— Preciso conversar com você. – Fael disse ao chegar se encostando a mim.

— Tira a mão do meu ombro. – desviei rapidamente. Ele estava com os olhos arregalados e parecia engolir seco. Acho que eu não era o único que ficava com a boca seca quando nervoso. – Não sei onde você colocou essa mão. – expliquei para ver se ele se acalmava.

— Preciso conversar com você. – ele não mudou a expressão e devia estar mesmo assustado porque não fez nenhuma piadinha com a minha reclamação. Levantei e o segui até a saída do bar.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

— Fala. – ele desviou o olhar e ficou em silêncio. Esperei mais um pouco e nada, ele parecia cada vez mais nervoso e amedrontado. – É sobre ter transado com Alicia? Se você a acha tão vadia e ela te odeia tanto, como conseguem? Não sei. Só me deixa fora dessa relação estranha, louca e doentia de vocês dois.

— Como você sabe? – ele me olhou ainda mais assustado.

— Vi os dois saindo quase juntos do banheiro. E são cinco horas da tarde Rafael, em um banheiro de bar de dia?

— Ela pediu. Achei que estivesse interessada em mim, mas não. Vi em seu olhar que ainda me odeia. Ela não queria nem ser beijada... Ela me mandou fazer o que eu tinha que fazer e não sei se estou andando demais com você e criando algum tipo de caráter ou consciência, mas agora eu estou muito mal, muito mesmo. Porque foi horrível. Ela deve ter até machucado de tão seca que estava e disfarçadamente vi que ela chorava, não consegui nem continuar. Nunca vivi nada parecido. Mesmo que ela tenha ordenado que eu fizesse eu sinto que fiz algo que no fundo ela jamais queria, tanto que o corpo dela dizia isso. Tentei questionar o motivo de ela estar fazendo isso, mas minha garganta travou! Não sei se é vingança por tudo que já fiz a ela e agora ela quer que eu me sinta assim... – ele estava se acabando em lágrimas. – Não quero sentir que eu fiz algo desse tamanho a alguém, você entende? Quando eu digo que ela é um demônio é porque ela é! Uma vadia mesmo. Ela se vingou da pior forma. Ela quis me ferir, fazendo com que eu me sentisse um verdadeiro violentador.

— Pesado! – exclamei sem saber o que dizer. – O que eu posso fazer para te ajudar?

— Não há muito que fazer. Vou embora. – ele realmente devia estar péssimo.

— Rafael... – o chamei antes que ele fosse. – Seguindo a sua própria lógica... Com tantas garotas novas porque optou por Alícia?

— Você teria que transar com ela para entender. – ele se foi me deixando ainda mais confuso.

Se não bastasse ter que ficar longe de Alice, eu tinha que lidar com o fato de ela ter beijado Kevin na primeira oportunidade. Isso era uma dor inexplicável. Agora doía muito mais porque ela sentia algo por mim, podia ser algo pequeno e que não pudesse tomar as proporções do que eu sentia, mas era alguma coisa.

— Escroto! – passava das cinco da tarde, eu já havia voltado do segundo turno de aulas e estava sentada em minha mesa de estudos revendo a matéria quando do nada Fabiana apareceu me empurrando da cadeira e me insultando. – Você fez com que ela vivesse a pior experiência da vida dela! Como pode ser tão ordinário?

— Do que você está falando? – perguntei enquanto tentava contê-la.

— Alícia. Ela está machucada. Emocionalmente e fisicamente. Porque decidiu que devia transar com o pior cara do mundo quando não tinha o mínimo anseio para isso. – pensei um pouco e encaixei sua fala com os últimos acontecimentos.

— O pior cara do mundo se derramou em lágrimas ao se sentir culpado pelo que ele fez! E o que EU tenho a ver com isso Fabiana?

— Você acha que ela fez isso por que?

— Segundo o próprio Rafael para fazê-lo se sentir mal. – ela deu uma risada nervosa.

— E você pensou o mesmo?

— Eu não sei. Não conheço Alícia ao ponto de saber o motivo que a leva a tomar decisões.

— Ela queria te provocar. Ou te esquecer. Não sei bem ao certo, é um pouco confuso. Mas o motivo principal foi você. Ela realmente gosta de você Arthur. E eu juro que nunca vi Alícia gostar de alguém assim. Você a controla da mesma forma que sua prima controla você. – fiquei calado sem saber o que dizer e pensando naquilo tudo. Alícia não podia se prejudicar dessa forma por mim, não mesmo. Isso era injusto e cruel. – Tá vendo? É esse Arthur que conheço e gosto, o cara centrado e sério que tem consciência. Conheço essa sua expressão e sei que está pensando na melhor forma de consertar isso.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

— Seria bom se você me ajudasse... Não sou tão autossuficiente.

