Aprecie o Silêncio

VIII - Aprecie o silêncio...


Aprecie o silêncio...

Aprecie o silêncio...

Aprecie o silêncio...

Aprecie o silêncio...

_ Ei! Olha aquilo! – apontou o outro pra fora das portas automáticas.

O primeiro foi atingido por um tiro no pescoço e caiu. O segundo desviou sua atenção de Audrey e começou a atirar contra o homem que avançava para a portaria do prédio.

Audrey arrastou-se até a porta do elevador, tentando se proteger dos tiros, assim como todos os presentes no saguão. Levantou-se e apertou os botões furiosamente enquanto via o outro segurança tombar ferido.

Duas silhuetas alcançaram a portaria do prédio. Audrey só viu que não os conhecia, e em seguida o elevador abriu as portas. Jogou-se dentro dele e protegeu-se numa das laterais enquanto alguns tiros eram disparados contra a porta, que se fecharam rapidamente.

Audrey ainda recostada na lateral do elevador tentava normalizar sua respiração.

_ Quem eram? Quem podem ser, meu Deus?

A luz do botão do oitavo andar estava acesa. Continuou recostada na lateral e ajeitou o corpo.

As portas se abriram ao chegar no andar de número 8.

Taila apontou para o elevador, mas não havia ninguém lá.

_ Aquela vaca... – reclamou.

Antes que pudesse abaixar a arma, sentiu um puxão muito forte que a lançou contra a parede do elevador. Bateu com o rosto no espelho do elevador, e o impacto fez com que derrubasse a arma.

Audrey apertou o botão que fechava as portas.

_ Vaca é você.

Taila sacudiu a cabeça de um lado a outro, tentando se recompor. Virou-se para Audrey.

_ Quanto tempo, Audrey.

Audrey apertou o botão de parada de emergência.

_ Sentiu saudades Taila?

_ Não imagina o quanto.

Sem que Audrey pudesse prever seus movimentos, Taila acertou seu nariz com um chute alto e voou para sua arma.

Audrey foi jogada contra a parede, mas ao ver a sombra de Taila se arrastando para a pistola, não pensou duas vezes antes de atirar.

Acertou o pulso da mulher que caiu gemendo de dor.

O nariz de Audrey sangrava intensamente quando avançou para Taila e a levantou. Forçou o rosto da ex-colega contra o espelho do recinto enquanto imobilizava suas mãos para trás.

_ Você ainda não aprendeu que sou melhor que você não é?

_ Pode até ser. Mas isso vai mudar Audrey. Você vai morrer aqui nesse prédio.

_ Quem mais está aqui?

_ Tem muita gente Audrey.

_ Onde eles estão?

_ Hahahaha! Não me faça rir sua vagabunda... Você acha mesmo que vou te dizer?

Audrey apontou a arma para a têmpora de Taila.

_ É você quem sabe.

Taila gemeu de dor por causa do tiro no pulso. Audrey puxou-a pelos cabelos e empurrou seu rosto novamente contra o vidro rachado.

_ Não tenho o dia todo Taila.

_ Não vou dizer!!! Não vou dizer!!! Você não tem capacidade para me matar Audrey!!! Você não consegue!!! Você é uma frouxa!

Audrey diminuiu a pressão da arma contra a têmpora de Taila.

_ Você se lembra do dia que saiu do grupo? Você quase arruinou tudo para contar à vítima o motivo de sua morte... Você não serve pra isso. Você não vai me matar por isso.

Um longo minuto de silêncio se seguiu, quebrado apenas por outro gemido de dor de Taila.

Audrey aproximou-se do ouvido da moça e disse:

_ Você vai morrer por não dar a localização de seus companheiros.

E puxou o gatilho.

Recuou até bater na porta do elevador. Escorregou até chegar ao chão. Suas pernas estavam trêmulas e sua garganta estava ficando apertada.

Esperou mais alguns minutos para se recompor e apertou o botão para que o elevador voltasse a funcionar.

Encarou o painel e pensou num andar. Não existia andar seguro. Então deliberadamente apertou o 11.

As portas se abriram. Segurou sua pistola com firmeza. O andar parecia vazio. Deu uma última olhada para o corpo de Taila estirado no chão, com a cabeça apoiada no vidro inferior do elevador.

_ Foi você quem escolheu assim Taila...

Segurou a arma com as duas mãos enquanto caminhava pelo corredor silencioso. Limpou o sangue na barra da blusa e continuou a caminhada, atenta a qualquer som. Ouviu alguma coisa ao longe, mas ao se aproximar descobriu que era apenas uma televisão ligada em um dos quartos.

_ Então aí está você!

Surgiram dois homens na escada um pouco mais a frente de onde Audrey estava. Eram outros dois rostos desconhecidos.

