Murilo Narrando

Deitei em minha cama e Kevin chegou se sentando e ficou me olhando.

— Quer ficar com ele? – fiquei em silêncio. – É, você quer. Por quê? – Também não respondi. - Que merda Murilo! Responde.

— Eu só queria te entender.

— Não tem que fazer isso para me entender. Não tem que me entender. Só somos diferentes e tudo bem. Não é a sua vontade, não é o seu desejo, não tem nada a ver com você. Não é o que você é. Para com isso. Nunca mais diga essa besteira.

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- Deita aqui comigo.

— Não. Preciso de ar. Estou sufocado com essa atitude sua.

— Desculpa. Não vou ficar com ele. Nem com nenhum outro. – ele me olhou e viu o quanto eu estava triste.

— Idiota. – nos olhamos. – Essa gripe está te afetando mesmo. – abracei minha coberta. Fiquei pensando no quanto eu estava carente e no tanto de tempo que eu estava sozinho. Iria ficar com a tal da Dani. – Ei. – ele se deitou e ficamos de frente um para o outro.

— Se quiser pode ir.

— Não estou gostando do seu semblante.

— Não está mais sufocado?

— Não fala nada. Deixa só eu ficar te olhando. Até que sua expressão mude.

— Como sabe que vai mudar?

— Da mesma forma que você tem certeza que muda o meu humor. – não falei mais nada e ficamos por muito tempo assim. – Dizem que quando você consegue ficar olhando nos olhos de uma pessoa é porque confia nela.

— Confio em você.

— Também confio em você. Só não faz mais isso que você fez hoje. Quer ter sua primeira experiência tenha, mas não desse jeito e nem me use como desculpa.

— Como foi? – perguntei timidamente.

— O que?

— Sua primeira experiência.

— Foi bom. Estava um pouco bêbado, devo dizer. – ele riu. – O medo me obrigou a beber. Éramos novos nisso... Os dois. Mas fiquei sóbrio assim que o beijei. Foi de longe um dos melhores beijos da minha vida. Em comparação com os beijos que eu tinha com as garotas, não chegava nem perto. Eu não conseguia parar de beija-lo. O sexo foi como uma primeira vez, mas bem intenso. Ainda lembro-me dele gemendo... Foi bem bom.

— Parece que foi.

— Mas foi passageiro.

— Quem era?

— Você não conhece. Um filho de uma amiga da minha mãe lá da capital. Depois dele teve o Renato da escola, ficamos juntos um bom tempo, mas não rolava muita coisa porque você sabe... É o Renato.

— Contido pra caralho né? – ele fez sinal positivo. – Capitão do time. – conclui.

— Por que você lesionou a perna. Era você.

— Então era pra ser eu a ficar com você? - ele me ignorou.

— Depois do Renato teve o Denis. Já não foi uma experiência tão boa. Ele me trouxe muitos problemas e ficou no meu pé por meses. Enquanto isso... Conheci esse cara que estou hoje.

— Conta dele.

— Outro dia. Já te contei coisa demais por hoje. – ele se deitou direito. – Deita aqui, vou te fazer dormir. – deitei em seu ombro e fechei os olhos. Ele começou a fazer carinho em meu cabelo.

— Não sei se consigo mais viver sem isso. – falei baixinho.

— Eu também não. – só uma coisa eu tinha certeza: era bem ali que eu queria estar.

Alice Narrando

Tudo o que eu queria estava acontecendo, aos poucos eu e Arthur estávamos conseguindo ultrapassar a barreira que surgiu entre a gente. Pelo menos agora a gente mantinha aquele contato de antes, de sempre, que nunca deveria ter acabado, por motivo nenhum.

Ele passou o braço pelo meu corpo e eu me ajeitei em seu peito. A noite estava um pouco fria e já era tarde. Saber sobre Murilo e Kevin me deixou muito espantada, eu tinha medo de Kevin ter conquistado meu irmão apenas para algum objetivo ou armadilha, não sei, mas se Arthur me garantiu que não era isso eu acreditaria e estaria aqui para ajudar aos dois no que eles precisassem. E eles precisariam, com certeza.

— Veja com os seus próprios olhos. – Arthur falou baixinho quando chegamos perto do dormitório do meu irmão. A luz já havia se apagado, e as poucas luzes do corredor e a da janela deixavam ver Murilo e Kevin dormindo abraçados. Olhei para Arthur.

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— Então é real? – ele concordou gestualmente. - Caramba! – andamos até o meu dormitório.

