Rios Fluem Até Você

Ele seria bom


Ele seria bom. Faria o que deveria. O passado estava acabado. Kylo Ren estava morto. Agora, era Yuri Snow, um simples mecânico de Jakku. Repetia como um mantra para si mesmo. Era Yuri Snow.

Yuri Snow. Esse era seu nome.

Queimaria aquelas lembranças até virarem cinzas. Não, cinzas eram ainda um vestígio. Ele transformaria aquilo em nada. Não restaria sequer as cinzas.

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Fora com esta resolução que procurara por Rey. Porém, na presença dela, chegara a vacilar por um instante, um fugaz instante, em que todas as suas decisões pareceram demasiadamente erradas.

Havia tantas perguntas que giravam em sua cabeça como se ele estivesse em um estranho carrossel.

Kylo Ren... Um dia ele fora aquele monstro temido e odiado por toda galáxia. O inimigo da Resistência. E, principalmente, o inimigo de Rey.

Estranho, porém, não tinha nenhuma lembrança de Rey enquanto Kylo Ren. Lembrava-se de Poe em uma sala pequena, asfixiante e sombria. Recordava-se de Finn em uma pequena vila em uma noite escura e sem vida, usando a armadura de stormtrooper. Mas, absolutamente, nenhuma memória de Rey em meio àqueles caóticos fragmentos de recordações.

Recordava-se também de algumas outras coisas. A máscara que o protegia, não permitindo a ninguém ver a sua face. De alguma forma, ele sabia deste fato. A máscara o tornava poderoso e temido. Também havia o sabre cor de sangue, seu companheiro fiel. Com ele, havia atravessado numerosos inimigos.

Apenas possuía pequenos fragmentos de memórias. Nada mais do que isso. Tudo era caótico em sua mente. As memórias eram como pequenas peças de um grande quebra-cabeça que ele tentava resolver sem sucesso algum. Nada fazia sentindo.

Talvez, Rey e Kylo nunca tivessem se enfrentado pessoalmente. Mas, ele ouvira que Rey havia derrotado Kylo... Bobagem. As pessoas podiam exagerar nos fatos, como bem sabia. Era melhor assim. Não suportava a ideia de um dia ter duelado com ela. Aliás, não suportava a ideia de um dia ter sido seu inimigo.

Mas, ele não fora o inimigo de Rey. Quem fora o inimigo era Kylo Ren.

Uma parte dele, uma pequenina parte, demasiadamente persistente, insistia que aquilo que estava fazendo era errado. Ele estava enganando Rey. Sufocava aquela parte, porque sabia que, no fundo, ela estava certa, o que estava fazendo era errado.

Não. Ele seria bom. Ele se redimiria de todos os crimes que um dia cometera. Todo aquele passado seria enterrado. Ele era Yuri Snow agora, um homem que curaria as feridas que causara.

Porém, algo o intrigava. Por que ele era parecido com Ben Solo?

Ben Solo, o filho da General Organa e de Han Solo. O amor de Rey.

Por que o inimigo de Rey tinha justamente a face do amor dela?

E se...

Não, estava pensando bobagens. Aquilo não interessava. Essa era uma dúvida que deveria enterrar juntamente com todas as outras. Só matando aquele passado, poderia seguir em frente. Não deveria escavar o passado. Ele não tinha nada a ver com seu eu atual. Nada.

Era Yuri Snow agora e seria um homem bom.

— Você parece distraído — disse Rey, resgatando-o daquele fluxo de pensamentos caóticos.

— Desculpa, eu dormi pouco... — Aquilo não era uma mentira. Nas últimas vinte e quatro horas não tinha dormido nenhum segundo.

— Você pode tirar um cochilo, tem uma cama por aí — sugeriu ela.

— Tem certeza?

— Vai lá, durma. Eu posso me virar aqui sozinha — afirmou ela, sorrindo. — Sei pilotar uma nave.

Ele acatou a sugestão de Rey. Não porque iria dormir (não conseguiria tão cedo), mas sim porque se ficasse lá, tinha certeza que ela notaria seu estado. E ele estava tentando parecer o mais normal possível. Se ninguém soubesse que havia recuperado suas memórias poderia continuar ao lado de Rey. Poderia continuar a ser Yuri Snow. Poderia enterrar o passado na poeira estelar. Poderia consertar as coisas.

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Ele seria bom. Sim, ele seria. Consertaria todos os erros de Kylo Ren.

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O planeta era tão verde como o das lembranças de Rey. Takodana, fora ali que sua história começara de fato. Fora ali que ela se deparara com a Primeira Ordem pela primeira vez. Fora ali que ela encontrara o sabre de Luke e tivera aquelas visões da Força. Fora ali que ela o conhecera, pensou olhando para Ben.

— O que foi? — perguntou ele ao ver o sorriso que se formava no rosto dela.

— Eu só estava lembrando... algumas coisas.

— Você já esteve aqui antes, não é? — disse ele, dando uma boa olhada ao redor.

— Muito tempo atrás. Parece até que foi em outra vida. Talvez, foi mesmo. Tanta coisa mudou...

Ele a olhou, um olhar cheio de... Ela não conseguiu captar com precisão o significado daquele olhar, o sentimento fora tão breve. Ele deixou que um pequeno sorriso tomasse conta de seus lábios e desviou os olhos.

