Alguns dias atrás...

Os grandes holofotes iluminavam as nuvens escassas e negras de Gotham, produzindo círculos luminosos que deslizavam pelo céu como objetos extraterrenos. Carros de luxo simplesmente lotavam o grande estacionamento, que ficava do outro lado da rua, em frente ao prédio que iria ser inaugurado esta noite. Era uma construção gótica, e mais lembrava uma catedral. Toda a construção era um grande retângulo, com paredes sólidas, janelas gigantes que iam do chão até o teto, e terminavam em abóbadas. Quatro seguranças estavam na pequena passarela que levava ao interior do recinto. Um pequeno jardim contornava toda a edificação, e um porteiro com roupa social impecável recebia todos os convidados. Homens, mulheres, os mais poderosos de Gotham e das cidades vizinhas.

No interior havia o mais puro luxo. Mesas redondas de madeira dispostas por todo o local, com toalhas de mesa vermelhas. Logo à frente havia um palco, com luzes nas bordas que jogavam a luz contra o microfone. Um tapete vermelho cobria tudo e logo atrás, na parede, cortinas vermelhas e brancas estavam amarradas. Os garçons começavam a aparecer, com postura ereta, e bandejas com champanhe, petiscos e bebidas. Havia uma expectativa geral de todos. Talvez aquilo fosse a inauguração do ano. Bom para os negócios de todos, exceto pelo fato de que era muito estranho que todos esses magnatas estarem interessados na inauguração de um restaurante cinco estrelas.

Após alguns longos minutos, uma silhueta apareceu no palco, e todos os murmúrios cessaram. O dono do restaurante, Frank Walter, era um homem jovial. Cabelos já um pouco grisalhos, magro, olhos expressivos e negros. Usava um blazer que pelo visto tinha sido muito caro. Ele pigarreou.

– Olá a todos.

O microfone fez um barulho agudo que logo cessou. Ele riu.

– É com um prazer muito grande, e uma imensa honra que estou aqui essa noite, para inaugurar o melhor restaurante cinco estrelas de Gotham! Primeiramen...

Um disparo foi ouvido, fazendo com que todos se assustassem, e onde havia um homem falando ao microfone, agora só tinha um cadáver no chão, com uma grande mancha de sangue aspergida na parede logo atrás dele. Nesse momento, vários homens com roupas escuras e com máscaras de palhaço apareceram. O que ia na frente disparou alguns tiros de metralhadora semiautomática no teto.

– Muito bem. Está na hora de fazerem a sua caridade do ano. Bolsas, relógios, pulseiras, brincos, tudo, tudo. Quero que coloquem nessas bolsas, agora. – ele gesticulava com a arma e apontava para os capangas que iam abrindo grandes sacos negros de pano. O medo dominava a todos, e sem discutir, colocavam todos seus pertences dentro dos sacos.

– Boa noite a todos, meus caros amigos.

Uma voz estranha veio do microfone e todos olharam. Quem estava lá no palco não era ninguém mais, ninguém menos que o Coringa.

– É com imensa honra que estou aqui para roubar a todos vocês! – ele sorriu, um sorriso que revelou todos os seus dentes.

– Mas vocês parecem um pouco entediados, irei alegrá-los. Só um instante.

Enfiou a mão no bolso. – Mas onde está... – apalpou todos os bolsos. – Ah, achei! – e logo tirou um cartão e começou a lê-lo.

– Por quê o Batman ainda não apareceu para salvar vocês nesse restaurante?

Ele olhou para as pessoas, de um lado ao outro do recinto. Silêncio.

– Ninguém sabe? É porquê ele é vegetariano! HA HA HA!

Nesse instante, um barulho baixo de vidro quebrando foi ouvido, e no segundo seguinte, todos um capanga estava no chão, com o sangue fluindo abundantemente pelo pescoço. Outro tiro, e mais, e outro, até que todos os capangas estivessem no chão. Olharam para uma das janelas que dava para a cidade, e viram buracos de bala na parte de cima. Alguém havia atirado do lado de fora, mas quem? Batman não usava armas. E se não era o Batman... quem era?

Coringa deu um assobio de admiração, ainda detrás do microfone com o cartão na mão. Estava com uma expressão de surpresa, sobrancelhas erguidas e boca aberta. – Essa piada foi mesmo de matar.

Retirou uma pistola do bolso e pulou para baixo. – Muito bem, o show acabou. – pegou os sacos no chão e foi saindo, passando por cima dos cadáveres, com a pistola erguida. – Aproveitem a comida.

Já do lado de fora, na passarela, os seguranças jaziam mortos, com uma poça de sangue formando-se embaixo de cada um. Logo à frente, um carro de luxo negro estacionou, e uma porta se abriu.

– As coisas estão melhorando. – e logo entrou no carro, fechando a porta. Alguns segundos se passaram, e a porta do motorista se abriu para um capanga com o pescoço cortado cair no chão.

– Desculpe amigo, nada pessoal, apenas negócios. – e fechou a porta, logo acelerando e saiu cantando pneu pela estrada. Virou a esquina, indo na contramão da avenida movimentada. Acelerava bem no meio da pista, fazendo com que os carros tivessem que derrapar para o lado para não se chocarem, e por vezes, os carros batiam em outros, ou no acostamento da avenida. Coringa amava isso. O Caos. Ele ria. – Estou me sentindo um Moisés.

Viaturas policiais enchiam a entrada do restaurante, e lá dentro, legistas fotografavam e pegavam pistas nos cadáveres. Comissário Gordon anotava algumas coisas num bloco de notas, e encarava a janela, perto dos cacos de vidro no chão. Sentiu uma sensação estranha e olhou para trás, e lá estava o Cavaleiro de Gotham, silencioso, atento, pensativo.

– Parece que alguém frustrou os planos do Coringa dessa vez. – falou o comissário.

– Não sei, os planos dele sempre são calculados. – respondeu o mascarado com sua voz modificada. – De onde vieram os tiros?

Gordon olhou para a cidade, além da janela, como se ainda não acreditasse e quisesse uma explicação mais plausível. – Ao que tudo indica, vieram daquele prédio lá. – apontou para um prédio, distante demais, no fim de uma avenida. Era fino e alto, com um pináculo no teto. Fino como um agulha furando o céu.

Batman cerrou os olhos. – Um franco atirador.

Gordon assentiu e olhou para ele novamente, apenas para encarar o vazio. Batman já havia sumido.