— É natural que leve um tempo para você digerir... Estou há dias fazendo isso. – demos uma risada baixa. – Boa noite. – sorrimos e eu o abracei.

— Obrigada por me contar.

— Nunca vou esconder nada de você, eu não consigo.

— Devo perguntar sobre a mulher ruiva que está te esperando em frente ao seu dormitório? – ele pareceu impressionado em ouvir meu questionamento.

— Você não está preparada para tamanha sinceridade.

— Ela não é sua namorada, mas tem algo entre vocês. Eu entendo. – abaixei a cabeça e fui em direção a minha cama.

— Nós transamos. Troquei sexo por ela descobrir se estava rolando um clima entre seu irmão e Kevin. Isso foi antes deles mesmo se entregarem. E falando parece horrível, mas... – fiz sinal para ele parar.

— Chega. Boa noite Arthur.

Pelo visto não havia mesmo uma só chance de a gente ter uma aproximação sequer.

Murilo Narrando

Acordei sozinho e suado. Minha febre havia passado e esse era o primeiro efeito, suor. Respirei fundo e me sentei. Lembrei que já havia tomado o remédio da manhã e fiquei me perguntando por que Kevin não estava ali para trazer o café para mim. Ele me deixou muito mal acostumado. Alice apareceu e eu pedi a ele que trouxesse e assim que comi dormi de novo. Quando levantei tomei um banho demorado, almocei rapidamente e fui encontrar todos que já haviam acabado suas funções e estavam reunidos no jardim lateral.

— Cadê o Kevin e o Arthur? – perguntei ao chegar e notar que eram os únicos que não estavam ali.

— Os irmãos siameses não se desgrudam mais e nunca se sabe onde estão.

— Aquele é o Arthur? - perguntei ao ver alguém vindo com pressa.

— Vocês viram o Kevin? - ele chegou procurando o irmão.

— Achamos que estavam juntos.

— Não. Alguém o viu?

— Relaxa Arthur. Ele deve estar dando umazinha com alguma garota por aí. - ele olhou Alê parecendo estar impaciente.

— Ou garoto. O Kevin é um mistério. - Fael falou e riu.

— Que seja. Ele está satisfazendo os desejos da carne. Deixa.

— Não há a mínima chance. – ele observou ficando ainda mais nervoso.

— Por que? – perguntei curioso.

— Ele não é disso. Qual indício você viu ou ouviu do Kevin fazendo esse tipo de coisa?

— Ele é reservado. Mas não significa que seja santo.

— Ele não está com alguém e eu tenho certeza disso.

— Tá com certeza demais para quem outro dia nem falava com ele.

— Tá com ciúme de mim? Sério Murilo? Você pode se intitular primo, melhor amigo ou o que for dele, mas eu sou irmão e passamos por coisas principalmente nos últimos dias que você nunca imaginaria.

— Jamais Arthur.

— Gostosão hein? Estão brigando por você. – Rafael falou enquanto Kevin se aproximava.

— Que? – ele olhou Arthur e eu.

— E mais uma vez eu estava certo. Olha a testa dele até suada. Ele estava dado umazinha.

— A gente precisa conversar. – ele falou para Arthur ignorando completamente todo o resto, era mestre nisso.

— Sabia. – ele reclamou em resposta e arrastou Kevin para longe.

— Caleb. – Alice falou baixinho ao meu lado. – É isso. Não fica assim. Eles têm esse pai meio... Demoníaco... Parece que têm uma luta enorme contra ele.

— Como você sabe? – suspirei. – Claro, seja como for Arthur não esconde nada de você. Queria que Kevin se abrisse comigo. Mas parece que ele não confia tanto em mim assim. Essa amizade não é muito recíproca.

— Você está se magoando demais com pouca coisa. Deve ser a gripe. – ela riu e beijou meu rosto. Ficamos conversando até o jantar ficar pronto. Comemos e ficamos no refeitório. Eu estava um pouco melhor. Pelo menos a febre parecia ter cessado.

— Por que você tá bravo comigo? – Kevin perguntou se sentando ao meu lado.

— Quem disse?

— Sua cara assim que cheguei.

— To de boa. Vou para o meu quarto. – me levantei e ajeitei minha blusa sem tirar os olhos do dele. – Ser seu amigo é difícil... Prefiro ser só seu primo.

— O que é isso Murilo? Tá doido?

— Não. Estou normal. Só acho melhor assim.

— Se é isso que você acha então tá. – vi que ele ficou magoado.

