A Nova Profecia

Capítulo 1 - Natasha


Eu estava sem nada para fazer, durante uma aula vaga. Simplesmente, rabiscava um rosto aqui, uma criatura ali, em meu caderno de desenho. Com a cabeça sobre uma palma da mão, sem motivação para nada, escutava Destiny passar de um lado para o outro, paquerando um ou dois garotos da nossa sala.

Rolei os olhos, irritada com aquilo. Se fosse longe de mim, tudo bem, ou se fosse apenas uma paquera. Mas Destiny, uma garota esbelta e atlética, ficava de gracinhas e falava coisas não muito legais e que me perturbavam, sem permitir que eu me concentrasse em algo. Eu parei de desenhar, fitando um cachorro de três cabeças que aparecera em meus sonhos.

Eu me encostei-me à cadeira. Deixei o lápis sobre o caderno e me inclinei na direção do meu livro de matemática, que seria usado na próxima aula. Assim que o peguei e o abri sobre minha mesa, meu amigo, Joshua Hall, chamou minha atenção.

— Vai fazer o que no seu aniversário? – parecia curioso. Bom, Joshua era assim, extrovertido, curioso e amigo. Mas ele era meio esquisito (se assim posso dizer) para um adolescente de dezessete anos. Tinha um jeito engraçado de falar e andar, sem contar que nunca largava seu boné que cobria o cabelo cacheado e preto dele. Ele era fanático pela comida do refeitório e parecia ter algum segredo, pelo modo que dava algumas desculpas esfarrapadas quando eu perguntava “o que fez nas férias?” ou então “por que está todo machucado?”. Ele geralmente respondia que era de esporte, mas sabia que ele mentia. E pessoas com atestado, livrando de Educação Física pelo resto da vida, não iriam fazer esportes.

Eu dei de ombros. Não sabia o que pensar. Olhei pela janela, o tempo estava feio, como se fosse tocar ao chão, um tornado. Era sempre assim na semana do meu aniversário. Apesar de ser na virada do ano, dia primeiro de janeiro, quando deveria estar um tempo bom mesmo sendo inverno, chovia de um modo inexplicável. Suspirei.

Eu voltei a olhar para Joshua.

— Provavelmente, um bolo simples e ficar em casa por causa do temporal. Mas nada de importante.

Ele hesitou.

— É seu aniversário.

— Nunca fui muito fã de aniversários – admiti.

Destiny ouviu. Parou de dar atenção a um garoto da sala e olhou em minha direção, com o olhar do tipo, “ótimo”. Ela se aproximou, lentamente, atraindo a atenção dos meninos pelo seu belo corpo e pelos olhos azuis. Apesar de usar umas roupas decentes (contrário de meninas do tipo dela), ainda sim, ela sobressaía.

— Deve ser porque ninguém vai ao seu aniversário, né? Por que alguém iria à festa de uma garota como você?

Eu fechei os olhos, guardando todas as implicâncias de Destiny. Assim que abri os olhos, sorri de uma maneira amigável.

— Eu odeio festas. E eu prefiro que ninguém vá. Não preciso aturar pessoas falsas, não é?

Ela deu uma leve risada. Olhou para Joshua, que era seu amigo (sim, um ser humano tão gentil quanto Joshua era amigo de Destiny, que ainda sim, caçoava da deficiência dele).

— De qualquer jeito, se você parasse de desenhar monstros – ela voltou a me olhar, após também observar suas unhas tingidas de vermelho. – E também, se isolar, talvez tivesse mais amigos. Pelo menos, além de Joshua.

— Joshua é suficiente – afirmei. – E além do mais, eu não me isolo. Só prefiro não me enturmar com os outros.

— Claro né – ela parecia estar ironizando tudo. – A ‘nerdzinha’ da sala não iria se enturmar com os idiotas.

Uma garota olhou para ela, não satisfeita com o comentário. Mas não poderia negar. Fazer amizade com pessoas que só ligavam para namoro, balada e outras coisas não muito legais, era horrível. Mas eu não era do tipo que iria menosprezá-las, pelo contrário, iria ajudar se precisassem, mas nada além das relações da sala.

Destiny a olhou, com um olhar de desdém.

— Nem reclame. Você não sabe nem diferenciar “mais” de “mas” – ela disse.

A garota se levantou para buscar briga com Destiny, mas ela se virou totalmente para a garota, cruzou os braços e com um sorriso de uma vitoriosa, pronunciou claramente:

— Sente-se e late para mim.

A menina não parecia acreditar – nem mesmo eu, Joshua e os outros. A garota se sentou e latiu algumas vezes. Destiny riu, assim como os dois garotos que ela paquerava. Joshua olhou para mim, como se não acreditasse. Achei que ele estivesse pensando o mesmo que eu: “isso não é certo”. Mas não parecia.

— Hey, Destiny. Isso não é certo! – disse o que pensava. Ela ergueu uma sobrancelha na minha direção.

— “Não é”? – debochou.

O professor entrou em sala antes mesmo que Destiny pudesse tentar alguma coisa contra mim. Bom, era o professor de Matemática e ele era sério, com uma aparência rígida. Ele bateu a mão no quadro-negro, atraindo nossa atenção.

— Senhorita Parrot e Senhorita Turner, vão brigar agora?

