A despeito de seu passado como ladino, ou talvez justamente por isso, Naraku era um homem (demônio?) que sabia como apreciar a boa vida. Fossem chás ou pinturas, bastava que lhe apresentassem um artigo de luxo para que sentisse a urgência de tomá-los para si.

Claro, havia coisas mais importantes na vida (como uma certa jóia por exemplo) mas uma única olhada nas sedas de luxo e cerâmicas de qualidade era suficiente para perceber sua inclinação à tudo que era belo.

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E claro que tais gostos não deixariam de se estender às pessoas também.

1.

Miroku, por exemplo, era como um jovem vinho verde. Parecia imaturo e aguado, trazendo ainda consigo o frescor das uvas recém colhidas. Era um bom acompanhamento às noites quentes de verão, mas seu sabor ordinário era muito para que se desse ao trabalho de prolongar sua fermentação. E no entanto, havia um certo toque de desespero permeando cada segundo de sua existência que fazia Naraku se divertir sempre que o degustava, perguntando-se como seu sabor se desenvolveria no futuro (caso ele sobrevivesse).

2.

Sango, em contrapartida, era um vinho seco feito com uvas maduras demais. Era picante, intensa, descia rasgando sua garganta, mas sempre deixava um sabor adocicado no final. Gostava de saboreá-la aos poucos, provando a melancolia de sua culpa e miséria sempre que posicionava seu irmão como uma peça chave do no tabuleiro. E deixando com que a acidez temperasse o restante de seu sabor, deleitava-se no prazer de saber que era o único capaz de trazer seu mais puro ódio à tona.

3.

Kagura era como uma bebida envelhecida, combinada da melhor maneira a agradar suas refinadas exigências, mas perto demais de alcançar sua data limite. Poderia ter sido um maravilhoso blend, mas havia algo nela, uma maldita nota aguda de individualidade que se sobressaía a todas as demais, avinagrando o restante da bebida e se acentuando quanto mais o tempo passava. No entanto, por mais insalubre que fosse sua rebeldia, achava divertido observá-la fermentar até que não servisse mais ao seu paladar.

4.

Inuyasha era uma explosão de sabores que gritavam na boca tão logo tocavam os lábios e desapareciam assim que passavam da garganta. E assim como sal é usado para disfarçar um sakê ruim, seu contraste até agradava alguns paladares (grosseiros), mas era a falta de refinamento nos sabores que mais aborrecia Naraku — quando não era a doçura exagerada, a acidez travava sua língua de tal maneira que precisava de mil litros de sangue apenas para desentortar a face.

Por isso servia-o sempre acompanhado de intrigas amargas e massacres de civis.

5.

Kagome era como um vinho sulista e encorpado: forte, decidida, a acidez do tanino espalhando-se como fogo em palha. Sempre que a via, seu coração de bandido desfazia-se em gargalhadas. Não era o lema de todo ladino bater e correr em retirada? Então, quem em sã consciência faria uma coisa dessas? Correr atrás do vilão quando poderia estar no aconchego de sua casa. E, no entanto, ali estava ela mais uma vez retornando ao poço por puro despeito contra sua pessoa. A dura realidade era que a sacerdotisa reencarnada tinha o fundo mais amargo da trupe e missões suicidas em nome do que é certo eram a única coisa que caíam bem com sua singularidade ocidental.

Tão diferente da jovem Kykiou...

+1

Ela era como um sakê fresco, feito com águas de degelo e florais de cerejeira, trazendo consigo ainda as notas do barro (hah, que ironia) onde fora armazenada. Quando acordou, após todos aqueles anos guardada, qualquer um pensaria que serviria apenas para água de banho, mas o ódio fez com que se tornasse envolvente e sedutora, com um sabor aveludado que massageava o paladar. Não ia lá muito bem com pratos fortes e eventos sanguinolentos, exigia um certo toque de suavidade, um quê de amadeirado que desse estabilidade à todas as nuances de seu sabor particular.

Naraku poderia ter sido o barril perfeito a armazená-la, mas no fim Inuyasha era tudo no que ela conseguia pensar.

E brindando à essa verdade amarga, Onigumo serviu-se de outra taça de sakê.

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Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.