A caminhada era inviável no estado de Vermont, então fizeram uma pausa, embora Tony permanecesse alerta. Não era tolo de se sentir confortável naquela floresta mesmo quando o grupo ainda estava completo. Vermont também não parecia satisfeito por precisar parar, mas meia hora já havia se passado, e eles não conseguiram se afastar mais do que poucos metros do lugar onde caíram. Vermont apoiava as costas em uma árvore, dizendo para si mesmo que só precisava de um tempo, e depois conseguiriam encontrar os outros, mas a dor era incessante, e ele se sentia cada vez mais cansado, e até um pouco sonolento. Já Tony estava bastante desperto, andava de um lado para o outro, inquieto. Obviamente achava a parada uma ideia ruim, o que fazia Vermont se sentir um peso, mesmo que concordasse quanto a isso. Nesse estado, seria impossível chegar a algum lugar. Ambos sabiam disso, mas nenhum queria ser o primeiro a falar em voz alta.

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— Quanto tempo acha que ainda temos de dia? — Vermont perguntou, estava com dificuldades para estimar há quanto tempo haviam saído da cidade.

— Uma hora, uma hora e meia, talvez. Eu não sei, não é tão claro aqui na floresta. — O silêncio voltou a se instalar. Eles prestavam atenção a cada ruído, ou mínimo tremor. Minutos atrás, o chão tremeu de leve, o que os deixou apreensivos. Os outros não haviam conseguido conter a criatura ainda, isso era fato, mas não sabiam se era falta de oportunidade ou se algo havia acontecido a eles, algo sério. Tony decidiu ser o primeiro a falar. — Assim não vamos conseguir... Precisamos de alguma ideia melhor do que só insistir fingindo que você não está ferido.

— É, eu também pensei nisso. Precisamos da médica. É melhor se você voltar sozinho.

— Não posso deixar você aqui, está ferido! E nem sequer pode usar sua joia, estamos muito longe do rio — rebateu. Depois completou, murmurando — Pelo menos eu acho que estamos longe, isso aqui está irreconhecível...

— A gente não tem alternativa, a criatura parece estar bem longe, então por enquanto não tem perigo. Se você for agora, pode voltar com a doutora... E com armas melhores.

— Aquele monstro não é a única ameaça aqui, e não acho que as armas da general serviriam de alguma coisa, ele só se reconstrói como se nem tivesse sido atingido.

— Então qual a sua ideia? — Vermont perguntou. Devido a dor, tinha cada vez mais dificuldade de se manter atento. Talvez por isso tenha demorado a entender o que Carter falara. — Espera, o que disse?

— Quando eu o atingi, ele só se reconstruiu. As rochas voltaram ao lugar. — Antony respondeu, curioso pela pergunta. — Você lembra disso, não lembra?

Vermont voltou o olhar para a frente, pensativo. Antony ficou apreensivo. Não tinha muito conhecimento médico, então, por via das dúvidas, considerava qualquer lesão mais complicada do que uma ferida como algo bastante grave.

— Você não o atingiu com nada. — Vermont falou, lentamente. Parecia se esforçar para remontar a cena. — Ele atacou primeiro, teve um terremoto, e nós caímos.

— Não foi assim que aconteceu. Você me disse para atacá-lo e ele revidou, o terremoto foi depois que Calisto se defendeu. Independente dos ataques, ele só se reconstruía como se nada o tivesse atingido, então armas não farão diferença.

— Mas... — Vermont não entendia como era possível que ambos tivessem memórias diferentes. Ele estava certo do que tinha acontecido, não parecia plausível que Carter tivesse dado o primeiro ataque. Porém, resolveu supor que ele estava certo. A maneira como tinha acontecido não era tão importante. — Mas vocês... você... Você viu a pedra? — Diante do olhar confuso de Carter, Vermont tentou se explicar melhor. — A pedra na cabeça dele.

— Vermont, acho que você deve ter tido uma concussão. Ele era todo feito de pedras.

— Essa era diferente, era menor, parecia com uma das nossas joias!

Carter não sabia do que ele estava falando, e agora estava ainda mais preocupado.

— Podemos falar sobre isso, mas acho mais urgente chegarmos até a general e a Dra. Walker agora. Não sei muito de medicina, e você deve ter levado uma pancada bem séria aí.

Vermont cedeu.

— Qual a sua ideia? — Carter hesitou por um instante, esperando que alguma outra solução se apresentasse milagrosamente, mas não foi daquela vez.

