Arborescente

Epílogo


Lá estava eu, pisando novamente naquele lugar, onde eu passei todo o meu tempo, até chegar a Cerimônia de Escolha: o colégio.

Evan tentou me convencer de que eu não precisava trabalhar, que ele conseguiria dar conta, mas deveria saber que as coisas nunca eram assim comigo. Eu queria trabalhar, não importava qual emprego fosse.

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No caso, eu era faxineira. Não era tão ruim assim... Desde que eu não tivesse que cuidar dos banheiros, estava tudo bem.

— Aeryn?

A princípio, ignorei. Deveria ter outras “Aeryn” naquela cidade.

— Aeryn — dessa vez, a voz estava firme, em vez de duvidosa.

Virei-me. A mulher estava com o cabelo preso em um rabo-de-cavalo, camiseta social branca, sob um blazer preto, e calças também pretas. Os olhos eram escondidos por trás de óculos escuros.

“Franqueza” pensei.

Depois de alguns minutos, percebi que era Karen.

— Ah! Oi! — disse, inexpressiva, antes de virar-me novamente para meu serviço, empurrando o esfregão para a frente.

Provavelmente, ela estava ali por causa de um filho. Ou por problemas burocráticos.

— Eu sinto muito — ela disse, tirando os óculos do rosto.

— Eu não — retruquei — Sou feliz.

— Não estou dizendo sobre você ser uma sem facção. Digo pelo modo que nos despedimos.

— Você quis assim.

— Eu sei! Acredite, eu sei! E não tem um dia que eu não me arrependa disso.

Suspirei, ainda empurrando o esfregão, com força.

— Um pouco tarde para vir falar comigo — disse — Sabia onde eu estava esse tempo todo...

— Minha vida estava uma loucura! — ela disse.

— Fico feliz por você...

Eu sei que não estava sendo nada fácil, mas eu não era das que perdoam com facilidade. Karen me magoou de um modo que mais ninguém conseguiu fazer.

— A gente se vê — ela despediu-se, triste.

— Certo... — murmurei, sem lhe olhar.

***

— Você devia tê-la perdoado — foi o que Rachel disse, quando eu voltei para casa.

— E o que garante que ela não vá sumir de novo? — murmurei.

— Depois dessa, aposto que vai mesmo! — Rachel afastou-se, carregando uma caixa de papelão.

— Isso só vai provar que ela não se importa realmente... Só quis disfarçar, por ter me visto ali — dei de ombros.

— Você exige muito das pessoas. Não sei como te ocorreu que não tinha relação com a Amizade — ela revirou os olhos.

Ouvi um barulho do lado de fora. Olhei para Rachel, que estava concentrada, empilhando as caixas de papelão vazias.

— Eu já volto! — disse.

— Ei! Leve uma faca, pelo menos — ela insistiu — São tempos perigosos.

Revirei os olhos, mas escondi uma faca no canto do meu short verde.

Talvez nos preocupávamos demais, mas já tivemos alguns sem facção incomodando. Desde esse dia, Evan insistiu para que tivéssemos mais cuidado.

Super protetor como só ele...

Assim que saí pela porta do prédio, vi um homem, segurando uma criança.

— Quem é o afilhado mais lindo desse mundo? — perguntei, aproximando-me, sorridente — Oi, tio.

Minha tia nunca ia ali, ela não se sentia confortável. Era meio frustrante saber que minha casa era considerada um lugar ruim para a minha família. Não importava quantas vezes eu insistisse, eles não me ouviam. Surpreendia-me de que ela tivesse permitido que meu priminho, Neal, viesse.

— Ele está crescendo muito rápido — disse meu tio.

— Sim... Estou vendo — disse, sem conseguir evitar minha voz de criança — Ele já mostrou interesse por alguma diversão?

— Fez uma bagunça com as tintas da sua mãe... — ele disse, divertido — Acho que puxou à prima.

— Coitado dele — brinquei.

Em resumo, tinha sido uma parada rápida, não permitida pela minha tia. Meu tio estava comprando algumas coisas para a fazenda, e aproveitou para levar Neal, para que ele conhecesse a cidade.

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Eles não se demoraram muito, era só uma parada rápida mesmo.

