Alvo Potter e a Sala de Espelhos

Capítulo 22 — Belo e Gigante



C
OMO TINHAM PREVISTO, Alvo estava à beira de um colapso. Sua mente girava em torno da Sala de Espelhos, do quadribol, de Adelaide Runcorn e de Boxe, o elfo doméstico. Mal conseguiu ter concentração suficiente para a aula de Feitiços, fracassando miseravelmente na tentativa de fazer sua xícara sapatear. Os três amigos tinham contado a Chloe Bridwell toda a teoria sobre o Antaglifo.

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— Vocês estão estranhos — comentou a menina a Alvo e Wayne, depois de ouvir a história. — Será que tudo isso tem a ver com o fato de Wayne ir com aquela sonserina ao baile?

Rose cobriu a boca com a mão, perplexa.

— Quem te contou? — perguntou Wayne sem modos.

— Ninguém. — Chloe riu. — Ouvi ela falando com uma amiga, nas masmorras. Prometo não contar a ninguém.

— Bom mesmo — disse Wayne ameaçadoramente.

Chloe ignorou a reação do amigo.

— Se não se importam, preciso ir à sala comunal, parece que teremos um jogo de perguntas e respostas. Tchau!

E a menina saiu aos pulos em direção da escadaria de mármore. Rose continuou a mirar os garotos, manchas vermelhas brotando pelo seu rosto como gêiseres.

— Você também sabia, não é? — Rose pressionou Alvo.

— Hã... sabia — disse Alvo sem ressentimentos.

— E iam me falar quando? — replicou a garota.

— Na hora certa — respondeu Alvo.

Rose, com as narinas abrindo e fechando de raiva, deu as costas aos amigos e saiu pisando com força no chão, seus cabelos esvoaçando como se fossem expelir lava.

— Foi uma péssima ideia, Alvo — lamentou Wayne.

— Agora é tarde — falou Alvo com rispidez. — Precisamos fazer isso, ou iremos ser delatados.

— Se não aparecermos no campo, ela não pode nos dedurar — Wayne tentou convencer.

— E aí eu não vou conseguir treinar — disse Alvo em ultimato. Wayne ainda relutava. — Prometo que vou arranjar uma maneira de você não ir ao baile com Runcorn. De qualquer modo, podemos ficar escondidos sob a capa.

Wayne mexeu a cabeça em desconfiança.

— Tudo bem — disse por fim. — Mas é a última vez que faremos algo assim, não quero que Rose fique mal conosco.

De fato, Rose não parecia disposta a reatar com Alvo e Wayne naquela noite. Tinham marcado para fazerem o dever de Astronomia juntos, porém, quando eles se aproximaram, a garota guardou seus materiais e subiu a escada para a torrinha que dava acesso ao dormitório feminino.

Wayne recomeçara a reclamar com Alvo, que não lhe deu atenção. Havia uma boa chance de serem pegos, mesmo usando a Capa da Invisibilidade, agora que Filch ganhara um assistente e tinha Madame Nor-r-ra a seu serviço. Estava claro que, uma hora ou outra, o zelador precisaria de ajuda para vigilar o castelo, afinal, a maior parte de seu tempo era dedicado a longos cochilos escorados nas paredes.

Por um momento, Alvo achou que estava cada dia mais parecido com Tiago: abusando da sorte em prol de tirar um proveito pessoal — e envolvendo seus amigos. Sentia nojo de si, mas sabia que era tarde demais para mandar o seu plano às favas.

— Já são quase oito horas — murmurou Wayne ao pausar seu trabalho. — Melhor você ir buscar a capa e a vassoura.

Alvo centralizara novamente seus pensamentos no Salão Comunal prefulgurado pelas chamas da lareira. Ainda havia grande parte dos alunos acordados, incluindo os primeiranistas. Fred e Roxanne, sentados a um canto distante, divertiam os colegas com as Medalhas-Metamórficas de tio Rony, mudando a aparência ora para um homem de meia-idade, ora para um bebê recém-nascido de rosto amassado e avermelhado.

Rindo daquela situação, os garotos foram ao dormitório, onde Alvo apanhou a Turbo XXX e retirou do fundo do malão a Capa da Invisibilidade. Facilmente eles se aconchegaram embaixo do manto e saíram de volta para a sala comunal, roçando os tornozelos de tão próximos que estavam com medo de serem descobertos. Contudo, quando alcançaram a abertura no retrato, sabiam que eles estavam, eventualmente, ocultos. Alvo até sentiu vontade de acertar um pontapé em Tiago no momento em que o avistou, mas achou que seria uma tremenda burrice.

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— Acho que podemos ir — sussurrou Wayne depois de checar se alguém mirava o local em que eles estavam em pé.

Cuidadosamente, Wayne e Alvo passaram pelo buraco do retrato e as conversas que provinham do Salão Comunal da Grifinória sumiram, dando a deixa para que os dois amigos caminhassem pelos corredores banhados pela luz noturna que entrava listrada pelas grades das janelas. O temor de serem pegos por Filch foi se dissipando conforme Alvo e Wayne iam dobrando cada esquina, descendo cada escada, até que eles imergiram nas proximidades da estátua de Lachlan, o Desengonçado, a qual estava ocupada por mais gente além de Adelaide Runcorn e Vera Flint. Parados aos flancos das grandalhonas, Alícia e Anguis Crawford riam em uma mistura de prazer e malícia. Junto deles, a figura branca esquálida de Scorpius Malfoy parecia um fantasma. Estava com um semblante de quem fora trazido a contragosto.

Atrás dos alunos da Sonserina, havia um bruxo extremamente baixo, careca e pançudo segurando sua varinha.

— Estou dizendo, Sr. Dwerryhouse, eles virão — afirmou Runcorn, com uma caixa de madeira em mãos. Alvo estreitou os olhos: era lá onde estariam os pomos enfeitiçados.

— É bom que seja verdade, senhorita, odeio perder tempo em serviço — disse o bruxo baixinho. Suas feições eram cheias de vincos e rugas.

