A Cortesã

Dedicatória


James voltou para ver Elizabeth, sentado do lado de sua cama ficou a observa-la dormir profundamente, cansada demais pelo pequeno passeio que teria dado. O Duque pensava sem parar nas palavras que lhe tinham sido ditas pela Cortesã: “Morreu de Desgosto. Isso lhe poderei garantir.” O que quereria dizer com tal frase? Era verdade que tinha visto sua mãe recuperar a olhos vistos, vira igualmente o desagrado de seu pai quanto a isso, e aquando a morte da Senhora York, o seu herdeiro nunca sequer cogitara outra razão senão a doença.

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Aquela prostituta falava demais, sem dúvidas! Decidiu que ia procurar justificações para o que tinha dito. Deu um beijo na frágil irmã e levantou-se de rompante, deixando para trás o amplo quarto luxuoso e vazio. Um lugar cheio de nada.

O corredor era bem iluminado, e os guardas que ali estavam a trabalho bem o conheciam. James estava habituado a vê-los, só não esperou cruzar-se com o Infante Fitzadam Price junto da Marquesa du Rothandberg.

— James.

— Duque de Mountbatten.

Ambos o cumprimentaram como lhes competia, trocaram olhares furtivos e fecharam os sorrisos diante do irmão da esposa do Infante.

— Negócios. — Justificou Marie quase sem graça e engoliu em seco, pois o jovem rapaz não parecia ter um ar amigável. — Junte-se a nós, Fitzadam Price teria um vinho maduro.

— Obrigada. Permita-me declinar tamanha oferta. — respondeu James de forma calma, afirmando para si mesmo que para estar diante daqueles dois, o assunto só poderia ser Charlie Dumont. O irmão do Rei afastou-se de forma provocadora para que o cunhado passasse, o que este fez sem hesitar, deixando-os para trás.

Mais do que nunca, James sabia a alegria que marido de Lizzie parecia ter junto da Cortesã, e isso de alguma forma o enfurecia visto que tinha sido ele a engendrar tal ideia. Tal raiva deu mais forças para que caminhasse em direção a propriedade daquela a quem desejava odiar. Quanto mais se aproximava mais conseguia ver a silhueta formosa da mulher negra diante da janela, e por um momento, o Duque sentiu dentro do seu peito um calor há muito adormecido. Os olhos azuis encontraram os escuros da mulher da vida, embora o momento tenha sido quebrado por uma silhueta escura por trás dela.

— Charlotte! — Gritou, e viu Charlie cair desfalecida. A figura percebeu que James agora corria na direção da casa, os passos pesados afundavam na relva e o casaco longo farfalhava atrás de si.

Entrou na casa cuja porta curiosamente não estava trancada, e ainda foi a tempo de ver o homem alto e corpulento que se escapou pela porta de trás da copa. O jovem York ainda cogitou ir atrás do intruso mas a sua consciência pendia mais para a senhora Dumont, e por isso subiu as escadas apressadamente sem ser interpelado por ninguém, o que lhe fez perceber que a mulher estaria sozinha.

Encontrou Charlotte estendida no chão do quarto, o corpo feminino notável por baixo de suas vestes de dormir transparentes e os lábios carnudos entreabertos.

— Charlotte? — Chamou pela mulher, acolhendo-a em seus braços. Virou o rosto de forma delicada, e respirou fundo ao ver que ela abria os olhos lentamente. Era visível nos olhos azuis o medo que sentira com a ideia dela estar morta.

— Não morrerei tão cedo. — respondeu e fez uma careta de dor levando a mão na cabeça onde continha sangue.

— Esqueça as brincadeiras, foste atacada! — Esbravejou enquanto a carregava até a cama num ápice. Um sabor amargo por saber que ali dormia outro homem. James voltou-se em direção ao quarto de banho.

— Para onde segues? Por favor chama Edith e vá embora! — pediu com o coração descompassado. Era estranho tê-lo ali tão perto de si e das suas coisas. Fechou os olhos.

— Tamanha ingratidão, não penses que desejo estar aqui. A sua casa está vazia, a senhora está sozinha! — bradou James que encontrou uma toalha e um frasco de álcool. Hesitou antes de se sentar junto de Charlie para limpar sua ferida. — No que andarás metida?

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— Não é de sua conta! — Ripostou secamente. Estava assustada, sabia muito bem que viriam atrás dos segredos que escrevia, só não esperava ser atacada em território protegido pelo rei. Soltou uma imprecação quando sentiu o ardor na ferida, e viu o afinco com que o Duque limpava.

Conseguia sentir o cheiro masculino, e passou a reparar os lábios estreitos e o queixo firme. Os olhos azuis estavam concentrados na testa.

— Chame o Infante nesse caso. — Pediu com calma, e se afastou dele causando uma reação de indignação por parte do jovem York.

James largou o pano e o frasco no criado mudo ao lado, o orgulho mandava que se fosse embora sem olhar para trás, no entanto sabia que o Infante estava ocupado com a Marquesa e que não viria. Cerrou os maxilares.

— Devo esperar alguém chegar, não posso deixa-la sozinha. — afirmou levantando-se para longe, e sentou na poltrona distante da cama, onde a Cortesã estivera sentada antes. Cruzou uma perna, e colocou a mão no queixo, tentando não olhar para a mulher a sua frente.

— Não deveria se preocupar com uma prostituta. — disse enquanto se deitava com dor, mordeu o lábio inferior e fechou os olhos.