— Por quê? – me sentei de novo. – Por que se magoa se não confia em mim? Se guarda segredos com Arthur? Se tem problemas sérios e não compartilha comigo? – ele ficou me olhando por um bom tempo sem dizer nada. – Imaginei. – levantei e ele segurou meu braço. Sentei novamente, como estava de costa para a mesa apoiei os cotovelos nela. Ele não disse nada.

— Por que você está tão bravo?

— Já expliquei.

— Mas não entendo. Por que isso.

— Ser seu amigo não é apenas rir contigo, além disso, eu sinto que não confia em mim. – ele se virou para frente e voltou ao seu silêncio total. – Vou ir dormir, é impossível ter uma conversa contigo.

— Espera.

— Você está me tirando. Só pode.

— Você está sendo injusto. Eu te contei coisas que ninguém sabia Murilo.

— Mas não me conta as coisas que acontecem com você.

— Você tem que me ajudar com isso, eu não sei muito sobre amizade, lealdade, confiança... A única pessoa que me abri de verdade foi Arthur porque não adianta tentar esconder nada dele.

— Por isso que eu digo que é melhor manter nossa conexão de primos... Isso de amizade é complicado.

— Nunca fomos apenas primos sem nenhuma amizade, sempre nos demos bem.

— Por que eu nunca julguei as merdas que você aprontava.

— Porque você me entende. – ficamos nos olhando. – Só não quero te colocar no meio de toda essa merda.

— Estando com você eu já estou e eu realmente não me importo. – falei e espirrei.

— Vem, você precisa deitar. – começamos a andar.

— Boa noite galera. – despedi de todos.

— Boa noite Kevin malvadão. – Alícia falou com malícia. Ele ignorou. Bom, como observei, era o que ele fazia de melhor.

— Ela quer te dar. – falei enquanto andávamos pelos corredores.

— Não. Ela quer provocar Arthur.

— Sim. E para isso ela quer te dar. – ele ficou calado.

— Passo.

— Óbvio, ela não tem um pênis. – ele revirou os olhos. – Ela é bem gata e tem uma cara que faz gostoso. Queria ela e Fabiana juntas, mas não rolou.

— Preciso mesmo ouvir isso?

— Até parece que não está acostumado com o meu jeito.

— Pior que não. Você é um escroto.

— Ah... Não é minha culpa, é que isso é igual droga. Você faz, faz, faz... Nunca se satisfaz. Tá sempre querendo mais. Sempre querendo sentir o ápice. Só que essa sensação dura segundos. Por isso eu pego todas e geralmente as mais fáceis. Vou ter tanto trampo por um prazer momentâneo?

— É por isso que eu ando sozinho. – sabia que ele estava se irritando e comecei a rir. - Vocês só pensam nesse prazer momentâneo que querem repetir e repetir em um eterno looping. Nojento.

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— Como se não existissem gays safados. - revirei os olhos. - Para Kevin. - ele ficou calado sabendo que eu estava certo. - É um ciclo vicioso. – dei de ombros. - E pensa... O tempo que eu gastaria atrás de uma difícil eu economizo com umas três fáceis. É mais negócio. – falei só para irrita-lo ainda mais.

— Se você não calar a boca eu vou voltar para o meu quarto. – ele parou e eu continuei andando.

— Anda Kevin. Prometo me comportar. - ele não aguentou e deu uma risada.

— Estou brincando. – falei quando ele chegou ao meu lado. – Sobre as coisas ridículas. Esse era o antigo Murilo. O novo eu é bem melhor. Desde que fiquei um pouco apaixonado por Aline e vi que mesmo assim eu não conseguia deixar Fabiana e no fim fiz as duas sofrerem, eu resolvi dar um tempo.

— O que é um pouco apaixonado?

— Ah, eu gostava dela. Mas não o suficiente então um pouco apaixonado.

— Acho que na verdade sentia admiração, via nela um desafio por ela ser diferente das outras... Mas não chegou a estar apaixonado. Quando a gente se apaixona por alguém não existe um pouco. É destruidor. Essa porra é um inferno. Você fica louco.

— Alguém aqui está bem apaixonado. Seu namorado é um sortudo.

— E se não for ele? – ele me olhou por cima.

— Aí acho que você tem um problema. – ele deu uma risada.

— Eu não namoro. – o olhei espantado.

— Você mentiu pra mim?

— Não disse a você que namorava, disse que tinha alguém. Disse que namorava só para Arthur.

— Como assim tem alguém?

— É complicado. Mas ele não é meu namorado.

— Por que disse ao Arthur que namorava?