— Que traidora! — exclamou Alvo em fúria. — O que faremos?

— Vamos distraí-los — disse Wayne.

— Como? — replicou Alvo.

— Hum... — Wayne olhou todos os cantos do corredor. — Ali!

Ele apontava para uma armadura imóvel a alguns metros atrás deles. Os garotos andaram na ponta dos pés até ela e Wayne aplicou-lhe um chute, desmoronando toda sua estrutura com um estampido metálico e um som esganiçado que o objeto soltara.

— A-HA! — gritou Runcorn, em puro prazer. — Eles estão ali.

Como um erumpente desgovernado, Runcorn e Flint correram aos tropeços até onde a armadura desmontara; Alvo e Wayne, aproveitando a debandada, esticaram o pé e apoiaram o calcanhar no chão. Não deu outra: ambas as meninas voaram alguns centímetros a frente e caíram uma sobre a outra com uma troada. A caixa de madeira, no entanto, fora ricocheteada metros à frente. Os outros sonserinos, que vinham logo atrás, deram um guincho de horror, ao passo que Dwerryhouse tentava apaziguar a situação.

— A Profa. McGonagall me informou que havia um poltergeist no castelo, muito abusado — informou-os. — Venha, levantem-se, damas.

O homenzinho abaixou-se para ajudar Runcorn e Flint a se levantar e Alvo não hesitou em empurrar o seu traseiro com o pé, fazendo com que um novo emaranhado se formasse.

— A caixa, pegue a caixa! — murmurou Wayne ao amigo.

Para se esquivar do furacão de gritos e empurrões, Alvo e Wayne deslizaram furtivamente e apanharam a caixa de madeira enquanto os sonserinos e Dwerryhouse tentavam se erguer do chão. Antes que percebessem o sumiço do objeto, os garotos apertaram o passo e Alvo, tropeçando na barra de saia da capa, baqueou com o ombro de Malfoy. Em desespero puro, os dois amigos só foram parar de correr quando chegaram ao Saguão de Entrada guarnecido por um Filch dorminhoco.

— Que sorte. — Wayne puxava o ar gelado.

— Como ele consegue? — perguntou-se Alvo vendo que o zelador dormia em pé.

— Não sei, mas a porta está trancada — disse Wayne tocando na fechadura antiga. Puxou a varinha das vestes e ordenou: — Alohomora!

Forçaram novamente a porta, que permaneceu cerrada.

— Acho que vamos precisar dela — comentou Wayne apontando para um molho de chaves que escapava do bolso das calças de Filch.

— Vamos pegá-la. — Alvo ia avançando, mas foi interceptado pelo amigo, que por pouco não o derrubou com a Turbo XXX.

— Ficou doido? Vai acordá-lo. Eu cuido disso... — Wayne pigarreou e tirou a varinha para fora da capa. — Wingardium Leviosa!

As chaves se ergueram com um tilintar e rutilaram diante das chamas dos archotes. Wayne manipulou com muito cuidado o molho, de modo que pairasse um metro acima da cabeça deles, evitando despertar Filch.

— Perfeito — comemorou Alvo. — Ande, destranque a porta.

Wayne experimentou algumas chaves até encontrar a correta. Sua cautela e inteligência eram invejáveis, uma vez que em situações de tensão o garoto tinha a frieza de manter tudo sob controle e tornar tarefas difíceis, simples. Havia destrancado a porta, devolvido o molho no bolso de Filch com o Feitiço de Levitação e selado novamente a trinca das portas com outro feitiço quando Alvo e ele desceram os terrenos, antegozando uma noite perfeita: com os sonserinos detidos e eles com o caminho livre para treinarem no campo de quadribol.

Os garotos começaram a despir a capa.

— Acho que não precisamos mais disto — disse Alvo no instante que entraram no campo oval.

— Bom, eu vou abrir a caixa e você vai buscar, OK? — instruiu Wayne.

Alvo, ansioso, passou a perna por cima do cabo da vassoura de corrida e aguardou; Wayne, com um desnecessário suspense, ergueu a tampa do receptáculo e nem ele, nem Alvo viram para onde as bolinhas foram.

— Deve ter sido um feitiço potente — disse Alvo, admirado. — Para que direção elas foram?

— Bom... — Wayne parecia frustrado. — Na verdade, elas não foram a lugar nenhum...

Então terminou de tirar a tampa.

— São bolas de golfe comuns.

Alvo sentiu uma vontade imensa de proferir obscenidades, mas o contorno do casebre lhe conferiu uma ideia.

— Podemos pedir uma vassoura emprestada ao Hagrid — sugeriu. — Aí você atira as bolas e eu as apanho.

Wayne torceu o nariz.

— Não parece muito elegante acordar o Hagrid no meio da noite para isso — insistiu.

Fingindo que não ouvira o amigo, Alvo já estava recolhendo a capa e caminhando na direção da cabana de Hagrid. Com os gemidos de “péssima ideia”, “vamos embora” de Wayne, Alvo bateu sutilmente na porta da cabana. Ninguém respondeu e, pelas cortinas fechadas, eles já pensavam em desistir. Porém, quando os dois meninos giravam os calcanhares para subir ao castelo, a porta se abriu, envolvendo-os com um mormaço descomunal.

Hagrid, com o rosto tão rubro quanto uma salsicha, estava parado à soleira e brandia as mãos selvagemente contra os garotos como pás de moinho.

— Saiam daqui, saiam daqui! — urrou. Alvo e Wayne recuaram. — Não é boa hora para vocês estarem na minha cabana!

— H-Hagr-rid... somos nós... — balbuciou Wayne.

— Eu sei bem quem vocês são, então vão embora antes que eu chame a Profa. McGonagall!