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— Acho que devemos retirar o galho do ferimento.

Vermont deixou escapar um riso amargo e exasperado diante da ideia.

— Está brincando?

— Depois esperamos mais uma ou duas horas, e voltamos a andar.

— Tem algum conhecimento médico oculto? — perguntou, contraindo o rosto em uma súbita expressão de dor. Antony não respondeu. — Resumo simplificado: sangue fora do corpo é ruim! Se tirar isso da ferida sem cuidado, podemos piorar a situação.

— Pelo menos esse galho não estaria rasgando sua perna por dentro toda vez que você se mexe.

— Não. Não mesmo! Pode esquecer essa ideia.

— Não é a melhor ideia, mas não temos outra por enquanto. Nosso tempo é bastante limitado. Ou você quer mesmo passar a noite aqui, ferido e vulnerável? Aquela criatura não é a única ameaça por aqui.

Nisso Vermont precisava concordar. Aos poucos, foi vendo a lógica naquela escolha. Era arriscado, sim, mas estava tão cansado para pensar melhor. Assentiu, com a cabeça. Carter fez menção de se aproximar, mas parou quando Vermont sinalizou.

— Eu faço. — Tomou alguns segundos de preparação, antes de envolver com os dedos o galho sujo de sangue e terra. No pior dos casos, eu posso morrer, pensou. Por algum motivo, pensou em Rowena Lafayette e seu olhar acusador, que apontava para ele todo o peso da culpa de um assassinato. Surpreendentemente, estar do outro lado desse jogo de morte não parecia tão assustador. No pior dos casos, eu posso apenas morrer.

E então puxou.

~*~

Alessa estava visivelmente apreensiva. Embora disfarçasse seus temores, com frequência verificava o tempo de missão, em seguida olhava para o alto, analisando quanto tempo ainda tinham antes de escurecer. Vez ou outra escutava um sons distantes, difíceis de determinar o que seriam. Seus soldados marcavam uma área de segurança mediana, onde Erin Walker e Sybeal Skinner faziam seu trabalho. Walker analisava leituras em um aparelho desconhecido para a general, em várias localidades. Verificava as leituras sobre a terra, depois nas árvores… em certo momento quase esfregou o aparelho na cara de uma dos soldados, que parecia querer quebrar o instrumento na cabeça da médica.

— Que está olhando? — Subitamente, Skinner entrou em seu campo de visão, colocando-se entre Alessa e a floresta aberta.

— Deveria estar ajudando a doutora.

— Minha pesquisa é diferente, preciso das amostras, mas os resultados saem depois da análise no laboratório. Erin está medindo a radiação.

— Eu… não perguntei. — Alessa suspirou, distraída da conversa, pegando o walkie-talkie para, pela quarta vez, tentar contato com os Portadores das Joias. Nada. Uma pergunta se formou na mente de Sybeal, que logo a fez, sem se importar com a postura pouco amigável da Rower.

— Existe algum plano B, caso eles não apareçam?

— O que está dizendo? — Alessa se irritou.

— Temos um tempo limitado de missão, não é? Se eles não aparecerem? Vamos atrás deles?

Apesar de não aparentar dúvidas, Alessa já tinha pensado sobre isso. Infelizmente, tinha um dever bastante claro.

— A prioridade da minha equipe são você e a dra. Walker. Se não recebermos nenhum sinal deles, teremos que levá-las de volta à cidade. Depois saímos para uma busca. — Sinceramente, Alessa não queria nem pensar em como justificaria para seus soldados uma missão de busca pelos Portadores. Se algo trouxera problemas para eles, com aquelas joias, o que poderiam fazer? Ela sabia que os procedimentos ainda estavam mal determinados. Podia ver no rosto de Sybeal que ela pensava que as missões ainda precisavam se organizar muito mais. Porém mesmo assim, Sybeal estava ali, fora dos muros em vez de na segurança de Aurora, então o que ela sabia mesmo?

— Se eu posso sugerir... — começou Sybeal, com uma postura efusiva. Alessa não conseguia ver seu rosto por causa do capacete do traje, mas conseguia quase visualizar suas feições. As sobrancelhas arqueadas, o olhar sustentando um ar divertido, como uma zombaria que só ela conhecia. Algumas pessoas na cidadela achavam seu jeito irritante, mas Alessa não se importava. Se as coisas tivessem sido diferentes para a família Skinner, talvez ambas tivessem crescido juntas, talvez até como amigas. Porém tudo deu errado, a família Skinner foi movida para a cidade baixa e o único Skinner de quem Alessa se aproximara tinha sido Liam, o irmão mais velho de Sybeal, que seguira carreira militar.

