Tëmallön jamais fora boa para seu povo, e em retorno seu povo jamais foi bom com Tëmallön. A cidade se erguera nos ossos daqueles que tentaram fazer melhor, nos tronos os reis eram fantoches de uma vontade maior a qual se até mesmo reis eram sujeitos, como poderia o indivíduo não o ser?

Enquanto as cordas de aço rangiam puxando o peso do elevador para cima, Alek pensava no Anel, todas aquelas pessoas misturadas lá em baixo, todos os que optaram por não fazer nada, todos veriam suas famílias no fim do dia. Mas eu não. O pequeno menino do seu lado havia agarrado seu antebraço, segurava-o como se buscasse segurança, mas o que era isso? Não havia conseguido salvar nem a si mesmo, queria agarrar a criança pelos ombros, gritar em seus ouvidos para que o deixasse. Eu não posso te proteger! Não sou capaz de fazê-lo. A voz inflamada urgia em sua mente.

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Então o elevador deu um solavanco e parou, abaixo deles vapor foi expelido pela pressão e uma nuvem esbranquiçada subiu por eles com cheiro de óleo queimado enquanto o metal parava de ranger.

Zeno, o guarda do pilar que até então olhava para o horizonte iluminado da cidade, virou-se para eles dando as costas para as luzes amareladas das ruas.

— Andando. — Disse aos dois.

Não retorquiu, aproveitou que o menino se agarrava a ele e conduziu-o pelo mesmo caminho, com Zeno atrás deles.

Alek olhou ao redor antes de prosseguir, não haviam subido até o pilar, estavam no meio da grande rocha com colunas de metal; havia uma abertura nela, e uma pequena ponte ligando o elevador neste túnel. O que é isso? Perguntou-se, mas sequer pensou em vocalizar os pensamentos.

Havia um conjunto de canos passando pelo teto, e no centro, de cinco em cinco metros, uma lamparina incandescente zumbindo, a luz avermelhada iluminando as paredes de rocha, hora bem acabadas, lisas e retas, hora rusticas com marcas de onde picaretas bateram abrindo o caminho do túnel à força. O chão, porém, era liso e uniforme, mas de diversos materiais, hora em pedras, hora em terra batida, hora em cascalho, indiferente ao material, todo o tempo havia dois trilhos, desde que desceram do elevador até além de onde foram, os trilhos internos seguiam todo o caminho, incluindo ramificações nas curvas para outros tuneis, os quais Zeno não os guiou.

Chegaram em um salão aberto nas rochas, de aparência muito mais convidativa, havia uma escada e dois outros corredores, além de grande espaço entre chão e teto, de onde um lustre pendia com chamas avermelhadas queimando. No chão havia espaço para refeições, duas grandes mesas, e próximo a um dos cantos do salão havia uma estante, um armário de latão e madeira, com grande fechadura de bronze, e uma mesa aonde dois homens conversavam (de um os corredores ainda se podia ouvir murmúrios, como conversas distantes).

— Silas, leve o garoto. — Zeno disse para um deles.

— Olha só o que temos aqui. — O outro sem ser Silas bradou.

Alek olhou ao redor, tentou entender o que acontecia. O homem pareceu animado ao ver ele e o garoto.

— Quer um docinho, criança? — Perguntou contornando a mesa e indo até o menino, que apertou os dedos no pulso de Alek.

— Não, não devo pegar coisas de estranhos.

— Sua mãe ensinou isso? — O menino anuiu covardemente ao ouvir a voz do homem e Zeno ao lado abriu um sorriso que não passou despercebido para Alek. — Que pena ela estar morta não é?

Alek puxou o menino para si e abraçou-o com a mão, a criança soluçou tentando conter o choro, e então o homem se endireitou olhando para Zeno, depois Alek.

— E esse? Pensei que era mãe filho e avô. De onde veio isso?

— De intrometido que veio. — Zeno disse empurrando Alek e puxando a criança. — Silas, está esperando o quê? — Bradou, agora mais imperativo, e Silas pegou a criança pela mão.

— Vem comigo. — Disse sem soar grosseiro, e saiu andando com o menino, rumo ao elevador de onde vieram.

Alek acompanhou com os olhos, mas então uma mão agarrou seu queixo, puxou-o para frente, fazendo encarar o homem, olhos verdes, pele morena e ressecada, cabelos crespos e um dente de ouro no lugar do canino esquerdo.

— Gosta de se intrometer, não é?

— Amon, dispensado. — Uma nova voz surgiu, Alek se virou no mesmo instante para trás, e no mesmo instante Amon, o guarda grosseiro que fizera a criança chorar, lhe deu um soco na boca do estomago, fazendo-o curvar e arfar sem ar.

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— Não vire as costas para um soldado, garoto.

— Exceto que é um guarda, não soldado. — O que acabara de chegar disse passando porpelos três. — O que temos?

Perguntou para Zeno. Alek pode ouvir, lá longe no corredor, o som do elevador e suas correntes.

