— Então Aeris atacou o cervo! - A caçula disse sorrindo na mesa.

Os Parsons conversavam durante mais um jantar. A Família Real do norte estava completa. O Rei acompanhava as risadas junto com o resto da família , Clair dava um sorriso mínimo, mas não deixava a alegria sair de seu rosto. Igual a seus irmãos: Aeris e Verirsis. Todos pareciam estar em um clima festivo, menos a rainha.

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Os cabelos loiros ondulados recaíam sob os ombros, sua coroa ramificada prateada permanecia intocável no topo de sua cabeça. Aqueles lindos e frios olhos azuis se concentravam na conversa, mas ela não esperou aquilo acabar para abrir sua boca.

— Devo dizer que estou extremamente confusa com todos aqui comentando festivos sobre a irmã caçula decidir ir caçar – Os sorrisos foram se silenciando aos poucos, e durante longos minutos o silêncio soava nos ouvidos da pequena princesa. Uma tosse de Verirsis terminou com aquilo, seguido de um garfo de prata caindo no prato, formando um som estridente causado pelo Rei Kloire. – E acho que qualquer um aqui que tenha um mínimo raciocínio lógico sabe que essa “aventura” só vai encoraja-la... Então minhas felicitações para o príncipe Aeris e o Rei do Norte, os nossos exemplos de liderança!

Nenhuma conversa entre a família continuou depois da bronca da Rainha Elli. Praire engoliu um seco e permaneceu olhando para o prato, o javali assado já não parecia tão saboroso quanto a algumas horas atrás. E o pior de tudo era que mesmo que a princesa tentasse pensar o contrário ela sabia que sua mãe estava certa.

Dois guardas abriram as portas do Salão de Jantar, as duras e grandes portas eram de um ferro polido, entalhado com símbolos invernais. Com passos ecoantes pelo salão um homem entrou, usando uma pele grossa de urso sob o corpo inteiro. Praire se perguntou que animal era aquele com uma pele tão grande capaz de abrigar um humano daquele tamanho, provavelmente era alguma besta além da "Rocha", o lar dos Homens de Chitu, o grande exército do Norte. Mas a alegria da garota só fortaleceu quando seus olhos viram os cabelos brancos e os olhos cinzas.

— Tio Vroiner! – A garotinha sorriu, seu corpo pulou da mesa e foi em direção ao homem em alta velocidade, com um salto abraçou seu tio com bastante força. Seus braços conseguiram sentir o casaco, ele era bem mais grosso do que sua mente podia imaginar.

— Não é possível que essa mocinha aqui seja a princesa Praire Parsons! – Os braços fortes dele a levantaram e um forte sorriso acompanhou tudo aquilo. Vroiner tinha as mesmas características dos outros membros da família. Seu cabelo liso branco batia no começo de sua orelha, não era tão grande comparado aos outros membros da família. Seu rosto era mais branco do que os outros Parsons, talvez por morar em um lugar mais frio do que o próprio Norte tenha beneficiado isso. Um risco em seu rosto deixava marcado aquilo que ele passava, uma cicatriz que começava do lado esquerdo do queixo e terminava poucos centímetros abaixo daquela imensidão cinza que eram seus olhos. Os mesmos olhos visavam a mesa de jantar ao mesmo tempo em que Praire voltava ao chão bem animada.

— Vroiner – Seu irmão foi em sua direção. Os dois tinham as mesmas características, mas tinham algumas diferenças que não os tornavam parecidos. A cicatriz no rosto de Kloire era um deles, mas diferente do irmão, Vroiner tinha o rosto mais fino e era um pouco menos musculoso que o outro. Eles deram um abraço, e Kloire e bateu nas suas costas junto com uma risada pausada. – Quanto tempo! Já fazem dois anos desde a última visita!

— Realmente! - Respondeu em meio a um sorriso. – Você engordou mais! Eu não pensei que isso ainda era possível!

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Antes que Kloire pudesse responder, o príncipe herdeiro caminhou em sua direção. Seus olhos cinzas se encontraram e outro abraço forte se formou.