— Eu já ia com a frigideira, se você tivesse demorado mais — disse Rachel, quando eu voltei.

Revirei os olhos, rindo.

— Vamos! Onde vai levar essas caixas? — perguntei, indo ajudá-la.

— Vou visitar meus avós hoje... Quer ir comigo? — perguntou.

Eu sabia que ela não se sentia confortável sobre esse assunto, então concordei em acompanhá-la.

— Eu sempre fui sozinha... Minha mãe não queria olhar na cara deles, e Evan não entende de Abnegação — ela deu de ombros.

— Temos bastantes caixas este mês — comentei, tentando desviar sua atenção.

— Eleonore vai nos mandar uns sabonetes, que ela aprendeu a fazer — disse.

— Isso me cheira a Amizade.

— É... Tem umas mulheres que aprendem a fazer isso. Sabe como é... Coisas orgânicas.

— Fala sério! Não me surpreende que tenha saído.

Disse a garota que, momentos antes, me disse que eu era a cara da Amizade.

Era bipolar... Só podia ser.

Pegamos as caixas, e fomos caminhando até a loja na Abnegação, que não era tão longe de onde estávamos.

Ela entrou pela porta dos fundos, como se fosse a casa dela.

— Vem! — ela disse, ao me ver hesitar.

— Eles vão vir com uma arma, achando que vamos roubar — sussurrei.

— Primeiro: armas não são permitidas na Abnegação. São como defesa própria, e isso é egoísmo.

— Mas pode ajudar para proteger as pessoas ao redor — eu disse, confusa.

— Mas machuca e pode matar — retrucou — E, segundo, eles não se importam com quem entra. Ninguém rouba a loja, por isso. Eles deixam a porta dos fundos aberta para que nós peguemos o que precisemos.

— Mas eles sabem que você vem, certo?

— É claro que sabem!

Continuei observando em como ela abria alguns armários, procurando por algo.

Pequena sensação de que eles só sabiam que ela vinha porque ela foi pega em uma das primeiras vezes... Mas resolvi não estender o assunto, ela não se sentia confortável.

— Rachel — disse.

— O que foi? — perguntou, sem desviar o olhar, enquanto avaliava algumas latas.

— Acho que aquelas sacolas são pra você.

Ela desviou o olhar de mim para elas. Colocou a lata de volta no lugar, e aproximou-se de um papel, que estava grampeado no saco de papel. Senti que ela engoliu em seco, mas pegou os sacos pelas alças, colocando-os dentro das caixas, para ajudar a segurar.

— Vamos! — disse, sem me olhar.

Não perguntei, peguei as caixas, e fui atrás dela.

Olhei para trás, e percebi uns olhos castanhos nos observando, silenciosamente.

Fechei a porta com o pé, e fomos apressadas para a nossa casa.

***

— O que você sabe que eu não sei? — perguntei, ao notar que Rachel parecia feliz demais.

— Nada — no entanto, ela não conseguia tirar o sorriso da cara.

Fiquei observando-a desconfiada, enquanto arrumávamos as latas na sala adjunta, que chamávamos de “cozinha”. Exceto pelo fato de que não cozinhávamos nada ali, e não tinha móveis, fora as mesas.

— Está namorando? — perguntei.

— Ainda não — ela deu de ombros.

— O que aconteceu? — insisti, mas ela fingia não me ouvir.

Pelo passar da tarde, percebi que ela não era a única radiante, Laney também estava assim.

— Rachel Ward, me diga logo o que está acontecendo! — encurralei-a, enquanto levávamos as roupas para o tanque.

— Ai! Está bem, mas você não pode lhes dizer que te contei!

Era difícil largar das ideias da Franqueza, mas não era como se eu sempre fosse franca, eram os meus instintos de sobrevivência aflorando. E, acima de tudo, eu era curiosa.

— Prometo! Prometo! Mas me conte — disse, rapidamente.

Ela olhou para os lados.

— Evan vai me matar... — murmurou, nervosa.

— Rachel! Por favor! Se quisesse que fosse segredo, deveria ter disfarçado esse sorriso aí! — reclamei — Sabe como sou curiosa...

— Evan vai te pedir em casamento.

Eu realmente não esperava por aquilo.

