Sioux Falls, julho de 1991

Os gritos agonizantes ecoavam por toda a casa e para além dela. A garota segurava os lençóis com toda a força que conseguia, tentando em vão canalizar sua dor para outro lugar. Parecia que sua barriga estava sendo arranhada e mordida de dentro para fora enquanto seus ossos se dilatavam, preparando-se para o que viria.

Sentiu uma mão afagando seu ombro e olhou para seu lado, encarando os olhos castanhos que transpassavam confiança e calma para ela. Sentiu mais uma fisgada e gritou de dor, empurrando com ainda mais força o corpo que queria sair dela. Sentiu uma dor como nunca, rasgando de dentro para fora enquanto o pequeno bebê saía de seu ventre.

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Caiu de costas na cama, respirando fundo e se sentindo aliviada por finalmente ser a única em seu próprio corpo. Ouviu o pequeno choro da criança e obrigou-se a se sentar, vendo que o pequeno embrulho já estava nas mãos de sua amiga.

— É uma menina. — sussurrou, andando em direção a cama e se sentando ao lado de Rose. — Tem os raros olhos verdes. — disse sorrindo, entregando o pequeno embrulho para ela.

Quando Rose a segurou, o pequeno bebê parou de se mexer, olhando atentamente ao rosto de sua mãe. Sentiu uma lágrima escorrer pela sua bochecha e sorriu, recebendo um pequenino sorriso de volta, fazendo com que Rose sorrisse ainda mais.

— Qual será o nome dela? — perguntou, impulsionando seu corpo mais para frente para poder ver o rosto dessa nova vida.

— Nyssa. Seu nome será Nyssa. — anunciou enquanto acariciava a pequena cabeça do bebê.

(...)

Nyssa se sentou na cadeira à sua frente e esperou Rosemary começar a falar. Ela colocou o porta retrato em cima da mesa e suspirou.

— Quando eu tinha vinte e um anos, eu conheci um homem que havia recém chegado à cidade. Ele começou a frequentar minha igreja e começamos a conversar. Era gentil, doce e cavalheiro. Apesar de ele ser um pouco reservado, não demoramos para acabar nos envolvendo um pouco mais. — murmurou enquanto olhava para a foto. — Namoramos durante alguns meses, não me recordo muito bem o tempo exato, e nesse meio tempo nos envolvemos cada vez mais. Porém, em uma semana ele foi chamado para algo importante um pouco longe daqui. Ele nunca me disse o que exatamente era. Pode parecer clichê, acho que com toda certeza é. — seus lábios se levantaram em um tímido sorriso enquanto falava. — Uma noite antes da viagem, eu me entreguei a ele. Acho que foi uma das melhores noites que já tive. — disse sonhadora, mas logo fez uma carranca quando Dean deu uma risada baixa. — Bom... Depois de algumas semanas em que ele foi embora, comecei a me sentir estranha, passando mal diversas vezes por dia, até que eu decidi ir ao médico e descobri que estava grávida.

"Uma amiga me ajudou em toda a minha gravidez, me apoiou até o fim. Então, eu tive você, a minha pequena Nyssa. Quando eu tive você em meus braços pela primeira vez era como se toda a minha vida tivesse se iluminado e tivesse tido um propósito. Te criei até seus doze anos. Mas, por favor, entenda. Eu tinha uma família extremamente conservadora e quando descobriram que eu havia engravidado sem antes de casar e, pior ainda, que o pai havia ido embora, eles me deserdaram. Eu consegui nos manter por alguns anos, mas eu sabia que aquilo não seria o suficiente para você, para você se tornar alguém. Então eu fiz a mais difícil escolha da minha vida, que foi te deixar no orfanato."

"Eu conhecia as Irmãs e sabia que elas cuidariam bem de você, então te deixei na estrada por onde a Irmã Sophie passava todos os dias. Garanti de todas as maneiras que você fosse encaminhada para as Irmãs e então decidi sair totalmente de sua vida, voltando para casa e tentando ao máximo..."