— Aeris! Como você está crescido! Já é um homem! – Sempre que algum parente ou amigo dos Parsons visitava a capital, eles diziam as mesmas palavras, e Praire ficava muito pensativa em relação a tudo aquilo. Um dos maiores medos de sua vida era pronunciar tais palavras daquela forma. A princesa realmente não se via dizendo “Você está enorme!” ou “Lembro-me de ti quando era apenas uma criança”. Pode não parecer, mas pensamentos assim a assustavam. – E você pequeno Verirsis? Está igual a seu pai quando tinha a sua idade! Eu diria até mais bonito!

No meio de toda aquela conversação, duas servas caminharam de forma lenta até as costas de Vroiner. Foi necessário a força extra das duas, para que elas conseguissem carregar o casaco negro do homem até outro cômodo.

Praire olhava para sua irmã caminhar a direção do seu tio. A menina sempre se imaginava mais velha, e um dos reflexos que ela definitivamente gostaria de seguir em seu futuro era o de Clair. As características eram a mesma coisa dos outros, mas é claro que cada um nasce com algo em especial, e a irmã mais velha tinha aquilo. Naquele dia os seus cabelos estavam trançados de uma forma que imitavam silhuetas de um rio naqueles lindos e ondulados cabelos brancos. Ela abriu um sorriso a medida em que se aproximava do tio e os dois se abraçaram.

— Não é possível! – Sua voz soou muito surpresa. – Será mesmo que estou na frente da dama mais linda de toda Hangarus?

— Parem com isso, tio! – Ela riu. Clair usava um vestido verde simples, a manga cobria todo o braço, e o decote era semelhante a um retângulo. - Senti sua falta!

— Eu também! De todos vocês!

Praire não lembrava muito bem o motivo de seu tio ter se juntando aos Homens de Chitu na Rocha. Não que fosse algo ruim, muito pelo contrário. A um tempo atrás a pequena tinha se perguntado se mulheres também podiam entrar, mas o nome já traz a reputação. O exército de Elite do Norte surgiu a muito tempo, fundados por Chitu Troknys, um lorde de uma família importante do Norte. Cada lugar possui sua guarda, mas o Exército protege o Norte em si, sempre trazendo muito prestígio ao Reino.

— Sente-se! Venha comer conosco! – O Rei soou sorridente.

— É claro! - Vroiner sorriu, a medida em que andava velozmente em direção a mesa. Porém a voz altiva da Rainha o fez parar, e olhar para os irmãos Parsons.

— Kloire, vamos?

O Rei juntou as sobrancelhas, como se estivesse esperando a resposta descer dos céus em sua direção. Ele permaneceu durante um tempo assim antes de conseguir lembrar de algo, mas quando isso aconteceu, seu sorriso se desmanchou como as rosas se desfazem no Inverno.

— Espero não ter feito a visita em má hora... - Vroiner já tinha se sentado a mesa, e olhava confuso para a Rainha.

— Não! É claro que não – Elli insistiu, junto com as suas sobrancelhas que se levantavam. – É apenas um assunto que eu e seu irmão decidimos terminar... Hoje.

Praire se colocava sentada à esquerda de seu tio, seus olhos focavam de um lado para o outro, procurando respostas.

— Sim... – Seu pai deixou que um ar de preocupação escapasse de sua boca. – Então vamos à sala do Conselho.

— Peço desculpas pela inconveniência – A Rainha fez uma reverência e olhou atentamente para a mesa, como se estivesse faltando algum filho. Ela deixou que um ar de tristeza escapasse de sua boca e disse. – Clair, venha, minha querida.

Praire arregalou os olhos, ela voltou seu rosto para Verirsis, que por sua vez seguia a feição preocupada de Aeris. Os dois mais novos pareciam estar confusos com toda aquela situação, mas o irmão mais velho parecia já saber a resposta.

Os guardas abriram as portas do salão e Clair, Elli e Kloire saíram. Por volta de seis minutos, aquele silêncio medonho permaneceu. Até que Vroiner quebrou aquilo.

— Então, o que fizeram no tempo em que estive fora?

- Nada muito importante... - Praire olhou para seu prato.

— Ela foi escondida para a caça semanal – A voz de Verirsis soou como se fosse algo normal, e o fato de estar colocando um pedaço do javali assado na boca o ajudou nisso.

— Você fez o que?! - Sua feição surpresa começou com um grande sorriso. Depois disso começou a se gabar. - Claramente és minha sobrinha!