— Vocês namoram há uns 5 anos! Já estava na hora — Rachel disse, sorrindo empolgada — Acho que ele estava esperando pelo dia que você fosse tentar voltar para a Amizade, ou coisa assim. Sabe como ele é inseguro...

— Sem motivos — consegui acrescentar.

— Respira! Respira! — ela começou a sacudir a mão na minha direção — Aeryn, pelo amor! Não me vá desmaiar!

— Preciso me sentar — disse, antes de jogar-me em cima de um canto.

Surpreendi-me quando senti meus olhos arderem, ao mesmo tempo em que assimilava a notícia.

— Eu nem sei o que dizer — disse, enquanto as lágrimas começavam a descer,

Ela sorriu para mim, compreensiva. Olhou para trás, pegando minha mão para levantar-me. Girou a torneira do tanque, e fez sinal para que eu limpasse os vestígios do choro.

— Se souberem que te contei, me crucificam — avisou, enquanto me afastava para jogar as roupas ali, molhando-as — Vá tomar um ar! Melhorar essa cara...

— Não! Eu preciso ocupar a minha mente! — protestei, pegando as roupas da mão dela — E de um calmante.

— Isso eu não posso te arrumar.

— Me contento fazendo isso aqui.

Não consegui tirar da minha mente aquilo durante toda a tarde. Nós quase nunca conversávamos sobre planos para o futuro, talvez pelo fato de minhas escolhas estarem tão evidentes.

A hora do jantar chegou, e o prédio estava cheio dos sem facção. A nossa casa era como se fosse a “sede”, todos nos juntávamos para compartilhar da comida.

— Aeryn, se você não se acalmar, ele vai perceber! — Rachel dizia, irritada.

— Desculpe! Desculpe! Eu não consigo me controlar — murmurei.

— Está tudo bem?

Paralisei, junto com Rachel, quando ouvimos a voz de Evan, atrás de nós.

— É claro que está! Por que não estaria? — ela apressou-se a contestar, já que eu tinha travado — Eu vou indo.

Quase soltei um palavrão, o que queria dizer muito. Eu não gostava de falar palavrões.

Virei-me, tentando aparentar estar normal, mas podia sentir minhas mãos suadas.

Ele deu-me um beijo demorado, como sempre fazia, quando chegava em casa. Já parecíamos casados, só iríamos passar no papel... E dormir no mesmo quarto. Porque Laney era bem restrita quanto a isso, e eu até me sentia aliviada por isso.

— Meu tio trouxe Neal hoje — disse, quando nos separamos.

— Sua tia deixou? — ele franziu o cenho.

— Não, vieram escondidos — ri.

— Como foi o primeiro dia de trabalho? — perguntou, parecendo preocupado.

— Foi tudo ótimo! — revirei os olhos.

Resolvi não comentar que encontrei com Karen. Parecia meio fora de lugar...

— E o seu trabalho? — perguntei.

— Mesma coisa de todos os dias — retrucou, nos afastamos para começar a ajudar na distribuição de latas.

— Sabe que não gosto disso... — murmurei — Você pode sofrer algum acidente.

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— Não sofrerei. E ganho bem mais do que nas outras profissões... — comentou.

— Se vocês não viessem, mamãe teria ido atrás de vocês — observou Rachel, quando nos encontramos.

— Não duvido disso — respondi.

Depois disso, foi difícil nos concentrarmos na conversação. Distribuímos a comida, e sentamo-nos para começar a comer. O que Rachel me disse mais cedo quase desapareceu de minha mente.

Quase.

— Eu estive na Amizade hoje — comentou Evan, nervoso.

— Por quê? — perguntei, embora soubesse a resposta.

— Precisava pedir permissão para os seus pais — ele deu de ombros.

Rachel e Laney começaram a nos observar de soslaio, curiosas.

— Permissão para...? — perguntei, o coração quase saindo pela minha boca.

Meu estado não melhorou quando ele ajoelhou-se na minha frente. Agora, a maioria parou de conversar para ver o que acontecia, mas eu não me importei com isso.

— Aeryn Mitchell, você quer casar comigo?

— Sim — quase sussurrei, atirando-me em seus braços.

Quando fui buscar aquelas bebidas, eu jamais imaginaria que minha vida poderia mudar tanto.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.