“Pelo jeito Fausto investiu pesado na minha morte...” Pensou desolada.

Sabia que não tinha tempo de pegar o elevador. Até ele chegar, já teria levado muitos tiros. Sem pensar mais, atirou-se com força contra uma das portas dos apartamentos.

_ Abaixem-se! Escondam-se! – gritava enquanto atravessava o quarto correndo.

Não precisou pedir duas vezes. Um casal de meia idade que assistia televisão escondeu-se no armário enquanto seu quarto era invadido por mais dois rapazes.

Audrey ouviu um disparo passar bem próximo a si. Mais a frente não tinha nada além de uma janela.

_ Maldição!!! Não pode ser!!

Quebrou o vidro da janela com um chute e precipitou-se para fora. Agarrou-se ao parapeito e iniciou uma perigosa caminhada rumo a janela do quarto ao lado.

Parou por um segundo. Apontou para a janela de onde saíra. Sua suspeita se confirmou quando surgiu a cabeça de seu perseguidor a sua procura.

Efetuou dois disparos antes que o homem conseguisse mirar. Voltou a andar em direção a outra janela, torcendo para ter tempo suficiente antes do outro surgir também.

_ Te peguei! Vem comigo!

Duas mãos fortes agarraram seus braços e a colocaram para dentro do quarto.

_ Felipe!!! – Gritou pulando no pescoço do noivo. – Felipe!

_ Calma, calma meu amor... Está tudo bem, vamos sair daqui.

Felipe soltou-se da moça e saiu na janela.

Audrey ouviu-o atirar, então soube que o outro também havia sido abatido.

Felipe a agarrou num abraço apertado.

_ Mas no que você pensou?!

_ Eu precisava avisá-los Felipe... Eles estão aqui... E não podem matá-los Felipe!

_ Audrey, não é hora para ser altruísta!!! Pense no nosso filho! Você não está mais arriscando somente a sua vida meu amor! Por favor, seja razoável!!

_ Mas eu não posso deixar Felipe... Fui eu quem os colocou nessa situação! Não posso deixar!!

_ O que você não pode deixar é nosso filho continuar nesse prédio! Venha.

Felipe a puxou para a porta do quarto. Audrey olhou ao redor, parecia um quarto que ainda estava vago.

Audrey observou a mão de Felipe segurando a sua com firmeza. Podia sentir o amor dele fluir por ela. Era um sentimento tão maravilhoso que podia acalmá-la ante qualquer situação.

_ O que foi? – perguntou Felipe quando a moça estacou.

_ Eu te amo mais que a mim mesma.

Felipe virou-se completamente para ela.

_ Eu também te amo mais que o possível Audrey. Sempre.

Puxou-a para um beijo não planejado. Em seguida, abriu a porta e espreitou.

_ Vamos. Tá tranquilo.

Saíram pelo corredor deserto. Felipe chamou o elevador. Apontou a arma para dentro deste, quando finalmente chegou e abriu as portas. Mas para seu alívio, estava vazio.

Seu alívio durou pouco.

_ Não adianta fugir. – alguém disse surgindo no fim do corredor.

Felipe empurrou Audrey gentilmente para dentro do elevador e disse sem tirar os olhos do perseguidor:

_ Nos encontramos na cobertura.

_ Não! Felipe!

Audrey tentou sair, mas Felipe a empurrou com um pouco mais de força fazendo-a cair. Antes que pudesse levantar, as portas já estavam fechadas.

Levantou-se trêmula e assustada. Felipe correndo risco de vida era muito mais atormentador que ela mesma estar em perigo. Mas agora não estava sozinha. Tinha que proteger também a seu filho.

Caminhou de um lado a outro. A luz do 14º botão se acendeu. Precipitou-se para o teto do elevador. Tirou a grade e subiu, colocando a grade novamente. Ficou quieta, respirando o mínimo possível, apontando a arma para baixo, através da grade.

Boquiabriu-se quando viu quem embarcou.

_ Rômulo!! – gritou e tirou a grade.

_ Não... Não desça. – ele pediu com a voz fraca.

Audrey observou-o cair ferido no chão.

_ Rômulo, onde estão os outros?!

_ Pegaram o Victor, Audrey... Eu não consegui ajudar...

O choque a calou. Victor estava morto. O Projeto Araucária matou seu amigo Victor. Sua boca ainda estava entreaberta numa frase que não conseguira formular.

Nem percebeu que o elevador parou no andar seguinte. O som do tiro a tirou de seu estado catatônico.

Cobriu a boca com a mão para impedir o grito. Rômulo acabara de receber novo tiro, que por fim lhe tirara a vida.

Mordeu os nós dos dedos para não gritar. Quando as portas voltaram a se fechar, saltou para dentro do elevador sem se importar.

