Eu ofeguei em uma respiração sem ar, meu corpo tremendo violentamente. Pisquei meus olhos ainda cegos, encarando uma luz branca ofuscante que machucava minhas íris, mas não consegui me fazer me importar com a dor, porque o pânico e o terror ainda percorriam minhas veias como fogo. Impossível. Impossível. Como? Ele, ele deveria, o antigo dono daquele corpo deveria ter sumido assim que eu assumi o controle!

Porque era eu no controle. Eu tinha certeza. Meus olhos, minha boca. Era somente por meus comandos que eles se moviam, era por mim que meus olhos piscavam sem parar e somente porque eu queria que minha boca estava aberta em busca de ar. Por mim.

Mas a pergunta aterrorizante se repetia sem parar em minha cabeça – Se é você quem manda, quem foi que falou?

Fechei minha boca em um estalo furioso, que mandou um pequeno raio de dor pela minha mandíbula, me distraindo até eu me dar conta do gosto metálico. Minhas memórias responderam antes de eu sequer precisar pensar. Sangue. Eu havia mordido meu lábio.

Uma voz então interrompeu meu ataque de pânico. “Acalme-se, você está seguro aqui” Girei meu rosto de maneira brusca na direção de onde eu achava que vinha a voz, mas minha visão estava cheia de pontilhados brilhantes de modo que não consegui enxergar nada. Soltei um som estrangulado – gemido – e fechei os olhos, trazendo automaticamente minhas mãos aos olhos.

Minhas mãos. Minhas. Eu que as controlava.

A voz gentil ao meu lado soltou um muxoxo preocupado. “Desculpe, eu não esperava que você acordasse tão cedo. Desligue as luzes, por favor. ”A ultima parte da frase, eu imaginei, não foi para mim e logo o brilho branco sumiu, aliviando a dor em meus olhos. Mas eu ainda estava cheio de medo e meu corpo inteiro ainda tremia, eu conseguia sentir isso. Meu estomago estava dando voltas e minha garganta seca, com um nó gelado preso nela, não me permitia uma respiração estável.

Uma mão pousou em meu ombro.

Minha reação foi repentina e automática.

Eu estava à flor da pele com um nível de medo que eu não estava acostumado, o que me fez gritar, mas devido minha inexperiência em lidar com um corpo tão imediato o som saiu estrangulado – um guincho agudo e alto foi à resposta.

“Se acalme!” Outra mão pousou em meu outro ombro e de repente uma face alarmada surgiu na minha frente. Por segundos confusos, eu não consegui identificar nada além disso, e eu ainda estava respirando rápido demais para o meu próprio bem quando meu cérebro resolveu voltar a funcionar. Mesmo assim, demorou um longo minuto até eu conseguir absorver os detalhes diante de mim.

Pela experiência daquele mente, o rosto parado na minha frente era masculino. Mesmo sem o pelo no maxilar, como parecia ser normal nas memórias do (Loki...) corpo, só pelo formato retangular e uma junção de milhões de detalhes pequenos e inconscientes, eu pude realizar isso. Tinha um cabelo curto espichado, num estilo quase bagunçado, de uma cor vermelha impressionante que prendeu imediatamente minha atenção por vários segundos, antes de meus olhos voltarem a deslizar pelo restante da face. O homem era um humano de tipo de pele branca, mas que estava quase totalmente coberto por pontilhados da mesma cor do seu cabelo – sardas – e possuía olhos com um azul espelhado e cheios de rugas em torno. Rugas de risos, algo me disse.

Mas o mais importante, o que mais atraiu minha atenção assustada naquele momento, foi a suave e clara fita prateada em torno das suas íris negras.

[... o pelo do nosso hospedeiro fica prateado por nossa causa]

[A boca, você vê? É aquele prateado no dente central...]

[... a aura corporal de um corpo com alma é prateado...]

[... Eles estão nos reconhecendo pela pele das costas que brilha prateada por nossa causa]

Um rasgo de incomodo que não era meu (esse corpo é meu!) me invadiu, mas pela primeira vez desde que tinha acordado eu tive certeza de algo.

Aquele rosto era amigo.

Empurrei o incomodo sem sentido para fora e me permitir ser acalmado. Os olhos marcados pela alegria passada se aqueceram quando o homem sorriu para mim, suas mãos apertando meus ombros de maneira asseguradora. “Você está seguro. Foi só a ultima memória do seu hospedeiro, nada daquilo realmente aconteceu a você” Ele falou com uma voz suave e macia.

