Reviver

Extra


— Com licença Sr. Wayne, teria alguns minutos para uma entrevista para o Planeta Diário? — Clark Kent, com seu bloquinho de anotações em mãos, perseguia o milionário pela cafeteria da Clínica de Neurologia.

— ... Não — Bruce murmurou, indo até uma das máquinas de salgadinhos.

— Soube que seu filho está internado, o que contradiz sua última entrevista mencionando uma colónia de férias em... — Antes que o jornalista conseguisse continuar a fazer seu trabalho de importunar Bruce, ele observou o amigo esmurrar a pobre máquina enquanto tentava pegar alguma coisa. Os demais que estavam na cantina simplesmente ignoraram, como se fosse algo rotineiro — Quer ajuda?

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— Não! — Bruce tentou mais uma vez.

— ... Tem certeza, Sr. Wayne?

— Eu quero a porra da barrinha de cereais! Você consegue pegar ela!? Consegue!?

Das poucas e extremamente raras vezes em que Clark viu o amigo naquele estado de nervos, não tinha muito o que se fazer. O jornalista apenas deu uma “forcinha” e fez com que uma das barrinhas caísse – talvez melhorasse o clima.

— Então, Sr. Wayne, podemos ter uma conversa agora? Ao menos enquanto você... — Enquanto ele falava, Bruce foi se afastando em direção ao elevador. Clark se viu obrigado a ir atrás dele para conseguir arrancar alguma coisa e, por sorte, a cabine estava vazia — Bruce, será que você pode ao menos me responder o que está acontecendo?

— Não.

— Bruce, Jon viu quando vocês chegaram e me deixou realmente preocupado. Sei que parte do que ele disse deve ser só imaginação, mas se Damian está aqui isso significa que...

— Desliga um pouco o lado repórter — Bruce praticamente ordenou, enfiando a barrinha na boca de uma vez só.

O jornalista o observou enquanto tentava entender toda aquela relutância. O Wayne estava desgastado, visivelmente abatido, ansioso e provavelmente sem dormir desde que pôs os pés em Metrópole primeira vez, três dias atrás.

— Ele vai ficar bem? — Clark perguntou como um amigo, tentava manter os pensamentos positivos.

— ... Ninguém sabe. — Bruce murmurou fechando os punhos com força o suficiente para nocautear quem quer que recebesse aquele golpe – ele queria acertar a própria cara, estava se considerando o pior dos vilões pelo que deixou acontecer com o filho. Ele encarava o chão, não tinha forças para lidar com o “símbolo de esperança” quando ele mesmo não tinha mais.

Os dois ficaram em silêncio.

Super, que naquele momento se sentia um completo inútil ali, ficou surpreso quando o amigo repousou uma das mãos no ombro dele. Seria um ato completamente normal devido às circunstâncias, mas conhecendo o melhor amigo tão bem quanto Kent afirmava conhecer o morcego, sabia que aquilo era um péssimo sinal – visão turva.

— ... Ele... — Clark se deteve, precisou de alguns segundos até conseguir continuar: — Ele pode morrer?

O elevador abriu.

Estavam em um dos últimos andares daquele instituto neurológico aos arredores de Metropolis. Há anos aquele centro de estudos passou a funcionar como uma clínica para casos especiais, o que não impedia de ser um local requintado e à altura dos Wayne. Damian ficava em um dos maiores quartos, curiosamente o único leito ocupado daquele andar.

— Se continuar só olhando, as portas do elevador vão se fechar — Bruce murmurou contrariado.

— Alfred sabe que você está com a pressão alta desse jeito? — Super perguntou tentando se controlar para não dar risadinha: o “invulnerável” Batman se mostrar como um “morcego cego”.

— Por quê? Vai contar a ele?

— A última vez que você ficou assim, a Terra estava sob...!

— Não importa. — o interrompeu, continuando logo depois: — O que me importa é o meu filho, a minha pressão eu trato depois. O resto do mundo: a Liga da Justiça cuida.

Clark Kent, deixando novamente seu lado jornalístico se aflorar enquanto conduzia o amigo pelo corredor em passos lentos, começou:

— Já tenho o título da minha matéria: “Pai do ano tem ataque cardíaco tentando cuidar do filho”, uma experiência realmente nova para você... Não! Não é chamativa o suficiente! Que tal essa: “Pai inconsequente enfarta deixando seus filhos órfãos”, hun? — sem conseguir se controlar, ele acabou dando um de seus sorrisos idiotas e continuou: — Pobre Alfred, precisando fingir que não notou o seu estado ainda... ele também deve estar à beira de um ataque de nervos!