— Por que eu não me lembro de nada da minha infância? — perguntou, a interrompendo. — A primeira lembrança da minha vida que eu tenho é quando a Irmã Sophie me encontrou, mas nada além disso.

— Eu realmente não sei. — balançou a cabeça, secando seus olhos. — A última vez que eu vi você, você estava bem. Eu garanti de todas as formas que você ficasse bem a partir dali.

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Respirou fundo, controlando suas lágrimas. Aquilo era informação demais, sentimentos demais. Apesar de no fundo querer se levantar e abraçá-la, ainda estava ressentida com tudo aquilo. Por que ela nunca a havia procurado? Principalmente depois de completar os dezoito anos. Mas havia outra coisa ali que não fazia sentido.

— Por que você não disse o nome dele nenhuma vez?

— Ele pediu para que eu nunca falasse o nome dele para alguém. — deu de ombros. — Nunca entendi o porquê disso, tanto como boa parte de sua vida, mas decidi fazer o que ele pedia. Ele falava isso de uma maneira como se eu contasse algo ruim pudesse acontecer, então eu decidi realmente não contar.

— Nunca mais o encontrou?

Ela negou, olhando para algo abaixo de si.

— Esse caso está sendo mais estranho do que imaginei. — comentou Dean, levando um tapa na nuca de Sam em seguida.

— Cala a boca! — ralhou Sam.

— Acho que tudo foi resolvido, não?

Nyssa gritou de susto quando Castiel apareceu de repente atrás de si. Olhou para trás enquanto ainda se recuperava de susto.

— Por quê você sempre faz isso?

— Desculpe, não era minha intenção assustar você. Rosemary, você está livre, os demônios se foram.

— Conseguiu resolver o problema? — perguntou olhando para Castiel esperançosa.

— Sim. — disse simplesmente.

Nyssa os olhou confusa enquanto os dois trocavam olhares cúmplices. Apesar da longa história de Rosemary sobre sua vida, sabia que haviam diversas brechas e coisas que ela não havia contato naquele momento. Segurou sua língua e sua curiosidade pela incontável vez nas últimas 24 horas, teria que esperar um outro momento para continuar a conversa.

Após terminarem de arrumar todas as coisas do almoço, Rosemary a puxou para a sala de estar, deixando os garotos sozinhos na cozinha.

— Eu preciso que você entenda que eu nunca quis realmente deixar você. — disse quando se sentaram nas poltronas da sala. — Meu desejo era que de você fosse adotada por uma boa família com condições suficientes para te dar uma boa vida, e não que você acabasse caçando monstros pelo mundo. — suspirou. — Naquela época, precisei tomar muita coragem para tomar a decisão.

— Por que você nunca me procurou, tentou saber como eu estava? Eu me perguntei a minha vida inteira o porquê eu não tinha nenhuma memória da minha infância e porque haviam me abandonado como se fosse nada.

— Existem tantas coisas neste mundo que você e eu não entenderíamos. Eu acredito que, por mais que todas as coisas tenham acontecido desde que deixei você, o destino fez com que nos encontrássemos novamente, aqui.

Franziu o cenho, não entendo o que Rosemary estava querendo dizer.

— Se você quiser, podemos manter contato, nos vermos quando você não estiver caçando. Sioux não é muito longe daqui.

— Eu não sei. — falou enquanto balançava a cabeça, sem saber o que dizer. — Você precisa entender que toda esta situação me pegou de surpresa. Nunca imaginaria que em alguma caçada eu pudesse encontrar minha mãe biológica e que tudo isto iria acontecer.

— Claro, claro, eu entendo perfeitamente. Vamos no seu tempo, sem pressa. Eu estarei sempre aqui para quando você decidir.