Eu engoli em seco. “Por que tanta... tanta violência?” As palavras saíram tremidas, fracas.

O sorriso do homem sumiu imediatamente e suas sobrancelhas se juntarão para construir uma expressão simpática e preocupada. Era engraçado como eu já estava sendo capaz de reconhecer as... emoções humanas com tanta facilidade – em nenhuma outra espécie que eu já fui era tão fácil. Mas também, nenhuma outra espécie havia de ter sentimentos tão afiados e imediatos. Em um espaço de poucos minutos eu havia sentindo quantas coisas? Olhei para o homem quando ele fez um som suave, triste. “Eu... eu sinto muito, meu jovem. Mesmo com tantas questões em jogo, nenhuma alma deveria ser forçada a isso”

“Alma?”

Ele deu um sorriso pequeno e rápido. “É o nome que demos a nossa espécie nesse planeta. Soa adequado, não acha?”

O homem se sentou diante de mim enquanto eu pensava. Alma. A essência do corpo humano, aquilo que lhe da vida. Sim, realmente parecia adequado. Respirei fundo, sentindo o tremor do meu corpo lentamente esvair.

“Você se sente melhor?” Perguntou o homem gentil, enquanto acariciava minhas costas num gesto de conforto. Deixei-me relaxar ao lado do meu companheiro de espécie, sabendo com absoluta certeza de que nenhum mal viria a mim enquanto eu estivesse com eles.

Ali, eu estava a salvo.

Entre os meus, qualquer problema que eu tivesse eles me ajudariam.

Acenei uma vez com a cabeça, respondendo a pergunta. “S-sim”

O homem sorriu. “As emoções nesses corpos são fortes, mas com o tempo você ira se acostumar” Ele falou, dando um tapa leve em meu ombro antes de se erguer da cama. Eu duvidei com certa tristeza de suas palavras, porque seria a mesma coisa se ele tivesse dito que eu iria me acostumar com levar facadas. Como os humanos lidavam com isso diariamente? Talvez fosse por isso que aquela espécie era tão... impulsiva. “Meu nome é Curador Tecedor de Céus, fui eu que o inseri. Como eu devo te chamar?”

Essa pergunta, mais do qualquer coisa que o Curador tivesse dito até agora, realmente tirou todo o resto da minha cabeça. O medo, a curiosidade, o pânico foram varridos enquanto eu pensava sobre isso.

Lembrei-me do meu primeiro hospedeiro, o qual tomei posse por volta do meio de sua vida e que ocupei por duzentas voltas em torno do sol até sua falência. Era um planeta florestado, com tons de púrpura lindos com o qual a pele da espécie inteligente dali se camuflava com perfeição. Foi por causa dessa habilidade de se esconder até mesmo dos olhos uns dos outros e por serem capazes de correrem sem qualquer ruído, que aquele foi um dos lugares que mais se demorou para uma total colonização. Se eu me recordava bem, sendo um dos primeiros a ter sido enviados para lá, levei quase um terço do tempo de vida restante do meu hospedeiro para conseguir instalar com sucesso uma vila só de almas. E somente quando meu corpo estava à beira da falência, quando eu decidi ir para o próximo alvo de colonização, que o planeta estava completamente implantado.

Depois daquela experiência – minha primeira, já que eu havia acabado de deixar meu planeta natal – eu decidi por aquele Chamado. Decidi ser um Enraizedor de linha de frente, ou seja, eu sempre seria enviado ao lado do primeiro grupo de Colonizadores para aprender e compreender os costumes do planeta para ajudar aos mais corajosos da minha espécie. Em um modo literal de se ver, eu poderia ser visto como o pesquisador de um grupo de exploração.

Desde então eu havia ajudado a colonizar com total sucesso doze planetas inteiros.

Meu nome me veio por causa do meu Chamado, o meu sucesso em minhas tarefas, concedido por um Original que eu tive a honra de conhecer pessoalmente e eu jamais consegui optar por outro além dele. Nunca soube explicar porque, ele simplesmente me pareceu encaixar. A tradução era difícil, porque nenhuma língua que eu experimentei foi capaz de realmente capturar o significado com precisão e aquela não me pareceu muito diferente.