— Seja amigo dela. Mostre seus defeitos. Você não é tão incrível quanto ela pensa. Uma hora ela irá desencantar.

— E se eu fizer com que isso dentro dela apenas cresça?

— Você é mesmo prepotente. – ela revirou os olhos.

— Não acredito que isso dê certo. O certo não seria me afastar totalmente até ela me esquecer?

— Ah, não sei Arthur. Se o seu coração pedir por isso... Faça como achar melhor! Só a procure e peça perdão, ela está muito mal e precisa disso. – concordei com ela e voltei a estudar, ou pelo menos tentei. Como eu não conseguia concentrar de jeito nenhum decidi tomar banho. Fael chegou um pouco depois de sete da noite, ele não gritava, ria ou fazia piadinhas e isso era extremamente incômodo. Fabiana estudava vendo um vídeo aula com fones e nem deu ideia para ele. Ele sabia que se mexesse com ela perderia as duas bolas, mas também parecia não ter a mínima vontade de qualquer brincadeira que fosse.

— Vamos sair. – falei em uma tentativa desesperada de anima-lo.

— To afim não. – transtorno de stress pós traumático? Nunca o vi assim.

— Mas você vai. – o levantei pela camisa e arrastei para fora. Peguei meu celular e chequei quais eram as opções da noite. Por sorte havia uma festa em uma república e que parecia boa. Entrei no carro e ele sentou ao meu lado em completo silêncio.

— É ruim sair segunda, as festas começam cedo e geralmente acabam cedo também. – ele finalmente falou alguma coisa.

— Não invente desculpas. Sei que você gosta de sair qualquer dia. Para de se torturar pelo que fez com Alícia. Vamos até o alojamento dela e você pede perdão.

- Não estou pronto para encara-la agora. Espero que ela não esteja nessa festa.

— Impossível eu te dar a certeza disso. – dei de ombros e continuamos indo em direção da tal república. Eram sete e pouca, o calor do início de maio fazia com que nossas bermudas e chinelos fossem ideais para qualquer festa ou saída. Ao chegarmos fomos recebidos por algumas garotas que eu conhecia de vista, segundo Fael elas são populares nas festas universitárias. Não reparei muito nas pessoas, eu só queria distrair o meu amigo e me distrair.

“Estou saindo da academia, vou chegar em casa, tomar banho e comer alguma coisa. Posso te ligar lá pelas 19:30?” 18:35

Li a mensagem de Alice e pensei se ignorava ou se respondia. Queria por uma noite esquecer esse drama todo. Sabia que amar minha prima mais nova que tinha uma deficiência cerebral não era meu único problema. Meu maior obstáculo talvez tivesse outro nome: Kevin. Guardei o aparelho no bolso e voltei a beber o liquido amargo que nesse instante queimava a minha garganta.

— Vai com calma. – Fael disse ao me olhar de relance e voltou seus olhos para a pista de dança improvisada. – Devia ter fumado um. Não consigo relaxar.

— Aê irmão.- parei um cara que passava por nós. – Tem um isqueiro? – ele me emprestou e eu acendi o cigarro bolado que trouxe em meu bolso.

— Quem diria. – olhei meu amigo após sua fala. – Todo certinho com a sua própria... – ele parou de falar do nada. – Não fumei ainda. Já estou vendo coisas ou aquela ali é a Alícia? – olhei na direção que ele estava olhando.

— A própria. – conclui passando o cigarro para ele.

— Parece que alguém também quer se distrair. – ele concluiu após soltar a fumaça no ar. – É uma boa oportunidade de eu pedir desculpas.

— Já eu quero ficar bem louco. – bebi minha vodka de uma vez.

— O que está pegando? – ele me olhou sabendo que havia algo errado.

— Meu irmão beijou Alice. – contei tentando conter a raiva. – Pior que ela quis. E parece que gostou, sei lá.

— Deixe-a pra ele Arthur, pra que se desgastar tanto?

— Eu a amo Rafael! Não consigo “deixa-la” para alguém. – fiz sinal negativo com a cabeça.

— Ficar bêbado não resolve os seus problemas.

— Nunca resolveu os seus e você nunca deixou de ficar. – ele deu uma risada. A primeira do dia.

— Idiota. – nos olhamos. Era bom ter Rafael por perto.

Não sei quanto tempo se passou, acho que pouco, mas eu não podia ter muita noção porque eu estava um pouco menos sóbrio. Fui ao banheiro e quando voltei Alícia estava mais perto. Parei de frente a ela.