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— Você nunca cala a boca? — Bruce mantinha o tom frio, não via a menor graça naquela situação — Não sei como conseguiu se tornar um repórter com títulos tão ruins.

— Acho que são os óculos... Louis sempre diz que falo mais quando uso eles — Sorriu novamente, ignorando as alfinetadas — Só é algo novo demais o que está acontecendo: você agindo como um pai preocupado, um Batman preocupado.

— Se você entendesse a gravidade de tudo... — Murmurou contrariado, sem paciência para demais explicações. Alfred era melhor em lidar com pessoas, ele só queria lidar com o filho.

Os dois voltaram ao silêncio: Bruce não queria falar mais nada e Clark começou a pensar no que havia dito – aquilo não era a hora e muito menos o lugar para tentar ser o “amigo bem-humorado”, apesar da recusa em respostas indicar sempre e indiretamente que tudo ficaria bem.

Quando finalmente chegaram em frente à porta do quarto, Clark a abriu para o amigo – julgou ser necessário, já que das duas vezes em que o Wayne levou a mão em uma tentativa de abrir, errou a maçaneta. Assim que entraram, se depararam com uma cena que conseguiu quebrar qualquer expectativa:

Naquele quarto amplo e refinado, Damian parecia desenhar algo com movimentos sistemáticos e repetitivos. Ao lado dele, Alfred afagava o cabelo rebelde de Jonathan, rapazinho este que tinha os olhos ainda chorosos.

— Ele logo vai ficar bem, não precisa se preocupar... — O mordomo tentava soar otimista.

— Jon!? — Clark praticamente ignorou o amigo que ainda precisava de alguma ajuda e foi até o filho — Como entrou aqui? Pedi para me esperar no carro... Filho, o que foi? — Com a falta de respostas, ele recorreu ao único que deveria saber a resposta — O que houve, Alfred?

— ... Damian, ele... — o mordomo suspirou, estava visivelmente cansado.

— Mais uma crise? — com a voz transparecendo o quão preocupado e frustrado estava, Bruce perguntou dando passos tortuosos até conseguir alcançar o filho. Estar com a visão turva não era o bastante para pará-lo naquela situação.

— Exatamente — O mais velho dentre eles concordou, encarando o chão — Começou há menos de dois minutos, quando o jovem Jonathan entrou para saber como o amigo estava.

— Eu não fiz por mal! E-Eu só queria ver ele, mas... mas... — o mais novo tentava se explicar, mas se sentia tão culpado que voltou a chorar antes de conseguir falar mais uma palavra que fosse. Estava fazendo jus ao apelido de “bebê chorão”, apelido tal que Damian ainda não tinha usado.

O jornalista endireitou os óculos e olhou para a outra criança. Damian continuava rabiscando seu bloco de desenhos, literalmente rabiscando. O olhar estava perdido no mais completo nada, enquanto ele continuava fazendo uma sequência de riscos pela folha.

— O jovem Jonathan entrou pela janela. — o mordomo terminou a explicação, deixando claro o motivo de sua criança preferida estar naquele estado.

— Jon...! — Clark, levado pela incerteza e angustia do momento, acabou repreendendo o filho – por mais que querer ver o amigo fosse algo normal.

— Ele não fez por mal — Bruce interviu, sem realmente dar atenção para aquele conflito familiar. Ele simplesmente não queria piorar a atmosfera naquele quarto, que consequentemente poderia piorar o estado do filho — Damian está passando por uma situação delicada, da qual ninguém precisa saber. Meu filho só precisa de tranquilidade.

— ... Quando diz ninguém, é realmente ninguém além de quem já sabe? — Clark endireitou os óculos, tentando manter o lado repórter em repouso.

— Sim.

— E-ele vai ficar bem logo? — Jon perguntou com a voz embargada.

— Ainda não sabemos muito sobre a Epilepsia — Alfred respondeu.

— Bruce... — Superman buscou alguma palavra que pudesse reconfortar o amigo, mas não conseguiu achar.

— Eu já consigo lidar melhor com isso — ele respondeu, tirando cuidadosamente o bloco de desenhos e o lápis das mãos de Damian — Meu filho é epiléptico — Afirmou, abraçando o pequeno de modo que ainda permitia que os movimentos repetitivos continuassem — Não posso ajudar ele, nem mesmo você pode, Clark... ninguém pode.