Fiquei uns bons cinco ou seis minutos (eu já sabia calcular o tempo?) tentando trazer meu nome para aquele idioma e no final fiquei com uma tradução literal. “Meu nome é... Insólito Triunfo” Eu falei, ligeiramente hesitante, estremecendo ao som deselegante das palavras. Mas contrariando minha reação, Curador Tecedor de Céus sorriu e segurou minha mão em um gesto que reconheci das memórias do (... Loki?) corpo como um cumprimento daquele mundo.

“É uma honra conhece-lo, Insólito Triunfo. Já ouvi falar tanto de você”

Pisquei surpreso para ele. “Ouviu?”

“Claro que sim! Doze planetas, meu caro, doze!” O ruivo riu, ainda agarrado a minha mão. “Você é quase uma lenda!”

Eu senti meus lábios se repuxarem nos lados sem meu comando mental e com um salto eu percebi que sorria pela primeira vez – um sinal de alegria. Deixei o problema de Loki de lado, assumindo que fora apenas um eco da antiga consciência que me dominara por alguns segundos (você sabe que isso não é verdade).“É um prazer te conhecer também, Tecedor de Céus. Seu cabelo tem uma cor linda”

O Curador sorriu de lado. “Obrigada. Vermelho realmente chama atenção, né?” Então ele piscou um olho para mim, uma ação que não reconheci. O encarei confuso. Tecedor apenas riu mais uma vez. “Desculpe, velho habito desse corpo”

Ergui as sobrancelhas. “Como assim?”

“Nada com que tenha que se preocupar, eu lhe garanto” Assegurou-me o homem, finalmente soltando minhas mãos. “O humano, você vai aprender, é um ser de rotina e hábitos. Quando se pega um corpo já com um tempo de vida razoável, tem certas coisas que vem de brinde. Kevin me deixou seu gosto por curry e alho, assim como um campo de medicinal amplo”

Absorvi as novas informações, tentando assimila-las com outras coisas que eu já sabia. “Você está dizendo que eu vou herdar certas coisas do meu hospedeiro?”

Tecedor de Céus acenou. “É uma possibilidade” Olhou para mim preocupado.

Eu me lembrei da ultima lembrança. A força incrível, a velocidade impressionante, além daqueles... clones? Era magia? Perguntei-me se seria capaz de fazer aquilo tudo também. Seria maravilhoso se eu pudesse, parecia tão impossível para um simples humano.

Revendo a memória, eu notei outra coisa que havia passado despercebido por minha atenção devido à dor. Então uma questão me abalou. Como um humano poderia estar no espaço?

“Curador Tecedor de Céus...” eu comecei devagar. “O quão avançado é a tecnologia humana?”

O ruivo franziu levemente o cenho, em uma expressão confusa. “Depende da referencia, mas em relação a maioria dos planetas que colonizamos, eu diria que é bem medieval. Maior sucesso deles até o momento na astrofísica foi ter chegado à lua” Os olhos azuis brilharam mais preocupados. “Por que a pergunta?”

Meu estomago embrulhou. “Eu...” Olhei para as minhas mãos pálidas, com uma pele impossivelmente perfeita. Meu medo voltou com força. Eu sou o Deus da Trapaça e da Mentira, eu sou- “Eu acho... eu acho que esse corpo...”

Uma voz masculina, grossa e inflexível, me interrompeu. “Não é humano”

[-Olá, mulherzinha. Usando seus truques de novo?]

A reação do meu corpo me pegou completamente de surpresa. Quando me dei conta, eu estava já de pé voltado para a porta do quarto em uma posa que só pude descrever como defensiva, com meus dedos já a procura das (armas) laminas escondidas que eu não tinha. Antes que eu pudesse ao menor me chocar com minha própria reação, uma mão forte agarrou meus pulsos.

Tecedor de Céus ao meu lado soltou uma exclamação assustada.

Um homem da minha altura pareceu surgir diante de mim. Tinha um rosto retangular branco com olhos negros puxados – chinês – sobre sobrancelhas negras permanentemente repuxadas em uma expressão irritada. Um nariz pequeno sobre uma boca também pequena e pálida e um cabelo azul escuro puxado para trás. No pescoço forte, eu pude ver o pedaço de uma tatuagem subindo pelo braço direito. O braço que me segurava.