— Mas me preocupo. — respondeu, e viu ela abrir novamente os olhos escuros. Os olhares se cruzaram por alguns segundos antes de James quebrar o momento. — Se algo lhe acontecer, não conseguirei salvar Lizzie.

Charlie fechou os olhos novamente, irritada consigo mesma por deixar-se levar por sentimentos do passado. Para onde teria ido todo mundo? O que teria o jovem York ido fazer ali?

“Peca igualmente quem apressa o hóspede que não quer partir e quem o detém quando este já está partindo […] — Recitou baixo, lembrando-se de um trecho do livro favorito.

— […] O hóspede deve ser bem tratado se fica, e não dever ser impedido de partir se assim o deseja.” — O Duque continuou sem pestanejar, pois conhecia tão bem quanto ela.

Completaram a frase um do outro, e Charlie abriu os olhos para o criado mudo onde repousava um livro velho de capa amarela. Desviou rápido quando percebeu que o Duque de Mountbatten tinha perseguido o olhar, mas já era tarde! O jovem se apressou para pegá-lo sem acreditar no que os seus olhos viam:

“É verdade que a leitura nos leva para vários mundos. No entanto, querida Charlotte, de nada adiantaria saber ler sem o poder da imaginação. A mente é a nossa melhor arma.

Do teu,

James York”

Quantos anos se tinham passado desde então?

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Vivenda York

Charlotte acabava de dar o chá de raízes do curandeiro para Ana York. Fazia algumas semanas que esta começara a tomar, e era visível a recuperação da mesma. A pele ganhara cor e o corpo alguma massa consistente. A própria senhora estava com um ar mais vivo, conseguindo passear por conta própria e fazer as refeições fora dos aposentos. Não tinha sido fácil convencê-la a beber dos remédios tradicionais dos empregados, mas agora que o efeito aparecia a olhos vistos, era Ana quem pedia por mais.

— O senhor seu marido jamais poderá descobrir. — Lembrou-lhe a jovem negra, a esconder os frascos feitos em barro dentro de uma sacola e em seguida sorriu para a mulher que se tornava bela a cada dia que se passava.

— Claro que não. Richard acredita que os remédios prescritos pelo médico de família começaram a fazer efeito. — Sorriu e acariciou os cabelos encaracolados da sua criada. — Muito obrigada. Mais algum tempo e poderei ver Elizabeth.

— Com certeza, senhora. — concordou e se despediu deixando o quarto. Caminhou apressadamente pelo corredor da vivenda como sempre fazia, nos últimos dias passava mais tempo fora da casa.

— Senhorita! — A voz de James fez com que a criada parasse a meio do trajeto. O coração bateu com tanta força que deixou suas pernas trémulas. — Por que me evitas?

Charlotte virou-se de olhos arregalados, caminhou até ele descalça e com um ar deveras zangado.

— Como pode, senhor? Neste mundo és o único que me trata por senhorita, pois não passo de uma criada. Por que me beijaste naquela tarde quando ocorreu o noivado recentemente? — Perguntou tudo o que jurara não querer saber. Uma mentira certamente, pois perdera muitas noites de sono por conta por conta do maldito beijo.

James lhe puxou pelo braço e entrou com ela na biblioteca onde passava a sua habitual hora de leitura, fechou a porta por trás deles.

— Tenho a sua pessoa mais em conta do que possas imaginar, senhorita. Perdoe se de alguma forma fui inoportuno, não medi as consequências de meus atos, tão menos soube como evitar que tal beijo acontecesse. — justificou de forma calma, e percebeu que a jovem negra não o encarava nos olhos. Ele segurou a sua face com a mão, erguendo-a para que os olhos se encontrassem.

— O que pretende? — questionou de forma firme. — Não me tome por uma qualquer. Sequer tinha beijado até então.

— Nunca a obrigarei a fazer o que não quer, no entanto tenho apreço a sua amizade por muito estranho que lhe possa parecer. — respondeu, embora fosse mais do que isso. Muito mais. James passava os dias com Charlotte em pensamentos.

Afastou-se dela e andou até a longa escrivaninha de mogno preto, onde abriu uma gaveta e tirou de lá um caderno com um cadeado dourado.

— Tenho um presente para si. — disse e procurou uma caneta preta com a ponta de prata. — Minha irmã adorava ter. Acredito que todas as jovens deveriam ter um. É um diário, onde poderás escrever sobre os teus dias.

Charlotte sentiu os olhos arderem e tentou segurar as lágrimas. Não só porque nunca lhe tinham oferecido um presente antes, e sim pela vergonha que a assolou. Engoliu em seco e fixou o herdeiro dos York.

— Agradeço tamanha gentileza, mas não farei nenhum uso do mesmo. — Ensaiou em pensamentos, até deixar as palavras saírem de sua boca. — Não sei ler e nem escrever.

O rapaz sentiu o sorriso morrer nos lábios e baixou a mão com o diário, sentindo-se incomodado com a situação. Voltou a olhar para a dona dos seus pensamentos e se aproximou com cuidado.

— Pois bem, eu lhe ensinarei a ler e escrever.

O brilho que viu nos olhos castanhos escuros foi mais gratificante do que poderia imaginar, e então recebeu o abraço inesperado que Charlotte lhe deu. Sentiu o coração da jovem bater contra o seu peito.

— Tem esse livro, A Odisseia. É meu favorito. Farei uma dedicatória para ti, e quando aprenderes a ler, saberás o que escrevi. — murmurou junto a seu ouvido.

Tinha tanta coisa para dizer, no entanto sabia não ser a hora.

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