POV Paulo

Quem diria que matar aula iria acabar comigo na prisão com o conselho tutelar me entupindo de perguntas. Resolvi tentar algo que sempre dava certo, pelo menos nos filmes:

—-Eu exijo o meu telefonema.

Todos pararam e me encararam. Era a primeira vez que eu falava desde que tinham me arrastado para aquela sala. O primeiro que se recompôs foi o policial que tinha me pegado, injustamente.

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—-Claro, vai ligar para seus pais?—perguntou. Meus pais? Se eles soubessem que eu matei aula e as companhias, quer dizer, ex-companhias que eu andava, eu estava lascado. Marcelina? Estaria em aula. A escola? Nunca, eles me expulsariam. Koki? Não. Eu só tinha uma esperança.

—-Eu só tenho uma ligação?—resolvi confirmar.

—-Você pode ligar para alguém que não seja da sua família, mas mesmo assim contataremos seus pais já que pela sua cara você não é maior de idade—o delegado falou.

Peguei o celular e disquei o primeiro numero que me veio a cabeça. Eu ia me lascar de um jeito ou de outro. Fiquei surpreso quando ela atendeu, pela hora devia estar na escola.

—-CJ?—perguntei.

—-Guerra? O que você quer?—CJ retrucou.

—-Não precisa ser grossa, Cat—resolvi lhe inventar um apelido logo agora. Se ela desligasse na minha cara, eu estaria ferrado mais ainda.

—-O que você quer—CJ repetiu numa voz controlada.

—-Não desliga, eu me meti numa roubada, por culpa de má companhia.—falei num sussurro e ela arquejou e bufou.—Tu é minha única chance, eu estou na delegacia.

—-O que você fez?

—-Eu não fiz nada, eles acertaram dois idosos e um policial com pedras, depois me empurraram no chão e saíram correndo...

—-Te deixando sozinho na roubada?—CJ completou.

—-Exatamente.

—-O que eu posso fazer?—CJ pareceu preocupada.

—-Vem agora para a delegacia da esquina do halfpipe, você deve saber onde é. Por favor, eu não estou de brincadeira.

—-Já chego ai.—CJ respondeu antes de desligar o telefone. Coloquei ele de volta no gancho e virei para todos que me encaravam.

—-Acabou?—o delegado perguntou.—Agora responda algumas simples perguntas.

Resolvi jogar duro. Eu não recebi fama de marrento atoa.

—-Depende—disse me sentando.

—-Do que?—o delegado retrucou.

—-Da pergunta.

Ele sorriu meio forçado antes de continuar.

—-Qual seu nome? E sua idade?

—-Paulo Guerra, dezesseis anos.—dei ombros.—Mas pode considerar dezessete já que só faltam alguns meses.

—-O que está fazendo fora da escola?

Agora não dava para brincar. Eu tinha de falar a verdade ou estava numa roubada. Resolvi tentar enrolar.

—-Não falo nada sem a presença dos meus advogados ou no máximo meus pais—a parada dos advogados funcionava em filmes.

—-Seu nome e Paulo Guerra hein?—um dos policiais perguntou.—Eu conheço o teu pai, ele é advogado.

Pronto agora ia virar manchete de jornal. “Filho de advogado famoso e pego por conselho tutelar e policial por matar aula e apedrejar idosos e um oficial.”

—-É ele mesmo—assenti.

—-Acho que ele vai gostar de saber que seu filho matou aula e apedrejou dois idosos—o delegado sorriu.—Ligue para ele.

Suspirei e bati a cabeça na mesa. Depois de cerca de quinze minutos eu ouvi certo burburinho do lado de fora antes de ver uma cabeleira loira com um skate na mão. Agi por impulso, levantei e a abracei. CJ estancou parecendo não saber o que fazer, mas deu tapinhas nas minhas costas. Me larguei dela e senti meu rosto dar uma esquentada.

Ela estava usando um gorro azul, uma camisa larga de um time de futebol que eu não me dei o trabalho de identificar e calças compridas.

—-Você é um idiota. Eu não te conheço a nem um dia e já to me metendo em uma roubada porque você fez besteira.—CJ me deu um tapa na nuca antes de começar a me socar, me arrependi de ter a chamado. Tentei segurar seus punhos, mas ela é muito baixinha e esquiva.

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—-PAREM!—o delegado gritou e eu fiquei grato por arrastarem CJ para longe de mim.—Quem é você?

—-Reforço?—CJ arriscou ainda sem tirar os olhos de mim, parecia que ela queria me perfurar com uma metralhadora.

O delegado me olhou e eu elaborei:

—-Ela é uma amiga. Eu liguei para ela. Mesmo que você tenha quase me espancado, valeu por ter vindo.

CJ me olhou como se eu tivesse sendo irônico.

—-Posso falar com ela a sós?—perguntei.

—-Vamos colher o depoimento dos senhores e vamos falar com seus pais.—o delegado avisou e saiu com os outros dois policiais e os idosos.

Quando eles sumiram pela porta encarei CJ. Ela jogou o skate no canto e me arrastou para sentar na cadeira ao seu lado.

—-Primeiro por que você não está na escola?—perguntou.

—-Posso te perguntar a mesma coisa—retruquei.

—-Eu não tive aula hoje.—CJ foi categórica.—E você? O que vai dar como desculpa?