— Para de fazer coisas idiotas com a desculpa do que sente por mim. – falei em um tom sério.

— Oi Arthur, tudo bem? – ela ignorou completamente a minha fala. Nossos olhares se estacionaram um no outro e pareciam que pegariam fogo a qualquer momento.

— Você fez Rafael se sentir culpado, Fabiana se sentir mal e depois ela me fazer me sentir péssimo. O que você ganha com isso?

— E como eu me senti? Isso não conta?

— Você acha que só você tem sentimentos, que só você é afetada com as coisas. Para de ser tão egoísta Alícia!

— Por que está com tanta raiva de mim? O que eu te fiz? – a ignorei ou foi apenas efeito da bebida que me fez olhar para os lados. – É por gostar tanto de você? Você sente raiva disso? Você queria que fosse outra pessoa que sentisse tudo o que eu sinto não é? – vi que ela estava prestes a chorar. – Não pude e não posso controlar isso. Aconteceu Arthur. Você é tão perfeito e... – a interrompi bruscamente.

— Eu não sou perfeito! Eu tenho manias, sou chato, sou teimoso, impaciente e às vezes até injusto. Sei ser a pessoa mais cruel quando quero. Não diga coisas que não sabe. Você mal me conhece. Eu sou a pessoa mais teimosa do mundo inteiro. Eu teimo em amar uma garota que nunca pôde ser minha e agora que ela não me tem mais por perto ela percebeu que sentia algo por mim, e logo agora, alguém vai fazer de tudo para acabar com esse pouco sentimento. E essa é a história da minha vida, eu nunca consigo o que de fato quero e tenho que inventar estratégias para amenizar isso. Você veio falar do meu pai, sem nem imaginar o quanto delicada é nossa relação. E ainda, eu sempre insisti em fazer isso dar certo, em ser tudo falsamente harmonioso, mas agora não... – antes que eu continuasse ela ficou nas pontas dos pés, agarrou meu pescoço me abaixou e me agarrou. Seu beijo era voraz e cheio de necessidade. Queria corresponder ou para-la, mas eu estava alcoolizado demais para reagir. Ela parou de me beijar e pegou meu celular em meu bolso e pareceu desliga-lo.

— Por que fez isso? – perguntei intrigado.

— Acho que é o que está te distraindo.

— Você sabe que não. Esse beijo do nada... – dei mais um gole em minha bebida, que ela tirou de minha mão.

— Daqui a pouco você vai estar de um jeito que não vai conseguir se lembrar amanhã que te beijei.

— Quer que eu me lembre? – senti Rafael chegar ao nosso lado.

— Transar comigo sem vontade alguma era peça do plano para beija-lo? – ele perguntou para ela com bastante seriedade e frieza. Lembrei a parte podre de Alícia que Fael insistia em dizer que existia. Ela não respondeu e ele me olhou. – Vou te esperar onde estávamos antes.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

— Ele é um grosso! – ela resmungou assim que ele saiu.

— E o pau dele? Também é? – perguntei ironicamente. E levei um tapa no rosto. Merecido talvez. Acho que era a bebida falando mais alto. Como eu estava sozinho e com o rosto ardendo, fui até onde meu amigo me esperava.

— O que você disse a ela para levar esse tabefe estalado? – ele perguntou com o olhar curioso.

— Perguntei a grossura do seu pau. – falei e peguei a garrafa que estava em sua mão para passar em meu rosto, era muito mais gelada que meu copo.

— Para que você quer saber isso? Você já me viu nu quantas vezes mesmo? E ereto umas... – o interrompi antes que aquilo ficasse ainda pior.

— Não foi assim. Ela disse que você era grosso e revidei com a pergunta.

— Ah. Não preciso que me defenda, obrigado.

— Não foi para te defender.

— Por que então?

— Você sempre diz que ela não presta. – dei de ombros.

— Depende do que é prestar para você. Mas ela deixa quem ela fica na noite passada. – ele concluiu como se fosse óbvio. – Ela é má. E se deixar, te enlouquece. – fiquei calado. – Ela é cheia de marra. Tem esse jeitão de superior, mas quando quer conquistar alguém demonstra fraqueza. Tem uns caras que se iludem... Mas é tudo pensado. Alícia é um verdadeiro demônio, como eu já disse tantas vezes. Aquela carinha de santa dela, o papinho furado... Ela sabe o que faz. E o pior que ela sabe que é a mais gostosa. E usa isso muito bem. Então não se engane Arthur. – fiquei analisando as palavras dele e fazendo conclusões terríveis. Um tempo se passou e ele voltou a falar. – Ela faz você se apaixonar, mas depois te faz chorar. É assim que ela gosta.

