A OFERENDA - Season 2

Capítulo 09.


Tivemos muito receio em confiar em Scott, afinal, a história que nos contou pareceu um pouco absurda para os padrões que encontramos nos outros experimentos. E14: Caverna; E18: Ilha; E21: Vale; E26: Hospital? Que sentido isso faz? Se for verdade, é de longe o pior e mais assustador dos Experimentos, ainda mais pelo modo como as coisas aconteciam por lá, segundo Scott.

No E26 não existia uma força maior que eliminava ou matava as pessoas – ele começou a explicar. – Nós éramos os próprios autores de cada uma das mortes. O ambiente praticamente pedia isso, era difícil ver alguém e não sentir vontade de acabar com ele, era como se sua vida dependesse daquilo. Além de tudo, estávamos tão assustados e com tanta vontade de sair daquele lugar que as coisas praticamente aconteciam e só conseguíamos assimilar depois.

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Por que você fala “nós” – questionei. Estávamos escorados na parede do corredor onde encontramos Scott. Digo, eu e ele estávamos. Winter preferiu se manter em pé, nitidamente desconfortável com aquele situação. Inteligente também, é claro! Caso precisasse, já estava preparada para dar nos pés. Ou atacar.

É difícil, Carter... No primeiro dia... Ou primeiros, encontrei uma garota quando estava descendo uma das escadas do hospital. Na realidade, está mais para um esbarrão. Cornélia, seu nome. Diferente do esperado, resolvemos permanecer juntos e proteger um ao outro e, desde então, Cornélia sempre esteve comigo.

E onde está ela agora? – Winter pergunta em tom de ironia.

Morta – ele responde enquanto abaixa a cabeça. Vejo a dor em sua expressão facial; realmente acredito que ele gostava dela.

Como aconteceu? – pergunto, mas logo penso que posso estar sendo invasivo demais. – Se quiser comentar, é claro.

Não sei ao certo quantos dias permanecemos dentro daquele lugar, mas havia um bom tempo em que não encontrávamos ninguém. Procurávamos a saída até a exaustão, em salas, corredores, sempre descendo – ele para de falar e sacode a cabeça, rindo de si próprio. – Optei por executarmos uma ação que gerou a morte de Cor. Resolvi que era melhor nos separarmos, teríamos menos tempo para verificar todo o corredor e não seria difícil de nos comunicarmos, já que não havia ninguém próximo. Depois de certo tempo, chamei por Cor e ela não respondeu. A princípio pensei que estava em alguma sala e não conseguiu me escutar, porém, com o passar do tempo comecei a me preocupar e resolvi fazer toda a rota que ela estava fazendo.

“Escutei passos fortes no corredor, mais exatamente do meu lado, mas, como tudo era muito escuro, não consegui prever aquilo. Repentinamente uma das luzes se acendeu e consegui ver dois rapazes descendo às escadas, gravei muito bem a fisionomia dos dois. Aproveitei a luz e entrei na sala mais próxima e me deparei com o corpo de Cornélia, estirado no chão”.

Foram eles? – Winter troca de posição, demonstrando-se cansada.

Eu me vinguei, sabe? Logo depois corri atrás dos dois rapazes, descendo as escadas também. Permaneci o maior tempo possível em silêncio, sem emitir som que pudesse me denunciar. Demorou um pouco, mas consegui ver quando os dois estavam descendo outra escada. O mais forte deles, que possuía cabelo um pouco mais comprido, estava na frente. Eles estavam de mãos dadas, provavelmente um casal. Peguei o outro pela camiseta e o puxei em minha direção. A adrenalina me fez carregá-lo rapidamente para o mais longe possível. Ainda enquanto carregava dei um soco em sua nuca e ele desmaiou, facilitando meu trabalho. Quando o outro garoto nos encontrou, seu namoradinho já estava morto.

Você se vangloria disso? – Winter brada rapidamente.

Quem é você para dizer algo? – ele olha com seriedade para ela. – Acabei de ver você matando uma garota.

Winter ficou sem palavras, tentando processar tudo aquilo que havia acontecido nas últimas horas. Scott abaixa a cabeça, um pouco perdido.

Acho que a gente precisa conversar – digo para Winter que assente com a cabeça. Nos afastamos de Scott, que fica imóvel até o momento de voltarmos. Por fim, optamos por tê-lo junto de nós, talvez seja útil.