E com uma batida de estremecer as paredes da cabana, Hagrid fechou a porta. Alvo e Wayne permaneceram hirtos, os rostos sem resquício de cor, tremendo da cabeça aos pés. Sem trocar nenhuma palavra, os dois decidiram vestir a Capa da Invisibilidade de novo e retornar para o castelo enquanto os álibis mais fantásticos substituíam-se na cabeça deles para explicar o comportamento de Hagrid. Estavam tão assustados e absortos nos pensamentos que nem sentiram a adrenalina fluir ao percorrerem os corredores de Hogwarts. Por sorte, não toparam com nenhum funcionário no meio do caminho. Não demorou muito e eles alcançaram o corredor do sétimo andar, onde finalmente puderam se desposar da capa.

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Diabinhos de pimenta — proferiu Alvo. O quadro da Mulher Gorda fez menção de rebatê-lo. — Por favor, diabinhos de pimenta.

— Que ótimos modos — elogiou a Mulher Gorda.

O retrato girou para frente e os meninos entraram no buraco, impotentes. Alvo estava cabisbaixo, pensando em todo o esforço e encrenca que tinham cometido, quase sendo apanhados fora de hora...

Ele simplesmente não conseguiu erguer os olhos até Wayne exclamar:

— Rose! Que é que está fazendo aqui tão tarde?

Rose, vestida no seu robe cor-de-rosa, estava sentada a uma poltrona com um livro tapando o rosto. Alvo apertou os olhos, mas não conseguiu distinguir palavras soltas como: Homem... Magia... Tempo.

Rose abaixou o livro.

— Digam vocês — replicou. — Acharam mesmo que eu engoliria aquela história do Wayne ir com Runcorn para o baile? Tss, conta outra. Afinal, por que o Alvo está com a vassoura nova nos ombros?

Alvo e Wayne trocaram um olhar surpreso e, em seguida, riram. Ter Rose de volta era a única coisa capaz de colocar um sorriso no rosto dos garotos. Os meninos se revezaram para relatar tudo o que viram, enquanto Rose mirava algum ponto no chão, balançando a cabeça em algumas sentenças.

— Parece — disse Rose no final da história — que Hagrid está guardando algo muito importante, então. Ele nunca teria agido assim em circunstâncias comuns. Eu aposto que tem um dedo de Copperfield nisso daí. Lembram daquele papo dele sobre serviços especiais?

— É — concordou Alvo. — Muito estranho.

— Só há uma maneira de descobrir — disse Wayne. — Perguntando a ele.

Rose riu em escárnio.

Hagrid, o que você e o Sr. Copperfield andam aprontando de tão importante que não pode contar para nós? — Rose fez voz de falsete para imitar Wayne. — Sinceramente, não me parece nada gentil.

Wayne girou os olhos.

— Então o que você sugere? — perguntou Wayne em um tom baixo e furioso. — Que sigamos Hagrid e entremos em sua cabana à força?

Rose, insensível à crítica do menino, encontrou os olhos de Alvo, ambos com as sobrancelhas erguidas.

— Até que não é má ideia... — comentou Alvo enquanto balançava a cabeça. — Poderíamos usar a capa para seguir Hagrid e descobrir o que ele está fazendo.

Tanto Wayne quanto Rose decidiram não questionar o plano do amigo. Uma parte deles sentia repugnância em invadir a privacidade de Hagrid, a outra queria saber mais, alocar uma peça importante do interminável quebra-cabeças que envolvia o Antaglifo, Scarlet, Hotwan e os treze tesouros.

As primeiras tiras laranjas mal tinham listrado o céu e Alvo, Wayne e Rose já estavam em pé, não para discutir alguma coisa sobre o plano de seguir Hagrid, mas para ajudar Alvo a se preparar para o teste que aconteceria logo mais — precisamente às dez horas, como dizia o aviso pregado no mural do Salão Comunal da Grifinória.

— E não se esqueça, Alvo... — Rose recitava uma dezena de regras de Quadribol através dos séculos. Alvo não decorara nem um terço delas.

— Puxe o cabo da vassoura deles! — brincou Wayne.

— Não, definitivamente é contra o regulamento — contrariou Rose, tornando a escarafunchar o livro.

Wayne fez uma careta e empurrou uma tigela de ovos a Alvo.

— Coma alguma coisa.

Embora o cheiro da comida fosse divino, não apeteceu a Alvo. O garoto sentia uma pontada fria abaixo do ventre mais acentuada quando Tiago se aproximou dele e anunciou:

— O time inteiro estará lá para acompanhar os testes, querem ver como reagimos com cada um dos concorrentes. Boa sorte, maninho.

Pela risada de Tiago, Alvo sabia que ele havia dito tudo aquilo para assustá-lo. E funcionou. Ele começou a imaginar as possibilidades de algo dar errado e chegou à conclusão de que as chances eram altíssimas, afinal, era o mais novo dentre os concorrentes. Contudo, ele era um Potter, como Sean Glascott fizera questão de frisar no Expresso de Hogwarts, nada poderia dar errado.

Somente para agradar aos amigos, Alvo empurrou umas torradas para dentro e tornou a subir para a Torre da Grifinória, acompanhado de frases de incentivo dos outros colegas. Destrancou novamente sua Turbo XXX e atravessou os terrenos com pressa até ser interceptado por duas figuras na entrada do campo: Fred e Roxanne.

— Fazendo guarda de novo — explicou Roxanne.

— Glascott não quer nenhum indesejado por essas bandas — disse Fred. — Como se já não bastasse a presença de Miguel Hammer.

Roxanne ergueu uma prancheta na altura dos olhos. Fred a seguiu.

— Vocês sabem que eu estou na lista dos concorrentes. — As entranhas de Alvo já estavam se roendo.

Os dois pararam de contemplar a prancheta.

— Sim, sabemos, mas isto aqui não é uma lista. — Fred mostrou a Alvo um pergaminho em branco.

— Então por que não me deixam entrar logo?

— Porque parecemos muito mais importantes com essa prancheta — Fred abaixou o tom de voz. — O Prof. Longbottom vai quitar duas semanas de detenção para a gente. Se mostrarmos que estamos levando a sério, podemos pechinchar mais alguns dias. Bom, não custa nada tentar.

— Então, Potter, você pode passar — Roxanne alteou a voz e, em seguida, piscou para o primo. — Boa sorte, Al.