Mas o que mais me surpreendeu foi sua velocidade. Mesmo que aquela situação toda não tivesse durado mais que dois segundos, meus olhos treinados conseguiram registrar uma distancia de três metros da minha cama até a porta. Eu sabia por uma experiência que não era minha que minha reação toda foi em menos de um segundo. Para aquele homem ter sido capaz de atravessar aquela distancia a tempo de deter meu (ataque) movimento, sua velocidade teria que ser comparável a daquele corpo. E eu sabia (–Um dos corredores mais rápidos do reino!) que humano nenhum era capaz de fazer aquilo.

Ou pelo menor, nenhum humano normal.

Mutante.

“Controle-se” Ele falou, sua voz sem traços de amabilidade. O chinês olhou para mim, seus olhos negros sérios.

Negros.

Sem prata.

Arregalei os olhos em choque e ofeguei. Recuei com violência para trás, puxando meus braços das mãos fortes. Senti minhas costas baterem com força contra a parede fria do quarto, enquanto meu corpo tremia incontrolavelmente. Em algum ponto, minhas pernas cederam e eu me vi agachado, encolhido.

Meus olhos, cravados no rosto de olhos negros, registraram pela primeira vez uma emoção naquelas feições. A surpresa se espalhou, junto de algo que reconheci como alivio.

Alivio?

Tecedor de Céus, surgindo do nada, bloqueou minha visão quando pulou entre nos dois. “Está tudo bem!” Ele exclamou esticando ambas as mãos, seu rosto gentil cheio de pânico. “Está tudo bem! Construtor de Cristais Azuis, ele é a alma, Insólito Triunfo sincronizou com sucesso!”

O homem de cabelos azuis olhou do Curador para mim e seus olhos inflexíveis negros de repente derreteram, ganhando um tom extremamente culpado e bondoso. Sem dizer nada, deu um passo para trás.

No mesmo instante, Tecedor de Céus se jogou de joelhos diante de mim e me agarrou pelos ombros. “Insólito Triunfo, respire mais devagar” Instruiu.

Olhei confuso, desorientado. Minha cabeça estava começando a rodar. O ruivo me sacudiu com mais força, atraindo novamente minha atenção. “Mais devagar!” Ele exclamou a meio centímetro do meu rosto. Engoli em seco, assustado, mas fiz o que ele me pediu. Comecei a desacelerar minha respiração. Alguns minutos se passaram em silencio, com apenas eu me concentrado. Depois de um tempo, os pontos pretos dançando diante dos meus olhos sumiram.

Tecedor de Céus respirou aliviado, acariciando uma vez minha cabeça. “Você quase hiperventilou” Olhei confuso para o Curador que apenas fez uma leve careta, mostrando desagrado a alguma memória. “Uma coisa humana. É quando você leva oxigênio demais para o cérebro. Sensação horrível, não queira experimentar”

Acenei, ainda meio abalado, sem realmente entender o que ele estava me dizendo. Um som de sapato arrastando no chão me fez pular e meus olhos imediatamente saltaram do rosto gentil de Tecedor para o chinês de olhos negros parado a um metro de nós. Não sei se eu fiz algum som ou foi apenas minha expressão retorcida de medo devido a muitas coisas diferentes (olhos negros [sem prata] Eu sou-), mas o homem de cabelos azuis se afastou mais um pouco e se agachou em um movimento suave e lento, as mãos afastadas do corpo.

Seu rosto retangular estava coberto por culpa e gentileza, o que era gritantemente diferente de sua expressão de segundos atrás. “Me desculpe. Não posso dizer que não tinha a intenção de assusta-lo, mas posso dizer que eu lamento tê-lo feito”

Olhei de olhos arregalados dele para o ruivo parado ao meu lado, ainda com as mãos firmes sobre meus ombros. O Curador ergueu levemente as sobrancelhas, claramente confuso com meu terror e se virou para o chinês diante de mim. Foi então que sua expressão repentinamente endureceu com uma emoção que eu jamais pensei que uma alma seria capaz. Desaprovação. Repreensão.

“Senhor Construtor de Cristais Azuis” Tecedor de Céus falou, sua voz saindo abafado por entre os dentes cerrados. “Seus olhos, por favor”

O chinês, a alma chamada de Construtor de Cristais Azuis pareceu não compreender de primeira, mas logo uma luz de entendimento iluminou seu rosto que ganhou um tom mais culpado ainda. Olhei confuso de um para o outro. Do que eles estavam falando?