Amon fez cara de desfeita para o homem que acabara de chegar, e Alek, por entropia, desenvolveu afinidade por esse mesmo homem. Este guarda então olhou para Amon de cima a baixo.

— Não ouviu? Dispensado! — A muito contragosto Amon retornou a mesa e começou a juntar suas coisas. — Foi tudo tranquilo? — Ele perguntou para Zeno então.

— Esse ai apareceu para salvar o dia, quase condenando todo mundo. Fora isso foi tudo como esperado.

— Bom, ainda bem. Não quero mais jornais falando das operações. Foram discretos?

— O máximo possível. — Zeno retorquiu de cabeça baixa e sem olhar para Alek, sabia que se Alek quisesse, podia estregar sua história, ele porém não desejava falar nada, pois sabia que falar podia significar seu fim antecipado.

Enquanto isso, Amon deixava-os resmungando baixinho ofensas inaudíveis indo rumo a escada de onde o homem viera momentos antes. Troca de turnos. Alek imaginou acompanhando movimentos com os olhos, tentando não deixar nada lhe escapar a vista.

— Me chamo Olivar. — O homem se apresentou então. — Você?

— Alek. — Respondeu ao guarda na sua frente, olhava para baixo do queixo do homem, na altura do pescoço, com medo de encará-lo e por isto sofrer represálias. — Senhor, se me deixar explicar...

— Temo que tenhamos passado desse ponto, Alek. — Olivar retorquiu interrompendo-o e indo à mesa, aonde em uma gaveta suspensa pegou um molho de chaves, apontou para Zeno um dos corredores, então a mão de Zeno encostou nas costas de Alek, pressão foi aplicada, empurrando-o para frente fazendo-o andar. — Possuí alguma filiação da qual queira compartilhar? Com alguma facção? A ordem de Hasgyz talvez?

Esse nome... Alek se lembrou de seu pai, a lembrança fraca, como cheiro de orvalho pela manhã, é sútil, mas forte o bastante para marcar. Os Hasgyz ainda existem?

— Se eu puder apenas explicar, eu queria ajudar, jamais quis ferir o guarda...

— Não o feriu, não se preocupe. Aonde mora? Possuí família?

Enquanto andavam rumo ao corredor, Alek percebeu que estavam entrando em um corredor de celas. Entendera de súbito o que era aquele local, o que ele havia ido fazer ali. Não estou indo ao Pilar. Ao menos não ao seu topo. Cogitou falar de sua mãe, suas irmãs, mas temeu que se o fizesse, as usassem como meios para conseguir algo dele. Havia ouvido histórias, pessoas inocentes que admitiam culpa para que a dor parasse, a dor, porém, nem sempre era nas próprias vítimas. Então se calou.

— Se não falar, vamos te jogar com os Carza. — Zeno cochichou nas suas costas enquanto o conduzia, e foi como se lhe espetassem agulhas por toda coluna. Até mesmo parou de andar, o que lhe rendeu um empurrão, cambaleou retomando o equilíbrio.

Olivar guiava o caminho andando pelo corredor enquanto nos dedos girava o molho de chaves.

— Pode escolher não falar, sim, sempre podemos escolher! — Disse para Alek quando parou de andar na frente de uma cela (gritos abafados vinham de celas mais ao fundo aonde sequer havia iluminação, aonde nada além de trevas podia ser visto). Olivar então destrancou uma porta, a fechadura rangeu e ele puxou a porta pesada de metal fundido. — Mas se eu fosse você escolheria cooperar, não há porque resistir no final!

— É um mago. — Zeno, atrás dele, disse empurrando para dentro da cela, aonde havia três pessoas. Dois homens, um em pé e um sentado encostado à parede, e uma mulher, em pé também, do lado oposto da cela, que era maior do que Alek esperava. — Um maldito mago! — O guarda riu rolando os olhos.

— Voltarei em breve! — Olivar disse trancando a cela em seguida. Então os dois deixaram Alek ali, que segurava as barras geladas que iam do chão ao teto, fincadas na própria rocha, cimentadas ao redor de onde eram encaixadas.

Alek continuou assim, parado olhando o corredor, ouvindo os gritos no breu e os passos dos guardas até que ambos silenciassem. Quando cansou, o que levou mais de uma hora, de olhar o nada, soltou lentamente as grades, suspirando, pensando nos companheiros de cela. Talvez eu devesse tê-los cumprimentado há algum tempo. Então sentiu medo de represálias novamente. Era como se tudo e qualquer coisa pudesse criar uma reação dolorosa ali.

Mas ao invés de sentir-se amedrontado, viu, ao menos na mulher (pois ambos os homens sequer olharam para ele), uma expressão amiga.

— Mago é? — Ela perguntou, e sua voz... Alek não se considerava um mago, conhecia alguns símbolos e entendia as escrituras, mas ao ouvir aquela voz; sorriu!