Alvo, com um pouco de medo do que aconteceria dali para frente, avançou na passagem do campo e encontrou Sean Glascott; um sorriso se abriu quando ele avistou mais um candidato.

— Alvo! — Sean abriu os braços como se esperasse um abraço afetuoso. — Que bom que veio. Venha, junte-se aos outros.

Pela primeira vez, Alvo notou a presença dos outros alunos. Tanto Miguel Hammer quanto Ralph Butland eram maiores, mais fortes e, da maneira que alongavam vigorosamente os braços, mais preparados que ele. Ambos olharam para Alvo como se fosse algo nojento que encontraram na tampa do vaso sanitário. Nas arquibancadas, como Tiago dissera, os outros jogadores do time observavam os concorrentes com um olhar neutro, cochichando em alguns momentos — o que piorou ainda mais o estado do menino.

— Ótimo, rapazes, agora que estão todos aqui, podemos começar. Voando pelo campo! — Sean bateu palmas de incentivos.

Os três candidatos subiram em suas vassouras e, após o silvo de Sean, içaram voo. Era a estreia de Alvo com seu novo modelo e, na sua primeira arrancada, ficou evidente que a Turbo XXX era superior às vassouras de Miguel Hammer e Ralph Butland; enquanto ele conseguia sobrevoar o estádio como um raio, os outros competidores pareciam estar apostando corrida com as borboletas.

— Muito bem, muito bem. — Sean também estava no ar, montado em sua Comet 290. Ele tirou um saco de bolas de golfe comuns do bolso. — Hora de testar o reflexo: atirarei uma dessas bolinhas aqui e gritarei o nome de um de vocês. É só apanhar a bola antes que ela toque o chão, OK? Um... dois... três... Butland!

Butland, que estava distraído com uma mancha nas suas vestes, saiu desembestado atrás da bola de golfe, Alvo e Miguel acompanhando-o com os olhos. Ele não iria conseguir, pensou Alvo, perdera a oportunidade de treinar na noite passada e agora...

— Potter! — gritou Sean.

Alvo, olhando para os lados, conseguiu localizar o trajeto que a bola fazia: com uma estugada, o garoto se debruçou sobre o cabo da vassoura para ganhar velocidade e contornou as balizas, onde capturou a bolinha em um tempo que nem ele mesmo esperava. Atônito, ele lançou um olhar para os outros jogadores, que acenavam positivamente a cabeça.

— Pura sorte — Miguel Hammmer comentou a Alvo, sem olhar diretamente para ele. — Vamos ver até onde ela durará.

Alvo, em um misto de medo e audácia, sorriu ironicamente a Miguel.

— Veremos.

E, para encanto de Glascott e infelicidade de Hammer e Butland, Alvo não perdeu nenhuma bola, fosse por sorte ou pela velocidade da Turbo XXX. Cerca de meia-hora mais tarde, estava claro que Alvo era a única escolha possível, não porque ele era realmente talentoso, mas porque assim que os outros jogadores se reuniram para um teste com cada um dos candidatos, um balaço errante partiu os dentes de Hammer, enquanto a Cleansweep de Butland se acidentara. Quando o teste acabou, ambos estavam vermelhos de fúria a ponto de azarar Alvo ali mesmo.

— Vocês voaram muito... muito bem, devo admitir. — Sean mirou Butland e Hammer com um certo medo. — O resultado sairá hoje à noite, pregarei no quadro da sala comunal. Parabéns a todos e até mais tarde!

O único a se retirar, no entanto, fora Alvo, que teve um último vislumbre de Hammer e Butland indo em direção de Sean, que recuara acintosamente. Antes que pudesse ouvir os gritos que viriam, o menino correu de volta ao castelo com um sorriso estampado no rosto. Rose e Wayne o aguardavam no Salão Comunal.

— E então? — perguntou Rose ao ver o semblante felicíssimo do primo. — Voou bem?

Alvo sacudiu os ombros.

— O resultado sai hoje à noite.

— Ótimo. — Rose despistou o assunto. — Estivemos planejando como descobrir o que Hagrid está fazendo. Não é tão difícil, podemos utilizar a sua capa e observar Hagrid da Torre de Astronomia.

Alvo pensou em rebater a estratégia que a prima bolara, porém, ficou calado. Parecia um plano simples e sem furos, como deveria ser. Na hora do almoço, os três amigos desceram ao Salão Principal e surrupiaram alguns pães de forma e uma garrafa de suco de abóbora da mesa do almoço antes de voltarem a subir a escadaria em direção da torre mais alta do castelo.

— Acho melhor vestirmos a capa aqui — disse Rose quando os três chegaram no sopé da escada espiral.

Os garotos concordaram e Alvo tirou do interior de suas vestes a capa da invisibilidade que seu pai lhe presenteara no Natal. Coube perfeitamente nos três, uma vez que eram baixos o suficiente para a capa ultrapassar-lhes os tornozelos. Então, agarrados às abas do manto e ao embrulho de pães e sucos, Alvo, Rose e Wayne subiram os lances de degraus da escada até chegarem na porta que dava acesso à torre. Mal haviam tocado o anel de ferro quando ouviram o som de passos e vozes do outro lado. As três crianças, paralisadas de terror, colaram o ouvido na porta.

— ... então você está insinuando que eu sabotei a memória do menino Malcom? — Era a voz do Prof. Godunov. — Pois pensei que fosse o senhor que estava cuidando da sanidade do rapaz, Copperfield!

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Alvo arregalou os olhos, Rose fez sinal para que ele continuasse quieto.

— E de fato estou, Godunov. — A voz de Copperfield transmitia impaciência. — É por isso que estou apontando você como suspeito. As profecias que anda proferindo... de onde obtém tanta informação?

— Dos astros, logicamente — respondeu o Prof. Godunov prontamente.

— Se nem um centauro consegue interpretar os movimentos dos planetas com tanta precisão, Godunov, me admira que um mero bruxo como o senhor esteja tão convicto. — Desta vez, Copperfield mostrava desprezo. Houve uma pausa. — O objeto que está em mãos, Godunov, o que é?

