Parte I

A Vigília Eterna

Eleyar abriu os olhos junto ao nascer do sol.

Do topo de Akatron, sua torre e casa, o elfo levantou de sua cama e caminhou para a varanda. Os raios de sol incidiram carinhosamente em seu corpo, os olhos lilás brilhantes ainda se acostumando à luminosidade do amanhecer. Como de costume, Eleyar tirou um tempo para contemplar tudo que sua visão permitia: a oeste, o imenso e verdejante Nakur, a leste, o menor e místico Maerys e, abaixo, outras terras cujos nomes nunca se dera o trabalho de aprender.

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no +Fiction e em seu antecessor, o Nyah, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!

Conforme descia a grande escada espiral de Akatron, o corpo de Eleyar começou a sentir a vibração das Linhas Arcanas, as correntes de energia mágica que fluem por todo o mundo. Sendo um elfo, sua afinidade com as Linhas era bem maior do que a das raças menores, especialmente a dos tão jovens humanos. A Vigília Eterna era um local especialmente propício para detectar a presença das Linhas Arcanas: acima da ilha, duas delas se interceptavam, formando um X no topo de Akatron. Isso, obviamente, não era nenhuma coincidência, a torre fora construída nesse lugar por ele e seus irmãos elfos há muitas eras levando em conta as Linhas Arcanas.

As escadas terminaram, Eleyar chegou à sala principal de Akatron. Flutuando no centro do salão hexagonal, uma esfera representando o mundo emanava um leve brilho azulado. A esfera, que Eleyar chamava de Orbe do Mundo, permitia ao elfo monitorar anomalias em todos os lugares do globo e, especialmente, em Kag’moth - o Inferno. Há mais tempo do que Eleyar conseguiria contar, o Orbe tinha permanecido imutável, tudo estava em silêncio e os Portões de Kag’moth selados.

Até agora.

Uma ruga de expressão formou-se na testa do elfo ao ver um pequeno brilho avermelhado emanando do outro lado do salão. Eleyar fez um gesto no ar e o Orbe girou até que o brilho estivesse à sua frente. Perplexo, o elfo lentamente desceu os degraus até o centro do salão hexagonal. “Sangue élfico...”, pensou, “Que sejam os meus olhos a falhar ou minha mente recém desperta a me enganar”.

Eleyar parou há poucos centímetros da esfera. Fechou os olhos, relembrando os horrores da Guerra Arcana e o sacrifício de seus irmãos. Quando os abriu novamente, os terrores que vivenciara éons atrás continuavam visíveis: o brilho vermelho emanava dos confins do mundo, de um oceano proibido e esquecido pelas areias do tempo, do infernal Kag’moth.

O elfo engoliu em seco, sua respiração ficou pesada e os olhos se arregalaram. Rapidamente, proferiu algumas palavras antigas e teleportou-se para o topo da torre, acima de seus aposentos. Ali, descansando empoeirada, estava uma luneta dourada com adornos de prata. Sem hesitar, o elfo apontou o artefato para o extremo oeste e olhou por detrás da lente enfeitiçada da luneta.

Uma lágrima escorreu por seu rosto ao ver os Portões parcialmente submergidos, água escorria e evaporava de cima das rochas, a grande runa de selamento bem no centro dos Portões já começava a ser visível. E, com seus olhos de elfo, Eleyar observou temeroso o primeiro resquício de magia infernal lutando para atravessar os Portões e subindo até a altura das Linhas Arcanas, impregnando-as com seu ódio e malícia.

“Eu sabia…”, falou para si mesmo, “Eu sabia que este dia chegaria”.

O elfo sorriu sarcasticamente, sentindo o gosto salgado de suas lágrimas encontrando a boca.

“É assim, com este resquício de maldade, que nossas vidas começam a se encaminhar para o triste fim que há muito foi previsto”. Eleyar suspirou, mais e mais traços da magia infernal se libertavam.