Sybeal falava suas sugestões, e Alessa percebeu que não estava ouvindo. Não tinha sido por orgulho — em outras situações, teria cortado Sybeal com um rígido "não, não pode sugerir!" Mas dadas as circunstâncias, Alessa estava disposta a ouvir a todos. O que havia roubado sua atenção, além do súbito pensamento em Liam, foram as duas silhuetas que se aproximavam semiocultos pelas sombras das árvores ao anoitecer.

— Dra. Walker! — chamou, de imediato, assim que tornaram-se minimamente reconhecíveis. Alessa deixou Sybeal e se aproximou de Antony Carter, cuja aparência cansada e maltrapilha só não superava a de Luc Vermont, que se movia com dificuldade, apoiando-se em Carter. Alessa notou a tentativa mal feita de uma ligadura na perna direita de Vermont, encharcada de sangue. Alessa ajudou Carter a deitá-lo no chão, enquanto Erin Walker aproximava-se com seus materiais. Vermont mal reagiu enquanto o moviam. Erin retirou o capacete dele, já que não fazia mais diferença pelo corte no traje na perna. Ele mantinha os olhos abertos com dificuldade e não falou nada ao ver que haviam chegado ao acampamento da general.

— Fomos jogados de um penhasco — ouviu a voz distante de Carter, em segundo plano, explicando o que havia acontecido.

— Um penhasco aqui? — Alessa questionou.

— Sim. Ele teve um ferimento na queda com um galho e eu acho que também pode ter tido uma concussão.

Alessa perguntou mais alguma coisa que Vermont não conseguiu compreender. Estava cansado até para tentar falar algo. Apenas alternava o olhar com esforço entre os três rostos preocupados acima dele. Quando Erin Walker surgiu com uma pequena lanterna em seu campo de visão, não conseguiu manter o olhar fixo. A luz parecia ainda mais incomoda que o natural e ele tentava desviar o olhar, de modo que Erin segurou seu rosto forçando-o à posição ideal até ver o que queria e, finalmente, desligar aquela luz.

— Você notou algum comportamento estranho? — Walker perguntou, fazendo Carter desviar o olhar preocupado de Vermont para a médica. Porém, Erin agora se dedicava ao ferimento na perna, que acreditava ser mais urgente. Se houvesse uma concussão, não teria muito o que fazer, além de impedir Vermont de se esforçar daquela maneira por um tempo. Erin apenas fazia perguntas para estar preparada.

— Só coisas que parecem normais pelo que aconteceu. Ele não se concentrava, parecia sonolento, cansado... Ah, e as memórias dele estão confusas.

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Vermont deixou de tentar ouvir a conversa, o que demandava cada vez mais esforço. Não sabia se a escuridão era devido à noite, que finalmente se instaurara, ou se sua visão lhe pregava peças. Fechou os olhos momentaneamente, ouvindo uma agitação distante, e quando voltou a abri-los, encontrou Alessa e Carter sobre si. A impressão que teve foi de que apagara completamente por alguns segundos. Ao menos um pensamento surgiu em foco, e Vermont agarrou-se a ele. Com um pouco mais de esforço, conseguiu falar:

— A pedra... — falou, apenas, deixando no ar o resto do pensamento mal formulado.

— Do que ele está falando? — A general Rower afastou Carter de Vermont e a Dra. Walker.

— É uma longa história... Você conseguiu falar com os outros? Eu preciso voltar lá.

— Eu não tive nenhuma notícia deles depois que vocês avisaram que o portal já havia se fechado.

Apesar dos contratempos, Carter não focou na possibilidade de algo ter acontecido. Ele se manteve calmo, sabendo que precisava encontrá-los.

— Então eu vou refazer o caminho que fizemos antes, e torcer para que eles estejam no último lugar em que os vi.

— É uma boa ideia? — A general perguntou, pois Antony parecia tão miserável quanto Vermont. Porém, Antony não estava ferido, e se os outros ainda estavam vivos, não existia alternativa além de procurar por ele.