Eles ouviram o Prof. Godunov recuar.

— Isto é um objeto que você jamais terá a capacidade de possuir!

— Meu caro, se você entendesse a importância disso que você possui... francamente...

— Eu já disse que não. — O Prof. Godunov parecia determinado e irredutível. — Se me dá licença, preciso ir.

Agora, quem recuou foram as crianças, que ficaram imóveis contra a parede. A porta se escancarou e o Prof. Godunov saiu arrastando suas vestes brancas, batendo o seu cajado degraus abaixo. Copperfield não tardou em segui-lo, o rosto revelando um esgotamento que os meninos não tinham notado antes.

— Preciso beber... — murmurou o inominável antes de sumir de vista.

Arfando, as crianças entraram na Torre imediatamente. Rose saiu de baixo da capa, sacou a sua varinha e apontou-a para a porta.

Colloportus! — Houve um estalo na fechadura e a garota tornou a guardar a varinha no decote das vestes. Ela se virou para Alvo e Wayne, confusa. — O cajado...

Os dois garotos se livraram a Capa da Invisibilidade.

— Você acha? — Wayne parecia ler a mente da amiga.

— É provável — respondeu Rose. Ela caminhou adiante das ameias da Torre. — Mas eu não acredito que seja... bem... não é possível que o Professor Godunov tenha enfeitiçado Malfoy.

— Claro que é. — Wayne já havia desfeito o embrulho de comida e arrancado um pedaço de pão com os dentes. — Você mesmo disse que ele poderia ser suspeito de tramar a catástrofe do Dia das Bruxas.

— Eu sei — falou Rose com firmeza. — Só que depois nós fomos conferir a fonte, não é? O próprio Professor Firenze afirmou que poderia acontecer algo ruim. E ele é um centauro.

— Mesmo assim — replicou Wayne. — Como o próprio Copperfield disse, o Godunov foi muito preciso.

Alvo estava escorado nas ameias, ouvindo atentamente a discussão dos amigos enquanto observava a longínqua cabana de Hagrid com as cortinas abaixadas. Alguma hora ele tinha de sair, não era possível que Hagrid ficasse preso para sempre lá. O que ele estava escondendo? Uma criatura? Alguma arma para Copperfield?

Ainda mais distante, na Floresta Proibida, Alvo notou que as árvores se mexiam de uma maneira esquisita, como se um leve tremor perturbasse os galhos nus. O céu naquele dia estava claro, embora o sol ardesse timidamente nos jardins de Hogwarts. Assim que o assunto sobre o Prof. Godunov foi encerrado, os três amigos desfrutaram dos pães e do suco, um pouco arrependidos por não terem furtado um pouco mais de comida quando o dia começou a cair. Estavam entediados de ficarem mirando o mesmo ponto durante horas quando a porta da cabana se abriu e a figura grande e maciça de Hagrid apareceu acompanhada de Noel.

— Olhem! — exclamou Alvo, encarapitando-se no parapeito. — Hagrid!

Rose e Wayne, que antes estavam com as pálpebras baixas, arregalaram os olhos e se juntaram a Alvo. Hagrid estava munido de seu arco e o estojo de flechas quando fechou rapidamente a porta de sua cabana e saiu em direção da floresta com Noel.

— Temos que ir! — disse Alvo, correndo para apanhar a capa.

Novamente os três estavam ocultos sob o manto. Eles destrancaram a porta da Torre e desceram o mais veloz que puderam, considerando as circunstâncias. Além de terem de se mover juntos, havia uma quantidade de alunos mais velhos impedindo o caminho para o Saguão de Entrada, atirando de um lado a outro o diário de uma garota. O plano quase foi por água abaixo quando o diário acertou a lateral do rosto de Wayne — o mais alto dos amigos –, arrancando um urro de terror dos outros meninos, que saíram correndo para todas as direções enquanto gritavam que o diário estava amaldiçoado.

Se não fosse o tempo que Alvo, Rose e Wayne levaram para esperarem o caminho ficar desimpedido de alunos, teriam alcançado a Floresta Proibida mais cedo. Assim que penetraram a escuridão, os garotos se encolheram diante do vento invernal que passava uivando por entre os galhos das árvores, os olhos procurando algum resquício de Hagrid.

Conforme a trilha foi se adensando, mais a penumbra esverdeada tornou-se em breu, apenas as teias de aranha cintilando entre os troncos. Tinham finalmente alcançado um trecho particularmente sinistro no centro da floresta, onde as árvores formavam uma espécie de cúpula sombria rodeada de ramos e espinheiros.

Os garotos pararam para contemplar.

— Bom... — Alvo olhou para Rose e Wayne, suando frio. — Devemos continuar?

A respiração de Wayne estava rasa e ofegante. Rose hesitou antes de falar:

— Só mais um pouco. — E puxou a varinha com a mão trêmula. — Prontos?

Como Rose, Alvo e Wayne também sacaram a varinha sob uma sensação de falsa segurança por estarem embaixo da Capa da Invisibilidade. Eles seguiram em frente, abrindo um caminho por silvados emaranhados até ouvirem latidos de estremecer as árvores.

— Para trás, Noel! — As crianças ficaram satisfeitas em escutar a voz de Hagrid. — Cachorro mal! Primeiro o Belo e agora...

Curiosos com o que descobririam a seguir, os garotos murmuraram: “Lumus!”, e a ponta de suas varinhas se acendeu. A voz de Hagrid estava ficando cada vez mais nítida, os latidos de Noel ainda mais ensurdecedores, faltava pouco para conhecer o plano de Copperfield. Havia uma fresta entre duas faias, na quais eles apreciaram a cena com a boca aberta: Noel corria para todos os lados, atarantado, enquanto Hagrid tentava apaziguar uma figura que Alvo achou engraçada. Era grande, muito grande, as costas curvas, uma cabeça feia de pedregulho, vestindo um paletó do tamanho de uma tenda.

— Pelas barbas de Merlim... — Rose guinchou. — Aquilo... aquilo é um gigante.