— Você é apaixonado por ela! – soltei minha conclusão e dei uma risada abafada.

— Vai para o inferno! – ele saiu andando, me deixando sozinho. Bebi mais um pouco e mais um pouco. Após um tempo procurei Fael e não achei. Sai para fora e tentei acha-lo, mas não consegui. Já devia estar ficando tarde e eu precisava ir embora.

— Você achou que escaparia dessa. – ouvi antes de levar um soco. E um chute. E vários chutes. O gosto de sangue em minha boca aumentava cada vez mais e o local que estava escuro fez com que fosse impossível ver o dono dos ataques. Até que parei de tentar. Agora uma luz forte irritava os meus olhos.

— Calma, não abre os olhos assim. – olhei para o lado e vi Fabiana. – Sim, você está em um hospital e não, não corre risco de vida.

— Como eu vim parar aqui? – perguntei com um pouco de dificuldade.

— Fael te encontrou desacordado e espancado perto do local que vocês dois estavam ontem. Ele esta lá embaixo na recepção, conversando com os seus pais por telefone, por mais que seja maior de idade, você é um universitário, eles tiveram que ser informados. Mas não se preocupe com isso, você conhece o seu amigo melhor que ninguém, ele vai saber amenizar as coisas.

— Quem me bateu? – tentei lembrar algo, mas nada ficava claro em minha mente.

— O namorado de uma garota que você pegou em uma das festas que esteve... Não sei direito, Rafael falou mais ou menos.

— Já sei. – antes de eu acabar de falar Fael entrou.

— Os seus pais não vão vim, mas querem que você ligue assim que puder. Eu disse a eles que não houve sequelas, então tente introduzir com calma o braço direito quebrado e os pontos na sobrancelha, que, aliás, ficaram da hora e vai ter deixar com um ar mais másculo.

— Você é ridículo. – Fabi fez sinal negativo com a cabeça. – Vou para a aula. Quando chegar ao alojamento eu cuido de você. – ela sorriu e se foi.

— O que aconteceu? – Rafael cruzou os braços e me olhou com uma expressão que ele não costumava usar muito.

— Não vi muita coisa, como você sabe eu estava alcoolizado. Só sei que apanhei. Ia acontecer uma hora ou outra. Isso é o que acontece quando somos inconsequentes.

— A gente tem que revidar!

— Qual é Fael, isso não é uma guerra ou algo do tipo.

— Como ele teve certeza que era você?

— Eu contei. – Alícia disse ao chegar olhando para as próprias mãos.

— Você enlouqueceu? – Rafael foi para cima dela.

— Ele me ofendeu tá legal? Eu estava nervosa, magoada, foi a primeira pessoa que encontrei e perguntando por ele. Sabia que ele queria socar o Arthur porque ouvi a conversas de vocês no bar e notei que o cara estava bem bravo, mas eu não pensei. E achei que seria apenas uma briguinha e que Arthur conseguiria revidar. – ela me olhou. - Você não é nenhum magrelo fraquinho.

— Querida ele estava bêbado e drogado. – ele respondeu sem olhar para ela.

— Desculpa. – ela estava mesmo arrependida. – Faço o que você quiser. Posso ajudar no que precisar, eu mudo meu horário no trabalho se for preciso, falto a aula...

— Relaxa Alícia. – falei para ela se calar.

— Relaxa um caralho. Você tá ruim na nossa mão. Capirota.

— Capirota? – ela franziu a testa de um jeito engraçado. Se eu não estivesse tão fodido iria dar algumas risadas.

— Feminino de capiroto. Adoro apelidar as pessoas. É um dos meus vários hobbys.

Depois que os dois discutiram mais um pouco, para variar, recebi alta. Claro que antes liguei para minha mãe, mostrando que estava vivo e bem. A semana passou dolorosa, os hematomas estavam ficando mais claros e os pontos foram tirados na sexta. Sábado partimos para Torres, para que senhora Luna ficasse um pouco mais calma a me ver pessoalmente.

A recepção não foi das melhores, ela me xingou, brigou comigo, como se eu fosse um moleque e aquilo me irritou muito. Só que ver Alice fazia com que eu esquecesse isso tudo. Eu a levei até sua casa, para que ela buscasse biquíni e roupas para irmos a cachoeira de tarde com o pessoal e lá tirei conclusões das quais eu estava fugindo. Simplesmente não sabia com quem desabafar sobre elas.