~*~

Entre as árvores da floresta, que, com a chegada da noite, adquiria uma aura sombria, uma mulher andava decididamente, segurando um bastão e uma bolsa que atravessava o tronco, batendo na lateral da cintura. Não era preciso pensar muito para perceber que ela não era desse mundo. Sua aparência era perfeitamente humana, à exceção dos cabelos e olhos esverdeados, um tom tão forte e vívido quanto os das folhagens que a rodeava, mas havia algo em volta dela, invisível, porém bastante sensível, como uma energia. Aquela mulher, Driya, pertencia ao Desconhecido.

Sempre silenciosa, Driya procurava sua presa sem perturbar a paz sepulcral da floresta. Seus passos não faziam barulho, Driya não parecia uma intrusa, parecia estar em sintonia com o ambiente ao seu redor. Seguindo os ocasionais tremores de terra, ela logo encontrou o que procurava. O golem. Ela sabia porque aquela criatura servil estava ali, só havia uma pessoa que poderia estar comandando aquilo. Khlyen gostaria de saber. O golem parecia ter encurralado algumas pessoas, e Driya estava para intervir, quando um outro humano irrompeu da mata e, de alguma forma, lançou uma grande rocha contra o golem. Driya permaneceu oculta, curiosa quanto ao que acontecera. Tinha certeza que todos no grupo eram humanos, então como um deles havia feito aquilo? Não tinha força suficiente para erguer uma rocha daquele tamanho, então, de alguma forma, o humano usara magia.

Por mais bem intencionado que tenha sido, o ataque do humano não surtiu efeito contra a criatura, que apenas se enraiveceu. Mas os outros, instigados pela chegada do conhecido, começaram e contribuir. E todos possuíam magia. Driya entendeu o que estava acontecendo. Khlyen lhe avisara sobre eles. Driya permaneceu oculta, mas logo teria de intervir, os humanos não faziam ideia de como derrotar o golem. Infelizmente, pois gostaria de manter sua existência em segredo, precisava agir.

Porém, quando Driya estava para atacar, um dos humanos foi lançado na sua direção por um golpe do golem. Driya desviou sem dificuldade, mas ele chamou sua atenção. Era aquele das rochas. Carter atingiu com as costas uma árvore, sentindo o impacto expulsar o ar dos seus pulmões. Caiu de joelhos, respirando ofegantemente. Precisava se levantar e ajudar os outros. Porém, quando ergueu o rosto, seu olhar cruzou com o de Driya e ele franziu as sobrancelhas em desconfiança, pensando se ela era também parte do ataque, e se deveria se defender de alguma maneira. Talvez a criatura fosse controlada por ela. Ela com certeza não era humana como ele e os outros.

— Quem... — começou, mas a falta de ar não permitiu que concluísse a frase. Driya não estava mais olhando para ele, e sim para o embate que os Portadores, à exceção de Calisto, que estava sem os poderes, travavam contra a criatura. — Ei! Você! — Carter gritou, tentando chamar sua atenção, mas foi completamente ignorado.

Driya resolveu o que deveria fazer. Voltou-se para Carter, deixando sua bolsa cair no chão, e aproximou-se dele com passos rápidos, o bastão em mãos, o que fez o humano erguer os braços defensivamente. Isso fez Driya parar, mostrando as mãos como se fosse inofensiva. Não o convenceu.

— Eu perguntei quem é você.

Driya estreitou os olhos, sem compreender. Levou a mão até a orelha, tocando-a ligeiramente, e em seguida gesticulou de modo rápido em direção ao grupo. Carter compreendeu que ela não podia lhe escutar. Os gestos que ela fazia nem mesmo pareciam a linguagem de sinais usada em Aurora, e nem essa ele era capaz de compreender, muito menos a de Driya.

— Eu não sei o que você está dizendo. — Carter falou, articulando as sílabas lentamente. Talvez ela pudesse entendê-lo, ler lábios ou algo assim? Se Driya podia, não demonstrou. Ele ainda não confiava nela, mas a insistência com a qual ela indicava o resto do grupo fez Carter pensar que ela queria avisar algo.

Driya pediu sua atenção, atraindo seu olhar para o golem, e então apontou para a arma que Carter trazia no coldre. Driya já tinha visto aquele artefato em ação antes, em seu próprio mundo, mas não haviam armas daquele tipo no Desconhecido. A única arma de fogo que havia no Desconhecido fora levada para lá. Carter não entendeu o que ela queria que fizesse com o revólver.

— Não fará efeito contra rochas — ele respondeu, já pensando em ignorá-la e seguir até os outros, já que a luta não esperava ele decidir o que fazer. Driya entrou na sua frente, impedindo-o de continuar. Ela apontou para o golem e, em seguida, levou os dedos à sua própria nuca. Fez menção de pegar a arma, mas Carter a afastou. Ela assentiu e, como se tivessem combinado algo, deixou-o sozinho.