A garota sorriu durante alguns segundos, mas logo depois notou o rosto preocupado de Aeris. Seu irmão era meio calado, algumas pessoas que não o conheciam de perto pensavam que ele era apenas sério. Uma vez Clair contou para Praire que o irmão mais velho desde sempre havia sido doutrinado para ser um Rei, e por isso ele sempre era o mais centrado, calculista e sério dos quatro príncipes do Norte.

— No que está pensando?

— Em nada – Ele respondeu.

— Jura? - Verirsis juntou as sobrancelhas, mas logo depois voltou a atenção para sua comida. - Não é o que parece.

- Clair e Veririsis, não estou pensando em nada!

Praire juntou as sobrancelhas e olhou para os lados, e procurou a irmã, talvez ela já tivesse voltado e a pequena nem havia notado. Mas não, Aeris havia apenas confundido as duas.

— Então está pensando em Clair? - O outro irmão deu um sorriso enquanto olhava a comida.

- O que? Não! - Aeris bufou. Depois de fechar seus olhos e soltar um ar de nervoso, se dirigiu a seu tio e perguntou. - Tio, por que não nos conta como decidiu se juntar aos Homens de Chitu?

O homem pareceu surpreso com a pergunta, estava tão ocupado deliciando a comida que talvez nem estivesse ouvindo os irmãos conversarem.

— Bem... - Vroiner respirou fundo. - Como vocês sabem, sou uns 3 anos mais novo que o pai de vocês... Eu nunca quis ser alguém de classe, ou alguém da corte... Me casar com alguém e viver o resto dos meus dias em um palácio esperando alguma coisa acontecer... Então eu apenas decidi ir embora, proteger o norte... Vocês sabem.

Os olhos de Praire brilharam quando ela ouviu aquelas palavras. Ele tinha resumido todos os pensamentos da garota, e era muito bom saber que alguém de sua família era igual a ela. Porém um enorme problema separava os dois... Vroiner era homem. Ele tinha essa escolha de "não virar careta", mas enquanto a caçula aqui? Dificilmente ela pensava em uma saída para tudo aquilo, e isso era triste.

- Meu pai queria se casar com minha mãe? - Os garotos olharam para a criança, como se não esperassem uma pergunta vindo dela, e alguns segundos após, olharam para Vroiner, todos eles estavam ansiosos para saber a resposta.

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- Seu pai era apaixonado por uma garota de um reino distante... Não lembro o nome, ou o reino, mas ainda lembro de seu rosto – Os olhos dele se elevaram para cima, como se conseguisse ver as memórias ali. - Ela tinha a pele clara, não igual a nossa, mas era clara... Os olhos azuis como o mar, e seus cabelos eram lisos e negros como a pedra de ônix...

— Como eles se conheceram? - Verirsis perguntou.

— A tempos atrás, aconteceu os "Dias de Aksum", isso foi uma grande reunião na capital de Aksum, na época do Rei Cefiso Tass e da Rainha Alcmena Tass. Essa reunião convocou todos os reinos acessíveis. E com os reis, as famílias reais se hospedaram na Fortaleza Flamejante... A reunião durou sete dias, mas a estadia durou cerca de dois meses.

- Já ouvi falar sobre isso, meus pais quase não falam disso, mas creio que já li em algum lugar. Deve ter sido ótimo! - Aeris disse

Praire começava a imaginar como deveria ser conhecer as famílias reais dos reinos, uma mistura de culturas e sentimentos convivendo juntos, deve ter sido o melhor evento já ocorrido.

— E foi! - Riu. - No começo, teve um enorme e poderoso Baile de máscaras... A garota de cabelos negros que ele tinha visto estava lá, e naquele dia foi o primeiro encontro dos dois... É claro que teve outras coisas nesses dois meses, corridas de dragões, torneios corpo a corpo... Porém isso é história para outros dias - Vroiner parou por uns instantes, a medida em que lembrava de cada detalhe. - Os dois estavam super apaixonados, mas tudo isso mudou no último dia dos "Dias de Aksum". Kloire me contou que os dois estavam na costa, distante do porto, até que ele teve que contar que já estava prometido, e tinha um dever com o seu reino... Ele não me contou sobre a conversa, apenas que ela terminou com a garota de cabelos negros saindo chorando.

