Cavaleiros do Zodíaco: A Saga dos Herdeiros

Primeira Fase - Episódio Oito. Fantasmas da Morte


O vento soprava o manto negro do cavaleiro de Capricórnio. O Sol, refletido sobre sua armadura, lhe conferia um brilho quase mágico. Parado diante de sua lendária casa zodiacal, em sua mente viajavam fórmulas, cálculos, gráficos e algoritmos. Então, Ban avistou Shiryu se aproximando e os símbolos desapareceram de sua imaginação.

— Chegou atrasado – disse Ban.

— Não marquei nenhum horário.

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— Perdoe-me, apenas pressupus que um cavaleiro de ouro seria mais rápido – brincou Ban, enquanto convidava Shiryu para entrar em sua casa.

Lá dentro, na lateral do hall central por onde se atravessava para chegar à próxima casa, Shiryu não podia deixar de notar a incrível quantidade de livros, grimórios, pergaminhos, ferramentas complexas e delicadas, vidros com líquidos luminescentes, tubos e caldeirões fumegantes. Uma variedade estonteante de objetos. Ban acomodou-se em um banco, ofereceu outro a Shiryu que, por sua vez, recusou.

— Então?

— Você foi um dos que treinou com Jabu após a queda de Hades. Eu gostaria de saber os detalhes sobre o treinamento dele.

Ban ficou pensativo e demonstrou um pouco de confusão.

— Você está errado, Shiryu. Eu não treinei com ele. O meu treinamento foi muito solitário. Na verdade, percebi, na Guerra Galáctica e nas batalhas que se seguiram, que eu não poderia ajudar em combate tanto quanto vocês já ajudavam. Decidi então afiar a minha mente, buscar os segredos do cosmo, do sétimo sentido e dos outros. O que posso lhe dizer sobre o treinamento de Jabu foi que, sem dúvidas, ele se pôs inúmeras vezes na beira da morte. Ele me fez algumas visitas, e em algumas delas, tive de correr para salvar a sua vida.

Shiryu se aproximou um passo.

— O que ele lhe disse durante essas visitas? – Perguntou o cavaleiro de Libra. – Ele fez algum comentário sobre que treinamento foi esse?

Ban via com estranheza tamanha curiosidade que Shiryu tinha sobre o assunto.

— Bom, ele...

O cavaleiro de Capricórnio começou a buscar detalhes sobre o que ocorrera em sua mente, mas ela estava estranhamente embaralhada. Ele se lembrava de sombras. Sombras que acompanhavam Jabu. De maneira embaçada e faltando pedaços, veio à sua mente a imagem do cavaleiro adentrando sua biblioteca particular. Era um local isolado, escondido em outro país. Jabu sangrava dentro da sua antiga armadura de unicórnio, pedia ajuda, mas ao se aproximar, tudo escurecia e sua memória era apenas um borrão.

— Ele não me disse nada – finalizou Ban, incapaz de lembrar-se. – Eu lembro apenas que o ajudei, e ele partiu. Na verdade, eu me lembro de algo.

Shiryu se aproximou de Ban, quase que como para pressionar-lhe a falar mais rápido.

— Ele me comentou que eu não precisava me preocupar, pois Geki estava supervisionando o seu treinamento.

O Juiz de Atena apenas deu as costas e partiu, sabendo agora com quem deveria falar.

Durante a fria noite, a oeste das Doze Casas, havia uma depressão no terreno, como se todo um local bem definido tivesse simplesmente baixado o seu nível alguns metros em comparação ao resto, tornando-se um lugar ermo, levemente íngreme, onde muitas vezes pequenos nevoeiros rasteiros se formavam. Os ventos faziam as paredes que cercavam o lugar uivar e algumas pedras rolarem, dando a sensação de passos. Como se não bastasse todas as características assustadoras, aquele era o cemitério do Santuário, lugar onde inúmeros cavaleiros estavam enterrados em covas simples com lápides sem luxo.

A terra era bruta, as lápides eram apenas lascas de pedra mal enterradas com o nome do cavaleiro talhado sem cuidado algum. A maioria delas era simbólica, pois nem ao menos havia um corpo sob o solo. Muitos se perguntavam o motivo de uma deusa tão bondosa tratar tão mal os seus mortos, guerreiros que lutaram e morreram por ela. Mas os cavaleiros mais experientes lembravam que venerar a morte é venerar Hades. Eles lembravam que o objetivo dos verdadeiros cavaleiros não é morrer pela deusa, mas sim, viver por ela.