Carter estava no mínimo confuso. Decidiu não esperar mais e voltou para a apertada clareira onde seus colegas tentavam cercear os movimentos da criatura. Calisto, que não tinha como ajudar, manteve-se em área segura, sem querer que os outros se distraíssem precisando protegê-la.

— Você está bem? — Tiberius perguntou, já que Carter demorara um pouco para voltar.

— Estou — respondeu, sem maiores explicações. O encontro com a estranha ficaria para depois.

Aquele confronto tornava-se extremamente cansativo. Nada que faziam surtia efeito. Catarina e Tiberius se mantinham distantes, mas ela tentava usar a força do vento para impedir o golem de se aproximar demais dos outros, Astra atirava rajadas de fogo que o atingiam inofensivamente, e toda vez que Carter o atingia, seus membros destruídos apensa se reconstituíam. Um rápido pensamento atravessou a mente de todos: Talvez essa seja a missão em que vamos morrer. Até o inabalável Tiberius parecia preocupado.

Enquanto continuavam naquele esforço inútil, a floresta parecia imergir ainda mais em profunda escuridão, sendo a única iluminação as ocasionais chamas que Astra criava. Nem a lua, nem as estrelas se faziam visíveis, pois um emaranhado de galhos fechava o topo daquela área, como um átrio, o que era estranho, pois os Portadores pensavam estar em uma clareira.

Estranhamente, o golem parou de tentar atacá-los. Ele parecia agitado com alguma outra coisa. Olhava para cima, como se procurasse por algo, ou girava sem sair do lugar, examinando ao seu redor. Seu comportamento pareceu tão estranho que os Portadores pararam os ataques momentaneamente, sendo uma pausa para respirarem sem esforço. Carter foi o único que notou, escondida entre as árvores, aquela estranha mulher batendo com o bastão nas árvores e atraindo a atenção do golem. Os grunhidos da criatura ocultavam o som que Driya fazia, por isso os outros não a perceberam. Driya atraiu o golem de modo que ele desse as costas para o grupo humano, ignorando a existência deles.

Aproveitando-se da distração, os Portadores partiram para mais uma onda de ataques sem sentido. Mas eles não podiam simplesmente desistir de lutar contra o golem, cuja presença era um risco constante para os andarilhos e também para os cidadãos de Aurora, caso ele um dia encontrasse a cidade. Carter estava para acompanhá-los nessa onda de ataques, quando viu, refletindo o brilho das chamas de Astra, uma pequena joia brilhando na nuca da criatura. Sua mente se iluminou. Carter lembrou das palavras estranhas de Vermont sobre uma pedra na cabeça do golem, e lembrou do gesto que Driya fizera, apontando para a nuca. As mãos de Carter se moveram mais rápido do que sua mente poderia comandar, quase como um reflexo, tirou a arma do coldre e apontou para a criatura. Bastava se concentrar, e talvez o combate terminasse em um único movimento.

Carter tinha uma ótima mira, já que atirava desde a adolescência por influência de seu pai. Ainda assim, como a criatura não estava estática, o primeiro tiro acertou na lateral do pescoço, inefetivo. O segundo, certeiramente na pedra lilás. Houve uns segundos de tensão em que pensou que entendera errado, e que a pedra não afetava em nada a criatura. Porém, o golem ficou imóvel por poucos segundos, em seguida seu corpo rochoso começou a se desfazer, desabando em grandes pedaços.

— Como você sabia? — Astra perguntou, deixado-se cair de joelhos pelo cansaço, mas parecendo aliviada.

— Bom... — Carter olhou na direção da floresta, mas Driya já tinha desaparecido. — Vermont me avisou.

— O que você está fazendo? — Catarina perguntou para Calisto, que subia os escombros do corpo da criatura procurando por algo. Calisto encontrou, mas se desequilibrou nas pedras soltas e caiu novamente no chão, sem se machucar. Ela levantou, não se importando com a poeira em suas roupas.

— Vejam só. — Calisto estendeu a mão com os restos da pedra lilás que dava vida ao golem. Os cacos eram pequenos e se esfarelavam, mas um pedaço razoavelmente grande sobrevivera.

— Parece... — Astra começou, mas não chegou a concluir. Foi Tiberius quem disse em voz alta o que todos estavam pensando.

— Parece com as joias de vocês.