Então o homem de cabelos azuis fechou os olhos negros. Uma curiosidade repentina atravessou meu véu de medo e me forçou a ficar estável, tentando ver o que ia acontecer.

Uma luz levemente prateada brilhou de repente por debaixo das pálpebras fechadas do outro homem e durou por vários segundos, ondulando como a luz do luar sobre a água do mar – a visão dessa imagem que eu pintei era magnífica e não era minha e me vi recebendo as informações sobre o que era mar – até que foi lentamente morrendo. Quando o brilho cessou, Construtor de Cristais Azuis esperou mais alguns segundos antes de novamente abrir os olhos.

E em volta das suas íris negras agora brilhava uma faixa prateada.

Minha confusão mais aumentou do que meu medo diminui. O próprio chinês se explicou, sorrindo suavemente. “Eu não sei se você foi informado, mas existe um tipo de humanos mais avançados na Terra. São os chamados mutantes, que possuem habilidades a mais do que os humanos normais. Meu hospedeiro era um deles, Paul Hark” Seus olhos puxados se concentraram em mim como se procurassem algo, muito embora continuassem sinceros e gentis. Eu já sabia dos mutantes, fora uma das primeiras coisas que me explicaram quando optei por vir para a Terra, mas o nome não despertou nenhuma memória minha ou do corpo. Minha falta de expressão provavelmente respondeu suas perguntas silenciosas, pois Construtor de Cristais Azuis continuou. “Ele tinha um controle total de seu corpo em níveis excepcionais. Isso se estendeu a mim também quando o ocupei. Sou capaz de retrair as minhas conexões que fazem os olhos ganharem essa tonalidade prateada até que o brilho suma, o que me ajudou muito em meu Chamado”

Aquela pergunta eu era capaz de me responder. Só havia um chamado onde exigia de uma alma algo como... atuação ou o mínimo de violência contra algo/alguém, por falta de palavra melhor, suspeita. Eu havia convivido o suficiente com esse tipo de situação para ser capaz de reconhecer.

“Buscador” Eu falei.

Construtor pareceu surpreso. “Sim, eu sou um Buscador” Ele se ergueu e esticou a mão em minha direção depois de um momento de hesitação. Encarei a palma de pele branca oferecida por alguns segundos antes de aceitar. Sabendo que era eu mesmo que dominava o corpo, o chinês foi mil vezes mais gentil ao me erguer do que tinha sido quando me agarrou para impedir meu movimento. “Você parece ser uma alma inteligente, talvez...” Ele deixou a frase no ar, olhando de mim para o Curador.

Tecedor de Céus pareceu fazer algo que só pude descrever como careta, mas não fez nenhum comentário a mais. Franzi o cenho. “Talvez...? O que foi?”.

Construtor de Cristais Azuis olhou para mim, o sorriso varrido de seu rosto. “Talvez você consiga adivinhar porque estou aqui?”.

Eu o encarei. O silencio reinou por algum tempo. “Não é uma mera visita social”. Eu falei, mais uma afirmação do que uma pergunta, meus olhos se alternando de rosto para rosto. O homem de cabelos azuis acenou e foi o suficiente para eu encaixar a ultima peça. “Você quer informações. Esse corpo... ele é um humano selvagem?”.

Eu sabia que a Terra estava quase completamente colonizada, mas que ainda existiam bolsões de resistência espalhados pelo globo azul. Faria sentido implantar uma alma no corpo de um humano rebelde para tentar achar informações. Mas eu sabia melhor do que erguer falsas esperanças.

Os olhos prateados do Buscador pareceram se encher de algo como solidariedade antes dele falar. “Não. Eu sei que você já adivinhou. O corpo que você usa não é humano, não pertence a Terra”.

Eu fechei os olhos, engolindo em seco. “O que... o que ele... é?”.

Minhas duvidas, meus medos seriam eles... [Eu sou-]

Construtor suspirou.

“Eu sinto muito. Seu hospedeiro é outro alien chamado Loki, que se autodenomina um deus de Asgard, outro planeta”.

Ele deu uma pausa antes de continuar com tristeza.

“E é um assassino”

Uma risada fria encheu minha cabeça, tomando todo o calor do meu corpo.

E isso é só o começo, parasita.