Antes de sair da casa, Nyssa prometeu a Rosemary que passaria por ali dali algumas semanas para conversarem, o que a deixou extremamente feliz. Quando entraram no carro e foram em direção a estrada, passou todo o caminho olhando para a janela. Muita coisa martelava em sua cabeça, bagunçando-a ainda mais. Apesar das poucas informações, tinha certeza que havia mais coisas além do que ela havia contado, coisas que se relacionavam a ela. Mas o que mais a intrigava era Castiel conhecer tão bem Rosemary, como se conhecessem há muito tempo.

— Como você está? — Sam perguntou depois de um tempo na estrada.

— Confusa... Ainda não sei o que pensar sobre tudo isso, em toda essa história que Rosemary contou, não sei.

— É estranho ela ter colocado você justamente no quarto em que aquele porta retrato estava... Onde ficamos não havia nada e nem no resto da casa. Coincidência demais. — Dean comentou.

— Ou talvez ela tivesse feito isso de propósito para que visse. — Sam retrucou.

— Tudo é possível. — Nyssa sussurrou.

— Mas por experiência própria, nunca se deve confiar de cara em qualquer pessoa que apareça de repente em sua vida. Nunca se sabe o que ela pode querer, mesmo sendo apenas humana. — Dean encarou a ruiva pelo retrovisor. — Mesmo quem tem a melhor das intenções pode fazer mal.

— Rosemary não me pareceu alguém que pudesse fazer mal a alguém, principalmente à Nyssa.

— Não sei, são coincidências demais... Vocês duas foram sequestradas por aquele demônio...

— E Rosemary a conhecia. — Nyssa disse pela primeira vez.

— Como assim? — Sam perguntou, virando-se para ela.

— O demônio que nos sequestrou sabia quem era ela, mas Rosemary não a conhecia, pelo menos eu acho. Mas a segunda que chegou, uma tal de Banshee, a conhecia, sabia quem ela era e sabia quem eu era também. Banshee queria algo dela.

— Isso está ficando cada vez mais estranho...

— E ainda tem isso de Castiel e ela se conhecerem. Ele já comentou alguma coisa sobre Rosemary antes?

— Nada além de algo relacionado ao caso. — respondeu Dean.

— Eles tinham uma intimidade, parecia que se conheciam fazia algum tempo, mais tempo do que o caso. — resmungou. — Acho que Castiel sabe mais sobre a minha vida do que eu mesma. — bufou.

— Acredite, isso é totalmente possível. Essa é uma das coisas que odeio nele. — resmungou Dean. — Se depender dele, ele apenas irá falar se achar necessário ou se for no tempo certo. Já tentamos arrancar as coisas dele, mas ele apenas dizia quando alguém estava prestes a morrer ou quando ele queria. Se tentar forçar, ele apenas dirá que não possui autorização para falar sobre.

— Autorização de quem? Deus?

— Não sabemos. Castiel comenta sobre participar de uma guerra, ser um guerreiro de Deus, e que sempre está seguindo ordens para tudo aquilo que faz, que cada passo está sendo vigiado. — Sam se virou para frente. — Essa servidão que os anjos tem com o que quer que comande eles chega a parecer doentio.

— Mas Deus não deu o livre arbítrio para todos?

— Aparentemente não para os anjos, mas até onde sabemos, Castiel não se importa muito com isso.

— Talvez porque seja a única coisa que ele conheça. Isso é errado, não sei.

Sam apenas deu de ombros, voltando o olhar para a estrada. Nyssa permaneceu no banco de trás, pensando sobre tudo aquilo. Conhecia extremamente pouco de Castiel, por mais que ele tenha aparecido diversas vezes por conta desse caso e ela já estivesse há meses com os Winchesters. Ele sempre pareceu uma incógnita para ela, aparecendo por breves momentos.

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Chegaram em uma encruzilhada um pouco antes da rodovia, Dean parando na placa de pare e olhando para os lados. Nyssa viu algumas luzes brilharem forte pelo retrovisor, iluminando todo o carro, e, antes que pudesse falar se virar para ver o que era, algo bateu na traseira do carro, impulsionando-a para frente e a fazendo bater a cabeça.