Praire imaginava a cena, e começou a ficar um pouco mais triste. Mas sua mente pensava em todo o evento, queria saber cada detalhe dessa época maravilhosa! Ela precisava saber mais sobre esses "Dias de Aksum".

- Isso é... Triste – Verirsis disse, olhando para o seu tio.

- E você tio? Não conheceu ninguém especial nesses dias? - Praire perguntou.

— Assim como seu pai, também conheci alguém no baile máscaras... Ela era da casa Konorra, tinha ondulados cabelos pretos, uma pele parda aveludada, e olhos de profundos castanhos... No Baile de Máscaras ela usava uma de borboleta, com pequenos rubis espalhados... Só de lembrar... - Suspirou. - Se eu fosse me casar um dia, seria com ela.

— Mas ela já estava prometida, não é? - Aeris fitou o seu tio. Sua voz estava suave, ele tinha ouvido essa história antes pela boca de seu pai. - Estava prometida para o Príncipe Átila Tass.

— Você se apaixonou pela Rainha de Aksum?! - Praire arregalou seus olhos.

Os servos próximos da mesa de jantar estavam tão interessados na história quanto as crianças Parsons. Eles tentavam não esboçar reações, ou disfarçar as caras e bocas, mas de vez quando, quando a caçula olhava para os lados, ela pegava uma reação.

- Antes de ser rainha, ela era uma princesa... Penny foi uma das melhores coisas que já me aconteceu – A voz dele soou triste, mas antes que ela pudesse notar mais detalhes, Verirsis a cutucou.

— De certa forma ela é nossa parente, certo? - Falou de uma forma que seu tio não ouvisse. - Já que a tia Laurier se casou com o irmão dela e tudo mais...

Praire começou a entender o raciocínio do irmão, ela havia se esquecido que Laurier, irmã de seu pai e tio, tinha se casado com o príncipe Fernis Konorra, digo, agora os dois são reis de Karlee, mas antes eles não eram.

— Isso devia ser uma conversa feliz, não é? - Vroiner deu um sorriso. - Praire, conte-me mais sobre essa sua aventura de caçadora!

Uma das únicas coisas que não tinha intenção, era deixar seu tio triste, então ela precisava rapidamente anima-lo. Foi quando ela começou a contar sobre o que aconteceu naquela manhã. A conversa dos quatro se estendeu durante horas, com todos os assuntos possíveis, mas o que mais causou a enrolação foram as histórias de quando Vroiner era mais jovem. Definitivamente, foi uma das melhores noites da vida de Praire, ou pelo menos uma que ela iria se lembrar para sempre, e isso era fácil de adivinhar. O corredor para os quartos era extenso. As paredes de rocha tinham tochas suspendidas por "escravos de ferro", nome dado pelos nortenhos para a peça inanimada de ferro que segurava o fogo. O sorriso ainda estava desenhado na cara da criança, mas antes de chegar na porta de seu quarto, ela passava pela porta de Clair, que estava entre aberta, dando espaço para um som estranho sair de dentro.

O choro e fungadas fez com que Praire se aproximasse lentamente. Ela colocou suas pequenas mãos na porta de madeira, e empurrou lentamente. O som da madeira rangendo não fez com que a outra se virasse. Clair estava com seu rosto deitado no travesseiro, as lágrimas caíam de seu rosto, até que a voz da pequena soou:

— Clair? O que aconteceu?

A adolescente colocou seu braço direito na cama, se firmando para que pudesse se sentar rapidamente. Seu rosto estava vermelho, Praire esperou que aquela vermelhidão fosse de tanto chorar.

- Praire! Sai daqui!

— Mas... - Antes que ela pudesse terminar sua irmã a cortou.

— Vai embora!

A caçula fechou a porta do quarto rapidamente, e seguiu em silêncio até seu quarto. Quando entrou, sentou em sua cama, e suas mãos sentiram a sensação daqueles cobertores de pelo animal. Os olhos se concentraram na porta de madeira, com um lobo de ferro estampado bem no meio. Tanta coisa tinha acontecido naquele dia, e aquilo sem dúvidas foi a única que a fez ficar preocupada.

O que aconteceu com Clair?