.

Tento ocupar minha cabeça com as tarefas que eu tinha que cumprir antes que as primeiras pessoas começassem a chegar.

Alimentei todos os cachorros, limpei e arrumei as velhas arquibancadas de madeira, enchi balões que seriam vendidos nos intervalos e ajudei as dançarinas com suas fantasias.

Quando vi, faltava apenas uma hora para o show começar e tive que correr para tomar banho. A água estava gelada, pois o chuveiro do trailer que eu dividia com mais algumas garotas tinha quebrado.

– Vou ter sorte se não pegar um resfriado de novo. – Resmungo, enquanto vestia minhas roupas de sempre. Blusa preta com a camiseta xadrez que era muito maior que número que eu usava, shorts rasgados e as velhas botas de couro preto.

Caminhei até a bilheteria, vendo as pessoas correndo de um lado par o outro, enquanto procuravam por suas roupas e treinavam uma última vez o número que apresentariam naquela noite.

Abri a caixa registradora quando as primeiras famílias começaram a chegar. Crianças gritavam de alegria ao verem as luzes piscando em volta das tendas e eu podia ver Matt já vendendo pipoca e doces para as pessoa que se aproximavam.

A melancolia me dominou quando vi as crianças contentes ao lado de seus pais. Me repreendi e tirei aquilo da cabeça, me concentrando na tarefa de contar o troco.

Vinte longos minutos depois, eu estava guardado o dinheiro dos ingressos no cofre para que o senhor Benzini pudesse contar no final da noite. Sua voz carregada com o sotaque italiano tomou conta dos meus ouvidos, anunciando o começo da apresentação.

– Senhoras e senhores! Sejam bem vindos ao Benzini Brothers, o maior espetáculo da terra!

Revirei os olhos ao ouvir a fala clichê e estúpida que o Benzini usava como slogan do circo. Só na cabeça daquele velho que alguns palhaços e cachorros dançarinos podiam ser considerados “o maior espetáculo da terra”.

Sai da bilheteria sem a menor vontade de assistir ao show, afinal, eu sabia todos os números de cabeça. Andei pelo gramado sentindo o vento gelado bater em minhas pernas descobertas, coloquei as mãos no bolso do shorts e olhei para o céu, que estava estrelado e sem nuvens.

A vontade de ter um lugar aonde eu poderia ser eu mesma e fazer as coisas que eu realmente gostasse, um lugar aonde eu pudesse ser livre, tomou conta de mim e quando vi, já estava parada na frente da tenda do tigre.

O vento balançou meu cabelos, enquanto meu coração palpitava no peito. Respirei fundo e decidi encarar aqueles sentimentos malucos. Afastei o tecido vermelho que servia como porta e entrei.

Dentro da tenta tudo estava escuro, e o que se via ali era uma enorme jaula pintada de vermelho e amarelo.

Me aproximei das grades de ferro e consegui enxergar a silhueta negra do tigre que se confundia com a escuridão do ambiente. Ele estava deitado, com a cabeça apoiada entre as patas e eu podia dizer que ele estava dormindo se não fosse pelo balanço de sua calda.

Ainda tentando entender o porquê de eu me sentir tão atraída por aquele animal, segurei uma das barras de ferro e tentei fazer com que minha voz não saísse falha.

– Então... Você é o Kishan?

Como resposta, recebi o olhar questionador do tigre quando ele virou a cabeça para me encarar com aqueles olhos amarelos.

Senti meu corpo ficar mole quando me vi presa no seu olhar solitário.

Continua...