Alvo e Wayne se espremeram no espaço entre as duas faias para poderem contemplar a criatura. O que Copperfield queria com um gigante?, Alvo pensou em perguntar, contudo um estalo às costas deles fez com que os garotos saltassem para a frente. Fosse quem fosse, eles não saberiam dizer, pois logo em seguida Alvo, Rose e Wayne deslizaram no monte de terra e rolaram ladeira abaixo à clareira que Hagrid estava. Além de ficarem cobertos de arranhões e pequenos cortes ocasionados pelos espinheiros, a capa havia escorregado do corpo deles.

— HAGGER! — urrava o gigante. — PERIGO, HAGGER!

A mão do gigante, grande como uma barraca, se lançou na direção dos meninos, que foram apanhados e erguidos até a altura do seu rosto. Alvo encarou os olhos dele por um instante; eram castanho-esverdeados e opacos, não transmitiam terror, como o garoto esperava. Rose gritava desesperadamente e o gigante aproximou o seu nariz curto e disforme, farejando as crianças. Alvo, Rose e Wayne estavam praticamente esmagados na palma da mão do gigante, as costas coladas umas às outras. Noel continuou latindo.

— Hagrid, somos nós! — Wayne berrou. — Por favor, nos ajude!

— Gropinho! — chamou Hagrid. — Desce!

Por sorte, o gigante entendia e algaraviava em inglês. Lentamente ele abaixou o braço e afrouxou o aperto nos garotos, embora as suas varinhas continuassem presas contra os próprios peitos, a ponta luminosa contra os seus queixos. Eles estavam agora nivelados ao rosto de Hagrid.

— Alvo? — Hagrid coçou os olhos. — Rose? Wayne? O que estão fazendo aqui?

Alvo hesitou.

— Queríamos falar com você... — Alvo tentou se livrar da mão do gigante, mas era tão sólida que era impossível se mover.

— Grope! — berrou Hagrid. — Solte!

Os dedos grandes e compactos se abriram e tanto Alvo como Wayne e Rose caíram aos pés de Hagrid. O amigo ajudou-os a ficar em pé.

— Pombas, vocês andaram me seguindo de novo? — Hagrid estapeou as vestes deles. — O que eu disse sobre não se meterem em confusão?

Uma lágrima de dor e vergonha brilhou nos olhos de Alvo. Nenhum deles respondeu.

— Bem... — disse Hagrid brandamente. — Aproveitando a ocasião... quero que vocês conheçam meio novo auxiliar e meio-irmão: Grope.

Grope, Alvo disse a si memo. Que nome engraçado para um gigante. O menino apontou a varinha para o rosto de Grope: lembrava uma pedra acinzentada e sem forma flutuando no ar.

Estes — Hagrid indicou as crianças — são Wayne, Rose e Alvo, Grope! Mais três amigos, hein?

A cabeça descomunal de Grope se abaixou até onde os três amigos estavam.

— Alvo, Hagger? — grunhiu o gigante. — Dumbdoor?

— Ah! Não, não! — Hagrid puxou Alvo pelos ombros. — Este é Alvo Potter! Potter, se lembra? É filho dele...

Grope fez que sim com a cabeça e tornou a descer a mão na direção das crianças, mas, em vez de agarrá-las, seu dedo esticou e tocou os cabelos ruivos de Rose. A garota se encolheu e recuou.

— Não tenha medo, não tenha medo — disse Hagrid a Rose. Não parecia a coisa mais óbvia a se dizer quando se estava cara a cara com uma criatura selvagem. Ele tornou a berrar ao gigante. — Ela é filha de Hermi, Grope!

A menção da palavra “Hermi” fez Grope se sentir um pouco alvoroçado.

— Hermi? — A boca enviesada formou o que Alvo supôs que fosse um sorriso. — Hermi, Hagger?

— Isso, isso! — Hagrid também sorriu ao gigante. — Então... você entendeu as instruções, eh?

Grope balançou a cabeça exageradamente.

— Bom menino! — Hagrid puxou de dentro do seu casaco um pedaço generoso de carne de arminho. Grope escancarou a sua boca, revelando dentes amarelos do tamanho de tijolos. Hagrid, então, atirou a carne na sua boca, deixando o gigante com um olhar satisfeito.

Grope, contentíssimo com o “petisco” e com os novos amigos, começou a jubilar; Noel tornou a latir.

— Bem, por hoje é tudo — disse Hagrid. Ele se virou para Alvo, Rose e Wayne. — Quanto a vocês... ah... tem uma coisa que eu quero mostrar na minha cabana, está bem?

Os três anuíram.

— Hagrid — disse Alvo, desconfiado –, você não está bravo conosco?

— Não — respondeu Hagrid. — Talvez eu tenha sido um pouco... rude e tudo mais... eu não queria que vocês se metessem em alguma encrenca com a Professora McGonagall.

— Nós pedimos desculpas, Hagrid. — Rose estava ruborizada sob o véu escuro da floresta. — Mas nós precisamos saber algumas coisas, é importante.

— De todo o jeito, é melhor que vocês saibam as coisas por mim do que por qualquer outro de menos confiança — disse Hagrid. Ele oscilou por um instante. — A propósito, como foi que vocês me seguiram?

— A capa da... — Mas as palavras morreram na boca de Alvo. Onde é que estava a capa? O espanto de encontrar Grope foi tão grande que ele nem lembrou que a Capa da Invisibilidade escorregara deles durante a queda.

Hagrid não precisou que ele terminasse a frase.

— Vá buscar então. — Hagrid parou e avaliou as feições do menino. — Não vai me dizer que você perdeu ela, vai?

Alvo estava esbaforido, sem encontrar nenhuma palavra para expressar o seu pânico. Ele, Rose e Wayne caminharam até o trecho de espinheiros, as varinhas iluminando os seus pés à procura da capa. Com uma coragem que nem ele mesmo esperava, Alvo meteu a mão no meio dos espinhos, a exasperação aumentando ainda mais à medida que seus dedos tocavam dolorosamente a ponta de um espinho, sem sinal do manto leve e sedoso.

