Eu sou apenas um garoto

Prólogo; A guerra se aproxima


A MULHER DE JALECO BRANCO percorreu o longo corredor, arrumando a postura e os cabelos pretos de maneira desajeitada. Indo em direção à única porta isolada daquele andar. Deu duas batidas antes de entrar.

— Mandou me chamar, Dr. Qiang?

A sala era bege, com acesso a nenhuma janela. Repleta de estantes de livros e desenhos infantis pendurados na parede. Uma pequena televisão de tubo pendurada num suporte atrás da mesa do diretor. No meio, se encontrava a mesa, feita de madeira maciça, com um telefone de discar azul claro, uma pilha de papelada e um porta-retrato com uma garotinha de cabelo raspado e aparelho ortodôntico sobre ela.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

O dono daquela sala, de meia-idade e cheio de entradas na testa, usava um terno preto. Escrevia rapidamente em um dos papéis, enquanto fumava um charuto grosso com a mão livre.

— Sim, Jiaying. — Esfumaçou o ar. — Sente, por favor.

Assentiu com a cabeça e assim o fez. Não era a primeira vez que estava ali, porém sempre sentiria um calafrio.

— Aconteceu algum problema?

— Nanquim foi bombardeada hoje de manhã.

Jiaying prendeu a respiração por um momento.

— Como…?

— Ataque norte-americano. Usaram um projétil nuclear, com poder de destruição cinco vezes maior do que foi o desastre de Hiroshima e Nagasaki. — Esfumaçou de novo. — Tinha uma base deles escondida numa província japonesa. Poucos sobreviventes… — Apagou o charuto no cinzeiro, apertando-o com força. — Não tenho certeza se… Nossas famílias…

— Não foram atingidas…. — Suspirou pesado. — Entendi… Esse era o preço que corríamos o risco a se pagar, não é?

— É, mas não deveria ser assim. Esse bombardeio, é o estopim de uma guerra sangrenta e avassaladora que se aproxima. Dias sombrios virão. A partir de agora teremos que revidar com tudo que está à nossa disposição, então se prepare, a cobrança que vem de cima vai cair matando nesse laboratório.

— Eles já fazem isso mesmo sem uma guerra anunciada — disse sem graça. Dr. Qiang concordou.

— Me diga, como vai o progresso do 386?

Jiaying engoliu em seco, apertando a barra do jaleco.

— Ainda está em desenvolvimento, vai levar um tempo até ele terminar de se aprimorar.

— Então, faça-o se aprimorar mais rápido.

— Elijah é apenas uma criança, ele precisa de seu tempo.

— 386 é uma arma, não uma pessoa.

— Apesar de ele ser um robô, parte dele tem meu material genético. Então, em teoria…

— Ele não é seu filho! — Alterou a voz — Pare de tratar como fosse, desse jeito ele nunca irá progredir, Jiaying. — Socou a mesa. — Eu e meus amigos investimos muito nesse projeto para termos progresso. 386 foi o único experimento que sobrou desde o massacre de 1979. Não estrague tudo de novo.

Ela abaixou a cabeça.

— Desculpa, papa.

— Por favor, me trate com respeito, agora sou seu chefe.

— Ah sim, desculpa, Dr. Qiang. Darei meu melhor para que Elijah esteja pronto pelos próximos 6 meses.

— 3, de preferência. — Jiaying ameaçou abrir a boca para rebater. — 386 é a nossa última chance do projeto M50. Quanto mais rápido, melhor. Temos que mostrar aos nossos inimigos que somos mais fortes! Vamos fazê-los pagar por todo o sangue que derramaram.

— O senhor tem razão. Nem 386 nem eu, iremos te decepcionar.

— Assim espero. — Tossiu. Acendeu outro charuto. — Agora vá! Você tem muito trabalho ainda a ser feito.

Jiaying assentiu e se retirou. Fechou a porta atrás de si, passando em frente ao memorial aberto dos 96 experimentos mortos.

386, o único que restou.