_ Rômulo...

Convenceu-se que não podia fazer nada. O próximo andar era a cobertura. Estava com a arma tremulamente apontada para frente quando as portas se abriram. Mas não havia ninguém à sua espera.

Observou a parede revestida em mogno e desembarcou. O elevador atrás de si apitou e fechou as portas.

Onde deveria esperar por Felipe?

_ Mas o que está fazendo aqui?!

Audrey por pouco não atirou em Vin que acabava de surgir na escada.

_ Vin!!!

_ Você devia ter ido embora!

_ Eu não podia Vin! É um grupo de extermínio...

_ Eu sei! – cortou Vin – Mataram o Alan... Temos de sair logo daqui... Vamos!

_ Não, eu preciso esperar pelo...

_ Eles estão vindo pra cá Audrey, temos de sair daqui!

Audrey preferiu não discutir. Se estavam se aproximando, era melhor mesmo fugir. Vin a agarrou pelo braço e correu para a porta da escada de incêndio.

Quando ele caiu, Audrey agachou-se tentando ajudá-lo a se levantar.

_ Acertou minha perna Audrey, corra.

_ Não, não corra não Audrey!

Estava tão mergulhada em seus pensamentos que não distinguira o barulho do tiro silencioso. Ao olhar para a extremidade do corredor, de onde Vin saíra, reconheceu Fausto.

_ Fausto... – disse baixa e fracamente.

_ Fique paradinha e evite maiores estragos.

_ Lembre-se de seu bebê... – pediu Vin num sussurro – Corra, eu seguro ele.

_ Vin...

_ Por favor, Audrey, não deixe que isso seja em vão...

_ E então Audrey, quer saber por que você vai morrer?

Audrey o encarou ferozmente.

_ Porque você é um canalha. Não respeita nem seus companheiros.

Fausto parou por um instante.

_ Hum, não foi nisso que eu pensei. Você atrai muita atenção para nós. E é também uma bomba-relógio. Por favor, não leve para o pessoal. São apenas negócios, e eu sigo ordens.

Audrey ajudou Vin a se levantar.

_ Opa, então você quer mesmo arriscar a vida de seu amigo?

_ Meu amigo é um homem de fibra Fausto. Não precisei pedir nada a ele.

Depois disso, virou-se e correu o mais rápido que pôde. Ouviu disparos e soube que de alguma forma Vin os bloqueara. Não quis pensar na forma quando puxou a pesada porta e precipitou-se para dentro.

Correu descendo os degraus de dois e de três de uma vez. A escada era escura e tinha um ar úmido.

Em cada patamar via grandes números vermelhos indicando o andar. Dezesseis, quinze onde Rômulo morrera, quatorze, treze, doze, onze onde se separou se Felipe, dez, nove, oito onde matou Taila, sete... Faltavam só seis.

Ouviu tiros ricochetearem nos corrimãos, vindos de cima. Era Fausto. Sinal que passara por Vin.

“Inferno! Vin... Alan... Rômulo... Victor... Todos eles...”

Concentrou-se em chegar ao final.

“Finalmente!!” Pensou com alívio ao alcançar a porta que dava no estacionamento. Puxou-a com força, mas nada aconteceu. Tentou novamente e de novo não conseguiu.

“Trancaram!!!” Pensou entrando em desespero.

Sacudia a porta com força dando murros e pontapés. Os tiros cessaram. Instintivamente olhou para o alto, na esperança que Fausto tivesse sido acertado por um tiro redentor. Mas apavorou-se ainda mais. Fausto desistira de atirar ao ver que Audrey estava encurralada e passou a correr mais rápido para alcançá-la.

Audrey empunhou sua arma. Podia ser melhor que Fausto.

A porta à suas costas se abriu, e ela se virou rapidamente mirando sua próxima vítima.

_ Calma! Vem logo, vamos!

Era Felipe. Ele agarrou sua mão e a puxou pelo estacionamento.

Novamente, Audrey pôde pensar com mais clareza. Sentiu-se infinitamente mais calma. Agora tudo daria certo.

_ Vamos roubar um dos carros... – começou Felipe.

_ Ele parou de atirar, o que estará pensando em fazer?

_ Melhor não ficarmos para descobrir...

Como que para contradizê-la, outro disparo. Silencioso e certeiro.

_ FELIPE!!!

_ Acalme-se... Fuja... Vá logo!

O tiro acertara o lado esquerdo de suas costas. Na altura do coração.

Audrey o puxou para trás de um dos veículos estacionados.

_ Audrey, está mesmo achando que vai se esconder de mim aí? – perguntou Fausto.

Nenhuma resposta. Nenhum barulho. Nenhum som. Fausto preocupou-se. Viu que acertara Felipe. Aproximou-se devagar.