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Fitando uma das lápides estava um jovem rapaz. Ele tinha o olhar triste de quem já vira muitas coisas terríveis. Coberto por um manto marrom rasgado e um capuz, o jovem podia ver ali muito mais do que outros podiam. Logo seu pensamento foi desviado pela chegada de uma presença sorrateira.

— Essas são terras proibidas – disse o que acabara de se aproximar. Sua voz era comum, mas também carregava certa tristeza.

— Então o que está fazendo aqui? – Perguntou o jovem que fitava a lápide.

O homem permaneceu em silêncio.

— Essa é uma das estratégias de Atena, não é? – Comentou o jovem. – Dizer que o local onde ficam os mortos é uma terra sagrada, onde até mesmo os cavaleiros são proibidos, fazendo desse lugar um ponto fraco do Santuário. Um bom lugar para uma incursão inimiga, enquanto, na verdade, todo esse terreno é uma grande armadilha.

O jovem então voltou o seu olhar para o céu.

— É como se mesmo após a morte, os cavaleiros continuassem a defender o Santuário e Atena – concluiu o jovem.

— Quem é você? – Perguntou o outro.

— Cavaleiro de bronze, Aziel de Erídano.

Imediatamente Aziel removeu o manto, revelando a sua armadura negra com o braço direito envolto em faixas.

— Nachi, cavaleiro de ouro de Câncer.

No momento em que Nachi, antigo cavaleiro de bronze de Lobo, revelou sua identidade, Aziel se pôs de joelhos.

— À vontade, cavaleiro – disse Nachi. – Estava visitando alguém?

— Eu estava visitando todos – Respondeu Aziel, levantando-se. – Todos com quem um dia me importei estão aqui agora.

Por mais triste que parecesse, Nachi não se sentiu abalado.

— Você deve partir, cavaleiro de Erídano. Não se deve bajular a morte.

Aziel começou a ir embora, mas então parou no caminho. Nachi o fitou com curiosidade.

— Se você é responsável pela armadilha do cemitério, então é porque é diferente também, não é mesmo? – Disse Aziel.

— Também? – Perguntou o cavaleiro de Câncer.

— Você também os vê, não vê? É capaz de retirar poder deles, de inserir-lhes vontade. É quase como um deus para eles.

Nesse momento, Aziel concentrou sua cosmo energia. Uma chama que bruxuleava um fogo branco e azul acendeu na palma da sua mão cheia de faixas. Nachi permaneceu impassível, como se aquilo não lhe representasse nada.

— Você deve partir, cavaleiro – repetiu Nachi.

Aziel então tirou o seu olhar das chamas. Com um movimento de mão, ele apagou o fogo, virando as costas e partindo. O cavaleiro de Câncer começou a receber um enorme acumulo de lembranças. Imagens que vinham à sua mente como uma sequência de fotos – primeiro, ele abandonando a armadura de Lobo, em seguida, indo viver em uma casa em um pequeno vilarejo fora do Santuário, fazendo novos amigos, conhecendo uma bela garota. Mas então vieram as sombras que traziam o medo. Sua casa destruída. Um mar de corpos cobrindo o chão do vilarejo. O corpo da sua garota em seus braços. Dia após dia vivendo em meio aos corpos em decomposição. Ele abraçara a morte como uma amiga. Jabu apareceu em seus sonhos, mas era apenas um borrão. Então, a primeira esfera de luz apareceu. Em seguida outra e mais outra. Eram seus amigos. As esferas o guiaram para a mata e lá estava ela ­– magnífica e reluzente – a armadura de ouro de Câncer.

Naquele chão vazio do cemitério, sob a visão de qualquer um, aquelas eram terras tão mortas quanto os seus moradores. Mas sob a sua visão, e a visão daquele garoto, aquela era uma terra divertida, viva, repleta de esferas brancas e azuis que iam e vinham, brincavam, chocavam-se umas com as outras. Algumas tomavam formas humanas e conversavam, contavam piadas umas às outras. De longe, Nachi via Aziel partindo de costas. Enquanto o olhar comum veria um garoto solitário, abandonado e misterioso, Nachi via um jovem com vários seguidores. Amigos em forma de pequenas esferas azuis. Pessoas que, mesmo após a morte, jamais o abandonariam.