— Achei! — Wayne exclamou, erguendo a capa no ar. Estava espantosamente intacto.

— Puxa vida! — Rose guinchou aterrorizada. — Foi pura sorte termos achado antes de alguma criatura.

— Melhor vocês se cobrirem logo — disse Hagrid.

Alvo, desconfiado de que a capa teria perdido o efeito durante a queda, atirou o manto sobre Rose e Wayne, que sumiram de vista logo em seguida. Sorrindo de alívio, o garoto se meteu junto dos amigos enquanto Hagrid aprumava o arco no seu ombro e indicava o caminho entre as árvores. Noel tomou a dianteira.

— Hagrid — esganiçou-se Rose –, quando você disse “meio-irmão” para se referir a Grope, não quis dizer de verdade, imagino...

— Ah, não, ele é mesmo o meu meio-irmão — confirmou Hagrid. — Minha mãe, Fridwulfa, o teve quando fugiu para as montanhas com outros gigantes.

— Nossa, e como você o trouxe para Hogwarts sem que ninguém o visse? — perguntou Rose.

— Uma longa história... — Hagrid bufou. — Olímpia, uma... ah... amiga minha e eu fomos tentar negociar com os gigantes na época em que Vold... ele estava tentando chegar no poder de novo. E então eu encontrei Grope, o meu meio-irmão, um tanto nanico para a espécie dele, sofria abusos dos seus colegas gigantes.

— Ah, claro! — exclamou Wayne. — Muito nanico.

— É, bem, ele só tem uns cinco metros — disse Hagrid. — De todo o jeito, foi muito difícil mantê-lo escondido na floresta, eu até pedi para seus pais cuidarem dele durante um tempo.

— E eles realmente cuidaram? — indagou Alvo.

— Não foi preciso — falou Hagrid por cima do ombro. — Depois que a gentalha do Ministério da Magia se foi, o Professor Dumbledore levou Grope à uma caverna em Hogsmeade, onde morava até pouco tempo.

— Significa... — Alvo hesitou. — Hagrid, você vai deixá-lo viver na floresta? Aqui, em Hogwarts?

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— Exatamente. — Hagrid sorriu. — A Professora McGonagall sugeriu que Filch e eu ganhássemos auxiliares. Pobre Filch, aquela guitarra velha não trabalha direito há anos e contrataram Zelotes para ajudar ele. Vocês não o viram por aí, viram?

Alvo e Wayne se entreolharam e riram baixo, agradecidos por Hagrid não poder vê-los.

— Vimos — respondeu Wayne. — E ainda não me decidi quem me assustou mais: ele ou Grope.

Hagrid e as crianças riram.

Por algum tempo, ninguém disse mais nada. A mente de Alvo vagou até Grope. Ele conhecia, de certa forma, os gigantes. Eram criaturas pouco amistosas com os bruxos, ainda mais que estes foram responsáveis pela morte de centenas deles. Na verdade, eram pouco amigáveis com qualquer um, inclusive com os de sua tribo. Alvo pensou quanto tempo Grope suportaria resolver os problemas verbalmente até esmurrar algum estudante ou habitante da floresta.

Não demorou muito e Hagrid, Alvo, Rose, Wayne e Noel chegaram na trilha que desembocava nos jardins de Hogwarts. Os pedaços do céu que entravam pelos galhos das árvores estavam tintos de roxo, o que significava que os alunos aos poucos iriam tomar rumo ao castelo para jantarem ou rumariam diretamente para suas salas comunais jogar uma partida de xadrez de bruxo. De todo o modo, foi um alívio para Alvo quando eles saíram do abrigo das árvores e foram direto à entrada da cabana de Hagrid, que parou com a mão na maçaneta.

— Bem, antes que vocês... que vocês entrem para ver o que eu quero mostrar, quero que saibam uma coisa — disse com a voz rouca, fosse pelo frio ou por ter gritado tanto com Grope. Alvo apostava na segunda. — Tudo que direi a vocês é informação sigilosa, não quero que contem a ninguém, ouviram? Ótimo... entrem rápido...

Hagrid girou a maçaneta e meio empurrou, meio conduziu as crianças para dentro da cabana. À princípio, tudo parecia dentro dos padrões: os livros estavam bem organizados nas prateleiras, a chaleira se encontrava sobre a mesa acompanhada de uma xícara do tamanho de um balde e, deitado aos pés da cama, uma criatura bizarra chamou a atenção de Alvo. Tinha o corpo bastante peludo e heterogêneo, as orelhas grandes e arredondada partindo das laterais do rosto felino, as patas curtas e cascudas e um rabo longo, escamoso e nacarado.

— O que é isto, Hagrid? — perguntou Alvo, hesitante. Na verdade, ele queria dizer “que é isto”, mas achou que magoaria o amigo.

Francamente! — Rose exclamou, o rosto lívido. — Hagrid... isto... isto é uma...

— Sim, Rose — disse Hagrid. — É uma quimera.

Wayne e Rose se olharam energicamente.

— Não é possível — disse Rose com a voz vacilante. — Hagrid, os ovos de quimera são Artigos Não Comerciáveis Classe A!

— Eu sei, eu sei. — Hagrid começou a mexer na barba, nervoso. — Sabem aquele dia que encontraram Carver pelos terrenos de Hogwarts? — Eles assentiram. — Bem, e vocês se lembram que a Professora McGonagall me encarregou de cuidar de um ovo? — Novamente eles confirmaram. — Então... era um ovo de quimera...

— De todo o jeito — disse Rose sem desgrudar os olhos do filhote de quimera –, a Professora Minerva sabe de tudo, não sabe?

— Ah. — Hagrid tornou a mexer na barba. — É... ah... Entenda, Rose, eu não poderia abandoná-lo. Quando eu peguei o ovo, ele estava em condições terríveis, imaginei que o filhote não sobreviveria por muito tempo, então eu andei lendo um pouco sobre essas criaturas, até pedi ajuda ao Professor Scamander, mas ele desconfiou de tudo e eu proibi qualquer um de entrar na minha casa.