— Porque ele sempre vai achar que te amo.

— Você ter um namorado muda isso em que?

— Tudo. Eu amaria meu namorado.

— Mas você não namora.

— O que não significa que eu te ame.

— Eu sei idiota. Estou só tentando entender.

— Mas como você está com isso? Você se sente desconfortável ao saber que sou solteiro?

— Por que me sentiria?

— Somos amigos e estamos bem próximos. Agora não posso mais te mandar desgrudar com essa desculpa.

— Estou tranquilo. Não muda nada... Você com seus caras e eu com as minhas minas.

— Você só sabe pensar nisso. É tão imbecil.

— Do nada você começa a me insultar gratuitamente.

— Gratuitamente? Você disse “minhas minas” e isso é nojento. Enquanto isso eu estou aqui preocupado com a sua reação.

— Olha Kevin, nada vai mudar entre a gente se é o que tanto te preocupa.

— Você diz isso agora, mas sei que vai se afastar. Só que não podia continuar escondendo isso de você.

— Parece que é você que está querendo que eu o afaste.

— Só não quero que diga mais tarde que não tivemos essa conversa.

— O que ter essa conversa significa? Que por ser solteiro você pode me querer?

— Não. – ele suspirou. – É esse tipo de pensamento que quero evitar.

— Tá difícil te entender. Você tem medo de gostar de mim, é isso então? – ele ficou em silêncio. – Ah, qual é Kevin. – dei uma risada. – Sei que sou estrondosamente lindo, mas você não seria estúpido a esse ponto. Todo mundo sabe que eu sou alucinado, completamente louco por... – ri mais ainda. – Eu amo as mulheres. E tudo nelas. Isso é algo inquestionável.

— Não estou questionando. Eu sei disso.

— Então pra que tanto medo? – levantei da cama. – Você vai cuidar de mim hoje? – tomei remédio e me deitei. Ele ficou me olhando. – O que foi? Você é solteiro, mas eu ainda estou gripado e preciso de cuidados. – fiz uma expressão de coitado e ele continuou sério. – Kevin. – me sentei novamente. – O que está te deixando tão tenso assim?

— Nada. Só acho melhor eu e você não ficarmos tão grudados assim.

— Ah, por que você tem o Arthur agora né? Não sirvo para mais nada.

— Você não está entendendo. Ele é meu irmão. Você é meu primo. Ser gay e estar tão próximo a você é incômodo mesmo que tudo esteja resolvido entre a gente.

— É incômodo porque não está tudo resolvido. Vou te dar algumas explicações que talvez melhore as coisas. – o puxei o fazendo se sentar ao meu lado. – Sou muito carinhoso, muito mesmo. Minha mãe diz que eu puxei meu pai e ele diz que puxei a ela, enfim... O fato é que eu não posso dar carinho para as garotas que eu fico então eu dou a minha irmã e aos meus amigos. Sou assim. Por isso deixei você me fazer dormir e tenho tanta proximidade contigo sem achar estranho. Se isso é um problema para você é só me falar e a gente nem chega muito perto um do outro. Mas não para de falar comigo, por favor.

— Por que tá agindo assim?

— Assim como?

— Sendo legal. Tentando conversar. Não dá para ser escroto e agir como a porra do machista que você é?

— Não sou machista!

— Trata mulher como objeto, então é sim.

— Tenho problemas afetivos. Não queria ser assim.

— Mas você é, machuca muitas garotas sendo desse jeito. E o seus problemas de afeto se resumem a elas, ser o amigo carinhoso tudo bem.

— Mais uma vez: por que está querendo me afastar?

— Dizer a verdade é querer te afastar?

— Você quer sim e eu ainda vou descobrir o motivo. Agora que ouvir uma verdade? – ele me olhou. – Minha cabeça está explodindo e eu to mal pra caralho. Dá pra você deitar comigo? – ele ficou me olhando. – Você é difícil demais. – eu me deitei e ele ficou sentado de costa para mim.

— Vou para o meu dormitório. – ele se virou me olhando.

— Estou cansado de te pedir para ficar.

— Não peça. Falei muita coisa hoje... Quero ficar sozinho.

— Tá bom. – dei um espirro e ele ficou me olhando.

— Arreda. – ele mandou e eu sorri me virando de barriga para cima e o observando deitar do mesmo jeito que eu estava.

— Fala dele hoje. – pedi enquanto ele começava a fazer carinho em meu cabelo. Ele suspirou antes de começar a falar. Até que enfim eu saberia sobre ele.