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Desde a chegada de Scott, nos empenhamos em descobrir como sair de Maltrak; criamos diversas teorias, analisamos atentamente aos locais e, principalmente, tentamos evitar o contato com outras pessoas.

― Não sei se procurar pela saída de noite é a melhor opção – comento assim que chegamos de mais uma busca sem sucesso. Sempre voltamos para o mesmo prédio, que até então parece ser o local mais seguro.

― Tudo se torna mais difícil – admite Scott –, porém, correremos uma infinidade de riscos caso decidirmos sair à luz do sol.

― Não consigo conceber o porquê de algumas pessoas possuírem esse desejo de matar, quando podemos todos nos unir e descobrir uma saída – Winter dá de ombros e possui uma expressão bastante confusa. Diferente dos das noites anteriores, a grande lua no céu deixa tudo bastante iluminado, já que não há presença de nuvens.

― Teve ter relação com a proporção inversa entre número de habitantes e número de dias – sugiro. – Se bem que ninguém nos comprovou que essa informação é verídica, certo? Pode ser apenas papo do russo para que essa matança aconteça.

― Entretenimento? – Scott questiona incrédulo.

― Por que não? – a sensação de raiva começa a tomar parte do meu corpo ao imaginar a possibilidade de estar sendo totalmente controlado por Ambrol.

― Seria desumano – Winter sussurra.

― É exatamente o que vem sendo, Winter – ouso dizer. – Bom, isso não vai nos tirar daqui. Continuo achando que precisamos sair de dia.

― Vamos arriscar – Scott é o primeiro a se manifestar enquanto Winter pondera um pouco, mas acaba concordando também. Não sei se estou tomando a iniciativa que vai acabar conosco, mas se não estamos colhendo resultados no escuro, talvez tenhamos alguma luz, na luz.

― Então acho que é o momento de descansarmos – Winter sugere e ninguém é capaz de contrariar. Ocupamos o mesmo cômodo ao dormir, para que estejamos juntos caso algo aconteça.

É Winter que me acorda e percebo que o sol já está no céu. Com a visão periférica percebo que Scott não está mais dormindo, logo, trato de levantar rapidamente. Como não temos água para nos lavar, tampouco algo para comer, não precisamos de muito tempo para nos preparar. Cada um pega algum objeto que encontrou nas buscas nos dias anteriores. Scott possui uma lâmina de ferro; Winter uma espécie de bastão de madeira e eu, um pedaço de uma corrente grossa.

Combinamos de evitar a área branca, que apesar de ser um lugar propício para uma saída, já que nada aqui é fácil, não queremos arriscar de primeira e estar em mal estado caso alguém apareça. Apenas acertamos que seria benéfico analisar os becos da área branca, mesmo que de longe. Ao sairmos, caminhamos juntos entre os prédios até a principal bifurcação da rua.

― É melhor nos dividirmos – é Scott que recomenda. – Faríamos o percurso com mais agilidade.

― Não sei se é a melhor solução – me sinto inseguro de deixar Winter sozinha com Scott, caso essa seja a intenção dele.

― Acho que é uma proposta viável – as palavras saem da boca de Winter, quebrando minhas pernas. – Posso ir com Scott, se você não se importar, Carter.

― Por mim ok – digo, apesar de não concordar nem um pouco com aquilo. – Vou pela esquerda.

― Nos encontramos aqui? – Winter pergunta.

― Acho melhor irmos direto ao prédio, para que ninguém fique esperando exposto – Scott indica e todos concordaram.

Scott e Winter seguem pelo caminho oposto, com uma velocidade além do caminhar, mas não rápido o suficiente para ser considerada uma corrida. Com passos calmos e sem fazer muito barulho, sigo meu caminho, segurando firme a corrente para que não emita ruídos fortes. Entro em todos os pequenos becos, visando conhecer melhor cada local, e vasculhando qualquer possível entrada suspeita. Não acredito que nossa saída estará dentro de um prédio, seria sem lógica, então não perco meu tempo vasculhando se há portas abertas.