_ Se você não fugisse, eu não precisaria matá-lo. Se vocês não tivessem se envolvido, talvez nada disso teria acontecido...

Deu mais um passo apreensivo. Estava tudo silenciosamente imóvel.

_ Audrey... – arriscou chamar.

_ Estou aqui.

Fausto sentiu o rancor na voz da moça. E soube que não teria mais muito tempo. Audrey surgira às suas costas e apontava para sua nuca.

_ Audrey... Talvez a gente possa pensar numa outra saída...

_ Você matou os meus amigos. Atirou no meu noivo.

_ Eu precisava fazer isso.

Audrey sentiu o rosto quente. Tateou e descobriu que estava chorando. Estava tão tomada por raiva que não sentiu o pranto se iniciar.

_ E agora eu preciso te matar Fausto.

Puxou o gatilho e instantaneamente seu mentor desabou sem vida.

Correu até Felipe. Estava estirado de costas para o chão. Audrey viu a poça que se formava embaixo dele.

_ Vamos Felipe, temos que te levar para algum lugar...

_ Não, Audrey...

_ Por favor, vamos...

_ Audrey! Presta atenção! Não adianta...

Felipe tossiu e se engasgou com o próprio sangue.

_ Felipe, meu amor, isso não é nada, vamos resolver... – as lágrimas corriam desesperadas por seu rosto.

_ Audrey não discuta, por favor... Pode ter mais dos homens de Fausto aqui... Você sabe que eu já não posso fazer nada por você...

_ Mas eu posso por você meu amor! Por favor...

_ Eu te amo demais Audrey. Eu os amo demais Audrey... Fui mais feliz do que qualquer um poderia ter sido...

_ Felipe não diga isso, estou te pedindo...

Felipe acariciou o rosto da noiva e em seguida sua mão caiu sem forças no piso do estacionamento.

_ Felipe, fica comigo. Felipe!! FELIPEEEE!!!

Audrey o agarrou com força, soluçando freneticamente, desesperadamente.

Agora, com seu noivo sem vida ali em seus braços, não via motivos para fugir. Não tinha motivos para viver.

Ficou agarrada ao corpo já sem vida do rapaz sentindo o calor ir embora.

Há quanto tempo não chorava? Desde a morte dos pais... Jurara nunca mais chorar desde então. Mas também jurara nunca mais amar. Então, de nada valia cumprir uma promessa em detrimento da outra.

Ouviu uma movimentação vinda da escada de incêndio de onde saíram.

Encarou o rosto sereno de seu noivo. Não podia permitir que a matassem. Tanto esforço pra nada?

Deu um último beijo nos lábios ainda quentes de Felipe e se levantou. Caminhou sem pressa para a rua e entrou no mesmo carro de onde saíra momentos atrás. O outro carro que disparara diversas vezes contra ela já não estava lá.

Arrancou cantando pneus e seguiu para a estrada.

Estava vazia. Aumentou a velocidade a 120 por hora.

Pra onde deveria ir? O que deveria fazer da vida? E aquela dor no coração, o que fazer com ela?

Não tinha mais esperanças...

_ Pra quê insistir numa vida vazia?

Atravessou no canteiro até sair na pista da mão oposta. Aumentou ainda mais a velocidade para 150 por hora.

Com um pouco de sorte logo encontraria um caminhão que pudesse levá-la de volta a Felipe.

Acelerou mais um pouco, subindo a velocidade para 180 por hora. Era uma região litorânea, não podia demorar muito para aparecer um caminhão de carga.

Apertou os olhos para ter certeza que os dois faróis adiante eram de um caminhão. Sorriu amargurada ao constatar que eram.

_ Pronto...

Acelerou para 190 por hora, o máximo.

A mão que estava no câmbio saiu de lá. Pousou no ventre e o apertou com força. Soluçou mais uma vez.

As lágrimas embaçaram sua vista.

Diminuiu a velocidade e voltou para sua pista. Parou no acostamento pois já não conseguia enxergar.

Abraçou o ventre enquanto o pranto voltava a lhe invadir.

Amaldiçoou-se pelo que esteve prestes a fazer a si mesma, e a seu filho.

_ Me perdoe...

Esfregou os olhos e engatou a primeira. Quando o carro começou a deslizar, aumentou as marchas gradativamente.

Não conseguia se perdoar por ter sido tão negligente. Encarou seu reflexo no retrovisor. Os cabelos esvoaçavam ao vento da estrada. Alguns fios se grudavam na face molhada pelas lágrimas. Sua expressão era de raiva, mas só estava determinada. Disse para sua imagem num tom ameaçador:

_ Vai se chamar Hope.

FIM

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.