— Nós percebemos pela maneira que você nos tratou ontem — disse Wayne com um pouco de rancor.

— Vocês não deveriam estar fora do castelo àquela hora — replicou Hagrid. — Afinal, o que vocês queriam?

— Uma vassoura emprestada para treinarmos no campo — respondeu Wayne.

— Puxa vida, Alvo! — Hagrid exclamou brandindo o punho. — Como foram os testes?

— Foram...

— Hagrid — chamou Rose, impaciente. — A situação é mais crítica do que aparenta. E quando ele crescer?

— Eu estou cuidando dele para o Sr. Copperfield — disse enfaticamente Hagrid.

— Copperfield?! — os três exclamaram.

— Bem, ele perguntou se eu já tinha descoberto alguma coisa sobre o ovo... — Hagrid titubeou. — E eu respondi que sim... então ele me falou alguma coisa sobre cuidar da quimera até que ela estivesse saudável para realizar algum serviço especial.

Alvo arqueou as sobrancelhas. Ele tinha a resposta de tudo isso na ponta da língua: a Sala de Espelhos. Preferiu não compartilhar a euforia com os amigos.

— E você queria nos mostrar a quimera para que ficássemos assustados? — indagou Wayne ironicamente.

— Eu os trouxe porque não queria que vocês ficassem xeretando atrás de mim de novo — respondeu Hagrid impacientemente. — É melhor que saibam logo antes que cometam alguma besteira... Acho que vou acordar ele, para que conheça vocês desde novo.

— Quê! — Rose recuou um passo. — Hagrid, é melhor nós voltarmos logo para o Salão Comunal...

Hagrid e os amigos, tampouco, deram atenção à menina. Ele se aproximou do filhote de quimera adormecido e o segurou no colo como se fosse um bebê. A quimera se remexeu e soltou um pouco de fumaça rala pelas narinas de leão.

— Decidi batizá-lo de Belo — disse Hagrid enlevado. — Belo! Belo! Vejam, ele já me reconhece.

Rose meneou a cabeça.

— Dê mais dois meses e não sobrará um tijolo do castelo — Rose sussurrou aos amigos.

— Calma — pediu Alvo. — Vai dar tudo certo.

Calma! — exclamou Rose, febril. — Era só o que faltava uma quimera em Hogwar...

Contudo, o que eles viram em seguida fez com o que seus queixos caíssem. Assim que Belo se virou para eles, revelou um belíssimo par de olhos iridescentes e sem pupilas, o que fez com que Rose mudasse o seu discurso instantaneamente.

— Por Dumbledore! — admirou-se. — Belo! Onde está a titia?

— Aposto que quando ele começar a cuspir fogo ela vai voltar ao normal — cochichou Wayne na orelha de Alvo.

— Hagrid — disse Alvo –, como você vai escondê-lo sem que ninguém suspeite?

— Ora, não vai ser difícil — falou Hagrid enquanto acariciava a barriga de Belo. — Basta caçar alguns ratos, comprar alguns gnus e uma boa dose de conhaque para que tudo dê certo. É, é, isto é o suficiente para deixar ele mansinho.

A noite não demorou a cair. Hagrid e as crianças passaram o resto do entardecer discutindo quanto tempo demoraria para Belo atingir um aspecto mortífero e passar a aterrorizá-los. Hagrid negou peremptoriamente que isto aconteceria, mas, mesmo a Rose embevecida sabia que chegaria uma hora que se tornaria impossível esconder uma quimera adulta. De toda forma, Alvo pediu para que eles não estragassem a alegria de Hagrid, afinal, ele era a única pessoa que acreditava que qualquer criatura — gargantuana ou não — poderia ser amorável, e não adiantaria debater.

Depois de uma última rodada do chá, os três se despediram de Hagrid e se desmaterializaram sob a Capa da Invisibilidade, caminhando em direção da sala comunal, ora topando com o fantasma de Madame Nor-r-ra, ora com Dwerryhouse — que andava apertando o seu traseiro.

— Aqui me parece seguro — disse Alvo quando eles chegaram no corredor do sétimo andar. Eles arrancaram a capa e andaram até o quadro da Mulher Gorda. — Diabinhos de pimenta.

— Ah, mas é claro! — Ela piscou para Alvo e girou para a frente.

Uma onda feérica de alunos os acolhera e uma pá de mãos puxaram Alvo para dentro do salão apinhado de gente. Sean Glascott veio correndo ao seu encontro com um sorriso radiante no rosto.

— Parabéns, Potter! — Ele empurrou um cálice de suco a Alvo, Rose e Wayne. Sean começou a falar em voz alta. — Pessoal, um brinde ao novo apanhador da Grifinória!

E ergueu o seu cálice, gesto que foi copiado pela maioria dos alunos; outra parte olhava Alvo com um olhar rancoroso — inclusive Daniel Dencourt. Houve um eco uníssono e os colegas voltaram a conversar euforicamente enquanto Alvo recebia os cumprimentos dos jogadores do time. Tiago veio por último.

— Sabe de uma coisa? Eu não estaria tão feliz no seu lugar.

Alvo amarrou a cara.

— Você está com inveja — disse com um quê de tristeza.

— Eu? — Tiago gargalhou. — Nunca! É que, sabe, os testrálios costumam voar pelo campo durante as partidas. É por isso que os apanhadores sempre terminam as partidas com um dente a menos. Talvez, se der azar, terminará sem as pernas.

Alvo esbugalhou os olhos, fomentando ainda mais o prazer de Tiago em ver o irmão amedrontado.

— Boa noite. — Tiago ergueu seu cálice e saiu na direção oposta.

Alvo, arquejando, se virou para os amigos.

— Ele não está falando sério, não é?

Mas, quando ele olhou para trás, encontrou Wayne e Rose entretidos com as performances de Fred e Roxanne com as Medalhas-Metamórficas de tio Rony. Por um instante, Alvo teve a impressão de que ele poderia ir ao baile e participar da equipe de quadribol.