Destiny se virou para ele, se fazendo de mal-entendida.

— Longe de mim, fessor. Só estava conversando com a doce Natasha Turner – ela olhou para mim, ironicamente.

— Acho bom. Porque se eu entrar e ver vocês duas que nem cão e gato, vão parar na direção!

A aula passou lentamente. Meu déficit de atenção ajudou a prestar atenção em uma poeira ou nas árvores – como se fosse mágica ou meu cérebro fazendo algo contra mim, eu podia jurar que as árvores se transformavam em mulheres. Ao ver isso, sacudi minha cabeça e as vi olhar para mim.

Eu arregalei meus olhos, soltando um leve grito e atraindo a atenção do professor. Droga! O professor de Matemática parou a aula dele.

— Senhorita Turner?

— Desculpa professor. Acreditei ter visto um fantasma – disse. Bom, poderia não ser mentira. Sabendo como eu era... Ele ergueu uma das sobrancelhas e fez um sinal leve com a cabeça, em direção ao corredor. – Entendi – peguei minhas coisas e as enfiei dentro da mochila, jogando-a sobre meu ombro. Antes de sair da sala e ir para a direção, vi as mulheres voltarem a serem árvores.

Eu estremeci com aquilo. Tentei tirar aquelas coisas da minha cabeça em meu caminho até a direção. Vi outro estudante na fila, sentado sobre uma das cadeiras e inclinado para frente, murmurando algo que eu não entendia e parecendo irritado. Bom, eu preferia não falar nada sobre ele, mas não pude deixar de notar suas roupas – uma blusa do Metallica, um colete jeans e uma calça preta. Também tinha o cabelo bagunçado, como se não se importasse com pentes.

Eu me sentei frente a ele, tentando não encará-lo. O garoto não olhou para mim, mas parou de falar sozinho quando a porta abriu e dela, uma aluna saiu. A diretora, Kailey – uma mulher de quase cinquenta anos de idade, com cabelos ruivos e presos em um rabo-de-cavalo feito rapidamente e com roupas apropriadas para a escola –, olhou para mim, docemente.

— Novamente aqui?

O garoto ergueu a cabeça, irritado e confuso. Mas não olhou sequer em minha direção.

— Eu acabei interrompendo a aula do professor de Matemática, sem querer— disse. Ela parecia querer saber mais, com aquele olhar de um detetive. – Eu achei ter visto um fantasma.

— Sabe que eles não existem, não é?

Bom, eu queria discordar dela, mas o fato é que fantasmas existiam e eu podia vê-los. Acreditava que tudo piorara depois de um acidente que tive.

Eu tinha doze anos e estava correndo pela rua para não me chegar atrasada em casa para a reunião de família. Mas eu tinha ficado após as aulas por causar alguns problemas na minha antiga escola, e estava sem tempo.

Olhei antes de atravessar a rua, mas enquanto estava sobre a faixa de pedestres, eu apenas ouvi o barulho de uma buzina e vi um vulto negro. Aquilo me assustou, me fazendo parar. Mas acabei tropeçando e colidindo com o carro que vinha em minha direção. Aquilo me acertou em cheio e eu fiquei lá... Caída no chão, com dor e com sangue ao meu redor.

Não sei como permaneci viva, mas diziam que era um milagre eu ter me recuperado tão rapidamente. Mas a partir daquele dia, passei a ver vultos negros, monstros e fantasmas. E tinha um em especial, que quando ia ao cemitério visitar uma amiga falecida de minha mãe, eu conversava com ela.

— Senhorita Turner?

A diretora me tirou dos meus pensamentos, preocupada.

— Desculpa, senhora... Estava absorta em umas memórias antigas. O que a senhora dizia?

— Sobre fantasmas. Eles não existem.

— Ah, sim – abri um leve sorriso.

— Bom... Você é o próximo – ela olhou para o garoto, tocando em seu ombro. Parecia não ter gostado disso e a diretora pulou para trás, como se havia levado um choque. Ela sacudiu a cabeça, tonta.

Ele olhou na direção dela. Vi em seus olhos azuis, um olhar intimidador e de desgosto. Ele recuou, olhou em minha direção, como se dissesse “está olhando o quê?”.

— Bom, não vai fugir dessa vez – ela disse para o garoto. – Entre logo, rapazinho. E você, Natasha, acredito que seja melhor ir para casa. O professor não iria aceita-la agora.

— Entendi – abri um leve sorriso e agradeci. Eu me despedi dela e andei até o meu armário para pegar o resto das minhas coisas e me preparar para o sábado. Antes que eu pudesse ir embora, vi uma carta pendurada em meu locker.

Era de Destiny Parrot. Dentro, dizia: “Natasha Turner, está convidada para a festa que acontecerá sábado à noite. Não pense em faltar ou lhe mandarei fazer algo estúpido... Bem, mais estúpido do que desenhar monstros e escrever em um diário”.

Depois de chegar a casa e fazer parte do dever de casa, eu me joguei em minha cama, fitando o teto branco e com enfeites de estrelas e uma lua que brilhava quando ficava escuro. Repassei tudo em minha memória – os sonhos, os monstros e fantasmas, as sensações de estar sendo vigiada. O que eu deveria fazer?