Quis indagar sobre aquilo. Porém, tudo fora tão breve e ela ainda estava atormentada por todas aquelas emoções e pensamentos ao ponto de estar interpretado as coisas ao seu redor de forma equivocada.

Rey deslizou a mão na dele, encaixando os dedos nos dele.

— Vamos? — perguntou ela, indo em direção ao velho castelo, que se erguia imponente sobre a floresta.

Depois da Primeira Ordem ter causado estragos naquele local, o castelo passara por reformas. Porém, ele continuava com aquele ar de coisa antiga, que guardava muitos segredos. Ela gostava do castelo, da floresta, daquele verde que invadia o planeta.

Quando seus pés pisaram no castelo era como se ela tivesse voltado no tempo. O lugar era barulhento como ela lembrava e um cheiro de comida pairava no ar. Um grupo de alienígenas tocava. As pessoas eram outras. No entanto, elas ainda eram tão diversas quanto as que encontrara naquele mesmo local. Era impressionante a capacidade de Maz reunir tantas pessoas com interesses tão distintos em um mesmo local.

Os dois sentaram-se em uma das mesas. Um atendente não demorou a aparecer. Eles pediram um pouco de pão e algumas frutas.

— Você pode esperar por mim aqui? — perguntou Rey, olhando ao redor. — Preciso encontrar Maz.

— Tudo bem — assentiu ele, pegando um pedaço de fruta. — Vá procurar Maz, eu fico por aqui.

Rey não demorou para encontrar Maz. Ela estava no armazém, verificando algumas bebidas.

— Rey! — exclamou a anciã assim que a avistou. A mulher não parecia nenhum um pouco surpresa ao vê-la. — Vem aqui! — Maz apertou Rey em seus pequenos braços.

Fazia muito tempo que não via Maz. Porém, ela não havia mudado nada, continuava igual a de suas recordações.

— Senti sua falta — disse Rey, dando uma boa olhada na pequena mulher.

— Eu também — replicou ela. — Venha, sente-se. — Ela indicou um pequeno banco. — Mas, sei que não são as saudades que a trouxeram aqui...

— Você também sentiu? — perguntou Rey, sentando-se em frente à Maz.

— Há um distúrbio na Força. Foi tão grande que não pude deixar de sentir.

— O que você acha que é? — indagou ela, apertando as mãos de Maz entre as suas com força.

— O que você acha que é? — devolveu a pergunta, olhando-a com aqueles olhos calmos e imensamente sábios. — Acho que você já sabe a resposta.

O coração de Rey se apertou. Aquela hipótese era tão terrível que ela temia até mesmo trazê-la para o nível das palavras.

— Não... Não pode ser. É impossível, não é? — negou ela, desejando desesperadamente que Maz concordasse com ela.

— Há verdades que não podem ser escondidas, minha querida Rey.

Ela negou com a cabeça, se recusando a acreditar naquilo. Aquilo era tão odioso que fazia seu estômago se revirar só de pensar.

— Mas, também há outra coisa que a atormenta — afirmou Maz, olhando-a com aqueles olhos antigos de quem já viveu durante um milênio. Nada podia escapar daquele olhar.

Rey sabia que se havia alguém que poderia compreender a situação em que se encontrava era Maz Kanata. Ela também sabia que nunca conseguiria esconder nada daquela mulher.

— Ben voltou.

Novamente, os olhos da anciã não demonstraram nenhum tipo de surpresa. Rey contou tudo a ela.

— Você pensa que isso é uma loucura? — perguntou Rey, após terminar de falar sobre aquela história que aos olhos de todos pareceria absurda demais.

— Não — falou ela com a voz serena. — Eu sei que é a verdade. Você e ele são a metade de uma mesma alma. Vocês estão destinados. Meia alma não pode sobreviver sem sua outra metade. Uma díade é algo extremamente poderoso.

— O que você acha que aconteceu a ele?

— Há mistérios demais na Força, minha menina. Mistérios que desconheço. A Força sabe o que faz.

— Sabe mesmo? — indagou Rey, pensando na situação em que se encontrava. Pensando naquela ameaça que pairava sobre suas cabeças.

Maz pegou novamente as mãos de Rey.

— Você precisa enfrentar o que vem pela frente. Não deve correr. Os medos só se tornam mais fortes porque nós os alimentamos, porque nós fugimos deles. Você sabe a verdade, Rey. Sabe que não adianta fugir.

Rey desviou os olhos dela com vergonha. Havia fugido tantas e tantas vezes. Foi por causa de sua covardia que ela cometera aquele erro. Talvez, se não tivesse fugido de Liebe nada daquilo teria acontecido com Ben. Tivera a oportunidade de mudar tudo, bem ali ao alcance de suas mãos, e simplesmente a desperdiçara por covardia, medo de enfrentar seus sentimentos. Se ela pudesse voltar no tempo... No entanto, era difícil não escapar, quando o caminho da fuga era claramente o mais fácil. O outro caminho era tortuoso e cheio de espinhos.

Ela assentiu e, pela primeira vez, deixou que aqueles pensamentos tomassem forma. Precisava parar de fugir e enfrentar a verdade.

— Palpatine está de volta — falou Rey, sentindo o gosto mais amargo que fel daquelas palavras estalando em sua boca.