—-Eu pulei o muro—murmurei.—Fugi da escola com três colegas.

—-Pelo que eu entendi, ex-colegas—CJ corrigiu com um leve sorriso, como se tivesse zombando de mim.

—-Más influencias.

—-Vai os dedurar?

—-Não sou fofoqueiro—dei a resposta categórica.

—-Você é teimoso mesmo...

—-Prefiro o termo decidido.—corrigi.—Eles estudam na mesma escola que eu, já comecei a segunda semana de aulas com encrenca.

—-Analise melhor suas amizades—CJ deu ombros.—Mas agora, voltando para o presente, o que você vai fazer?

—-Meu pai vai provavelmente me mandar para um reformatório, mesmo que a culpa não tenha sido por completo minha. Eu admito que errei...

Fui interrompido pela porta se abrindo entrando o delegado, os policiais e os idosos.

—-Não conseguimos falar com seus pais garoto.—suspirei aliviado com as palavras do delegado.—Mas não ache que escapou.

—-Olha pelo que entendemos—a senhora idosa começou e eu previ a bomba.—você não fez nada e sim seu amigos...

—-Não são meus amigos—agi por impulso e acabei não sendo nada educado e interrompendo.

—-O.k. seus ex-amigos que armaram tudo. Se você falar quem são eles e o que estavam fazendo fora da escola a essa hora, podemos retirar a acusação—o senhor completou. Olhei para CJ em busca de apoio, ela só deu os ombros.

—-Nos fugimos da escola eu não sei o que íamos fazer e eles estudavam comigo eles eram Zeca, Joe e Spencer. Eles eram um pouco mais velhos que eu, mil desculpas eu não sabia no que estava me metendo.—falei desembalado com os olhos marejando.

—-E você?—a senhora olhou para CJ.

—-Meu nome e Catherine Johnson. Eu estudo no centro e não tive aulas hoje e o idiota do Paulo que, infelizmente, é meu amigo me chamou.—CJ falou quase tão rápido quanto eu. Parecia estar assustada.

—-Entendi—o delegado se virou para mim.—Só isso que você sabe garoto?

—-Sim.

—-Uma última pergunta, onde vocês estuda?

—-Na escola Mundial—baixei a cabeça.

—-A diretora Olivia gostará de saber disso.—não contar para os meus pais, mas contar para a bruxa. Deu na mesma.

—-Tudo bem—suspirei e me levantei.—Posso ir?

Todos olharam para os idosos. Eles me encararam.

—-Você não me parece um mau garoto, só anda em más companhias. Retiramos as acusações contra você.—sorri internamente.—Não faça isso novamente e escolha melhor suas amizades.

Olhei para CJ e sorri antes de responder:

—-Pode deixar.

Puxei CJ pela mão para fora da delegacia. Quando estava do lado de fora respirei o ar puro e ela riu do meu alivio. Já eram quase três horas, o pessoal do colégio já devia ter saído. Eu nem pensava que ficaria tanto tempo fora. Senti minha barriga roncar.

—-Está com fome?—CJ percebeu.

—-Muita.—ofeguei e ela sorriu.

—-Conheço um ótimo lugar para almoçarmos.

Dessa vez foi ela quem me arrastou. Eu ainda estava com a minha mochila então estava indo um pouco mais devagar. Paramos na frente de uma lanchonete.

—-Por minha conta—falamos juntos antes de corar.

—-Meio a meio—decido e ela concorda. Entramos na lanchonete e escolhemos nossos lugares bem ao fundo. Sentamos lado a lado.

—-O que vão querer?—dou uma de cavaleiro e peço para CJ.

—-Dois refris grandes, uma batata-frita também grande e dois chesburguers, mas um só com a carne e o queijo.—pedi e CJ sorriu para mim levemente. A garçonete anotou o pedido e saiu.

CJ e eu ficamos em silencio até ela retornar com nosso pedido. Comemos também em silencio, eu não tirava os olhos de minha nova amiga. Depois disso ela era com certeza minha melhor amiga.

—-Obrigado—disse pela primeira vez enquanto bebia meu refri.—Pela força que você me deu lá na delegacia.

—-Sei o que é andar em más companhias.—não entendi o que CJ quis dizer.

—-Só aceita meu agradecimento—repliquei e ela abriu um sorriso que se extinguiu na mesma velocidade que veio.

—-Quanto deu?—perguntou para a garçonete.

—-Vinte—ela mascava um chiclete. Peguei dez reais trocados na carteira e CJ também.—Grata.

Levantamos e saímos em silencio do recinto. Paramos em uma praça e nos sentamos. A coisa mais inesperada do mundo acontece. CJ me dá um selinho antes de me olhar nos olhos e sorrir. Fiquei extasiado, mas a única coisa que saiu da minha boca foi algo como:

—-Hã?

CJ me olhou meio corada e com um sorriso de leve. Olhava-a ainda meio boquiaberto. CJ reparou na minha cara e o sorriso sumiu.

—-Desculpa, eu não devia—antes de ela terminar selei novamente nossos lábios. Quando nos separamos ambos sorrimos fracamente sem desgrudar nossos lábios por completo. Olhei para ela nos olhos que estavam mais suaves. Ela me deu um leve empurrão para me afastar e me encarar de cima abaixo.