Os quentes e brilhantes raios solares penetravam qualquer vão, janela ou porta abertos e banhava de luz a tarde de véspera da Calheita nas Montanhas Rochosas de Panem, onde o distrito mais próximo, territorialmente e socialmente, da Capital se localizava.

Uma garota de longos cabelos loiros repleto de ondas estava a passos firmes pelos corredores da Academia Preparatória dos Jogos Vorazes. Tecnicamente se preparar todos os anos para ser um voluntário e ter mais vantagem que os distritos mais pobres era contra as regras, porém como o Dois era o distrito praticamente mais rico e que fornecia toda legião de pacificadores e armas para a Capital, era óbvio que as autoridades fechavam os olhos para o seu descumprimento das regras. E todos os demais distritos sabiam que algo mais acontecia ali, porém não tinham como fazer nada. O mais fácil era que todos fingissem que estava tudo sobre controle e aceitar a situação a se rebelar novamente? Ao menos era o que faziam. Todas as noites oravam para que suas crianças ficassem bem e ignoravam o fato de serem menos favorecidos.

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Delphine Saint-Exupéry Black. 18 anos. Seus olhos claros brilhavam enquanto ela caminhava. Suas botas de cano alto batendo contra o chão polido. Ela desviou dos diversos jovens sem lhes dirigir o olhar e empurrou a porta de uma das salas as quais mais usava. A sala pouco iluminada e repleta de facas de diversos tamanhos, agilidades e afiadas se distribuíam por muitas prateleiras. Alvos estavam pregados na parede do fundo do cômodo e alguns bonecos estavam dependurados do teto como marionetes mortas.

Uma garota de cabelos cor de fogo estava atirando facas em um dos alvos. Delphine revirou os olhos e apanhou uma de suas facas favoritas. Ela era firme, média e afiada. Muito maleável e de fácil movimentação dentre seus ágeis dedos travessos. Segurou-a e dirigiu a lâmina até uma superfície de metal de uma das estantes, então, começou a deslizar a ponta contra o material produzindo um fino e agudo barulho que fez a outra garota se desconcertar e errar o alvo. Sua última faca se prendeu na parede de gesso na lateral direita próximo ao chão. A ruiva se virou e encarou a loira. Seus olhos fraquejaram por um estante, porém em seguida, ela endireitou a postura e cerrou os punhos.

— Estou usando a sala - A garota afirmou.

— Estava. Agora ela é minha - Delphine apontou a lâmina de sua faca em direção a saída - Saia.

— Você não pode ter tudo o que quer, Delphine. Tenho que treinar para os Jogos como todo mundo.

— Como se você tivesse capacidade para vencer alguma coisa - Um sorriso malicioso abriu em sua face clara e limpa, sem nenhum sinal de acnes e manchas - Sem contar que você já tem 18 anos e não teve coragem de se voluntariar ainda, Lore.

Os dentes da garota se cerraram. Ela largou as facas sobre uma prateleira e se encaminhou até estar de frente para a loira. Apenas cerca de trinta centímetros de distância.

— Eu vou me voluntariar esse ano - A ruiva fechou o semblante - E vou trazer o título de vitória para casa.

Dizendo assim, ela se virou para sair do mesmo ambiente em que Delphine. A loira revirou os olhos de novo e soltou uma risada abafada antes de lhe gritar:

— Ótimo. Desejaria que a sorte estivesse a seu favor se ela já não estivesse do meu - Lore olhou-a de relance enquanto saia - O Massacre Quaternário é o meu ano, sinto muito, lindinha.

Por fim, Delphine empurrou a porta e a fechou mesmo sem a outra garota ter tido tempo de dizer ou fazer nada. Agora sozinha pode contemplar o quanto se sentia revigorante e pronta. Ela se aproximou do alvo em que outrora Lore usara e segurou firme sua faca predileta. Não havia nada que a tirasse do sério. Ela conseguia tudo que queria. Não tinha com o que se preocupar, além de ter um talento enorme para persuadir e usar armas, principalmente facas. Delphine respirou fundo, se preparou e atirou o objeto que cravou no meio do alvo. Um sorriso leve brotou em seus lábios. Sua pontaria era impecável. E esse seria o seu ano.

***

Como sendo o distrito mais beneficiado era óbvio que a quantidade de tésseras era menor no Dois. Delphine fazia parte dos privilegiados que tinham uma vida boa. Sua casa era maior do que a da maioria. Cada um de seus irmãos tinham um quarto. Ninguém precisava dividir, até porque não demorou muito para seu irmão mais velho, Jordan, se casar e ir morar em uma casa mais simples com sua esposa, deixando assim o quarto maior da casa para Delphi que exigiu com seus chiliques já muito conhecidos e, o seu anterior ficou para o mais novo, Maximiliano, que dormia no quarto dos pais quando bem pequenino. Apenas seu outro irmão mais velho, Francis, não sofreu nenhuma mudança.

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Durante a noite a garota foi dormir mais cedo e bem alimentada. Ela não queria estar cansada porque a sua vida estava prestes a mudar no dia seguinte. Quando acordou, ela abriu o armário e encontrou uma roupa coberta por uma lona transparente. Um dos maiores hobbies de Delphine era a moda e ela se dedicara muito a isso, portanto vestia as melhores roupas e seu quarto continha um manequim, fita métrica, linhas, agulhas e tecidos. A loira puxou o cabide e colocou sobre sua cama.

Ela abriu e se deparou vim um vestido curto de costas pelada. Ele era cheio de tirinhas coloridas da azul e na barra, pouco acima do joelho, se tornavam cor de vinho. Aquela seria sua roupa da Colheita. Ela ficaria inesquecível. Delphine se trocou e arrumou os cabelos sedosos para que caíssem belamente sobre seus ombros.

Um sorriso brotou em seus lábios quando ela observou seu reflexo no espelho pequeno e oval de seu quarto. Ela estava deslumbrante mesmo levando em conta que o vidro era antigo e um pouco rachado em cima. O sangue corria em suas veias e seu coração estava acelerado. Seu momento de glória tinha de chegar. Todo aquele desejo havia começado quando Jordan vencera há alguns anos e chamara mais atenção do que ela. Ela sempre fora impecável e todos a observavam por onde andava e queria estar com ela mesmo que ela os menosprezasse ou usasse e ser compara a seu irmão mais velho fez a inveja consumi-la.

Agora era sua chance de provar que conseguia ser tão valente e corajosa e honrada quanto ele. E, também, mostrar que a família Saint-Exupéry Black estava com tudo e dominava o distrito. Uma prova disso era o seu pai ser o chefe dos pacificadores. Ela era quase como uma princesa para a maioria. E como tal, ela queria trazer uma coroa para casa.