Após caminhar longos minutos, talvez horas, me aproximo da Área Branca, ficando atento a cada detalhe, mesmo que de longe. Ouço um barulho de passos atrás de mim, fazendo-me virar rapidamente. Vejo uma garota correndo ao longe, mas não consigo identificar precisamente quem é. Um grito vem logo em seguida, diminuindo de intensidade à medida que sua dona perde forças. Identifico Kate, acorrentada nas mãos e pés, em um dos becos da Área Branca, com corrimento na cabeça e da sua barriga. Ela vomita com frequência e parece muito fraca, sintomas da Área Branca, certamente. Não penso duas vezes antes de entrar no beco e ajuda-la, mas logo sou tomado por uma tontura forte.

― O que houve? – me apoio na parede de pressa, evitando ir ao chão. Não obtenho resposta, Kate está fraca demais para isso. Vagarosamente me aproximo dela e vejo que quem a acorrentou possuía um tipo de cadeado, tornando o trabalho de desacorrentá-la muito mais complicado. – Kate, não vou conseguir te soltar aqui. Vou te arrastar para fora da Área. Se sentir muita dor tente me avisar.

Ela me olha com carinho e posso ver que concorda com minha sugestão. Estou tonto o suficiente para acreditar que não vou conseguir arrastar Kate os poucos metros necessários para tirarmos da Área Branca. Seguro a corrente que firma seus pés com as duas mãos e lentamente começo a tirá-la do lugar. O trabalho é exaustivo – ainda mais aqui – e praticamente não produz resultados. Ela geme de dor a cada vez que tomo impulso para arrastá-la e isso me desespera cada vez mais.

Sinto o ácido subindo para minha garganta, solto Kate no mesmo instante e tento correr para a beirada do prédio, onde vomito todo o resto da pasta que ainda existia dentro de mim. Só nesse momento percebo que existe um tipo de alavanca, pequena o suficiente para não ser avistada de relance. Penso que ela pode ser o início ou até mesmo a chave da nossa saída. Meu pensamento volta a Kate, logo que escuto seu gemido novamente. Retomo meu trabalho e só após longos minutos consigo fazer com que deixemos a Área Branca.

― Você consegue falar comigo, Kate? – questiono assim que sinto a tontura esvaindo meu corpo.

― Não vou resistir – ela fala baixinho.

― Claro que vai. Não fiz esse esforço em vão.

― Desculpa Carter... E obrigada – Kate fecha os olhos lentamente e vejo se entregar à morte. Balanço a cabeça sem acreditar que mais alguém do E14 nos deixou. Ando de um lado para o outro sem saber o que fazer com o corpo, como tornar um pouco digna sua morte. Cerro minhas mãos com força e sinto o ranger dos meus dentes. Droga!

Ouço um grito cortando o silêncio que pairava sobre mim e o corpo sem vida de Kate. Me assusto e giro meu corpo para encarar a face confusa de Scott e a expressão de pavor de Winter.

― O que você fez, Carter? – Winter comenta e em seguida leva as duas mãos à boca.

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― Não, não Winter – me aproximo de ambos, mas eles recuam e instintivamente paro. – Eu tentei ajudá-la, mas ela não resistiu.

― São as suas correntes – ela afirma e só então percebo que minhas correntes não estão mais comigo, devo tê-las deixado cair no beco.

― Não são as minhas – respondo rapidamente –, elas devem ter caído em algum lugar. Eu tentei ajudar Kate, ela estava na Área Branca, só que não fui rápido o suficiente.

― Quem fez isso com ela? – Scott questiona com seriedade.

― Não sei – admito. – Vi uma garota correndo ao longe, mas não consegui identificar quem era. Quando ouvi os gritos de Kate não hesitei e tentei ajudá-la. A Área Branca me deixou ruim também, tanto é que passei mal e...

― Se justificando demais – Scott logo corta.

― Eu encontrei uma alavanca – o acontecimento atual me vem a cabeça e sei que essa pode ser a chance de fazê-los acreditar em mim.

― Alavanca? Onde? – ela questiona intrigada.

― Dentro desse beco – aponto para o local, na direção da alavanca. – Está atrás daquele latão. Não verifiquei melhor, minha prioridade era outra – olho para Kate no chão e sinto que a culpa por sua morte é parcialmente minha.

Scott não conta tempo e entre rapidamente no beco, procurando pela alavanca. Ele vasculha o local e me olha intrigado. Ele chuta o latão para o outro lado e em seguida ergue os braços.

― Acho que tem alguém nos enganando, Winter – afirma.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.